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segunda-feira, novembro 29, 2010

O homem que não bazofiava

Dezembro de 1989. A cachorrada reunida no Top Bar está dividida em torno de um desafio lançado pelo abusado quarto zagueiro Lucio Preto: de que ele é capaz de ficar sentado, nu, em uma pedra de gelo, durante meia hora.

Frank Cavalcante comanda a claque de que ele não aguenta.

Nei Parada Dura garante que ele aguenta.

Começam as apostas, em dinheiro.

Rubens Bentes e Jones Cunha vão até a Frigelo, compram uma pedra de gelo de 50 kg e retornam para o bar, para tirar a prova dos nove.

A pedra de gelo é colocada na área externa do boteco, quase no cruzamento entre as ruas Borba e Parintins.

Lucio Preto faz uma única exigência: quer ficar sentado de costas para a rua Borba, em virtude de existir uma parada de ônibus na frente do bar. A exigência é aceita.

Por volta das 16h de um sábado, Lucio Preto fica completamente pelado, senta na pedra de gelo e o resto dos cachorros começa a contar o tempo.

Com o calção e a cueca em uma das mãos, Lucio Preto cobre pudicamente a sua ferramenta.

Os transeuntes que passavam em direção a feira livre da Cachoeirinha ficavam intrigados com aquela presepada.

Muitos se aproximavam para conferir se aquela bunda morena estava mesmo se transformando em picolé de açaí.

Quando o primeiro ônibus parou em frente ao bar, os passageiros fizeram um tremendo alvoroço para apreciar aquela inusitada situação.

Lucio Preto, tranquilo como um iogue indiano, fuma um cigarro atrás do outro.

As apostas começam a dobrar de valor.

Meia hora depois, o quarto zagueiro se levanta. Na pedra de gelo, lindamente esculpida, suas duas nádegas.

Nei Parada Dura começa a receber a grana das apostas.

O dinheiro apurado é suficiente para levar Lucio Preto para uma consulta de emergência na Drogaria Menescal, porque ele não estava mais sentindo a circulação de sangue na própria bunda.

Depois de examinar o local, o farmacêutico Francisco Menescal fica injuriado:

– Caralho! Essa tua bunda entrou em um gravíssimo processo de gangrena! Se a medicação não funcionar, vou ter que sarjar agora mesmo... Que merda foi que vocês andaram aprontando?...

Lucio Preto explica o acontecido.

O farmacêutico lhe aplica na bunda antibióticos de última geração, banho de assento, palmadas, massagem, choque elétrico, choque térmico, o diabo a quatro.

Depois de 20 minutos de agonia, o sangue recomeça a circular no buzanfã do quarto zagueiro.

Lucio Preto passou um mês sem poder beber e sem poder se sentar sobre a própria bunda.

Mas manteve a dignidade de sempre provar o que afirmava, apesar de tudo.

Causos de Bambas: Marius Bell

Marius Bell diante do painel retratando a belle époque de Manaus, que produziu em um dos muros da Penitenciária do Estado

Agosto de 1963. Aluno do terceiro ano primário no grupo escolar Getúlio Vargas, na mesma classe de Mário Cortez e Silene Pessoa, Marius Bell sonhava em ser professor de História, provavelmente por conta da sofreguidão com que lia gibis, romances de cavalaria e obras de Monteiro Lobato.

Naquela época, ele já era um desenhista de mão cheia.

O problema é que Marius Bell havia descoberto os catecismos do Carlos Zéfiro e começara a ganhar dinheiro dos colegas de classe replicando aquelas saborosas histórias em quadrinhos com traços cada vez mais ultrarrealistas.

Na maioria das vezes, a heroína das picantes (ops!) HQs tinha a cara da professora Terezinha, que era o terror da turma. Ninguém gostava dela.

A outra professora da classe, Cristina, era sangue bom.

Durante uma aula de português, onde a missão da classe era escrever o ditado “A caneca da Cecília”, recitada pela professora Terezinha, Marius Bell começou a desenhar, a pedido de seu colega Sergio Gordo, a diretora do colégio, Dona Mirandolina, participando de uma orgia espetacular.

A diretora estava sendo vítima de seis predadores sexuais, incluindo um padre redentorista dotado de uma estrovenga estilo Long Dong Silver.

Marius Bell estava ali, entretido na tarefa, quando a professora Terezinha, silenciosa como uma sucuriju armando o bote, se aproximou de sua carteira, segurou-lhe pela orelha e, antes que ele pudesse reagir, tomou-lhe o indecente desenho das mãos.

