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sábado, agosto 07, 2010

Causos de Bambas - Coronel Feliciano

Princesa Isabel, cidade do alto sertão da Paraíba, terra onde se aquartelava a tropa cangaceira do temido Zé Pereira, berço da saga biográfica do coronel Feliciano, homem de muita fé, mas só em si mesmo. Homem de truculência e bizarrice. Homem para homem nenhum botar defeito mode continuar vivo.

Homem que só saiu de Princesa Isabel uma única vez para visitar a Feira de Caruaru, de onde partiu para sempre uma hora depois de arribaldo voltando pro lombo do trem. “Chega de tanta grandeza”, ele disse.

Homem que não acreditava que a Terra fosse redonda e se mexia. “Coisa de padre pra contar história. Se fosse redonda e se mexesse ia ter indecência. Os home tudo por cima das muié”.

Homem que odiava padre e santo e que negava esmola a cego. “Vá pedir dinheiro pra quem te cegou, peste!”.

Homem que negava a existência da Arca de Noé com uma argumentação imbatível:

– Uma vez teve um circo aqui. O elefante comeu sozinho umas cinquenta arrobas de resto de cana. Imagine um barco cheio de bicho por quarenta dias e quarenta noites! Onde o velho ia guardar a comida dos animais?

E concluía:

– Só de piolho conheço umas dez raças diferentes e uma vez quis pegar um casal de rolinhas, só peguei macho.

A mulher do coronel Feliciano, ao contrário do marido, era beata de ralar joelho, vivia na missa, vivia rezando.

Na grande seca de 1936, toda a população se reuniu numa procissão para pedir água ao céu abrasador.

O coronel pediu a seu modo: pegou uma imagem de São Judas Tadeu – um “calunga”, como ele chamava –, amarrou no talo de um rojão – na “taboca”, como tratam o rabo de foguete por lá – e disparou a peça de artilharia que se espatifou, junto com a imagem, a uns cem metros de altura.

Coincidência ou milagre, no dia seguinte desabou o maior pé-d’água do sertão. Explicação prática do coronel:

– Uai! E não era pra chover, cabra? Já imaginou um pipoco do pé de ouvido a duzentos metros de altura! Tinha mais é que tomar providência!

E não parou mais de chover, o açude estava por estourar. O coronel encheu um saco de santo, foi no açude e, segundo ele, “pipinou os calungas de metro em metro” e avisou pras santificadas imagens:

– Agora é com vocês! Se estourar desce tudo por água abaixo. E vocês descem junto.

Dia seguinte parou de chover.

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