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sexta-feira, fevereiro 20, 2009

Assim nascem as lendas


Por Laurent Chalumeau, da Rock & Folk

“Se deus não se resolver a destruir o mercado do rock, ele deve desculpas escritas a Sodoma e Gomorra” – Tomy Parsons (Platinum Logic)

HOLLYWOOD, CALIFÓRNIA – INÍCIO DOS ANOS 80

A Califórnia é uma região enganadora: típica periferia americana, isto é, um campo de trabalhos forçados disfarçado em colônia de férias pelo seu clima agradável e os maquiadores, estilistas e decoradores de Hollywood. Vince trabalha como eletricista, ou qualquer coisa do gênero, enquanto os outros estão curtindo. Quando não trabalha, dá um giro pelos lados de Hollywood.

Ele gostaria de encontrar um estilista ou uma maquiadora que o transformasse em mais um curtidor da vida. Manequim, ator, talvez uma estrela do rock, porque, afinal, ele gosta bastante de rock. Rockstar como aqueles que aparecem nos anúncios e nos clips: carros chiques, roupas transadas, garotas sexies.

Por enquanto, a experiência de Vince se limita a um ou dois Air Guitar Contest, esses concursos de solos epiléticos tocados sobre guitarras invisíveis, tal como praticado pela garotada durante os concertos: um tipo de diversão em moda nos salões hard do centro-oeste americano e da Califórnia. Vince nunca faturou um prêmio, apesar do “consolo” que ele deixa aparecer acima das calças para distrair o júri. “Por que não, afinal?”, pensa Vince.

“Fisicamente não tenho muita pinta. Também não sou o cara mais inteligente que eu conheço, mas, puxa, não é porque somos feios e burros que não temos direito a um pouco de diversão. Pelo contrário, a gente deveria ter direito a uma dupla dose de bebidas, dinheiro e garotas. Para compensar.”

KERRANG KERRANG

Não se preocupe, porque você não está sozinho nesta jogada. Por exemplo, tem o seu amigo Nikki, que não é como você, é uma espécie de cabeça feita, lê os livros até o fim. Durante o dia ele vende telefones e à noite ele recopia as cartas dos leitores de Penthouse, tentando encontrar rimas. Nikki escreve letras de música. Pelo menos tenta.

Ele toca também um pouco de baixo, alguns riffs que encontrou na lixeira do estúdio Record Plant. Mas isso não tem tanta importância. O rock não é só música. Nikki quer aproveitar sua juventude, esvaziar todas as garrafas, traçar o que pintar e não se chatear com um trampo mixuruca. Nikki também quer ser rockstar. Mas, como ele é mais inteligente, quer “viver o rock até os seus limites”.

Tommy é metido a gostosão. Nem precisa dizer que toca num grupo só para faturar as gatas. Ele gosta de bater nos tambores e será o baterista.

Quanto a Mick Mars... Bem, ele é muito mais velho que os demais. É casado. Já tem três filhos. Nasceu em Indiana, de pai pastor. Começou a tocar com nove anos, depois que sua família mudou para Hollywood. Quando encontra os três outros, ele sobrevive tocando num grupo disco. Mas a discothèque está decaindo e o heavy parece estar acordando em L. A.: Quiet Riot, Hanoi Rocks etc... Por que não o metal? Nikki já tem um nome ótimo: “Motley Crüe” (germanização de motley crew, que em português significa “gangue de maltrapilhos”).

Uma noite eles estão bebendo no Rainbow, o bar hard da rua Sunset, quando decidem começar a trabalhar juntos. Alguns ensaios mais tarde, já gravam o primeiro álbum, de qualquer jeito. Eles mesmos se produzem e lançam o disco pela Leathur Records (o seu próprio selo). Mas, mesmo quando se trata de “te enfiar minha lâmina quente até o fundo, até que o sangue escorregue nas suas coxas, yeah!”, palavras bem escolhidas, nada acontece. Parece mesmo uma gangue de maltrapilhos que fica gritando obscenidades.

Entretanto, eles são um pouco mais ousados que os outros grupos de metal. Quem sabe, com um empresário que os dirigisse com bastante dinamismo?

Quando se juntaram à escuderia do empresário Doug Thaler, os quatro integrantes do Crüe deram um belo pulo pra frente, em termos de carreira. Muito tempo atrás Doug tocara no grupo de Ronnie James Dio e, durante os anos 70, organizara para a agência ATI as turnês de Blue Oyster Cult, Aerosmith e muitos outros.

Pouco a pouco Thaler aprendeu todos os detalhes infalíveis que, a sorte ajudando, enchem os ginásios norte-americanos e vendem discos para os garotos da periferia. Thaler conhece a música, ele já entendeu tudo.

Associado ao herdeiro de uma pequena fortuna texana, Doug decide arriscar com Nikki e sua gangue. E começa gastando dois mil dólares em roupas. Na seqüência, confia a produção do álbum a Roy Baker, produtor de talento, encarregando-o de dar uma polida geral. O álbum interessa à Elektra e o LP Too Fast for Love é relançado, dessa vez “de verdade”.

Então, para o seguinte – Shout at the Devil –, Thaler faz uma nova extravagância: contrata Tom Werman produtor de Ted Nugent, Cheap Trick e Twisted Sister. Thaler e Werman concordam, pelo menos, num ponto: os quatro não são geniais, mas também não são preguiçosos. Transformá-los em estrelas não será difícil. Werman os força a estudar música e Thaler marca show em cima de show.

As letras de Nikki fazem o resto do serviço: “De joelhos, bote-o pra fora, bem devagar”. Acaba chamando a atenção. O segundo disco do Motley vende que nem banana. Tudo funciona a mil quando, de repente, uma entrevista de rotina, uma simples operação de promoção, ameaça virar uma catástrofe.

No final de 83, Thaler não reclamaria nada se conseguisse um pouco de publicidade. Quando uma certa Debra Frost anuncia que a revista People gostaria de dar seis páginas de Motley Crüe e que ela precisaria passar uns tempos com as figuras, Thaler fica muito contente. Os jornalistas da People são profissionais, sabem o que devem imprimir e o que deve ser deixado de lado. Debra passa vários dias em companhia do Crüe, e cada um do grupo, a começar por Thaler, abre o coração para a jornalista.

No dia em que descobre que, além do People, Frost pensava aproveitar as entrevistas para publicar um tipo de “Hard Rock Babylon” no Village Voice (com toda a verdade que o pessoal ligado deseja saber), Thaler entra em pânico.

Ele se toca de que a desgraçada vai publicar não somente todas as histórias de bebidas, sexo (até aqui, tudo bem; Thaler sabe que um bom escândalo vale o mesmo que cinco a dez mil execuções no rádio), mas também de que ela vai “revelar os segredos” (a expressão é dele), a idade real dos caras (sem maquilagem, Mick Mars parece muito além dos trinta), a situação familiar de cada um (Vince é casado, Mick está para divorciar, tem três crianças), os passados (Nikki contou umas boas sobre sua infância e sua mãe) ou mesmo as estadias em clínicas para se limpar de todos os micróbios que o “bráulio” catou durante as turnês (daria para esfriar até a mais disposta das groupies).

Para melhorar as coisas, mais ou menos na mesma época, Vince, bêbado, pega uma auto-estrada na contra-mão, amassa um carro, machuca duas garotas e aproveita para mandar pro além o baterista do Hanoi Rocks. Vince pode pegar até cinco anos de cadeia. E durante o processo tem o juiz que fica lendo Star Hits para citar os trechos onde Vince se vangloria de beber sozinho em uma noite o que a Polônia e a Irlanda demorariam seis meses para esvaziar.

O grupo decide não posar para a People, que não publica o artigo. Vince é condenado a trinta dias e a uma multa indenizatória de US$ 2,5 milhões, pagos às vítimas. Thaler respira aliviado. Mesmo assim o Village Voice publica o artigo de Frost.

As mulheres dos senadores norte-americanos declaram guerra ao rock, em geral, e ao hard, em particular. E Thaler constata feliz que, afinal, todo esse barulho ajudou as vendas de Theatre of Pain.

Entretanto, ele escapa de uma fria, conforme confidenciou a 5pm: “Ter deixado essa mulher se aproximar deles foi talvez o maior erro da minha carreira. Primeiro, ela parecia um professor de ginástica. Por outro lado, os quatro são falocratas até a morte; para eles uma garota só serve para uma coisa: foder. Ela perguntava coisas do gênero ‘como vocês se chamavam antes de começar o grupo?’ Pô, o cara passa seu tempo tentando esquecer os primeiros vinte cinco anos de sua vida, e acabam perguntando logo isso? Isso não vai vender discos nem revistas, só vai machucar o carinha”.

No mês seguinte a 5pm publica uma carta de Debra Frost: “Primeiro, não pareço um professor de ginástica. E não estranho o fato de Thaler pensar que os jornalistas só servem para vender discos. Ele também se parece muito com seus potrinhos, que acham que mulher só serve para sacanagem”. Enquanto isso o Mõtley Crüe vende milhões de discos e é consagrado o grupo mais ultrajante dos anos 80.

Well... Entrevistei Nikki Sixx, entrevistei Mick Mars, discuti com Debra Frost. Doug Thaler foi muito simpático comigo.

Encantados por encontrar alguém que ainda se escandalize com esse tipo de imbecilidade, os quatro aproveitaram para acrescentar e chocar Debra Frost. Eles pediam para ela ficar na sala onde eles traziam suas jovens fãs. E pediam que ela olhasse as “brincadeiras”.

Ela se aproximou desses garotos mais do que qualquer outro jornalista, antes ou depois dela. E trouxe duas ou três observações: “Vince é comovente. Sempre falando do seu bar: ‘Você precisa ver todas as garrafas que tenho’”; “Ele prefere as garrafas a todos seus discos de ouro”; “Eles odeiam as mulheres, em geral, e as groupies, em particular. Você precisa ver como eles falam das mães!”; “Eles desprezam a docilidade de seus fãs”.

Naturalmente, em sociedade eles não são nem David Niven nem John Gilgoud. As lições de boas maneiras foram tomadas na zona. Mas, sem ser simpático, Nikki, por exemplo, é interessante em entrevista. E até intrigante como usa sua coleção de sofismas.

P: Vocês vêm de onde, geograficamente, socialmente e musicalmente?
N: Geograficamente, de Hollywood. Socialmente, da sarjeta. Musicalmente, dos grupos glitter e hard dos anos 70.

P: Vocês deram uma entrevista apimentada a Spin? (amostras: “No próximo álbum e durante a próxima tour, vamos ser mais nojentos”) Afinal, não é cansativo ser nojento todos os dias?
N: Não me forço a ser nojento. Vivo assim, às gargalhadas.

P: Se você achasse a mulher da sua vida...
N: Isso não existe para mim.

P: ...isso não o deixaria mais calmo?
N: Nada pode me acalmar! Tenho o rock’n’roll no sangue. Para mim tudo isso é normal. Se os outros grupos fossem menos chatos ninguém repararia na gente. Eu aproveito para agradecer a todos os Dire Straits e Simple Minds do mundo por terem feito de mim um rebelde, o Inimigo Público n.º 1. Nós somos o show total, nas ruas ou no palco. Nós damos tudo. Como num filme pornográfico. Exato, é com isso que temos de ser comparados.

P: Já que você é um rebelde, tem alguma causa a propor a seu público?
N: Não é a minha. Estou aqui só para tocar rock.

P: O acidente do Vince vai mudar alguma coisa?
N: Nunca. Agora só falamos de não beber antes de dirigir.

