Pesquisar este blog

sábado, setembro 12, 2009

Porque hoje é sábado!


Nós, na casa da Gracionei Medeiros: No primeiro plano, eu, Dora Tupinambá e Renato Pitanga. No fundão, Álvaro, Davi Almeida, Jorge Álvaro, Dinari, Alberto e Ana Domingues (não deu pra identificar o sujeito coberto pelo Pitanga. Foda-se.)

Entre as poucas coisas que nos fazem brigar (eu e a Dinari), uma delas é eu ficar enchendo a cara de uísque até amanhecer o dia (não tenho pressa), com o aparelho de som no volume máximo tocando house music. Bobagem. Aqui perto de casa há uma igreja de crentes cujos hinários enlouquecidos me deixam à beira de um ataque de nervos. Nunca reclamei.

Do outro lado da rua, em frente de casa, há uma família distinta (a matriarca é a melhor quituteira de tartaruga que já conheci na vida) que tem uma paixão especial por duplas sertanejas. A impressão que me dá é que eles querem reviver aquela festa da peãozada de Barretos aqui no bairro. Utilizam, inclusive, umas caixas de som tamanho família que ficam posicionadas diretamente aqui pro meu escritório. Nunca reclamei.

Duas casas depois da minha, a presepada é samba mauriçola. Do meio dia até meia noite, todo santo dia. Com o aparelho de som no volume máximo, eu tenho que suportar (esse, o termo exato) aquelas porcarias berradas por Alexandre Pires, Rodriguinho, Belo, Exaltasamba, Sorriso Maroto, Art Popular, Boka Loka, Araketu, Gustavo Lins, Jeito Muleke, Guigg Guetto, Revelação, Sem Compromisso, Pixote, Harmonia do Samba e Herlon. Nunca reclamei.

Nessa sexta-feira, eu havia me programado para participar do aniversário de 15 anos do Augusto, um dos filhos diletos do meu brother Geraldo Karaiba, lá pras banadas do Parque das Laranjeiras. De repente a minha macuxi começou a se queixar de dores estomacais. Conhecedor desses argumentos baixos (lato senso), senti que o aniversário havia ido pras cucuias. Aqui em casa, havia uma garrafa de Johnnie Walker Red Label dando sopa. Desconfiei: é com esse andarilho que eu vou.

Telefonei pra moçada da rádio táxi Ajuricaba solicitando gelo pra uísque, umas latinhas de red bull, meia dúzia de cervejas em lata, queijo, azeitonas, salame, essas coisas. Fiquei me divertindo na tevê vendo o presidente, com aquela sua habitual falta de jeito com as regras gramaticais, explicando que a crise passou por causa do pessoal do programa Bolsa Família. Quem tem o nível intelectual do Lula deve gostar muito do que ele fala. Eu, não. Mas nunca reclamei.

De repente, toca a cigarra daqui de casa. Fui abrir o portão, era o Renato Pitanga e a França, esposa dele. Pitanga trazia nas mãos uma sacola de gelo. Eu, que ainda não havia tocado em álcool, tomei um susto. Que porra era aquela? O Renato Pitanga havia se transformado em motorista da rádio táxi?...

Desfeito o equívoco (sabedor que eu tinha uísque em casa, ele resolvera trazer uma sacola de gelo. Simples, assim), nos abarcamos para escutar os velhos hits dos anos 70 – em volume alto, capaz de abafar os crentes, os sambistas mauriçolas, os sertanejos, a merda toda. Sem reclamações de parte a parte.

Nós dois nos concentramos na cachaçada. Renato Pitanga, na sua nova paixão (garrafinhas long neck, da Brahma), eu, no meu eterno modismo (Red Label nas pedras). Quando o motorista da rádio táxi chegou com o resto dos suprimentos, a gente já havia começado a fazer uma festa. Dinari e França foram assistir o último capítulo da novela “Caminho pra Índia” e preparar as poções de tira-gosto. Bem feito.

