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segunda-feira, junho 01, 2009

Para você entender o Techno


É techno para lá, é techno para cá: nunca um rótulo musical foi tão (mal) utilizado. De subgênero da música eletrônica, o techno virou sinônimo para tudo que tenha um bate-estaca por trás - um saco de gatos que mistura desde Prodigy (big beat) até Cher (ítalo-house do mais rasteiro).

Esclarecendo de vez: techno é toda música que tenha uma batida reta incessante, sem quebras, e nada ou quase de voz humana. Pianinhos baba, guitarras e divas chorosas estão de fora.

É bem verdade que o techno de hoje é muito diferente de quando surgiu, no final da década de 80.

Na época, um quarteto de DJs/produtores de Detroit, nos Estados Unidos - Derrick May, Juan Atkins, Carl Craig e Kevin Saunderson -, resolveu misturar o electro (criado por Afrika Bambaataa e sua turma ao ouvir muito Kraftwerk) ao lado mais pesado da house de Chicago (criado por Frankie Knuckles e sua turma ao ouvir muita “disco music”) num som diferente que começou a ser chamado de techno.

A música refletia a Detroit da era Reagan: a cidade em crise, com sua juventude imersa num cenário urbano-industrial sombrio, acabou gerando um som alienante e hipnótico para quem queria esquecer da vida dançando noite (e, eventualmente, manhã) adentro.

Com o tempo, o techno chegou ao cenário rave da Inglaterra e foi incorporado pelos súditos da rainha.

Tratado como underground e música para moderninhos no Brasil, o techno é tão banal na Europa como ver a banda Calypso no Domingão do Faustão.

DJs superstars como Carl Cox e Paul Oakenfold são figurinhas fáceis em revistas e TV, rádios tocam techno o dia inteiro e lojas de DJ vivem lotadas de moleques levando discos de vinil (isso mesmo!) para tocar em casa.

Para penetrar nesse mundo e não sair mais confundindo arapucas como “Puro Êxtase” do Barão e “Firestarter” do Prodigy com techno, preparamos uma seleção de dez discos essenciais.

Depois é só ir no Pirate Bay ou no Torrentech, downlodar e se jogar na pista.


KRAFTWERK

The Mix (1991 - EMI)

O Kraftwerk inspirou a geração de Detroit a criar o techno com álbuns como Autobahn e Trans- Europe Express. Nada mais justo que o quarteto entrasse na onda e remixasse seus próprios clássicos – “The Robots”, “Trans-Europe Express”, “Computerlove”, “Pocket Calculator”, “Radioactivity” - inspirados pela música de seus seguidores. O resultado em si saiu tecnopop (para usar o termo do refrão de “Music Non Stop”, também no álbum), mas serve para entender, de uma tacada só, como o Kraftwerk inspirou toda uma geração de DJs - e para vislumbrar a maior característica da música eletrônica: a autofagia. Ninguém é de ninguém no mundo do sampler.


DERRICK MAY

Innovator (1997 - Transmat)

Coletânea dupla que reúne os momentos mais significativos do inovador Derrick May, o DJ de Detroit, cidade americana que foi berço da primeira geração do tecno. Fã de Kraftwerk e Yello, May ainda era estudante quando revolucionou o cenário dance lançando faixas como “The Dance”, “It Is What It Is” e “Strings Of Life” (1989), sob os pseudônimos de Mayday ou Rhythm Is Rhythm. Nas 27 faixas - muitos remixes das antigas, por colegas como Juan Atkins - vê-se que o início do techno devia muito ao requebrar cheio de groove da house e do electro.


JOSH WINK

Higher State Of Wink's Works Compiled (1996 - Manifesto)

Justiça seja feita: o primeiro grande hit do techno a tomar conta das boates caretas no Brasil foi “Higher State Of Conciousness”, o cartão de visitas do gênero para muita gente em 1995. A música nasceu da cabeça do DJ Josh Wink, um americano da Filadélfia. Ele emplacou “Higher State...” usando e abusando da TB 303, a bateria da Rolland responsável pelos “tzins” agudíssimos que viraram marca registrada de Wink e seus copiadores. Nesta coletânea em CD de seus maiores sucessos, ainda vêm a rara “Tribal Confusion”, de 1990, outro marco, e duas versões de “Higher State...”.


