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segunda-feira, janeiro 18, 2010

Joe Weider, treinador de campeões


Seguindo o método Weider, você pode ficar com um corpo assim...


Mas malhando em um corpo assim, você vai se divertir muito mais. Palavra de especialista...

Em março de 1971, quando comecei a estudar na ETFA, no 1º ano de Eletrotécnica, eu tinha 14 anos, media 1,50 cm de altura e pesava 42 kg. Em outras palavras, era um autêntico ted tampinha.

Por mais que não admitisse, comecei a desconfiar que minha sina estava escrita nas estrelas e que eu seria, ao longo da vida, um eterno “zé ruela”: baixinho, magrelo e ingênuo.

Para se transformar no “bobo da corte” dos marmanjos, era conta de multiplicar. Eu já sabia disso desde os tempos do Ida Nelson.

Uma vez, com doze anos, indo para minha sala de aula sem mexer com ninguém, tive que atravessar uma espécie de corredor polonês supostamente preparado para os “bichos” do colégio (eu já era “pipoca”) e levei tanta porrada de uns 15 sujeitos, que minha camisa ficou completamente destruída.

Não sabia se chorava pelas porradas ou pelo fato de os hunos terem transformado em farrapos a minha única camisa escolar, que eu vinha usando com uma parcimônia de monge trapista desde o ano anterior.

Minha intuição dizia que aquilo representaria um novo baque no cada vez mais apertado orçamento do velho. Não deu outra. Passei vários meses indo assistir aulas com camisas de meia comuns até poder comprar uma nova camisa oficial da farda escolar.

O certo é que, no dia da agressão, fui liberado pelo colégio e voltei pra casa sem camisa, com o corpo cheio de hematomas. Ninguém, que eu saiba, foi punido. Também nunca entendi, até hoje, a razão de tanta selvageria contra um moleque indefeso.

Dos sujeitos que iniciaram aquela pancadaria sem sentido, João Lucio, o “Careca”, que anos depois seria um respeitado centroavante do Nacional, morreu do coração há alguns anos.

Outro, o rotundo Raimundo Pinho, que morava perto do Conjunto Kubitschek e me conhecia desde criança, desenvolveu diabetes, já teve uma das pernas amputadas e está quase cego. Só posso repetir, mesmo sem convicção, um velho lugar comum: Deus castiga!


Em pé: Nonato Índio, Luiz Lobão e eu. Agachados: Mário Adolfo e Kepelé. A foto já está detonada (foi tirada no campo do Internato Melo Matos em 1971) mas ainda dá pra ver que eu tinha um físico de refugiado de Biafra.

Voltando à vaca fria. Até 1970, a escola técnica era um feudo masculino intransponível. Em 1971, pela primeira vez, a ETFA havia aberto suas portas para o público feminino. Portanto, sou da “primeira turma mista da ETFA”, como os professores gostavam de frisar.

Considerado um dos melhores estabelecimentos de ensino da cidade, era necessário enfrentar um “mini-vestibular” para obter uma vaga na ETFA.

Por sugestão do meu velho, resolvi encarar o curso mais concorrido – o dos “macacos de poste” –, que devia ter uma média de 15 alunos por vaga (quem se formasse era automaticamente contratado por alguma fábrica do nascente Distrito Industrial, ou então pelas estatais Petrobras, CEM, Telamazon, Celetramazon, etc).

Fui aprovado com um pé nas costas. Méritos dos professores do Colégio Batista Ida Nelson, evidentemente, que haviam me transformado em um leitor compulsivo.


Havia três turmas de Eletrotécnica, de 50 alunos cada, que competiam entre si pelas melhores notas do curso.

A gente sabia das performances de cada turma pelos professores (Heyrton Bessa, Manu, Nelson Falcão, Waldir Garcia, Burra Preta, Maneca, Norton, etc).

O porteiro da ETFA se chamava Osvaldo e tinha uma obsessão quase sexual para barrar a entrada dos estudantes que não estivessem de meia preta, tarefa que ele realizava com a dedicação de um inspetor de alfândega norte-americano depois do 11 de setembro.

Resultado: um monte de alunos se amontova embaixo da janela de sua classe (a ETFA possuía dois andares) e ficava esperando os seus companheiros tirarem as meias e jogarem pela janela.

O esquema de segurança do velho Osvaldo era furado em questão de minutos. Aquilo devia fazer parte do folclore, já que os dois bedéis, Firmino e Jurandir, não davam a mínima para esses detalhes insignificantes.