P: O que é essa estrela que serve de logotipo da banda e essa história de “Teatro da Dor” – é verdade que vocês são adoradores de Satanás?
N: Porra, quantas vezes vou precisar explicar isso? A estrela é um pentagrama. A Bíblia o define como um símbolo de sorte. Theatre of Pain vem de um livro que eu li sobre o teatro italiano da Idade Média, sabe, a comedia de l’arte. Eu fiquei impressionado pela semelhança com o nosso show. Na época, se os saltimbancos não divertiam o rei, eles eram degolados. Para nós é a mesma coisa. Se não damos o máximo de nossas possibilidades, o público nos condena à morte. Nosso lema é “diversão ou morte”. E os nossos fãs sabem disso perfeitamente. São os pais e as mal-amadas do PMRC (o grupo de mulheres dos senadores de Washington) que divulgam todas essas besteiras sobre a gente, mas a garotada entende. Nós somos um grupo de rock (a essa altura ele começa a declamar o que parece ser o seu credo, já que o recitou várias vezes frente a outros microfones)... A gente adora os excessos do rock. Porque é maravilhoso. Aqueles que dizem que não desejam essa vida estão falando abobrinhas. Não precisa fazer a cama de manhã. É melhor do que o Natal: não é preciso crescer, amadurecer e todas essas palhaçadas. Tudo o que você precisa fazer é pegar o telefone e pedir champanhe, depois descer do quarto, pegar a limusine que está à sua espera para levá-lo aonde você quiser, tocar, na seqüência comer, encher a cara e, depois, festas backstage com garotas geniais e os fãs, e cataplum! – no dia seguinte você recomeça tudo numa outra cidade, com outras pessoas. É genial.

VIVER O ROCK (5.º GERAÇÃO)

Nikki entendeu tudo. Quando você ouve suas explicações, o que o rock deveria ou não ser, pensa que ele deveria ser crítico. Nikki decorou os relatórios das turnês históricas do Who, Rolling Stones, Aerosmith. E realizou seu sonho: vive como seus ídolos. Nikki leva uma vida de rockstar, mas não é um roqueiro. Os pequenos textos pornográficos que ele rabisca rapidamente não são ruins, mas até hoje não escreveu uma boa canção. Mas ele não está nem aí. Afinal, o rock não é só música. Na comédia do rock, é verdade, todo mundo tem um papel já definido por trinta anos de tradição: Arlequin, as estrelas, os fãs, as groupies, os empresários etc... e um dia – Nikki já sacou – ele será degolado.

quinta-feira, fevereiro 19, 2009

A musicalidade de Jack Kerouac


Jack Kerouac trabalhando na sua prosa-bebop-espontânea


Dylan e Ginsberg recitando poemas diante do túmulo de Kerouac


Em 1992, a editora City Lights tirou dos cofres poemas escritos por Jack Kerouac entre 1954 e 1956 e lançou o livro Pomes of All Sizes, colocando em foco a lucidez e o ceticismo do poeta beat. No prefácio do livro, do qual publico alguns trechos, Allen Ginsberg escreveu o seguinte:

Ele era poeta. “Vocês se dizem poetas e escrevem linhazinhas curtas. Eu sou poeta, mas escrevo linhas, parágrafos, de páginas e páginas de comprimento”. Ele escreveu isso em meados dos anos 50, numa carta da Cidade do México, que embrulhava um rolo de folhas de seus Mexico City Blues.

Daí seu ouvido examinar a nua poesia em prosa de Burroughs (...) Seu ouvido seguiu o caminho do som. Veio de leitura e música: Thomas Wolfe, Herman Melville, Shakespeare, Spengler em O Declínio do Oeste, Sir Thomas Brown, Rabelais, Shelley, Poe, Hart Crane – um ouvido romântico. E o moderno: Whitman, Eliot, Pound, Céline e Genet. Alma de Dostoievsky e Gogol. Música da “Paixão segundo São Mateus”, de Bach, ao “Mysterioso”, de Thelonius Monk. Sua influência é mundial, não apenas espiritual, com o beat planetário de uma cultura jovem, mas poética, técnica.

Despertou Bob Dylan para menestrel do mundo. “Como o senhor conhece a poesia de Kerouac?”, perguntei a Dylan, depois que improvisamos canções e lemos coros de Mexico City Blues, diante do túmulo de Kerouac, de 1976, no cemitério Edison, de Lowell. A resposta de Dylan: “Alguém me pôs nas mãos México City Blues em St. Paul, em 1959, e aquilo mexeu com a minha cabeça”. Diss que foi a poesia que falou a sua língua.

Minha própria poesia sempre se modelou pela prática de Kerouac de traçar os sons e pensamentos de sua mente diretamente no papel (...) Todos os poetas da Renascença de San Francisco foram interessados, impressionados e às vezes inspirados pela força solitária e autóctone de Kerouac, por seu domínio desimpedido do idioma americano.

(...) Leroi Jones, que liberou um mundo de verso afroamericano também captou um pouco da musicalidade de Kerouac. E foi Kerouac, sem dúvida, que colaborou com Burroughs em sua primeira ficção hard boiled, em 1945, e passou a chama preciosa da sagrada poesia em prosa – feita em casa, pessoal, espontânea – para o próprio Burroughs. Kerouac foi um catalisador, ali. E quantos pretendentes a poetas, poetas comuns e poetas geniais nos Estados Unidos encontraram um modelo na lenda e nos textos de Kerouac?

Kerouac é um poema maior, seminal, da segunda metade do século 20 americano. E pela marca que deixou em Dylan e em mim, entre outros, uma influência poética planetária. E, no entanto, um poeta que ainda não é reconhecido pela Academia, representada aqui pelas maiores antologias didáticas usadas nesse quarto de século que transcorreu desde a morte de Kerouac. “Nova Poesia Americana”, dos anos 60, introduziu Kerouac no mundo das antologias disso, amnésia total! Onde encontrar um texto de Kerouac? Onde encontrar Kerouac para surpreender e encantar os jovens que abrem seus livros escolares?

Até que Kerouac seja entendido como poeta, a beleza de seu verso formal se torne visível para estudiosos e sua surpreendente ternura seja captada e sentida por professores, o ensino de Literatura Americana nunca vai cair no trilho certo, a nação não exaltará seu espírito compassivo, hordas de burocratas literários continuarão a soprar inspiração oca e novas gerações serão afastadas da poesia, a não ser que tenham a chance individual de se achar esse livro original de Kerouac ou obras de seus companheiros de viagem, semelhantes e de coração leve, na mesma estrada anunciada por Walt Whitman.


Ônibus para o Leste

A sociedade tem boas intenções
A burocracia parece uma amiga

5 anos atrás – outras fúrias
outras perdas –

A América está tentando
controlar o
incontrolável
Incêndios em florestas,
Vícios

O sorriso essencial
No sono essencial
Das crianças
Da mente essencial

Eu estou cansado de fazer o papel
do americano
Agora eu vou levar
uma vida boa e tranqüila

(Poema escrito em um ônibus de San Francisco para Nova York, em abril de 1954)

Em 2007, na Universidade Federal do Paraná, a Bacharel em Letras Gisele Pacola apresentou uma monografia intitulada “A influência de Jack Kerouac na transição musical de Bob Dylan”, que merece ser lida. Se estiver interessado, entre nesse endereço: www.letras.ufpr.br/documentos/graduacao/monografias/ss_2007/Gisele_Pacola.pdf

Festa da Literatura em MG

Da série "Meu Personagem Favorito"


As milhares de bobajadas que recebo diariamente são sempre bem vindas. Sim, levo uma meia hora diária para debulhar o trigo, separar o joio e estreitar nas mãos o precioso mel.

De vez em quando, alguns trojans e spywares me escapam pelos dedos e detonam meu HD. Fazer o que? No mar intrépido da net, ser bucaneiro é nossa honra e maldição.

O cara (ou a cara) que me enviou isso deve ter-me em conta como um grande machão ("Chuck Norris das letras manauenses a serviço da reificação do machismo numa sociedade comum de dois gêneros (...)"). Gostar de mulheres? Gosto sim, com mucho gosto. Heterosexual convicto? Sim, sem nenhum deslize na vida pregressa ou futura. Machão? Sim, sou mesmo, e daí?... Vai encarar...

Na boa, mesmo, esses axiomas me transportaram para o tempo em que éramos todos jovens e que a suprema heresia era passar a mão – de leve – sobre um peitinho guarnecido por um sutiã com a consistência de encosto de fusca, circa 76. Se fosse num baile de carnaval, então, era assunto pro ano inteiro...

Ri pra caralho, no sentido termoplástico do termo. Se puderem, divirtam-se:

- As lágrimas de Chuck Norris curam câncer. Mas ele é tão durão que nunca chorou na vida. Nunca!

- Chuck Norris já contou até o infinito. Duas vezes.

- Chuck Norris não sai à caça. Caçar implica a possibilidade de que falhe. Cuck Norris sai pra matar.

- Nas letras miúdas na última página do livro Guinness dos Recordes está escrito que todos os recordes mundiais pertencem a Chuck Norris e aqueles listados no livro são os de quem chegou mais próximo.

- A Teoria da Evolução não existe. O que existem são as criaturas que Chuck Norris permite viver.

- Não houve uma bomba em Nagasaki. Chuck Norris pulou de um avião e deu um soco no chão. Contam-se no dedo os sobreviventes que riram da parada.

- Há uma nova Teoria da Relatividade envolvendo múltiplos universos nos quais Chuck Norris é ainda pior do que é aqui. Quando Albert Einstein divulgou a descoberta, Chuck Norris o chutou na cara. Hoje conhecemos Albert Einstein pelo nome de Stephen Hawking. E se ele insistir em teoria quântica de buracos negros, vem mais porrada por aí.

- O tempo não espera ninguém. Exceto se for Chuck Norris .

- Não existem armas de destruição em massa. Existe apenas Chuck Norris.

- Chuck Norris pediu um Big Mac no Burger King. E foi atendido.

- Chuck Norris consegue dividir por zero. E o matemático que reclamar entra na porrada.

- Algumas pessoas usam uniforme do Superman. Já o Superman usa uniforme do Chuck Norris.

- Quando Deus disse "haja luz" Chuck Norris disse "diga 'por favor'".

- Se você consegue ver Chuck Norris, ele também consegue vê-lo. Se você não consegue ver Chuck Norris, provavelmente você está a alguns segundos da morte.

- Certa vez, Chuck Norris chutou um cara tão forte que seu pé entrou na velocidade da luz, voltou no tempo e matou Amelia Earhart enquanto ela sobrevoava o Pacífico.

- Os círculos em plantações de milhos é o jeito de Chuck dizer ao mundo que, às vezes, os milhos deviam crescer no chão.

- Chuck Norris mede 10 pés de altura, pesa duas toneladas, respira fogo, e poderia comer um martelo e levar um tiro de shotgun sem se mexer.

- A Grande Muralha da China foi originalmente criada para manter o Chuck afastado das mulheres xintoístas. Falhou miseravelmente.

- Se você perguntar para Chuck Norris que horas são, ele dirá que "faltam 2 segundos". Logo após você perguntar "para o que?", ele te dará um chute na cara.

- Chuck Norris dirige um caminhão de sorvete coberto por crânios humanos.

- Chuck Norris vendeu sua alma ao Diabo para ter sua aparência e incomparável habilidade em artes marciais. Logo após o cumprimento da transação, Chuck deu uma voadora no Diabo e pegou sua alma de volta. O Diabo, que aprecia ironia, não pôde ficar brabo e admitiu que deveria ter previsto. Agora eles jogam poker toda 2ª quarta do mês.

- Uma vez Chuck Norris comeu três bifes de 2kg em uma hora. É que ele passou os primeiros 45 minutos fazendo sexo com a garçonete que o serviu!

- Chuck Norris é o único ser humano que já derrotou uma parede de tijolos em um jogo de tênis.

- Chuck Norris não bate manteiga. Ele dá uma voadora na vaca e a manteiga sai voando.

- Quando paga seus impostos, Chuck Norris apenas envia formulários em branco e uma foto sua, em posição de ataque. Chuck nunca teve problemas com a Receita.