MOBY

Moby (1991 - Mute)

O nova-iorquino Richard Melville - parente do autor de Moby Dick, Herman, daí o apelido - tornou- se o primeiro DJ superstar do techno graças ao single “Go”. Sampleando o tema de mistério do seriado Twin Peaks, Moby rompeu barreiras e colocou o techno nas paradas de sucesso. Daí em diante, ele seria um dos poucos americanos num rol de estrelas européias, lançando o contundente álbum Everything Is Wrong, de 1995. Entre 1991 e 95, Moby namorou o techno, a house e o trance até romper com tudo e resolver virar roqueiro, remexendo seu passado punk.


HARDFLOOR

The Best Of Hardfloor (1998 - Studio K7)

O duo alemão formado por Ramon Zenker e Oliver Bondzio faz um som essencial, daqueles que desafiam os amantes de rótulos: para uns é acid house; para outros “techno paneleiro”, por causa - de novo - dos timbres das baterias TB 303 e TB 909, as guitarras da música eletrônica. É um baticum animado, que privilegia médios e agudos aos graves, como se vê neste CD duplo com o melhor da dupla. Aí estão o hit de 1992, “Acperience”, “Circus Bells” e o inspiradíssimo remix de 95 para “Blue Monday”, do New Order. O primeiro CD conta com versões originais; o segundo traz remixes de DJs como Dave Angel e Surgeon.


DAVE ANGEL

Classics (1996 - R&S)

Dave Angel começou como DJ de funk, até que uma 303 passou pela sua frente. Tornou-se um dos maiores nomes do techno e acid-house ingleses graças à audácia de fazer um remix não-autorizado para “Sweet Dreams”, do Eurythmics - depois aprovado e lançado oficialmente. Sua obra é essencial para entender como a linha originalmente traçada pelo quarteto de Detroit - May, Atkins, Craig e Saunderson - evoluiu com o passar dos anos, uma vez que Angel é herdeiro direto do estilo da primeira geração do techno de Detroit.


LUKE SLATER

Free Funk (1997 - Jelly Jam)

O DJ inglês Luke Slater já lançou faixas sob vários pseudônimos, como o famoso Planetary Assault Systems, quando seu som tinha mais a ver com o techno de Detroit. No elogiado Free Funk, ele atinge a maturidade sonora lançando um álbum “cabeça”, com influências de electro, minimal, ambient e... jazz (!). Slater mostra versatilidade em dezesseis faixas marcantes, indo do balanço típico de um Joey Beltram (“Are You There?”, “Filter 2”) a um minimal espacial (“Origins”) e batendo o bife em “Engine One”. Deixando apenas o drum’n’bass de lado, Slater passa por todos os estilos da música eletrônica que mantêm um parentesco com o techno.


CARL COX

F.A.C.T. II (1997 - Moonshine)

Para entender mesmo o techno, nada melhor que ouvir o DJ número um do mundo em ação. O inglês Carl Cox racha o assoalho numa coletânea mixada em CD duplo. O homem é o primeiro do ranking por três fatores: ecletismo (mistura hits acessíveis e faixas obscuras); mixagem (é o Eric Clapton das pick-ups); e simpatia contagiante, que reflete em seu set. Todo o repertório deste álbum - de “Spirit Catcher” a “Calling Earth”, passando pela obrigatória “Born Slippy” - foi absorvido pelos DJs de techno do Brasil (e do mundo) como referência. Se em momentos soa datado - a efemeridade é uma característica das músicas de techno -, F.A.C.T. II ainda é a melhor introdução ao gênero.


UNDERWORLD

Second Toughest In The Infants (1997 - BMG)

No meio do pacote chamado “techno” - Prodigy, Chemical Brothers e Underworld -, só o último, trio formado por Karl Hyde, Rick Smith e Darren Emerson, chega perto do gênero. O Underworld procura dar um tom pop às suas faixas quilométricas, e acabou acertando as paradas em cheio com “Born Slippy”, uma das poucas músicas techno a emplacar boates caretas. Virou hino da geração clubber-teen-pós-grunge. Na mesma linha, o álbum ainda traz “Pearls Girl” e faixas que namoram outros ritmos eletrônicos, como o ambient e o jungle.


JEFF MILLS

Waveform Transmission Vol. 3 (1994 - BMG)

Se há deuses no panteão do tecno, Jeff Mills é o demo. Seu nome é sinônimo de som minimalista, sombrio, cruel. Suas músicas são neuróticas, desprovidas de sentimento e opressivas - vide “The Extremist” e “Workers”, contidas neste álbum. Nascido em Detroit, ex-membro do Underground Resistance, Mills virou lenda ao tocar sem olhar para o público, sem rir ou se divertir - só desce a lenha. Faz-se de gostoso ao tocar isoladamente num clube enquanto outros grandes nomes do techno tocam juntos em algum festival - e lota a casa mesmo assim.

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