Na turma da manhã, estudavam Engels Medeiros, Pauderney e Pauderley Avelino, Sebastião Peixoto, Luiz Bacellar, Alcion Castelo Branco, Ernesto Coelho, Carlos Almeida, Reinildo Cunha, Aldenir Alencar, Alberto Tadeu Borges (hoje reputado como o melhor cirurgião-dentista de Manaus), Miguel Rocha, Paulo Roberto Saraiva, Wendell Van Der Zee e Gilson Gonzalez, entre outros.

Na turma da tarde, que era a minha, estudavam João Carlos D’Antona, Augusto César Gato, Edílson Pinho, Jadir Rocha, Ivaldo Gama Barros, Alexandre Frederico, Augusto César Salgado, Jaci Lima, Zé Eduardo Soares, João Bosco Gomes, Milton Frazão, Luiz Carlos Barreto, Seidon Duarte, Antonio Adauto e Michael Pereira.

Da turma da noite, eu não conhecia ninguém.

No primeiro dia de aula, o professor Manu, de Matemática, pegou a pagela, começou a ler o nome dos alunos por ordem alfabética e a pedir que o cidadão se levantasse e se identificasse, para os demais alunos da classe o conhecerem.

Ele citou o nome de um cabeluão alto, magro, trajando uma camiseta de meia apertadíssima pintada na técnica tie-dye, calça Lee boca de sino e tamancos, que estava sentado ao meu lado.

O vistoso cordão de dentes de jacaré preso feito uma gargantilha no pescoço do cabeludão já era uma tremenda bandeira: o sujeito era um legítimo sobrevivente da geração Woodstock.

– Ouvi falar que você é guitarrista de uma banda de rock. É verdade? – disparou Manu.

O cabeludão tomou um susto:

– Banda de rock? Que banda de rock?...

– Uma tal de The Fezes... – disparou o professor.

A classe inteira caiu na maior gargalhada. O hippie não sabia onde enfiar a cara. Desse dia em diante, ele nunca mais colocou os pés na ETFA.


Só voltei a ouvir falar do sujeito uns 20 anos depois, quando uma reportagem de televisão lhe mostrava no presídio Bangu I fazendo a conversão evangélica de Gregório, o Gordo, o maior ladrão de carros da história do Brasil e principal estrategista do Comando Vermelho. O ex-hippie havia se transformado no pastor Caio Fábio.

Um dia, durante a aula de Educação Física, comandada pelo lendário professor Valverde, o pessoal da nossa classe armou um “racha” na quadra de futebol de salão, depois dos exercícios obrigatórios.

Fui escalado para jogar de ala, por sugestão do Ivaldo Gama Barros, um excepcional artista gráfico que me conhecia das antigas.

Abatedor de lebres em tempo integral com o codinome Frank Seixas Dumont, Ivaldo era freqüentador assíduo das brincadeiras em minha casa, na Cachoeirinha.

Apesar de ser um tampinha, entrei na quadra disposto a mostrar serviço.

Na primeira bola que peguei, dei um “elástico” no marcador, me livrei do infeliz, e quando avançava rapidamente em direção ao gol, para finalizar, levei uma rasteira por trás, daquelas que pegam nos dois pés.

Subi uns dois metros de altura e cai de cara na quadra.

Com a velocidade que vinha, ralei o rosto, o peito os braços e os joelhos (a gente jogava sem camisa). A quadra era de concreto armado, ainda não tinha sido polida. Cair ali era como se jogar em cima de uma piscina de cacos de vidros e nadar de braçada.

Eu me levantei meio grogue, com o sangue minando pelo corpo inteiro, e o sujeito (Zé Eduardo, um cara alto e magrelo, apelidado de “Zé Magro”) que havia me detonado foi logo avisando: “Futebol é pra homem, porra! Não agüentou pede pra sair!”.

Nunca mais esqueci aquilo – e pedi pra sair.

Lambendo minhas feridas no banheiro, enquanto procurava estancar o sangue com aquela água gelada da moléstia, amaldiçoei mais uma vez a minha carga genética hereditária. Puta que pariu, aquilo não era vida!

Quando cheguei em casa, feito um mutilado de guerra, minha mãe quase teve um troço. Ela queria porque queria ir até a ETFA tomar satisfações. Foi um custo impedi-la.