- O jeito mais rápido de parar o coração de um homem é pelo punho de Norris.

- As vagas de deficientes não são realmente para deficientes. São todas do Chuck Norris, e o que está desenhado no chão é apenas um aviso para quem parar nelas.

- Chuck Norris originalmente aparecia no jogo "Street Fighter II", mas foi removido por Beta Testers porque qualquer botão apertado fazia com que ele desse uma voadora no adversário. Quanto perguntado sobre o bug, Norris respondia: "isto não é um bug". E a porrada comia.

- A cena de abertura de "O Resgate do Soldado Ryan" é baseada em jogos de queimada que Chuck Norris jogava na segunda série.

- Certa vez, Chuck derrubou um caça alemão usando seu dedo e gritando: "Bang!". O piloto se intitulava Barão Vermelho.

- Chuck Norris certa vez apostou com a NASA que conseguiria entrar na atmosfera sem utilizar uma roupa espacial. No dia 19 de Julho de 1999, Norris, pelado, entrou na atmosfera, passando por 14 estados e alcançando uma temperatura de 3000°C. A NASA, envergonhada pela aposta, desmente tudo, afirmando se tratar de um meteoro e até hoje lhe deve uma cerveja.

- Chuck Norris tem duas velocidades: Caminhar e Matar.

- Certa vez, alguém tentou convencer Norris de que uma voadora não seria o melhor jeito de se chutar. Historiadores relembram o fato como o maior erro que alguém já cometeu.

- Ao contrário do que a maioria pensa, os EUA não são democráticos. São ChuckNorrisáticos.

- As Tartarugas Mutantes Ninjas são baseadas em fatos reais: Norris certa vez engoliu uma tartaruga por inteiro e, quando a defecou, ela tinha 6 pés de altura e lutava karatê.

- Chuck Norris não é forte como um cavalo. Os cavalos que são fortes como Norris.

- Chuck Norris é conhecido por ter ilustrado o princípio de Heisenberg
- você nunca sabe exatamente onde e com que velocidade ele lhe dará uma voadora.

- Chuck Norris pode beber um galão de leite em 47s. Se estiver contaminado com salmonella, a marca baixa para 17s.

- No dia de seu nascimento, ao invés de nascer, Norris soqueou seu caminho para fora do útero de sua mãe.

- A unidade militar "Chuck Norris" não foi utilizada no jogo Civilization 4, pois uma única unidade poderia derrotar todos os outros impérios juntos do Mundo em 1 turno.

- Em uma sala comum, existem 1.242 objetos com os quais Norris poderia matá-lo, incluindo a própria sala.

- Não há queixo atrás da barba de Chuck Norris. Há outro punho

- Quando Chuck Norris cai na água, Chuck Norris não fica molhado. A água fica Chuck Norris.

- No seu aniversário, Chuck Norris seleciona aleatoriamente uma criança de sorte que será arremessada ao sol. Se sobreviver, ela será o novo Capitão Marvel.

- Chuck Norris jogou roleta russa com uma arma totalmente carregada e ganhou.

- Não existe anabolizantes. Existem apenas as pessoas que Chuck Norris assoprou pelo cu.

- Não existem raças. Existem apenas países em que a população apanhou de Chuck Norris em diferentes tonalidades de roxo.

- A grama do vizinho sempre é mais verde, a não ser que Chuck Norris vá lá. Nesse caso, a grama vai estar ensopada em sangue e lágrimas.

- Chuck Norris inventou seu próprio estilo de caratê. Ele se chama Chuck-Will-Kill

- Quando Chuck Norris fala, todos o ouvem. E morrem.

- Chuck Norris sabe exatamente ONDE está Carmen Sandiego

- No início, não havia nada... Então Chuck Norris deu um chute na cara do nada e falou: "Vá fazer alguma porra útil". Essa é a verdadeira história do universo.

- O café de Chuck Norris é muito simples: Ele mói café com seus próprios dentes e ferve a água com sua fúria. Não pergunte como ele côa, a não ser que queira levar porrada.

- Se você procurar no Google "Chuck Norris tomando uma surra" você vai ter 0 resultados.

- Chuck Norris não faz strikes. Ele nocauteia um pino e os outros 9 desmaiam de medo.

- Chuck Norris respeita profundamente a vida humana. A menos que alguém passe na sua frente assoviando uma música do Radiohead.

- O que passa na cabeça das vítimas de Chuck Norris antes de morrerem? O sapato de Chuck Norris.

- Chuck Norris não tem fogão, forno ou micro-ondas, pois a vingança é um prato que se come frio...

- Tom Clancy teve que pagar indenizações para Chuck Norris pois "A soma de todos os medos" na verdade é a sua autobiografia

- Chuck Norris come bife e caga pólvora. Com a pólvora ele faz uma bala, que usa pra matar uma vaca e poder comer mais bife. As pessoas se referem a isso como "ciclo vital".

- Chuck Norris não pisa no chão, ele pisa em pescoços.

- Chuck Norris não brinca de Deus. Brincar é coisa de criança.

- Chuck Norris não pode "amar". Ele pode "não-matar".

- De acordo com a teoria da relatividade de Einstein, Chuck Norris pode te dar um chute ontem.

- Cientistas estimaram que a energia liberada durante o Big Bang é rigorosamente igual a 1CNRhk (Chuck Norris Roudhouse Kick)

- Chuck Norris leva 20 minutos para assistir ao show "60 minutos"

- O triângulo das bermudas costumava ser o quadrado das bermudas até um chute do Chuck Norris arrebentar um dos lados e a hipotenusa ficar encagaçada.

- Uma vez, Chuck Norris engoliu um pote de tranqüilizantes. Eles quase fizeram ele piscar.

- Chuck Norris é o responsável pela superpopulação da China. Ele apresentou um show de karatê em Pequim e todas as mulheres num raio de 1600 Km ficaram grávidas instantaneamente.

- Uma vez, Chuck Norris trabalhou como apresentador da previsão do tempo em uma emissora de TV e apresentava sempre o mesmo texto: "Parcialmente nublado com 75% de chance de dor." Ninguém ligou pra reclamar.

- Chuck Norris mantém os seus amigos próximos e seus inimigos mais próximos ainda. Próximo o bastante para derrubá-los com um chute na cara.

- Chuck Norris pode fechar uma porta giratória.

- Não existe essa coisa de aquecimento global. Chuck Norris estava com frio e aumentou a temperatura do sol.

- Quando era adolescente, Chuck Norris transou com todas as freiras de um convento no Rio de Janeiro. Nove meses depois elas deram a luz ao time maravilhoso que ganhou a copa do mundo de 1970.

- Todas as vezes que Chuck Norris sorri alguém morre. A menos que ele esteja sorrindo e chutando a cara de alguém. Aí duas pessoas morrem.

- Um dia um homem perguntou a Chuck Norris se seu nome verdadeiro era Charles. Chuck Norris não respondeu nada. Ele simplesmente encarou o homem enquanto ele se convertia em cinzas. O nome disso, hoje, se chama “incineração auto-espontânea”.

- Chuck norris não dorme. Ele espera

- O sangue de Chuck Norris é CNR+ (chute no rabo positivo) e é compatível somente com equipamentos pesados, tanques Schindler e caças de última geração.

- Se em um jogo de soletrar você soletrar Chuck Norris, você ganha. Para sempre.

- Quando Chuck Norris vai doar sangue ele recusa a seringa. Ele pede um revolver e um balde.

- Um dia Chuck Norris desafiou Lance Armstrong para um concurso de "quem tem mais testículos?" Chuck Norris ganhou por cinco.

- Chuck Norris troca de pele duas vezes por ano.

- Uma vez Chuck Norris comeu um bolo inteiro antes que seus amigos o avisassem de que havia uma stripper dentro do bolo.

- A casa de Chuck Norris não tem portas, somente paredes que ele atravessa naturalmente.

- Chuck Norris não usa lâmina de barbear. Ele apenas dá um chute em seu próprio rosto com a unha do dedão do pé em posição de ataque. A única coisa que pode cortar Chuck Norris é Chuck Norris.

- Chuck Norris não usa relógio. Ele decide que horas são.

- Chuck Norris esteve uma vez em uma briga de facas. E as facas perderam.

- Na comunidade médica a morte é classificada como: Mal De Chuck Norris.

- Chuck Norris nunca vai ao dentista porque seus dentes são inquebrantáveis. Seus inimigos nunca vão ao dentista porque não tem dentes.

- Na Bíblia, Jesus transformou água em vinho. Se Chuck Norris estivesse presente, ele transformaria o vinho em cerveja.

- Chuck Norris consegue terminar aquele joguinho "LIG 4" com somente três movimentos.

- Zuou uma vez comigo, você é um chato. Zuou uma vez com Chuck Norris, você está fodido!

- Mais rápido que uma bala... Mais poderoso que uma locomotiva... Capaz de transpor arranha céus com um sinples salto... Sim, esses são alguns dos exercícios de aquecimento de Chuck Norris.

- A maioria das pessoas possui 23 pares de cromossomos. Chuck Norris tem 72, todos eles venenosos.

- Chuck Norris inventou a receita secreta dos frangos do KFC com 11 ervas e especiarias. Mas ninguém nunca mencionou o 12o ingrediente: Medo.

- Chuck Norris pode te acertar tão forte que na verdade pode alterar seu DNA. Décadas depois, seus descendentes podem levar as mãos à cabeça e dizer: Putz! O que foi isso!?

- Chuck Norris tem 12 luas. Uma delas é a Terra

- Se em qualquer vestibular você escrever Chuck Norris em todas as respostas você gabarita tudo

- Pressionando simplesmente pelas extremidades, Chuck Norris pode transformar os diamantes de volta em carvão

- James Cameron queria Chuck Norris para estrelar "O Exterminador do Futuro", mas aí ele pensou bem e achou que seu filme ia virar um documentário. Foi por isso que ele chamou o Arnold Schwarzenegger.

- Não existem armas de destruição em massa no Iraque. Chuck Norris mora nos Estados Unidos.

- Quando você é Chuck Norris, qualquer coisa + qualquer coisa é igual a 1. Um chute na sua cara.

- Chuck Norris tirou sua carteira de motorista aos 16... segundos

- Chuck Norris inventou a cor negra. Na verdade ele inventou todo o espectro de cores visíveis menos o rosa. Tom Cruise inventou o rosa.

- Quando Chuck Norris urina ele pode facilmente fundir titânio

- A 3a Lei de Newton está errada: Mesmo que ela diga que para a cada ação há uma reação igual, não existe nenhuma força igual em reação a um chute de Chuck Norris.

- Uma imagem é melhor do que 1000 palavras. Um Chuck Norris é melhor do que 1 bilhão de imagens.

- Na verdade, Chuck Norris não escreve livros. As palavras vão se ajuntando sozinhas de puro medo.

- O chute de Chuck Norris é o método preferido de execução em 16 estados americanos.

- A cor preferida de Ray Charles era Chuck Norris

- Nos filmes dos X-Man não existem efeitos especiais para os poderes dos personagens. Chuck Norris serve como dublê para todos eles.

- Nós vivemos em um universo em expansão. Todo ele querendo escapar de Chuck Norris.

- Chuck Norris pode incendiar formigas com uma lente de aumento. À noite.

- Chuck Norris recentemente teve a idéia de vender sua urina em pequenas latinhas. Nós conhecemos essa bebida como Red Bull.

- Quando Bruce Banner fica puto ele vira o Hulk. Quando o Hulk fica puto ele vira Chuck Norris.

- Chuck Norris usa uma cascavel viva como camisinha. Se perguntar como ele entra dentro dela, você leva um chute na cara.

domingo, fevereiro 15, 2009

Você já estão atrasados, moleques...


