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sábado, julho 10, 2010

A História dos Quadrinhos (Parte 1)

Em 1895, Richard Felton Outcault desenhava uma página no suplemento dominical colorido do jornal New York World, chamada Down Hogan’s AlIey. A página introduziu Yellow Kid, o primeiro personagem famoso das Histórias em Quadrinhos, que celebrizaria seu roupão amarelo até nos palcos da Broadway.

Em 1904, as histórias de Yellow Kid foram compiladas e deram origem à revista em quadrinhos.

Antes do Kid, os quadrinhos eram rudimentares. Little Bears and Tigers (1892) de Jimmy Swinnerton, considerado por muitos o verdadeiro pai do gênero, não usava seqüência de quadros nem diálogos com balões.

O fato é que Yellow Kid mostrou que quadrinhos vendiam jornais. E os artistas passaram a ter seus passes disputados pelos grandes rivais da imprensa.

William Randolph Hearst, proprietário do New York Journal, não só contratou os melhores desenhistas da época, inclusive Outcault, como providenciou o segundo sucesso histórico dos quadrinhos.

Hearst sugeriu a Rudolph Dirks, então com 20 anos, que adaptasse as aventuras de Max und Moritz para o seu jornal. Surgiam os Katzenjammer Kids, mais conhecidos como Os Sobrinhos do Capitão, dois endiabrados pirralhos que adoravam atormentar a família.

As primeiras tiras (strips) eram cheias de personagens infantis. Além dos citados, havia entre os mais famosos, Little Nemo, que vivia no mundo dos sonhos e A Aninha (Little Orphan Annie), a órfã boazinha de Harold Gray.

Mas também havia muitos bichinhos humanizados como Maud de Frederick Burr Opper, o brilhante Krazy Kat de Herriman e seu sucessor, o gato Felix de Pat Sullivan, que lidavam com o humor em sua forma mais pura, ao contrário dos personagens tirados dos cartoons cinematográficos, que encenavam sempre o mesmo sketch: pequenos Davis do reino animal invariavelmente levando a vantagem sobre seus maiores e mais fortes antagonistas.

Os Três Porquinhos e o Lobo Mau, de Disney, começaram a tradição, continuada por Tom e Jerry, Pernalonga, Pica-Pau e inúmeros outros.

O bichinho mais famoso, Mickey, chegou aos jornais em 1930. Seu maior concorrente, o Pato Donald, em 1938. Em muitas partes do globo (incluindo o Brasil) é o genioso pato que lidera em popularidade.

O mérito é de Carl Barks, o artista que desenhou os primeiros quadrinhos das revistas Uncle Scrrooge (Tio Patinhas) e Walt Disney’s Comics and Stories. Ainda hoje, suas sempre reprisadas histórias de caça a tesouros perdidos inspiram novas aventuras, como Duck Tales.

O charme do “tipo azarado” foi outro fator de sucesso de Donald. O azarado era uma categoria de personagem popular no início dos quadrinhos,descendente de Happy Hooligan (1899, de Opper), Mutt (que fazia dupla com Jeff) e Dagwood (o marido de Blondie).

A criação de uma rede de distribuição nacional (Syndication) causou o primeiro grande impacto nos quadrinhos.

Os personagens de maior identificação pertenciam à classe média baixa e ignoravam a era do jazz – à exceção de Polly, da tira Positive Polly (mais tarde, Polly and Her Palls) de Cliff Sterrett, que despertava temores em seus pais devido a seus vestidos escandalosos e estilo coquete.

Pafúncio (Bringing Up Father) de George McManus, foi a tira mais bem sucedida do período, centrando seu argumento na guerra doméstica entre um casal novo-rico.

Foi McManus, aliás, quem criou a primeira tira familiar, The Newlyweds, responsável pela temática predominante nas primeiras décadas: a crise entre a bela esposa atarefada e o bom marido vagabundo – tema levado à perfeição por Chic Young nas tiras de Blondie.

As primeiras tiras de quadrinhos eram cômicas e caricatas e por isso foram chamadas de comics, nome que persistiu mesmo quando seu conteúdo se abriu para o campo da aventura e dos problemas sociais. Os quadrinhos de humor (funnies) reinaram até os anos 30.

Contudo, a partir do crack da economia americana, até mesmo personagens de traço caricato como Ferdinando (L’il Abner), de Al Capp, passaram a temperar o humor tradicional com um estilo satírico grotesco.

Mas a principal guinada dos comics, que passaram a refletir a necessidade de fuga da crise do período entre-guerras, foi o surgimento das tiras de aventura e dos super-heróis.

Foi um marinheiro introduzido por Elzie Segar na série ThimbleTheatre (1924) quem fez a transição. Popeye foi o primeiro super-herói dos quadrinhos, adquirindo super-força ao ingerir espinafre.

A era das tiras de aventura começou, de fato, com Tarzan e Buck Rogers, publicados, por coincidência, no mesmo dia (7 de Janeiro de 1929).