Um dia, encontrei a solução definitiva para os meus problemas: um anúncio de “Joe Weider – Treinador de Campeões”, que afirmava transformar qualquer frangote em Mr. Olympia em questão de semanas.

Joe Weider era um badalado fisioculturista de Montreal, no Canadá, que publicava seus anúncios na 4ª capa dos gibis da Rio Gráfica Editora (RGE).

A editora chancelava a proposta ao imprimir, no canto direito superior de cada edição, um selo em que se lia “Aprovado pelo Código de Ética”, coisa que hoje não se vê mais sequer em livro de advogado.

Convenci minha mãe a comprar o curso pra mim.

Com exceção da alimentação – sofisticada e cara demais para o nosso padrão de classe média baixa –, segui direitinho o método Weider.

O meu irmão Simas, que dividia um quarto comigo, morria de rir ao me encontrar fazendo exercícios que, para ele, eram simplesmente ridículos (fazer 100 apoios com as mãos apoiadas em duas cadeiras distantes um metro uma da outra, hoje eu também acho ridículo. Na época, não.).

Em dezembro daquele ano, eu já havia crescido 5 cm e engordado 8 kg, mas continuava sendo um tampinha (1,55 cm e 50 kg).

Ocorre que ainda estávamos em março. Nas aulas de Educação Física, sempre que via o Zé Magro amarrando o tênis, entrava em pânico.

Comecei a dar desculpas para não participar dos “rachas”. Preferia ficar correndo em volta do campo, feito um pomba-lesa.

Aí, no segundo semestre de 1971, abandonei definitivamente a quadra de futebol de salão e comecei a me enturmar com a turma de futebol de campo, tendo como “padrinho” o João Bosco, um dos melhores pontas direitas que já via atuar na vida (ele chegou a jogar profissionalmente em Rondônia) e que hoje é dono do restaurante Três Porquinhos, ali na rua Duque de Caxias, próximo do Sindicato dos Metalúrgicos.

Fui apelidado de “Corisco” não porque se assemelhasse a um cangaceiro e sim porque era rápido o suficiente para se livrar dos chutes dos cavalões. Questão de sobrevivência na selva.

Se tivesse marcado bobeira diante, por exemplo, do nego Berto, mais conhecido como Capa Onça, um zagueiro de 1,90 cm de altura e 100 kg, cara de homicida registrado em cartório e malino feito um filho do Maldito, dificilmente estaria recordando essas histórias.

No ano seguinte, a ETFA resolveu acabar com o turno vespertino de Eletrotécnica. Metade da turma foi pro turno da manhã (eu, inclusive) e a outra metade, pro turno noturno (Zé Magro, entre eles).

Sim, apesar dessa mudança providencial, eu não descuidara dos exercícios e continuava me preparando para ser um novo Mr. Olympia. Mas os progressos ainda eram risíveis.

Foi quando recebi em casa, pelos Correios, uma nova proposta para fazer um segundo curso oferecido pelo Joe Weider intitulado “Como tornar-se um defensor em 30 dias”. Aquele fisioculturista canadense andava lendo os meus pensamentos...

No folheto, Joe Weider perguntava ao leitor se ele estava preparado para defender sua vida e avisava que era possível se livrar de qualquer assaltante em apenas 5 segundos.

Em seguida, continuava mandando brasa: qualquer valentão, com duas vezes o seu tamanho, ficará tremendo a seus pés em apenas 5 segundos.

O curso que lhe oferecemos é a maior proeza na arte de defesa pessoal já traduzido para 16 línguas em mais de 70 países.

Mais rápido do que você pensa, nós vamos transformá-lo em uma máquina de combate com técnicas avançadas de jiu-jitsu, judô, karatê, savate, kali silat, kung fu, kickboxing e krav maga, entre outras.

Você vai poder proteger a si e aos seus contra qualquer marginal que queira atacá-lo.

Um simples golpe de dedo imobilizará o mais brutal fanfarrão de rua e reduzirá qualquer marginal a um covarde. Magro ou gordo, alto ou baixo, jovem ou velho, você será respeitado por todos.

Ele (o curso) o tornará, da noite para o dia, veloz como um raio, forte como uma locomotiva e ágil como um felino. Mandei buscar o curso. O Zé Magro que me aguardasse.


Uma noite de sábado, provavelmente em junho ou julho de 1972, o Felipe Aguiar (que estudava Edificações, mas era viciado em HQs que nem eu, razão de termos nos tornado amigos rapidamente), resolveu passar em casa e me levar para conhecer um puteiro na periferia da cidade.