Para os místicos, o último sábado (dia do desfile da BICA) marcou o inicio de um novo período para a humanidade. Em 14 de fevereiro de 2009 – eu estava me recuperando de um porre desgraçado, não lembro direito – começou a era de Aquário – que rege, além do amor e da paz, a liberdade e as mudanças.

Sim, brothers and sisters, antigas civilizações descobriram que a posição da Terra em relação à Via Láctea muda lentamente. A cada dois mil anos, uma nova constelação aparece no horizonte, no primeiro dia da primavera do hemisfério norte.

Por dois milênios, essa constelação rege uma era astrológica, na qual predomina uma nova civilização.

A era de Gêmeos foi a da invenção da escrita; a era de Touro, a do antigo Egito; a de Áries, a da Grécia Antiga e a de Peixes, a do Cristianismo. Agora, nós estaríamos entrando numa nova era, a era de Aquário – em latim, Aquarius.

Os astrólogos discordam sobre o início da era de Aquarius, mas alguns calcularam a data a partir dos versos que abrem a canção mais famosa sobre a nova era, que faz parte do musical Hair. Eles concluíram que, pela configuração dos astros, Aquarius começou neste sábado, 14 de fevereiro de 2009 (e o bonitinho aqui, cagando...).

O filme dos anos 70 e a nova montagem do musical Hair, que está em ensaios e estreia em março na Broadway, começam com a profecia: "Quando a lua estiver na sétima casa e Júpiter alinhado a Marte, a paz guiará os planetas e o amor governará as estrelas".

Aquário rege, além de paz e amor, a tecnologia da informação, a liberdade e a mudança. Será o fim do autoritarismo da era de Peixes.

A diretora da nova montagem do musical, Diane Paulus, diz que gostaria de ter sido adolescente nos anos 60, quando a era de Aquário tinha um sentido coletivo, de união.

Para a cantora Sasha Allen, que encabeça o elenco, a canção faz a gente se sentir em comunhão com o universo.

Para quem não sabe de que merda estou falando, sente a bunda na cadeira, acenda o incenso, inspire profundamente e se posicione na flor de lótus. Aí clique aqui para ver um pedaço do filme “Hair” legendado.

Antes que a gente esqueça: o nome da banda que tocava originalmente essa parada da nova era - ou novo aeon, pra gente se lembrar do Raul Seixas - se chamava 5ª Dimensão. De leve.

quarta-feira, fevereiro 11, 2009

BICA: Um reduto da rebeldia em Manaus


D. Lourdes e Armando sendo homenageados pelo GRES Reino Unido da Liberdade


Ana Lúcia, Armando, Praciano, D. Lourdes e Ana Cláudia, na cerimônia em que o português virou cidadão manauense


A eterna musa Petronila em dose dupla


Orlando Farias, Chicão Cruz, Rogelio Casado, Felix Valois, Mário Adolfo, Anchieta (meio encoberto), Leandro, Pedro Paulo e Simão Pessoa


Joana Meireles, Jomar Fernandes, Petronila, Chicão Cruz, Professor Mestrinho, Mário Adolfo e Felix Valois


O então prefeito Serafim Corrêa comandando o desfile da banda pelas ruas



Orlando Farias

Imaginem uma senhora de 60 anos, 100% fora dos padrões de beleza, docemente cavernosa, que parou naquele Bar do Armando há muitos anos numa rotina impressionante: ela reza todas as noites na Igreja de São Sebastião e, ao sair, beberica uma cerveja no espaço ao lado.

Não é preciso ir muito longe para saber que naquele ato e gesto da admirada e adorada Petronila de Carvalho, há uma fusão dos aspectos religioso e profano.

A Doce Rainha Petronila – Não por acaso, Petronila virou a rainha eterna da BICA desde o primeiro carnaval naquele já cada vez longínquo fevereiro de 1987. E igualmente não por acaso, a BICA é uma mistura dos muitos valores culturais da terra de Ajuricaba.

Numa entrevista realizada em janeiro de 2004 com a própria Petronila, no dia da realização do desfile da banda, em sua residência, quando estava sendo conduzida até a praça São Sebastião (ela estava adoentada e não conseguia andar direito), a Rainha da Banda traduziu em poucas palavras para o autor e para o fotógrafo Marco Gomes o estado de espírito dela própria em relação ao fenômeno em que se transformou a BICA:

“Para mim a BICA é como rezar; é estar sempre alegre dentro de mim mesma!”.

Tanto quanto o estilo Petronila do rezar e de uns bons copos de cerveja, a frase da Rainha é reveladora de um sentimento quase religioso que as pessoas, sobretudo aquelas pessoas que passaram com o tempo a se identificar pelo neologismo de “biqueiros”. Há definitivamente um fervor naquilo que nunca deixou de ser uma brincadeira do início da década de 80, sempre nos fins de ano e na semana derradeira do carnaval: a batalha do talco travada entre os vários freqüentadores do Bar do Armando.

Mona e Pepeta – Há dois nomes cuja imagem é muito associada ao estilo libertário e prosaico da banda. A primeira é a Porta-Bandeira Mona (Maria da Glória Lopes) que, na verdade, foi a primeira Rainha da BICA, passando depois o cetro para Petronila, que era a Princesa. A outra é o Destaque Pepeta, figura que, em seus carnavais, invocava todo o seu poder transformista para virar obeliscas e outras figuras do gênero. Pepeta morreu de causas desconhecidas há alguns anos.

Há dezenas de aspectos religiosos na brincadeira que virou uma das principais manifestações culturais de Manaus. A começar pela influência da própria paróquia de São Sebastião ao lado, mantida secularmente pelos capuchinhos.

Breve História da BICA – Para quem não sabe, o imóvel tombado pelo Patrimônio Histórico Estadual e construído no início do século passado pertence à Ordem dos Capuchinhos. O caráter pluralista, cultural e religioso sempre encantou os missionários da Ordem.

É possível afirmar com certeza que o imóvel existia já em 1913, porquanto exista uma fotografia no Acervo do Estado e por meio da qual a Secretaria de Cultura do Amazonas realizou recentemente a restauração do prédio.

Desde aquela época, o imóvel já era uma mercearia como denota a sua fachada com três portas. Chamava-se Mercearia São Sebastião.

Ao lado da mercearia, onde hoje está localizada a garagem do Armando, onde igualmente ele guarda o seu indefectível Fusquinha modelo 1973, funcionava no passado uma oficina de bicicletas de um cidadão conhecido como Zuza (“Oficina do Zuza”).

Era lá que as bicicletas que circulavam na praça São Sebastião eram consertadas.

Ao lado da ex-Mercearia São Sebastião, moraram algumas proeminências, como o historiador Mário Ypiranga Monteiro, Thales Loureiro e mais recentemente o ex-presidente nacional da OAB e ex-senador Bernardo Cabral.

O patrono da BICA, Armando Soares, garante que ao tomar posse do estabelecimento, vindo do mercadão Adolpho Lisboa, onde vendia carne, o imóvel servia para revenda clandestina de derivados de petróleo. Provavelmente, por conta disso, os capuchinhos desfizeram o negócio com o antigo locatário e o repassaram ao atual ocupante.

Raízes Religiosas da BICA – Há dezenas de aspectos religiosos na brincadeira que virou uma das principais manifestações culturais de Manaus. A começar pela influência da própria paróquia de São Sebastião ao lado, mantida pelos capuchinhos.

Basta lembrar que no carnaval da BICA em que a banda fez uma crítica direta às seitas religiosas e tascou com o samba de sucesso do hit parade “Xô, Satanás”, frei Fulgêncio Monacelli, coordenador dos Capuchinhos, esteve pessoalmente vários vezes no Bar do Armando para demonstrar sua solidariedade ao tema.

O crescimento da Banda da BICA acabou sendo uma dor de cabeça para frei Fulgêncio, que mantém uma reivindicação há mais de 15 anos depois dos primeiros carnavais: a de que o sábado, dia da concentração da banda, deveria ser transferida para outro dia da semana ou mesmo, numa concessão, para o domingo.

Frei Fulgêncio Casamenteiro – A lamúria e a reivindicação são motivadas por uma tradição na Igreja de São Sebastião: a sua forte tradição casamenteira. Trata-se da igreja mais charmosa para um casal contrair núpcias por causa do cenário arquitetônico e histórico em volta e pela própria história da igreja decorada originalmente como planejou o gênio italiano De Angelis.

Decerto que, por uma questão de tradição mais recente, a reivindicação sincera de frei Fulgêncio até hoje não pôde ser cumprida: o carnaval da BICA arraigou-se de tal maneira enquanto data no sábado magro da semana momesca, que seria quase impossível convencer a banda de realizar em outro dia e conter os brincantes que nesse dia se concentram espontaneamente, sem precisar conferir a data em reportagens de jornais. A faixa estendida na fachada do bar alertando para o dia da saída da banda é mais do que suficiente para mobilizar a população.

Mais recentemente, porém, frei Fulgêncio Monacelli encontrou uma maneira de compatibilizar os casamentos: antecipa sua celebração para o início da tarde, quando o público ainda não lotou o Largo de São Sebastião.

Não é difícil imaginar que os recém-casados encontrem pela frente um cenário ainda mais temperado de alegria, já que na saída deles, por volta de 13 às 15h, a irreverência e a folia literalmente já galopam lá fora. Há um certo sonho alimentado pelos biqueiros mais novos de que suas respectivas cerimônias de casamentos ocorram na Igreja de São Sebastião ou em locais mais nobres como o palco do Teatro Amazonas.

Os contornos religiosos saltam aos olhos por todos os lados. Os bonecos gigantes construídos pelo ventríloquo Paulo Mamulengo são uma prova disso. Eles não representam apenas figuras vivas como Armando Soares, Dona Lourdes Soares (sua esposa), Deocleciano Bentes (um dos coordenadores da banda), como também figuras que fizeram história naquele espaço e na própria banda.

Celeste, Celestial, Criatura – A funcionária pública Celeste Pereira e fundadora da banda, foi uma delas. Falecida prematuramente no ano de 1997, Celeste foi alvo de uma das maiores comoções dos membros da banda. Em seu funeral, a Bandeira da BICA estava lá.

Celeste ganhou imediatamente o status de uma personalidade pós-morte, ocupando importante espaço na galeria da banda que, vale ressaltar, existe apenas na memória dos fundadores, dos biqueiros e dos freqüentadores do espaço cultural do Bar do Armando.

Uma das cenas mais marcantes da história da banda envolve um ato estritamente religioso: o momento em que chega na praça São Sebastião, hoje Largo de São Sebastião, o boneco confeccionado por Paulo Mamulengo em homenagem a Celeste.
Dezenas de membros da banda choraram em profusão, totalmente em desacordo com as normas do carnaval onde o reinado é o da alegria.

O empresário Isper Acram, ladeando o presidente regional da OAB, Alberto Simonetti Filho, não se conteve: “Simonetti, eu não estou entendendo nada. O boneco é bonito. Era para todo mundo estar rindo e aqui ao nosso lado todo mundo está chorando”.

Só então Acram ficou sabendo que o boneco que chegara era o confeccionado em homenagem a Celeste cujo falecimento tinha ocorrido há apenas dois meses. Excelente cantora e animadora cultural, Celeste, Celestial, Criatura (slogan da camisa em sua homenagem), ela era uma espécie de símbolo da alegria da banda.

O contorno religioso pode ser visto ainda no boneco de Salignac, um dos fundadores da banda, que teve o boneco confeccionado antes de sua partida desta vida, e no próprio boneco do frei Fulgêncio. Por representar um ícone da sociedade amazonense – de longe frei Fulgêncio é uma das figuras mais queridas da cidade –, o boneco é manipulado com certos limites, sempre cercado de respeito pelos brincantes.

O boneco em homenagem a Armando Soares é cercado do mesmo respeito pelos brincantes. Diferente do de frei Fulgêncio, ele é manipulado de forma mais lúdica, alegre e brincalhona.