As primeiras tiras de Tarzan foram adaptadas do livro Tarzan dos Macacos de Edgar Rice Burroughs, de 1914.

Harold Foster, o autor da adaptação, desenvolveu uma técnica romanceada em suas ilustrações, substituindo os balões convencionais por legendas.

A idéia foi especialmente feliz por resolver um problema peculiar: Tarzan, de acordo com o conceito original de Burroughs, não falava nenhuma linguagem específica.

Após Foster, o melhor artista de Tarzan foi Burne Hogarth, responsável pela transformação do Homem-Macaco em um super-herói selvagem.

Buck Rogers foi o primeiro herói espacial. Boa parte dos conceitos de suas tiras, de autoria de Phil Nowlan e Dick Calkins, eram baseados em escritores como Jules Verne e H. G. Wells.

O próprio tema das histórias, um astronauta do século XX que despertava cinco séculos no futuro, possuía relação direta com A Máquina do Tempo de Wells.

Suas aventuras ainda mostraram o primeiro pouso na Lua, mísseis, lasers, televisores, robôs e, numa seqüência de 1939, seis anos antes de Hiroshima, uma descrição da bomba atômica.

Buck Rogers também foi a primeira novela radiofônica adaptada dos comics (1932) e o personagem da primeira revista em quadrinhos mensal dos EUA, Famous Funnies (1933).

O filão aberto por Buck Rogers foi seguido por Brick Bradford, outro viajante do tempo, criado por William Riu e Clarence Gray em 1933.

Graças a seu “Balão do Tempo”, o herói vivia aventuras que se desenrolavam tanto na pré-história como no futuro distante.

A idéia colou até mesmo no funnie Brucutu (Ailey Oop) de V. T. Hamlin, também de 33. Em 1939, Brucutu e sua namorada Ula (Dola) foram desmaterializados em sua época pré-histórica, graças a uma engenhoca do tempo, e transportados para o século XX.

Mas nenhum personagem de ficção foi tão famoso quanto Flash Gordon.

O herói, criado por Alex Raymond em 1934, foi a outro planeta, salvou a terra da destruição e ainda lutou ao lado dos americanos na Segunda Guerra Mundial. Flash Gordon foi também a primeira aventura dos quadrinhos adaptada para o cinema (em 1936).

Alex Raymond era o artista mais criativo de seu tempo. No mesmo dia em que Flash Gordon foi publicado, ele lançou Jim das Selvas (Jungle Jim), em aventuras transcorridas no Sudoeste Asiático. Ao lado da bela Lil e de seu companheiro hindu, Kolu, Jim Bradley disputava o público de Tarzan com o único rival a altura da arte de seu autor: Hal Foster.

As selvas também foram exploradas pela editora Fiction House, especialmente nas páginas da revista Jumbo Comics, lançada em 1939 e adaptada do maior sucesso da editora, as Jungle Stories dos anos 20.

Jumbo Comics apresentava aventuras de vários personagens, entre eles Hawk, criado por Will Eisner, e Sheena, uma garota perdida na selva. A loira de maiô tigrado, inventada por W. Morgan Thomas, foi a primeira heroína das revistas em quadrinhos. Em 1942, essa versão feminina de Tarzan ganhou revista própria.

A King Features, a editora mais poderosa da época, também tinha a sua Jungle strip. Na verdade, o Fantasma (The Phantom), uma criação de Lee Falk e Ray Moore em 1936, era mais que uma simples história de selva.

O Fantasma era um justiceiro mascarado, um dos primeiros heróis uniformizados, que cumpria o juramento de um ancestral do século XVI, combatendo o mal nas selvas.

Seus auxiliares eram os terríveis pigmeus Bandar, os únicos além de sua namorada, (e posteriormente esposa) Diana Palmer, que conheciam a localização da caverna da Caveira, seu lar, e os segredos de sua origem.

Para os malfeitores, o Fantasma era uma lenda, “o espírito que anda”, um imortal com mais de quatrocentos anos de idade, que deixava em suas vítimas a marca da caveira.

As histórias de Tim e Tom (Tim Tyler’s Luck), de Lyman Young (irmão de Chic Young, autor de Blondie) também chegaram às selvas da África.

Entretanto, a tira começou como uma aventura de aviação, vertente inspirada no vôo de Charles Lindenbergh através do Atlântico, em 1927.

O herói mais popular entre inúmeras tiras de aviação dos anos 30 era Ace Drummond, de Eddie Rickenbacker e Clayton Knight.

O western também habitava as tiras. Os principais “mocinhos” dos quadrinhos eram o Rei da Polícia Montada (1935) de Zane Gray, Red Ryder (1938) de Fred Harman e Zorro (The Lone Ranger, 1939), adaptação da mais popular série radiofônica de todos os tempos.

Havia aventuras realmente exóticas, como as vividas na China por Terry e os Piratas, de Milton Caniff, as inúmeras voltas ao mundo de Tintin, o personagem de quadrinhos mais popular da Europa, criado por Hergé, aliás George Remis, num jornal de Bruxelas, Bélgica, em 1929.