Apesar de ser apenas um ano mais velho do que eu, Felipe freqüentava os lupanares desde os 14 anos – pelo menos era o que ele me garantia.

Ao contrário dele, eu, aos 16 anos, continuava inocente, puro e besta. Nunca havia trepado e sequer tinha o hábito de tocar punheta diariamente.

Comer viado, então, prática corriqueira entre os homeboys da minha área, nem pensar.

Daí que quando o Felipe Aguiar me convidou para participar dessa nova presepada, eu nem pensei duas vezes. Topei no ato.

Eu já havia escutado muitas histórias sobre os lendários puteiros de Manaus e, no futuro, saberia até localizá-los geograficamente, mas até então nunca havia colocado os pés em um.

O mais famoso deles, o Lá Hoje, ficava onde hoje é a Estação Rodoviária. O Verônica, onde hoje é o Millenium, ali no Parque dos Bilhares. O Shangri-la, quase em frente ao Verônica, nas imediações do conjunto Cidade Jardim. O Ângelus, num ramal à direita, depois do Verônica, nas proximidades do antigo Maromba. O Piscina, no começo da Torquato Neto, onde hoje é um posto de gasolina.

O Rosa de Maio ficava na entrada da Cidade Nova. O Iracema, em um ramal logo depois do Rosa de Maio. O Selvagem, do lado esquerdo da Torquato Tapajós, um pouco antes da entrada da Cidade Nova. O Saramandaia, onde hoje é o conjunto Santos Dumont. A Chica Bobó, na entrada do Aeroclube. A Mansão das Brumas, na estrada da Ponta Negra. A Maria dos Patos, ali em Petrópolis. O Poço de Caldas, ali do lado esquerdo da alameda Cosme Ferreira, antes de chegar na entrada do conjunto Tiradentes.

Também não sabia qual o comportamento social adotado nos lupanares. O cara podia pegar qualquer vagabunda existente no recinto ou tinha que negociar primeiro com os gigolôs? O pagamento da lia era feito antes ou depois do serviço? Quem escolhia o quarto? A trepada era com luz acesa ou em quarto escuro?

A primeira surpresa que tive foi com a música que tocava no lugar: boleros, exclusivamente boleros. Assim que a gente entrou no basfond (Iracema? Piscina? Rosa de Maio?), ouvi um pistão em surdina fazendo as honras da casa. Plangente, pungente, chamamento e grito de guerra: “Ouvi sua boca dizer / Já não quero você / Ouvi, sua boca, ouvi / Estou farto de ti”.

Dolorosas, viscerais, verticais, as letras de bolero nos irmanaram, com certo melaço, é verdade, mas com sua extremada dose de verdade humana, corações mexicanos e brasileiros. Românticos e sensuais.

“Perfume de gardênia / Tiene tu boca...”. Bienvenido Granda, o bigode que cantava, traduzia uma virilidade tropical muito próxima da gente. Era impossível não gostar daquilo.

Meus parceiros de noitada (Felipe, Paulo Sarará, Siqueira, Robertinho e Moisés Pinguço, todos eles estudantes da ETFA) sabiam dançar bolero e acompanhar com uma mão só, usando todos os dedos mais a palma, as batidas do ritmo na mesa no pardieiro.

“Besame / Besame mucho / Como si fuera esta noche / La ultima vez...” A impressão que tive foi de que estava em uma “brincadeira” familiar para pessoas adultas. Gente dançando, gente namorando, gente bebendo. Os seguranças e os garçons extremamente solícitos. Mulheres vestidas sem afetação. Tudo muito normal e bem comportado.


Era muito, muito diferente, do Red Light District dos meus sonhos, o Distrito da Luz Vermelha, em Amsterdam, onde dezenas de garotas de programa dançam com pouca (ou nenhuma roupa) nas vitrines para atrair os turistas e evitar que seus eventuais clientes não comprem gato por lebre.

Foi um choque e, por que não?, uma grande decepção. Eu achava que aqueles covis se chamavam puteiros porque rolava uma putaria generalizada 24 horas por dia. Não era nada disso.