O boneco, afinal de contas, reproduz muito o humor do próprio Armando, uma figura brincalhona e irreverente que, antes das pegadinhas da TV, já adorava pregar peças em seus clientes. “– Olha, Nazareno, ele veio aqui te procurar!”. “– Quem, sêo Armando?”, pergunta inocente o jornalista Jersey Nazareno. “– Ó caralho!”, diz Armando com o forte sotaque lusitano. “Ó caralho, tu quer cegar ou tu quer ser gay?” (risadas gerais).

No gesto de Armando Dias Soares, 70 anos, sobressai denso o profano que, no dia do desfile, embala um dos carnavais mais instigantes que se conhece. A banda é uma irreverência referencial na cultura da cidade, queiram ou não as pessoas que a desprezam.

O próprio Armando traz na sua história traços muito firmes da irreverência. Quando jovem, participava ativamente de reuniões do clube representativo dos seus patrícios – o Luso Sporting Club.

Não raras vezes contestou atos da diretoria e, numa delas, as desavenças chegaram até a esfera policial, já que Armando, bom de briga, não deixou por menos, e aplicou uns safanões em certo portuga.

Por ter sido a vida inteira um homem irrepreensivelmente honesto e mantendo sempre uma postura exemplar, seja como comerciante, seja como marido e pai, acabou sendo assimilado e convertido como espécie de uma referência obrigatória da imigração portuguesa para Manaus.

Não foi por outro motivo que diretores e produtores portugueses que rodaram o filme A Selva, baseado no romance do escritor português Ferreira de Castro (morou no Amazonas, precisamente no sítio Paraíso, na região dos seringais no rio Madeira), quiseram conhecer o Bar do Armando e o próprio comerciante assim que aterrissaram na capital amazonense em 2002, procedentes de Portugal.

Quem quiser um roteiro clássico de tal irreverência é só consultar a extensa lista das marchinhas que a BICA lançou, todas elas abordando temas picantes, satirizando os políticos do Estado.

Ninguém incorpora melhor um perfil indelével, uma marquinha registrada, digamos assim, como o patrono em pessoa da BICA, Armando Dias Soares. E logo ele que representou o momento máximo da banda, o momento inesquecível, arrebatador de todos os que se proclamaram biqueiro.

O momento foi a transformação do patrono da banda em “Cidadão de Manaus” na Câmara Municipal. O projeto que outorgou a cidadania a Armando foi apresentado por um biqueiro, o vereador Francisco Praciano, em 1998.

A batalha para aprová-lo remonta um processo levado a efeito por freqüentadores da Banda da BICA. O grupo literário e artístico Gens da Selva sensibilizou em iniciar uma campanha visando a tornar Armando “Cidadão de Manaus”.

Armando, Cidadão do Mundo e de Manaus – A maneira encontrada para garantir o título ao nosso portuga-mor foi iniciar o levantamento de assinaturas de eleitores propondo a concessão da outorga ao patrono da BICA. As assinaturas enfeixavam uma categoria parlamentar que é uma conquista recente do aperfeiçoamento democrático e constitucional do Brasil – a emenda popular.

“Levamos cerca de um mês apenas para reunir 5 mil assinaturas. Foi relativamente fácil porque Armando realmente é uma figura muito querida na cidade e todos queriam assinar”, diz o poeta Marco Gomes, lembrando que o vereador Francisco Praciano participou ativamente do processo e desde o início fez questão de chamar para si a responsabilidade de apresentar a Emenda.

Ela foi apresentada em sessão da Câmara Municipal de Manaus no segundo semestre de 1998 e aprovada por unanimidade. No fim do ano, celebrou-se a cerimônia de outorga do título. Foi a primeira vez, ao que consta, que Armando deixou aquele seu jaleco azul com o qual é visto sempre atendendo sua clientela para envergar um garboso terno com gravata.

O feito de Armando era muito fácil de estabelecer. Sem que a cidade percebesse seu envolvimento na sua vida política e cultural, Armando garantiu um mínimo de espaço democrático para que jovens, artistas, jornalistas, socialistas de todas as matizes e até rebeldes sem causa pudessem debater diariamente sobre os assuntos da cidade.

Mais tarde, Armando Soares acabou dando à cidade, por iniciativa de seus freqüentadores – inspirada nele e conduzida por ele –, a maior manifestação cultural de rua da cidade – a Banda da BICA.

Um dos coordenadores da BICA, Deocleciano Souza (ex-presidente do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Amazonas), fez um discurso simples – flagrantemente de reconhecimento a uma obra que a cidade deve a Armando.

Foi a primeira e única vez que um homem tido como dotado por nervos de aço, que viveu parte da longa era da peixeira na cintura que vigorou nas décadas de cinqüenta e sessenta no mercadão Adolpho Lisboa, quando até crianças faziam o mesmo lá e no matadouro de Manaus (Koure), sucumbiu às lágrimas.

Foi um momento emocionante, conta Deocleciano. Tudo quanto Armando pôde dizer em discurso – “Nós que sabíamos que seu coração estava apertado” – foi que, se morresse naquele momento, estaria partindo feliz por se saber reconhecido pela cidade que escolheu para sua, cidade que tanto ama e onde nasceram, cresceram e se formaram suas duas filhas.

Ana Cláudia e Ana Lúcia são profissionais respeitadas na cidade, atuando uma como pedagoga e agora também advogada, sendo a outra profissional da Comunicação. Ambas biqueiras.

O título foi o mote para que a Escola de Samba Reino Unido da Liberdade escolhesse a história de Armando e da própria BICA como seu enredo no carnaval de 1999. Então presidente da Câmara Municipal de Manaus, o vereador Bosco Saraiva, diretor da Reino Unido da Liberdade, teve a idéia de estalo. Armando era um excelente nome para o carnaval da sua escola no próximo ano na avenida.

Chegado o grande dia do desfile, o enredo “Armando Brasileiro” sacudiu o Sambódromo e venceu de ponta a ponta na computação dos resultados. Os biqueiros passaram três dias comemorando.

Malhação de Judas – A partir daquele momento e daquele ano, ficou claro para os biqueiros que a brincadeira tinha ido longe demais. Convertera-se em expressão cultural da cidade. E como tal, a “brincadeira” jamais poderia acabar, até porque virou uma lei da cidade – esperar o carnaval da banda como uma espécie de “Malhação do Judas” (novamente pontifica aí o religioso) fora de época.

Virou lugar-comum fora da BICA chegar e indagar: “Quem é que vocês vão malhar esse ano?”. E a “malhação da BICA” virou quase uma obsessão popular, já que significa sempre satirizar políticos e personalidades inatingíveis pela crítica popular e muitas vezes até pela própria imprensa.

Tem o mesmo tom de malhação uma pequena tradição recorrente da cidade ao dia seguinte às eleições: “A Partida para o Balatal”. Freqüentadores da banda não deixam nunca de aparecer no “Day After” para enumerar os passageiros do Batelão (um barco sem cobertura para protegê-los do sol e da chuva) derrotados nas eleições e que, punidos pela sociedade, vão cortar seringa em distantes seringais, conforme a brincadeira irreverente do imaginário popular amazonense.

É muito comum, durante os períodos eleitorais, vigorar também uma certa “marcha do pleito”. São freqüentadores da BICA, afinal, pesquisadores de opinião pública e marqueteiros. As anedotas mais picantes invariavelmente surgem ou são reverberadas para a população.

A Consolidação da BICA – Ainda sobre a comemoração do “Armando Brasileiro” na avenida, vale lembrar que daquele momento brotou outro sentimento que emergiu cristalino do seio dos “brincantes”. A de que aquela era uma brincadeira que verdadeiramente arrebatara senhores de cabelos grisalhos, homens do povo, sisudos doutores do Judiciário, desocupados, poetas, etc, etc, etc. Um sentimento de profunda alegria e de amor à banda povoaram os seus admiradores.

As lágrimas foram traduzidas na frase de um dos fundadores da BICA, o promotor público Francisco Cruz: “A brincadeira da BICA é uma coisa muito séria”.

Se é ou não uma coisa séria, objeto, aliás, atraente para o debate dos seus admiradores e até das pesquisas da Antropologia, a BICA pode dizer que é rigorosamente uma banda de carnaval. E mais: uma banda que, arrebatando corações e mentes, mantém-se fiel aos seus postulados de ser verdadeiramente de carnaval e de rua.

Toscano e os Gêneros da Moda – Sendo uma banda de carnaval, ela nunca se permitiu enveredar por ritmos e gêneros musicais diferentes ou de moda. “Nunca sucumbimos ao poder avassalador da indústria das músicas da moda”, explica Afonso Toscano, outro fundador muito influente e autor de muitos dos sambas que levaram o nome de biqueiros mortos, como é da tradição da BICA.

Mantém rigorosamente a sua origem de bandinha de rua. Jamais se curvou à tentação de migrar para um carnaval comercial, em lugares fechados, com cobrança de ingressos e outros expedientes.

“A marca do nosso carnaval é que ele é feito na rua de forma livre e espontânea”, diz um dos organizadores da folia no Largo, o também artista Manuelzinho Batera. Ele lembra que o custo do primeiro carnaval foi praticamente zero e foi bancado pela contribuição dos freqüentadores do espaço cultural Bar do Armando.

O fenômeno de massa em que se converteu acabou exigindo um investimento mais vigoroso para garantir ampla segurança aos brincantes, banheiros públicos, sonorização e cachês da banda de metais que acompanha a BICA. “Hoje, além da contribuição dos muitos membros, aceitamos um ou outro patrocínio”, diz Manuelzinho. Resta ainda lembrar que, no dicionário da BICA, ser biqueiro é ser relativamente fiel à sua banda.

Sem Precisar das Estrelas – Um fato marcante e indelével da imagem da BICA: o fato de ser a única banda que não precisa contratar atrações de fora, artistas a peso de ouro, bandas de cachês milionários, visando atrair público ao Largo de São Sebastião.

A BICA tem apenas uma atração: a sua Banda de Metais. Também faz um único tipo de propaganda para anunciar o dia da realização de seu carnaval: a divulgação boca a boca. Mais do que isso, uma faixa em frente ao Bar do Armando anuncia o dia do seu carnaval.

Esse caráter original e mobilizador deve encher de inveja muitos políticos que, para atrair platéia, recorrem a contratação de artistas, bandas e outras estrelas em seus eventos.

O Biqueiro Serafim – Um caso clássico é o do economista Serafim Corrêa, biqueiro desde a primeira hora, que freqüenta o Armando, dentre outras coisas, por causa dos seus laços lusitanos. O pai de Serafim, Joaquim Francisco Corrêa, e seu tio, Alcino Francisco Corrêa, eram amigos pessoais de Armando.

Pouco afeito a eventos festivos, Serafim sempre se destacou como um membro de ponta da banda, sendo um caso máximo de fidelidade a ela. “Minha única paixão nesse caso é a BICA”, sustenta.

A frase de Serafim Corrêa pôde ser inteiramente confirmada no dia 29 de outubro de 2004, ao fim do debate na TV que travou com Amazonino Mendes e no qual venceu incontestavelmente o seu adversário, conforme levantamento do instituto Action Marketing e Pesquisas de Mercado. Sabendo que a BICA estava lotando e torcendo por ele, Serafim saiu do debate direto para rever os amigos biqueiros.

Em determinado desfile da banda (ela percorre todo ano uma área do Centro com seus bonecos, bandeiras, flâmulas e personalidades), Serafim foi induzido por brincantes a subir no trio elétrico da BICA. Como aquele ato transpareceu imediatamente aos olhos dos biqueiros como um ato de favorecimento político, houve imediata reprimenda para que Serafim de lá descesse.

Democrata e muito afinado com as regras da BICA, ele imediatamente entendeu o recado e desceu do trio sob aplausos. Aliviado, desceu acompanhando a marcha da banda como simples membro.