Mas o grande filão das tiras dos anos 30 foi mesmo a realidade das ruas, transformada em manchetes graças à onda de violência que varreu os EUA durante a Lei Seca.

A primeira tira policial séria foi desenhada por Chester Gold em 1931: Dick Tracy atuava em Chicago, o principal reduto dos gangsterismo, na época dominada por Al Capone.

Seus inimigos eram grotescos, deformados como o crime. Por isso, Dick Tracy entrava em ação derrubando portas a tiros de metralhadoras e esparramando sangue em quantidade industrial.

O maior noir dos detetives dos quadrinhos foi Red Barry, criado por Will Gould em 1934 para disputar o concurso que daria um desenhista ao agente secreto X-9, de Dashiell Hammett.

O ruivo Barry era um irlandês durão, convicto de que a lei deveria se opor ao crime com métodos tão violentos quanto fossem necessários. Sua vida foi curta, infelizmente.

Seis anos após sua estréia, a censura interna da King Features exigiu uma reformulação do personagem, que deveria renunciar à violência e ter o conteúdo moral de suas histórias alterado. Gould encerrou a carreira.

Alex Raymond, o primeiro desenhista do detetive do FBI conhecido como agente secreto X-9, por ironia, acabou redefinindo o perfil áspero dos detetives dos quadrinhos.

Ao contrário dos tipos dos anos 30, Rip Kirby (no Brasil, Nick Holmes), que Raymond trouxe ao mundo em 1946, era um intelectual sofisticado, burguês, que amava música clássica, bebia moderadamente, jogava xadrez e golfe... até usava óculos!

O tema “herói detetive” ainda se prestaria a variações como a de Charlie Chan, o detetive chinês, Mandrake, o detetive mágico, os mascarados Spirit e Sombra e o super-detetive Batman, entre os mais famosos.

A grande contribuição das tiras de aventura, na verdade, foi uma nova concepção de desenho, que exigia conhecimento da anatomia, perspectiva, luz, sombra e uma acurada busca de autenticidade em todos os detalhes – O Príncipe Valente de Hal Foster foi o ápice.

Os enredos das tiras, porém, não eram novidade. Já existiam em pulp, revistas baratas com histórias curtas estreladas por um mesmo personagem. Doc Savage, criado por Lesse Dent, foi o primeiro herói a se denominar “super-homem”.

O Sombra de Maxwel Grant, por sua vez, foi a grande influência de Batman. Quando os dois se encontraram, em 1972, Batman admitiu: “Nunca disse a ninguém, mas você foi minha maior inspiração! Será uma honra apertar sua mão”.

Doc Savage e o Sombra, personagens dos pulps, viraram quadrinhos quando sua editora, Street e Smith, decidiu entrar no boom dos comics nos anos 40.

Galeria de Personagens

Ferdinando (L’il Abner) é um caipirão que foi caçado até ao altar por Violeta (Daisy Mãe), uma loirinha ingênua e deliciosa nas medidas de Marilyn Monroe. O escritor John Steinbeck chegou a considerar suas desventuras o melhor exemplo de seu tempo. Seu maior clássico foi a saga dos Schmoos (os tipos bizarros inventados por Al Capp eram inúmeros), criaturinhas amáveis que, infelizmente, reproduziam tão rápido que ameaçavam arruinar a economia.

Krazy Kat foi precursor dos quadrinhos underground. Sua ultrajante farsa de amor e ódio envolvia um gato andrógino, um rato sádico e um policial. Ignatz era o rato com uma missão: acertar Kat com um tijolo. O gato, porém, amava loucamente o rato e via em cada tijolo um míssil de amor. George Herriman criou esse comic clássico em 1941 e morreu com ele em 1944. A tira não teve seqüência – seu apelo não era popular. Entre os ávidos admiradores de Krazy Kat encontravam-se o poeta e.e.cummings e o presidente Wilson.

As aventuras de Little Nemo, iniciadas em 1905, duravam uma página, tempo suficiente para o menino sonhar e cair da cama. O traço de Winsor Mccay possuía uma perspectiva única, que transformava as duas dimensões dos quadrinhos num plano infinito. Sua fantasia onírica antecipou o surrealismo, bombardeando o papel com rococós, sets bizantinos e detalhamento obsessivo.

Os Sobrinhos do Capitão são inspirados em Max und Moritz, onde Wilhelm Busch já misturava poemas infantis com desenhos ilustrativos. Rudolph Dirks adaptou as histórias de dois garotos levados da breca e desenvolveu a técnica de contar uma história a partir de seqüências narrativas (os quadrinhos) e do uso dos balões.

Yellow Kid, o risonho garotinho oriental de camisola amarela de Richard Felton Outcault, foi o primeiro que reuniu as características que passaram a definir a história em quadrinhos: um elenco regular de personagens em histórias com continuação, um tema comum e texto integrado à imagem, que mais tarde se desenvolveu em balões com legendas.

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