Por volta da meia noite, Felipe, rebocando uma garota de quase dois metros de altura (na realidade, ela tinha 1,75 cm, mas se transformava em uma giganta se ficasse ao meu lado), se aproximou da mesa onde eu me limitava a beber doses industriais de cerveja morna e disparou:

– Bicho, essa aqui é a Adriana. Ela tem apenas 16 aninhos e está vindo aqui pela primeira vez. O quarto de vocês é o 14. Vão lá se divertir...

Com aquele seu sorriso tipicamente cafajeste, Felipe me estendeu a ensebada chave do quarto e já saiu para abordar uma morena que ia passando.

Peguei a Adriana pela mão e nos dirigimos para a encrenca. Ela, tímida de doer. Eu, bancando um novo Marquês de Sade comandando uma orgia franciscana.

Perdemos dez minutos discutindo se ia ser com a luz acesa ou apagada. Consegui dobrá-la com o argumento absolutamente sincero de que, desde que me engasgara com uma espinha de jaraqui num jantar à luz de candeeiro, só conseguia comer qualquer coisa com a luz acesa. Rindo nervosamente, ela se deu por vencida.


Pode parecer que estou blefando, mas a Adriana era um mulherão. Boca carnuda, dentes perfeitos, peitinhos pequenos “pero no mucho”, barriguinha sarada, cinturinha de pilão, bundona de tanajura, boquinha movida por ventosas, penugem acetinada e uma pele absolutamente deslumbrante.

Como dizia o boêmio Nei Parada Dura, foi “linha, papagaio e rabiola”. Se a gente tivesse encontrado um tabelião no puteiro naquele dia, teríamos nos casado na mesma hora. Juro por Deus.

Confesso, também, que em nenhum momento acreditei que ela estivesse ali pela primeira vez. Essa era uma mentira recorrente que fazia parte do folclore das meninas – a exemplo da história do soldado, marinheiro ou vizinho safado, que lhes havia ultrajado a inocência com promessa de casamento e depois picado a mula.

Na seqüência, a família descobria a desonra, a menina era expulsa de casa e ia morar com uma amiga na mesma situação. O resultado era aquele: vender o corpo para conseguir sobreviver.

Adriana voltou pra nossa mesa e se comportou como uma dama com doutorado na Socila. Não sei quanto o Felipe desembolsou pelo teatro do absurdo, mas curti bastante.

Ela limpava o suor do meu rosto com uma extrema delicadeza (o ambiente esfumaçado e o calor modorrento do puteiro lembravam uma sauna), enchia meu copo de cerveja, me dava batatinhas fritas na boca, me beijava de vez em quando no rosto, me acariciava os cabelos e não largava uma das minhas mãos nem pelo caralho.

Não bastasse isso, recusou polidamente uns doze convites pra trepar, explicando graciosamente que “naquela noite estava com o namorado”.

Os caras olhavam pra mim (um tampinha, volto a repetir) e achavam que ela estava apenas tirando onda. Mas não insistiam.

Saímos do puteiro por volta das 5h da manhã de domingo. Minha mãe estava em estado de choque, supondo, provavelmente, que eu havia fugido de casa (uma de minhas ameaças recorrentes quando era contrariado).


Até hoje não sei que diabo aconteceu, mas o certo é que depois de ter trepado pela primeira vez desembestei a crescer. Em dezembro de 1972, já estava com 1,75 cm de altura (20 centímetros em seis meses) e pesando 75 kg. Um verdadeiro Mr. Olympia.

Por conta disso, doei meus cursos Joe Weider para o Rubens Bentes, que depois o repassou para o Nonato da Oficina, que aproveitou para abrir uma academia de halterofilismo e defesa pessoal na rua Parintins, que existe até hoje. Um dos filhos do Simas, seu primogênito Samis Gabriel, chegou a treinar jiu-jitsu na dita academia durante vários meses.

Foi quando, em 1973, a ETFA resolveu acabar com o 3º ano diurno de Eletrotécnica e juntar todo mundo em duas turmas noturnas. Dos 150 alunos iniciais, havíamos nos transformado em 100. Desses, somente 85 receberiam o canudo no final daquele ano.

Fiquei em uma classe em que a maioria dos alunos vinha do turno matutino. Meu eterno desafeto, Zé Magro, mais uma vez, ficara na outra turma, junto com Ivaldo, Nego Alexandre, Edílson Papagaio, Antorildo Rodrigues, Francisco Duarte (meu treinador no juvenil do São Raimundo) e outros cachaceiros menos lembrados.