O mais dramático fato envolvendo um político ocorreu com a vereadora de Manaus, Lúcia Antony, biqueira histórica, impedida de ler um documento elaborado por um grupo de biqueiros.

Alegou-se, como é da norma da BICA, que não se lê manifestos, notas ou coisa que o valha durante o carnaval. É vedado o uso de discurso, o tom de comício. Ali reina 100% o império do carnaval, de suas brincadeiras, irreverências, malhações e marchinhas.

A norma que penalizou Lúcia Antony estava e está em vigor. Mas Lúcia leu um documento elaborado por um pequeno grupo de biqueiros, ao qual me incluo, redimindo-me com ela daquela desconfortável reação da massa. Aliás, em carnavais posteriores, Lúcia Antony recebeu das mãos deste autor camisas da diretoria da banda em sinal de respeito e reverência.

Amazonino na Restauração – O fato de haver tanta gente de esquerda na BICA não quer dizer que ela não seja um espaço plural. As paredes do Armando são o melhor testemunho. Ali está fixada uma fotografia da visita que o ex-governador Amazonino Mendes fez ao bar, no momento em que a fachada histórica do imóvel estava sendo restaurada.

Dois Fenômenos, Duas Lendas – A BICA respira mesmo ares muito civilizados. Dois casos são clássicos e reveladores da oxigenação do ambiente. O do ex-fora da lei Euler Silva, o popular “Cocota”, e o policial Lamego, que se fez acompanhar durante muito tempo pela suspeita de matador e maligno.

Cocota é uma lenda da praça São Sebastião (hoje Largo) e de seus arredores, tendo se envolvido com tráfico de drogas e outros pequenos ilícitos. Lamego foi objeto de muitas reportagens citado sempre como exterminador. A acusação ele sempre rechaçou: “– Na verdade, fui apenas duro no cumprimento da lei e no combate permanente com os bandidos”, ressalva hoje.

Lamego admite que deve muito a BICA e aos estudos, aos quais resolveu se debruçar após os 30 anos, pela superação definitiva daquela triste fama. “Na BICA, eu me purifiquei bebendo na experiência de vida de muitos amigos”, conta Lamego. Diz que aprendeu boas doses de humanismo, de ética e de democracia. “Hoje eu sou muito mais ponde rado, crítico e devoto uma importância grande aos estudos”, diz.

Hoje, já tendo ultrapassado a casa dos 40 anos, Lamego continua investigador de ponta da Polícia Civil. Mas tem um grande orgulho na vida. Conseguiu concluir um curso superior e ser Psicólogo, profissão que já começa a exercer, ao mesmo tempo que vai levando adiante os estudos – cursa atualmente pós-graduação numa universidade de Manaus.

É oportuno lembrar que um ex-policial, Waldenor Figueiredo, “Metralha”, cumpriu mais ou menos a mesma trajetória. Waldenor formou-se em advogado e foi diretor da BICA. Faleceu há três anos e virou um dos “compositores” da banda, uma estratégia do corpo de compositores da Casa para não atrair o ódio e a ira dos poderosos sobre cidadãos que continuam militando nesta vida.

O Admirável Vagabundo – Cocota, por sua vez, aprontou tudo que tinha direito. Foi morar na rua protegido por uma companhia lendária – a de uma cadela cujo maior feito foi tê-lo esperado dois meses à porta do presídio Raimundo Vidal Pessoa. No dia em que de lá saiu, dois meses após um flagrante por levar consigo algumas trouxinhas de maconha, lá estava a cadela à sua espera.

Cocota jamais foi um homem perigoso à sociedade. Na verdade, naufragou sob o impacto das ondas ditadas pelas mazelas sociais e do banzeiro da mediocridade das estruturas do Estado, que não lhe permitiram, em determinado momento da vida, ser um simples vagabundo.

A história de Cocota foi muito bem ilustrada pelo jornalista Inácio Oliveira, biqueiro, numa reportagem no jornal Amazonas em Tempo e legou um título inesquecível: “Admirável Vagabundo”. Mais recentemente, no ano de 2003, Cocota foi motivo novamente de uma reportagem levada a efeito pela assessoria de imprensa do Tribunal de Justiça do Amazonas. Ele foi identificado como um dos muitos casos de pessoas que não viraram reféns do crime, após entrar em seus subterrâneos e deles sair intacto.

Cocota foi se retirando dos submundos pela ação assistencial da igreja capuchinha de frei Fulgêncio Monacelli e com a ajuda de muitos biqueiros, com destaque para o psiquiatra Rogelio Casado e o delegado aposentado Trindade, ambos biqueiros.

Reabilitado socialmente, sem dever nada à Justiça ou à sociedade, Cocota cumpre uma missão pra lá de louvável a qualquer ser vivente que habite esse planetinha azul tão açoitado por impactos das guerras, das revoluções industriais e tecnológicas que se sucedem e das devastadoras perdas impostas pela exploração criminosa das matérias-primas. Cocota coordena no Paricatuba (margem direita do rio Negro, em frente da cidade de Manaus) um projeto de reprodução de mudas nativas da Amazônia para reflorestar áreas degradadas da floresta.

O projeto vem sendo executado numa ilha 100% nativa e selvagem, espécie de santuário de lazer para muitos integrantes da BICA, já que ela é de propriedade do agora advogado Trindade.

Vale também ressaltar duas figuras muito populares do Armando. O sambista Américo Madrugada em função de suas letras irônicas, e o traço original de Jorge Palheta. Aliás, e muito oportunamente, Palheta iniciou em Manaus a tradição das camisetas de carnavais com temas hilariantes e irônicos a partir de camisa que pintou para a banda. Hoje, Palheta é praticamente uma marca de camisas em bandas de carnaval.

Aproveito o gancho da relação do psiquiatra Rogelio Casado com Cocota para resgatar um dos momentos mais intensos da trajetória da banda, suficiente para revelar a atuação de um setor que pontifica no presente relato: a atuação do setor jurídico da BICA antes ou depois de seu carnaval.

Uma Prisão Insólita – No ano em que a BICA satirizou o lado sombrio do Poder Judiciário, o advogado Félix Valois, biqueiro, emprestou sua beca (vestuário) ao psiquiatra Rogelio Casado, como uma maneira de ilustrar melhor o enredo.

Em determinado momento daquele carnaval, pessoas que se identificavam como membros do Serviço de Inteligência da Aeronáutica deram voz de prisão a Rogelio alegando que aquele ato constituía atentado aos poderes constituídos.

Rogelio estava preso e rodeado por aqueles agentes, quando vários advogados chegaram, entre eles o próprio dono da beca, o advogado e biqueiro Félix Valois.

A prisão foi contestada. Os oficiais disseram que ele estaria usando irregularmente um vestuário do Poder Judiciário, maculando-o. Em verdade, o agente confundiu a toga dos juízes de Direito – que é privativa do Judiciário, com a beca dos advogados. “A beca é minha e fui eu que a emprestei. Se há crime, quem deve ser preso sou eu”.

Chegou em seguida o presidente da OAB, Simonetti, declarando que autorizara o uso simbólico da mesma por parte do psiquiatra. Foram chegando juízes de Direito, promotores, defensores públicos e jornalistas registrando o fato. A prisão acabou sendo relaxada.

Retomando o foco sobre o gigantesco carnaval de todo ano, é curioso o fato de a multidão não ser fruto de nenhuma estrutura planejada e muito bem organizada da banda. A desorganização, aliás, é uma das suas marcas.

Em primeiro lugar, a banda nunca teve presidente. Geralmente, são eleitos um, dois ou três coordenadores que vão se responsabilizar pelo carnaval daquele determinado ano.

Charles e a Diretoria – Existe uma diretoria que surgiu ao sabor das nuances e dos copos de cerveja. Ela passou a existir a partir de uma frase do ex-garçom Charles, uma das estrelas da banda que ganhou fama e montou um bar nas proximidades – o Cinco Estrelas, espécie de sucursal da BICA. Charles atendia aos freqüentadores que ganharam a primazia de beber dentro do balcão do bar como a diretoria. “Aí, vai mais uma cerveja para a diretoria”, dizia.

Atento ao juízo de valor inferido pelo garçom, José de Anchieta Lins, 48, comprou a idéia e lançou uma camisa com o timbre da diretoria, que nunca foi eleita, sequer são conhecidos quantos membros a integram. O fato é que a camisa estabeleceu uma escala de valor na hierarquia da banda e aqueles que a envergam desfrutam de prestígio interno.

Por mais incrível que pareça, contudo, não há reunião para a eleição dos enredos, tampouco dos sambas-enredo. A escolha de um e outro vai se dando ao sabor dos acontecimentos e das conversas em torno do balcão do bar. Vence esse ou aquele que for garantindo maior apoio interno.

Oposição Sistemática – Há muita luta interna para que o tema da BICA não ceda às tentações do poder.

Em determinado ano, o tema fez ligeira saudação a um biqueiro que se aliançara ao poder – paródia da toada “Vermelho” (Chico da Silva). Uma parcela imensa de biqueiros protestou e saiu vestido com uma camisa provocativa: “Eu não me aliancei”.

“Foi uma maneira de dizer ao povo que a BICA não iria trair suas origens”, diz Lúcio Carril, fundador nato e membro da oposição que, sem precisar escamotear, sempre atuou em espaço próprio na existência da banda.

Na verdade, em pelo menos dois carnavais, a BICA saiu dividida entre os seus membros. Esse fato jamais transpareceu ao público. O comportamento talvez explique porque a BICA nunca registrou uma dissidência que saiu de lá para criar uma banda concorrente.

“Somos em verdade um saco-de-gato, gente de todas as áreas e opiniões, mas sabemos zelar por uma manifestação que já é de toda a sociedade”, diz Jomar Fernandes, fundador da banda e juiz de Direito.

O Bonequeiro Louro – De fato, pessoas das mais diferentes camadas sociais fazem parte da banda. Um exemplo é o pequeno comerciante conhecido como Louro, que conheceu a banda vendendo cerveja em caixas de isopor durante um de seus carnavais e a descobriu “como uma causa importante para abraçar”.

Diz ter ficado na cola dos “diretores” até ser aceito, por conta de seus dotes físicos, como segurança dos bonecos da banda. Nascia ali um caso de amor que acabou escrevendo uma das melhores páginas da história da banda.

Louro levou seu amor à BICA a tamanha conseqüência que virou não apenas o bonequeiro e restaurador dos bonecos da banda como o fiel depositário de todos eles. Ganhando a sobrevivência num pequeno lanche, Louro construiu, com recursos próprios, um ateliê nos fundos de sua residência onde são guardados todos os bonecos da BICA.

Dali, eles só saem para exposições ou demonstrações nas escolas, quando solicitado. Um dos atos mais notáveis dele foi a localização de um dos bonecos roubados durante um dos carnavais.

Com pistas que conseguiu entre brincantes, ele saiu à caça como detetive improvisado e conseguiu localizar o boneco. O resgate foi feito com a ajuda da polícia. “A BICA ocupa na minha vida a mesma importância da minha família”, resume, lembrando que sua mulher e filhos são membros da banda. A tradição vai passar de pai para filho pelo jeito. Determinado a manter a guarda dos bonecos dentro de casa, ele já ensinou a um dos filhos a cuidar, conservar e confeccionar bonecos.

Louro é representativo assim de um sentimento que centenas de pessoas devotam por uma manifestação que criou raízes na cultura da cidade e se afirmou como um evento ligado à sua identidade. Ser biqueiro para Louro é um orgulho. Mas nem ser biqueiro significa status e proteção. Afinal, a BICA nunca se livrou daquele clichê discriminatório de ser o local em que pessoas de esquerda faziam a “revolução em mesa de bar”.