Duas horas depois, telefonamos pro Oliveira (leia-se Bar Snoopy) e o cu da cotia assobiou: ele despachou pra gente aqueles indescritíveis bolinhos de bacalhau, jabá com macaxeira, língua à moda do Porto, pernil escandaloso - uma espécie de "pirarucu à casca" feito de leitão – e duas caixas de long neck. O que era uma festa, virou um fuzuê. O Renato olhava pra os novos suprimentos como se estivesse com seis anos de idade e descobrisse uma locomotiva a pilha embaixo da árvore de natal. Foi um porre de juntar crianças.

Pra quem não sabe, o Renato Pitanga é um dos melhores amigos que tenho. Atualmente, ele mora em Benjamin Constant e dirige a rádio “Encanto do Rio”, que atinge os municípios de Tabatinga, São Paulo de Olivença e Atalaia do Norte. Vivo dando desculpas cada vez mais esdrúxulas pra não colocar os pés naquele canto perdido do mundo. Infelizmente, o repertório está acabando. E ele me cobra uma ida ao alto Solimões cada vez com mais veemência. Devo ir por lá em novembro.

Conheci o Renato Pitanga em 1998, mas tenho a impressão de que somos amigos há pelo menos uns 500 anos. Explico. Dos amigos que ele teve (ou tem) entre os anos 70 e os 80, eu era um brother chegado de quase 90% dos homeboys dele, incluindo a "turma do Canto", que se reunia em frente ao edifício Cidade de Manaus. Não é pouca porcaria.

O fato de a gente nunca ter se falado nesses tempos todos, tendo tantos amigos em comum, credito a sua (dele) falha de caráter. Ele devolve na mesma moeda. Como tenho 53 anos, e ele fez 50 no último dia 24 de agosto, imagino que seja coisa de rebeldia. Coisa de jovem. Só o conheci, fisicamente (ele sempre um pouco mais gordo do que eu, apesar da nossa luta conjunta para desmoralizar as balanças), em agosto de 1998.

Na época, eu era redator da agência Grafite, do Mário Junior. Uma outra empresa, DMP Comunicações, do qual o Mario Jr. era sócio, foi escolhida para fazer a propaganda dos candidatos a deputado estadual e federal do então governador Amazonino Mendes, candidato a reeleição. Ele me escalou para a tarefa.

O secretário de Comunicação, Jéferson Coronel, e o ex-secretário de Comunicação, deputado Ronaldo Tiradentes, me apresentaram pro Renato Pitanga, na presença do Mario Jr., Shibuya (presidente da DMP) e Samuel Hanan, candidato a vice-governador. Única recomendação: não queremos baixaria!

Segui o script direitinho. Eu fazia os textos, os candidatos liam (ou improvisavam em cima) e o Pitanga editava. A gente acompanhava os programas da oposição apenas pra ajustar o discurso, sem nenhum estresse. Era uma moleza tão grande que, um dia, falei pro Pitanga: “Se eu não estiver aqui, você mesmo faz as escaladas – chamadas pro assunto do dia – que eu assumo a presepada. Confio em você!” – e ia me embriagar no Bar do Armando, que sempre fui filho de Deus.

Umas duas semanas depois, Deus me pegou pela palavra. Eu estava no Bar do Armando, numa quinta-feira, desde as 6 horas da tarde, quando fui chamado no telefone do português. Devia ser umas 10 da noite. O Renato Pitanga exigia minha presença imediata no estúdio. Chamei um táxi e fui. Estavam lá Egberto Batista, Samuel Hanan, Klinger Costa e o estado-maior da Policia Militar.

No programa daquele dia, o deputado estadual Eron Bezerra (meu brother!), do PC do B, havia detonado o Samuel Hanan. Entre outras baboseiras, Eron tinha dito que ele havia caído de pára-quedas em Manaus. Era uma idiotice sem tamanho, mas aquilo exigia resposta imediata. E até nisso a oposição havia sido esperta: a gente só tinha até 8h da manhã de sexta-feira para entregar o programa que seria exibido no sábado.

Apesar do meu adiantado estado etílico, pedi pro Samuel Hanan me contar a vida dele, que eu conhecia vagamente. Anotei o que servia e o que não servia. Depois, solicitei fotografias para ilustrar a matéria. Elas chegaram em menos de meia hora. Como não havia scanner no estúdio, o Renato Pitanga filmou as fotografias em alta definição. Já devia ser quase meia-noite. Os nossos locutores oficiais haviam ido dormir.