Dos novos companheiros de sala, lembro bem do Lauro Rocha (seu pai era dono da famosa “Casa das Redes Santana”), um playboy baixinho, de cabelos encaracolados, que comia as meninas mais bonitas de Manaus e era extremamente solidário, do Domingos do Rosário, que morava perto da casa de minha avó Rosa, no bairro de São Francisco, e do José Geraldo Bessa, o “Catatau”, com quem troco figurinhas até hoje.

Também acabei me transformando em amigo querido de Jamel Amed (irmão do Mamoud Ahmed, ex-prefeito de Itacoatiara, um sujeito super gente fina que faleceu trágica e precocemente em um acidente de carro na rodovia Manaus-Itacoatiara), do Mitsuaki Koba (era gerente técnico da Sanyo) e do Américo Leitão (antes de ser dono dos Supermercados Leitão, ele havia morado em frente de casa, na antiga Waupés).

Em virtude de a gente estudar à noite, a disciplina de Educação Física havia sido limada do currículo. Daí que foi preciso muito maquiavelismo de minha parte para convencer a nossa turma a enfrentar a outra em uma prosaica partida de futebol de salão, pra saber definitivamente quem eram os verdadeiros “fodões” do pedaço.

A nossa classe tinha um celeiro de craques (Aldenir Alencar, o “Bolo”, que já brilhava no juvenil do Nacional, o saudoso Gilson Gonzalez, depois vereador de Manaus, que tinha o físico do Lou Ferrigno – o cara que fazia o papel do Hulk nos seriados –, Geraldo Nogueira, Luis Barreto – que era tão bom no futebol quanto no basquete e que, em parceria com o atual coronel Zé Maria Sirotheau, levantou vários títulos de basquete pra ETFA). Tudo bem, eu ia ficar na “grade”. Mas e daí? Eu só queria pegar o Zé Magro.

Entrei no segundo tempo. A gente já estava ganhando, se não me engano, de 7 a 1. Como há três anos, novamente jogando de ala.

A diferença era que o piso da quadra havia sido polido – o que fazia a bola ganhar maior velocidade – e eu tinha o dobro da massa muscular do Zé Magro. Lembro como se fosse hoje.

Dominei a bola de costas para o gol adversário, ali na intermediária do campo deles, o Zé Magro me cercando. Pisando em cima da bola com a perna direita, girei o corpo 180º e tentei um novo “elástico” com a perna esquerda (em termo de pernas, sempre fui canhoto).

De propósito, deixei a bola fugir do meu controle. Zé Magro me deu as costas, para dominar a bola, pisando em cima dela com o pé esquerdo. Dei uma patada atômica de canhota, que levou o tornozelo dele e a bola pro fundo das redes.

Enquanto ele gritava de dor, caído no chão, segurando o tornozelo com as duas mãos, me aproximei e repeti as palavras cabalísticas: “Futebol é pra homem, porra! Não agüentou pede pra sair!”.

Ele saiu amparado pelo Raimundo Andrade, pulando em uma única perna que nem saci, me xingando pra caralho. Desse dia em diante, nunca mais tirou graça comigo. Pelo contrário, acabou se transformando em um grande amigo e parceiro de inenarráveis porres homéricos.

Há uns seis anos, nos encontramos no saguão do aeroporto de Parintins. Eu, chegando de Manaus, ele se preparando pra vir pra Manaus. Desconfio que o Zé Magro é funcionário de algum órgão do governo federal.

Relembramos os velhos tempos da ETFA, perguntamos mutuamente pelos antigos colegas de turma, rimos muito de várias presepadas, trocamos telefones, aquelas coisas. Mas evitamos, claro, falar sobre futebol de salão. Amigos são pra essas coisas.

2 comentários:

Anônimo disse...

Geraldo de Caicó

Essa é a chamada época de ouro. Sobre o curso de Joe Weider, nunca tive condições de comprá-lo, pois, eu não tinha dinheiro o suficiente.Um amigo em Florânia/RN, mostrou-me as lições o que me matara o desejo de conhecer. Lá em Florânia tive o prazer de conhecer também o curso de Charles Atlas(muito legal para a época).
Li suas histórias apesar de não conhecer seus contemporâneos, já que sou potiguar de Caicó/RN.Apreciei visitar seu blog.
Deixo aqui também o meu:www.geraldoanizio.zip.net
Abraço amigo.

Anônimo disse...

voce tem essa apostila ainda? entre em contato comigo albertayrton@hotmail.com