O Brasil se democratizou e os muros caíram. Com o surgimento da BICA, perdurou e perdura um certo conceito de que o Bar do Armando é um lugar maldito e de malditos (ainda bem, com todo o orgulho), ainda que esteja localizado no quadrilátero mais belo, charmoso e histórico da cidade de Manaus. O quadrilátero em torno do Teatro Amazonas.

Simplesmente Banda de Carnaval – A BICA é em verdade uma banda de carnaval, simplesmente. Quem negar que ela seja uma das maiores manifestações culturais da cidade de Manaus estará irremediavelmente mentindo.

Há ainda uma particularidade, senão a mais deslumbrante, a que mais confunde o espaço do Bar do Armando com a alma de Manaus – um aspecto de resistência política, de zelo pelos valores barés, de quase tribuna política dos acontecimentos, de pasquinização dos fatos mais burlescos e de um certo jeito “soy contra”, marca dos rebeldes.

Entrevistado à época da restauração do frontispício da BICA, o historiador Robério Braga viu na banda e em torno dela um aspecto romântico: “Ali é a trincheira da rebeldia inteligente porque, afinal de contas, babaca, ali, naquele ambiente, não se cria. É uma trincheira do sarcasmo, da crítica bem-humorada – é a trincheira da Liberdade”.

A BICA constitui mesmo um dos espaços mais politizados da capital amazonense e, de longe, um dos que reúne mais formadores de opinião por metro quadrado de Manaus. Numa palavra, a realidade da cidade e do Estado passam sob o seu crivo diariamente.

A banda ganhou muitos de seus melhores tons e contornos culturais pela proximidade com o Teatro Amazonas, esse monumento construído por Eduardo Ribeiro e inaugurado por Fileto Pires em 1896.

Toda a efervescência do Teatro Amazonas acabava repercutindo ali naquelas mesas do Bar do Armando. Ressalte-se a grande importância que teve o projeto “Nossa Música” levado a efeito pela Administração de Guto Rodrigues, também biqueiro, na Superintendência Cultural do Amazonas. Celito, Toscano, Candinho e Inês, alguns dos compositores que marcaram aquele momento, são biqueiros. Toscano e Celito são fundadores da banda e dois de seus maiores compositores.

Naqueles anos de 85 a 86, o movimento de música esticou suas canelas em busca de afirmação e houve intenso burburinho cultural dentro e em torno do bar.

Reunindo profissionais dos mais variados setores formais e informais da sociedade, a BICA é também um centro de informações privilegiadas, um caldeirão onde são temperados os mais diferentes assuntos publicados, publicáveis, não publicáveis e impublicáveis.

Adiciono minha experiência pessoal nesse campo. Como repórter, correspondente do JB há mais de duas décadas e redator da coluna “Sim & Não” do jornal A Crítica, sempre tive a BICA como um laboratório de pautas, como fonte orgânica de informações e como consultoria.

Foi bebendo nessa fonte de notícias que jorra abundante diariamente que alimentei grande parte do trabalho como formador de opinião e como repórter. Lembro que desempenho a função de redator da coluna “Sim & Não” há nove anos. Ali na BICA pesquei e capturei muitas informações.

Em contrapartida, a BICA também ganhou muitas linhas da coluna, que chegou a ganhar a fama de ser Diário Oficial da Banda, o que, conve- nhamos, é um epíteto desprovido de qualquer fundamento e lógica.

De fato, a BICA é uma banda de carnaval de rua. Ela ultrapassou os li- mites da simples manifestação carnavalesca. O mais pertinente é que seja analisada pela Antropologia e não por um simples registro de sua existência de forma descompromissada com os instrumentos científicos das Ciências Sociais.

A Rebeldia da Banda da BICA – Resta indicar, mais por suposição e emoção do que por constatação metodológica adequada, que a BICA é irremediavelmente fruto dos movimentos de rebeldia que sacudiram o mundo nos anos sessenta. O Bar do Armando, afinal de contas, era na década de setenta o espaço de encontro dos estudantes da Faculdade de Filosofia – que funcionava onde hoje existe o Centro de Artes da Universidade Federal do Amazonas (Caua).

Como numerosos artistas amadores de teatro (Dori Carvalho, Davi Almeida, Djalma Cosmos, Rui Brito, Guto Rodrigues, Marcos José, Paulo Graça, Almir Graça, Socorro Papoula, pessoal do Pombal, etc., etc., etc.), cheguei ali primeiro como militante do movimento cultural (durante a ditadura era uma das poucas opções de expressão).

Posteriormente, passei a freqüentar o Armando quando já passara para a militância no movimento estudantil. As salas de aula eram monitoradas pelos agentes da repressão do famigerado SNI.

Inesquecíveis Professores – Naquelas mesas de alumínio do Armando era possível assistir às aulas de socialismo proibidas em sala de aula. E foi para ouvir professores brilhantes como Rosendo Lima e Theodoro Botinelly, militantes como Laerte Sphefano Aguiar, Nestor Nascimento e Henrique Lima, todos com o coração pulsando pelo Socialismo (o Laerte não vai me perdoar de ser identificado apenas como socialista, então, confiro-lhe o título merecido de marxista-leninista), que eu e dezenas de outros jovens estudantes adotamos o Armando como espécie de escola de formação política.

Esse caráter talvez tenha passado desapercebido da historiografia amazonense. O fato é que ali, entre um gole e outro de cerveja, os estudantes conspiravam à sua maneira sobre os terríveis anos de chumbo que se abatiam sobre eles e sobre o País.

Os tempos de sombra tornaram os jovens opacos e amargos. O Armando, apesar das catacumbas, era povoado por um razoável riso, uma certa ironia, uma alegria incomum, sentimento que o autor recolheu da experiência pessoal de vários remanescentes daquele período.

O comportamento pode ser vislumbrado de corpo inteiro numa brincadeira surgida entre as décadas de sessenta e setenta: uma batalha de talco nos fins de ano que, aliás, era uma extensão do bota-fora de cada ano acadêmico (claramente levado pelos estudantes universitários para lá). A batalha de talco foi depois adotada também no carnaval.

A Língua Ferina da BICA – Ao melhor estilo da marchinha de carnaval de Emilinha Borba que exalta a língua ferina incapaz de ser lavada pela água de qualquer BICA (fonte de água), o movimento incorporado pela banda é fugaz e não deixa passar absolutamente nada sobre os acontecimentos barés. Daí o autor ter escolhido a estrofe para referenciar o comportamento dos biqueiros, incluído no início deste trabalho.

Vale a lembrança. O saxofonista Toinho, biqueiro, que tem no Armando um de seus palcos para sobrevivência tocando seu sax, garante que a música se tornou muito popular em Manaus a partir de uma apresentação de Linda Batista na avenida Eduardo Ribeiro.

“Ela cantou essa marcha de carnaval que à época era uma das mais populares”, diz o saxofonista, que assistiu ao show quando tinha 15 anos. “Nunca mais esqueci aquela música e a apresentação da Linda Batista”, rememora.

A batalha de talco foi o estopim para a criação da banda, mas não os seus ingredientes constitutivos e determinantes sob a ótica a partir da qual evoluímos.

Importa constatar agora que os jovens daquela época enveredaram pelos mais diferentes caminhos. Muitos são profissionais de ponta no Magistério, no Judiciário, na Imprensa, na Política, etc. Todos desfrutando de larga respeitabilidade.

Já que não se podia discutir política em sala de aula e em outros ambientes, o Armando foi o palco privilegiado daquele debate e nos serviu como escola.

O Charme do Bar e do Largo – Aqueles debates ganhavam o charme de ser travado ali naquela área arquitetonicamente portentosa, onde o senador Fábio Lucena fez o discurso para nós, estudantes das batalhas da Meia-Passagem, lembrando que em volta estão erguidos os três templos mais importantes: o Templo da Arte (o Teatro Amazonas), o Templo da Fé (a Igreja de São Sebastião) e o Templo do Direito (o prédio histórico do Tribunal de Justiça do Amazonas).

Aquele ambiente em que se falava baixinho e no qual era regra não se deixar sentar penetra para evitar infiltrações de dedos-duros, foi o ambiente que ajudou a formar alguns dos melhores quadros profissionais da atualidade.

O bar é um importante espaço na vida política brasileira, já o disseram personalidades da estirpe de Antônio Callado e Chico Buarque de Holanda.

Assim sendo, não é possível deixar escapar um certo sentimento de orgulho diante daquele clichê que vigorou tanto tempo contra os seus freqüentadores.

“Viva a Revolução de Bar!”.

A revolução de bar nos moldou e nos educou pelos melhores caminhos da profissão e da liberdade. Gracias!

(texto publicado originalmente no livro “Amor de BICA”, de 2006, escrito por Mário Adolfo, Orlando Farias, Simão Pessoa e Marco Gomes)

Noite da Imprensa no Reino Unido


Será nesta sexta-feira, 13 de fevereiro, que a Escola de Samba Reino Unido da Liberdade estará realizando uma noitada espetacular oferecida a todos os profissionais do radio, jornal e televisão denominada "NOITE DA IMPRENSA". Esta homenagem, segundo o departamento de comunicação da Escola, é uma forma de agradecimento a estes profissionais, que ao longo do ano ajudam na divulgação das atividades sócio-culturais da agremiação.

A festa terá inicio às 22 horas, com um coquetel e a participação do Grupo de Pagode Resistência do Samba. Logo depois, a partir de meia-noite e trinta (00:30), muito samba-enredo com a Bateria Show da Escola, Show de Mulatas, Mestre-Sala e Porta-Bandeira e muito mais. O convite está sendo feito para o profissional se distrair, brincar, não para trabalhar, porém, não será proibida a entrada do seu material de trabalho. O grande público também poderá participar: homem pagará 5 reais, mulher entra de graça.

No sábado, grande feijoada promovida pela Harmonia da Escola, na cervejaria Felicce, no Studio 5, a partir das 12 horas. O evento será regado com muito pagode dos grupos Resistência do Samba e Panela de Presamba e muito samba de enredo com a Bateria Show da Escola. Dos que não conseguirem camisas na escola será cobrado um valor na recepção da cervejaria.

No domingo, dia 15, haverá uma grande carreata, com a concentração às 13 horas em frente à quadra da Escola, no Morro da Liberdade, e às 15 horas a carreata saíra percorrendo as principais ruas da Zona Sul da cidade.

Ensaio Geral: Às 16 horas, também deste domingo, a Reino Unido se concentrará na Rua Maués, bairro da Cachoeirinha, para a realização do seu Ensaio Geral. Será o ultimo Desfile Técnico da Escola antes do Desfile Oficial, dia 21. Todos os quesitos importantes da Agremiação estarão presentes.

O Desfile Técnico terá inicio às 17 horas. Quando chegar ao Morro, o Desfile Técnico do Reino se encontrará com a Banda do Bagaço da Laranja que estará acontecendo na Praça da Vitória. A partir das 20h30 terá inicio ao Banho de Samba, em frente à quadra. Será, portanto, um domingo bastante ativo no Morro da Liberdade. E todos estão convidados.

Contato: Ivan de Oliveira (Diretor de Comunicação da Escola)

Tel. 9966.9758

Morre o poeta Max Martins aos 82 anos


EDUARDO ROCHA

Da Redação

A literatura está de luto. O escritor paraense Max Martins morreu ontem, às 17h10, no Hospital Porto Dias, vítima de falência múltipla dos órgãos. O poeta estava internado há nove meses, com pneumonia. Morto aos 82 anos, deixa uma obra literária das mais importantes para as letras paraenses, dado o esmero que sempre teve na construção de imagens e composição gráfica de seus poemas. "Ele foi um homem que consagrou a sua vida à poesia", externou o presidente da Academia Brasileira de Letras (APL), Edson Franco, reitor da Unama, tão logo soube da morte de Max. Literatos e admiradores da obra de Max Martins lamentaram a perda do escritor.