Depois de alguns minutos de discussão, liberei o Samuel Hanan (“vá pedir votos pro Negão!”), o Klinger Costa e o estado maior da Policia Militar. Egberto Batista queria ficar, mas também o liberamos pra ir atrás de votos, garantindo que deixaríamos uma cópia do programa na portaria do Tropical Hotel, onde ele morava. No estúdio, ficamos eu, Renato Pitanga e o vigia.

Falei pro Pitanga: “Edita essas fotos, desde ele criança até hoje. Depois cola essas imagens dele conversando com a população. A gente vai fechar com a pior fotografia possível do Eron”. Falei pro vigia: “Vá procurar cervejas e não volte sem trazer pelo menos uma dúzia” (o estúdio da DPM ficava defronte ao antigo Parque Amazonense, no Beco do Macedo). Com quinze minutos, a gente já estava caindo nas latinhas de Skol.

Por volta das duas horas da madrugada, eu havia feito o texto completo (quase 8 minutos) e obriguei o Renato Pitanga a fazer a locução. Quase que sai porrada. Ele argumentava que ganhava como editor, não como locutor. Eu argumentava que, pessoalmente, eu nem devia estar ali, naquele horário, participando daquela merda. Devia estar no bar do Armando, enchendo a cara. Mas já que estava ali, a gente precisava fazer o melhor. Não era questão de ideologia. Era questão de profissionalismo. Ele concordou em ler o texto.

Lá pelas quatro, Pitanga começou a gravar. Era uma corrida contra o tempo. “Faltou ênfase na parte tal”, eu dizia. Ele recomeçava. O vigia trouxe uma garrafa de cachaça. Eu, enchendo a burra, oferecia uma dose pra ele soltar a voz, mas o Pitanga recusava. Devia ser mais profissional do que eu. Por volta das cinco horas, falei: “É isso aí! Valeu! Vamos editar”. O Pitanga quase me beijou os pés.

O programa foi pro ar no sábado. Naquele seu vozeirão de locutor de FM, Renato Pitanga ia desfiando a vida do candidato a vice-governador Samuel Hanan: esse cidadão nasceu em Manaus no dia tal, estudou no grupo escolar tal, fez o colegial no grupo tal, se formou na FUA no dia tal, montou a primeira empresa no Distrito Industrial no dia tal, participou da fundação da Utam no dia tal, é professor universitário desde o dia tal, foi condecorado na ONU por conta disso e daquilo, etc.

No final, a gente mostrava o Samuel Hanan sendo abraçado pelos populares em algum canto da cidade e, em off, o Pitanga insistia: “Samuel Hanan é um profissional competente que enche de orgulho qualquer cidadão de bem...”.

Aí, dava uma paradinha, entrava no ar uma foto do Eron Bezerra (barbas desgrenhadas, cara de louco, jeito de marciano, uma das piores fotos que já vi) e o Pitanga continuava: “... enquanto o deputado Eron Bezerra não passa de um comunistazinho mal educado...”. O programa abalou geral.

Na segunda-feira, Amazonino Mendes, Samuel Hanan, Klinger Costa, Pauderney Avelino, Egberto Batista, Jéferson Coronel, Ronaldo Tiradentes, etc, foram lá no estúdio nos parabenizar pela desforra. E exigir que a gente fosse participar da criação dos programas majoritários da Oana, que estavam sem "punch". Mas isso é uma outra história.

Como é que um sacana desses não ia se tornar meu amigo de infância?

Um comentário:

Anônimo disse...

Ganhei a noite, lendo este artigo. Já me sinto até teu amigo tambem....Estava pesquisando o nome Samuel Hanan, tomando uma taça de vinho tinto aqui na churrascaria do Bigode, em Maceió...
Amanhã inaugura aqui um novo shopping, o Pátio Maceió. O empreendedor se chama Samuel Hanan, daí a pesquisa.
Sou pilôto e fotografo, e fiz varias aéreas da construção do shopping, mas depois pararam de solicitar...e eu sem contacto com os verdadeiros donos... Mas azar, agora não dá mais tempo mesmo.
Abraços

Hugo (82) 8808 3776 fotobrasil@msn.com