Em nota divulgada ontem à tarde, o Governo do Estado lamentou a morte do poeta, "um dos maiores nomes da nossa literatura". Max, além da poesia, dedicou-se à arte e à filosofia. "Publicou dezenas de obras importantes e foi diretor da Casa da Linguagem entre 1990 e 1994. Sua morte representa uma perda irreparável, por tudo o que ele foi e significou para a nossa cultura", diz a nota.

Familiares de Max Martins informaram ontem à noite que o velório do poeta acontece no Museu do Estado do Pará, no entorno da praça D. Pedro I, de onde sairá o féretro, às 15h de hoje, em direção ao cemitério Max Domini, em Marituba, onde serão sepultados os restos mortais do escritor.

A neta de Max, Laís Martins, funcionária da Fundação Cultural do Pará Tancredo Neves, esteve sempre junto ao escritor durante a internação hospitalar, e foi a última pessoa a vê-lo na tarde de ontem. Laís conta que, após ter sido diagnostica a pneumonia, Max Martins teve seu estado de saúde progressivamente complicado, inclusive, com problemas respiratórios, parada cardíaca no mês de dezembro e paralisia dos rins. Pai de Maria da Graça e Maria de Nazaré e casado com Maria Laís, o poeta morava no conjunto IAPI, em São Brás. No imóvel encontra-se uma biblioteca organizada por ele, que reúne cerca de três mil livros. Max deixa três netos e três bisnetos. A primeira bisneta do escritor, filha de Laís, é aguardada para os próximos dias.

"Vou lembrar dele sempre como um homem que só queria viver pra família", conta Laís Martins, única neta mulher de Max Martins, que espera pelo nascimento da também primeira bisneta do poeta. "Ele sempre quis preservar a família. Nunca teve interesses, era muito simples", descreve, com emoção, o avô, que segundo ela, faleceu às 17h15 da tarde de ontem. "Ele já não falava, mas acho que sentia o que eu dizia", disse ela, que lamentou por ele não conhecer sua filha, que vai nascer em breve. Segundo a neta, a família decidiu não contar sobre o falecimento a dona Maria Laís, viúva de 87 anos e que sofre de diabete e mal de Alzheimer. "Ela nem sabe que estamos aqui (no hospital). Achamos melhor não contar nada, pois isso só agravaria o estado de saúde dela".

O professor Edson Franco ressaltou que o nome de Max Martins foi cogitado por diversas vezes para a Academia, mas ele nunca se interessou em ingressar na APL. Edson Franco enfatizou que Max tinha "uma poesia maravilhosa", e que, dada a importância da obra dele, a Universidade da Amazônia (Unama) prestou uma homenagem ao escritor: um vídeo sobre a sua vida e obra.

O vídeo sobre Max chama-se "Fazer como os pássaros cantar e voar", baseado em um verso do autor. A produção envolveu os professores Paulo Nunes, Josse Fares e Abdias Pinheiro, por meio do Núcleo Cultural da Unama, em 1995.

"Este vídeo estreitou muito a minha relação com ele, e permanecemos sempre nos falando, mesmo depois de ele deixar a Casa da Linguagem", lembra o professor de Literatura e escritor Paulo Nunes. "Como membro da geração modernista, Max entendia o ofício da palavra como algo exaustivo". Para Paulo Nunes, Max foi um dos mais importantes poetas brasileiros, com uma literatura muito vigorosa, e se constitui em um divisor de águas entre os poetas paraenses.

O casal Benedito e Maria Sylvia Nunes (filósofo e diretora teatral) conviveu com Max Martins. Além da amizade, ficou a admiração. "Foi Max o meu amigo primeiro e o mais antigo. Ligava-nos antiga feição. Lemos os mesmos poetas e romancistas. Quando mais novos, defendemos as mesmas causas políticas e sociais. Tive nesse amigo o mais constante companheiro de trabalho. Junto, dirigimos revistas literárias. E nossos amigos eram comuns. Foi, como eu, um autodidata. E sobretudo um admirável e autêntico poeta, que soube viver a poesia que escreveu. É também a opinião de Maria Sylvia Nunes, de quem foi amigo", declarou Nunes. (Colaborou Yáskara Cavalcanti)

Poesia de Max

Tuas antenas trêmulas


0 som

(subterrâneo)

que o teu silêncio chama

A palavra nenhuma que trazes para o almoço. Pães e peixes

Para quem?

E o poema redemoinha no sono que rasgas.

Como rasgas esta noite enrolada em si mesma.


É entre centelhas que plantas o teu jorro.


É entre espinhos e pedras virgens que celebras essa estrela. Todos os astros.


O caldeirão

Aos sessenta anos-sonhos de tua vida (portas

que se abrem e fecham

fecham e abrem

carcomidas)

ferve


a gordura e as unhas das palavras

seu licor umbroso, teus remorsos-pêlos

Ferve


e entorna o caldo, quebra o caldeirão

e enterra

teu faisão de jade do futuro

teu mavioso osso do passado


Agora que a madeira e o fogo de novo se combinam

e o inimigo nº 1 já não te enxerga

ou vai-se embora

varre a tua cabana e expõe ao sol tua língua

tua esperança tíbia

o tigre da Coréia da parede

É lícito tomar agora a concubina

E despentear na cama a lua escura, o ideograma



No lugar do medo

Todos os dias aqui tu te observas

E ainda está oculta (aqui) a tua semente


Comum será a tua raiz

comum

ao olor da fêmea que atua no teu leito


Sê criativo o dia todo

Te empenha o dia todo cauteloso

voa

mesmo hesitante sobre o teu malogro


Quer sigas o fogo, quer sigas a água

sê só do fogo ou só da água

(pois que não há caminho

e a lei

é o inesperado)


Ainda oculta (aqui) a tua semente

está




A fera


Das cavernas do sono das palavras, dentre

os lábios confortáveis de um poema lido

e já sabido

voltas


para ela - para a terra

maleável e amante. Dela

de novo te aproximas


e de novo a enlaças firme sobre o lago

do diálogo, moldas

novo destino


Firme penetra e cresce a aproximação conjunta

E ocupa um centro: A morte, a fera

da vida

te lambendo



Saltimbanco


O não mais espumoso vinho dos abismos

O cauterizado testemunho de um instante de beleza:

O ritmo do oceano

O palco

e a metade da cama para o falso poema

O saltimbanco


Ou o sangramento

da perda de um deus a cada assalto

O cadafalso

O semidestroçado frêmito de um destino cego de antemão

O não mais aceito rito do ofício O ofício:

esta rasura do corpo sendo esquecido

O esquecimento

O desabitado segredo das palavras

Um escritor paraense de dimensão universal

Foi em 20 de junho de 1926 que nasceu em Belém Max Martins, um autodidata que trabalhou como chefe de escritório do Instituto Medicamenta Fontoura. Foi inspetor administrativo no Ministério da Saúde-Sucam. Nos anos 90, Max exerceu o cargo de diretor da Casa da Linguagem, da Fundação Curro Velho. Max foi patrono da 4ª Feira do Livro Pan-amazônico, promovida pela Secretaria de Estado de Cultura (Secult), em 1999.

"Eu conheci o Max quando eu ainda era estudante universitário e ele participava de um grupo poético junto com o Elliston Altman, chamado Grupo Parvinista. Esse grupo procurava desenvolver poemas de cunho surrealista com temas inusitados. Depois, eu convivi mais com ele na casa do Benedito Nunes, na época do Norte Teatro Escola do Pará. A partir daí tivemos contato em diferentes situações", afirma o poeta João de Jesus Paes Loureiro. Para ele, a obra de Max Martins "é fundamental não apenas pela qualidade formal e linguagem poética, mas, também, pela benéfica influência do seu estilo na atualidade da poesia do Pará".

Paes Loureiro ressalta a relação da obra de Max com a poesia concreta, ou seja, um trabalho marcado por uma poesia de grande rigor técnico privilegiando a poesia leve e procurando relacionar-se com as modernas corrente poéticas. "Foi um homem de grande sensibilidade e caráter, extremamente afetuoso que ficará para sempre no coração des seus amigos da literatura do Pará. É um poeta paraense de dimensão universal".

De acordo com o site www.culturapara.art.br, onde se pode conferir informações sobre a vida e obra de Max Martins, as obras e prêmios que marcam a história deste autor são:

Livros: O Estranho. Belém, Revista de Veterinária, 1952; Anti-Retrato. Belém, Falângola, 1960 — ambos de poesia. Tanto o primeiro como o segundo livro receberam respectivamente os prêmios da Academia Paraense de Letras e Secretaria de Educação do Estado do Pará; Alguns Poemas (1965); 15 Poemas (1970); H’era (1971); O Ovo Filosófico (1975); O Risco Subscrito. Belém, Mitografe, 1980; A Fala entre Parênteses. Belém, Grapho/Grafisa, 1982. Parceria com o poeta Age de Carvalho; Abracadabra (1982); Caminho de Marahu. Belém, Grapho/Grafisa, 1983; 60/35. Belém, Grapho/Grafisa, 1986; Não para consolar. Poesia completa. Belém, CEJUP, 1992. Prémio Olavo Bilac da ABL, dividido com o poeta António Carlos Osório; Marahu Poemas. Belém, CEJUP 1992; Colagens. Belém. CEJUP, 1992; Para ter onde ir. SP, Massao Ohno/Augusto Massi, 1992; Outrossim. Poema-cartaz. Belém, Casa da Linguagem, 1991; J poemas. Folder. Belém, Falângola, 1991; Diário do Poeta. Belém, Revista Unamazônia, n.°0, junho 1998; e Caudrons of Críatirity. Poemas e ilustrações de Max Martins de seus Diários do Poeta. Exposição na Universidade do Colorado, EUA, 1999. (E. R.)

Lendo Max Martins

Edson Coelho

Escritor

Uma vez, quando Max Martins era diretor da Casa da Linguagem, vi-o no Banco do Estado do Pará a receber o salário. Não ganhava mal, e recebeu tudo de uma vez, bolos de dinheiros pelos bolsos. Óbvio que era uma pessoa que não lidava bem com aquela situação (fila, salário, manusear o dinheiro). Parecia alheio, sem a movimentação das pessoas práticas. A concentração era funda, sim, nos tantos poemas árduos que por aquele tempo escrevia.

Max completaria 83 anos em junho próximo. Sempre soube, na vida e na obra, que uma cabana basta: para se ter de onde se ir. Índio de Belém, ancestral, filosófico: caminho de Marahu. Zen-amazônico. Ter de onde se ir para outra dimensão – a da palavra, da linguagem; e depurar o Eu pela dura saga do artista: poesia-vida.

E também – inevitável - ter de onde se ir para além da vida (toda obra é uma preparação para a morte). Leio dois textos marcantes do final da década de 80 (Max tinha 62 anos): "os grampos, teus cabelos ali"; no outro, chega a indagar-se sobre a morte: "Por que mais esta noite inteira esperando?". Enfrentar, então, o tempo implacável - reagir-lhe, impor-lhe um instante, sobreviver-lhe. A obra e o semblante de Max Martins: vincados pelas intempéries, serenos. Conquista, aceitação: resposta às ruínas como no belo poema (também de 20 anos atrás) "Outro sim'": outro sim à vida-obra:


Para que não se vá

a vida ainda

e a amada volte

pede à palavra

outra palavra

outra sob

palavra.


A palavra agora te dará cada palavra que pedires, Max Martins, pois que oitenta e dois anos foram só o começo. Tua obra-vida (cabana em Marahu) é o teu eterno lugar de onde se ir, tua preparação para a montanha, triunfo sobre o tempo; teus livros são lugares de onde partem, há séculos, jovens poetas: lugares intactos, inviolados, expressos em ti para que nós, leitores, tenhamos também, sempre, de onde seguir.

(publicado no jornal O Liberal, nesta terça-feira, dia 10 de fevereiro)