Marius Bell foi levado, sendo puxado pela orelha, até a sala da diretoria.

Era uma sexta-feira, dia em que o padre redentorista Elesbão Fritz comparecia ao educandário para ministrar aquelas chatíssimas palestras sobre a necessidade de neguim não tocar punheta sob pena de ficar cego, nascer cabelos nas palmas da mão ou passar o resto da vida ardendo no fogo eterno do inferno.

Quando viu o desenho, o padre quase enfartou – já que ele era um dos seis sujeitos que estavam na orgia.

Dona Mirandolina, que nem quis olhar o desenho, fez a única coisa possível para manter a moral da tropa: expulsou o indecente artista gráfico do grupo escolar.

E anexou ao documento de expulsão um boletim de ocorrência denunciando o entrevero.

Quando Dona Maria Pura Fernandes do Amaral, mãe do moleque, tomou tenência do acontecido, a cobra fumou.

– Já que é assim, seu fedelho indecente, você nunca mais vai estudar. Você agora vai é trabalhar, pra aprender a ter juízo! – detonou.

Com dez anos de idade, o promissor artista plástico foi trabalhar como auxiliar de gari do Departamento Estadual de Rodagem do Amazonas (DER-AM).

Sua missão era meio espinhosa: retirar as ervas daninhas que teimavam em nascer no entorno dos paralelepípedos da rua Carvalho Leal.

Havia um milhão de paralelepípedos só naquela artéria.

Munido de uma pequena “faca” artesanal feita de um pedaço dos flandres que eram usados como cintas das caixas de refrigerantes, Marius Bell começou sua odisseia.

Ele iniciou sua tarefa em frente da Casa Amarela e sua missão era chegar até a rua Paraíba, uns 800 metros depois.

Trabalhando oito horas diárias, ele conseguia dar conta de mil paralelepípedos.

Diariamente, um fiscal do DER-AM vinha conferir o trabalho.

Em outubro, Marius Bell já havia atingido a antiga rua Waupés (hoje avenida Castelo Branco) e estava trabalhando exatamente em frente ao grupo escolar.

Seus velhos companheiros de classe do Getúlio Vargas se divertiam ao vê-lo acocorado naquela tarefa inglória.

Foi quando a professora Cristina, saindo do educandário, deparou-se com o ex-aluno na sua faina indescritível e levou um susto.

– Pensei que você estivesse faltando às aulas porque estivesse doente. Que merda é essa?...

Marius Bell relatou seu drama. A professora, que já era progressista naquela época, ficou abespinhada:

– Mas só por causa de um simples desenho erótico eles foram capazes de fazer toda essa maldade? Cadê a liberdade de expressão do nosso país? Ah, meu filho, não tem mais polícia... Mas não esquenta não. Faz o seguinte. Procura o meu sobrinho, Gustavo Flores, que ele vai te repassar as matérias que já foram dadas. Depois você me procura, que eu mesma vou fazer teu teste final.

Marius Bell cumpriu o script direitinho. Estudou as matérias com o Gustavo Flores, fez o teste final com a professora Cristina, foi aprovado e passou de ano.

Mas preferiu continuar trabalhando, em vez de seguir a carreira acadêmica.

O Amazonas perdeu um provável professor de História, mas ganhou um dos melhores artistas plásticos do planeta. Evoé!

Causos de Bambas: Napoleão de Alencastro Guimarães

O senador Napoleão de Alencastro Guimarães era diretor da Central do Brasil, no Rio de Janeiro.

De uma janela em frente ao cais do porto viu um vagão, estacionado num desvio, com mostras visíveis de abandono.

Anotou o número e de lá mesmo telefonou para o Departamento de Patrimônio:

– Eu quero falar com o chefe.

– Quem deseja falar com ele?

– É Napoleão de Alencastro Guimarães, diretor da Central.

A voz perdeu a cor quando pediu um minutinho, doutor.

– Quero que o senhor me informe onde está o vagão de número tal, tal, assim, assim.

– Um instante só, doutor

Três minutos depois, a voz repete o número para conferir. É este mesmo, confere.

– Está no desvio de recuperação, em Brumadinho, Minas Gerais, para reparos de urgência.

O que você faria no lugar dele? Exatamente o que o senador fez.

Assombração

Maio de 1992. Funcionário de carreira do Tribunal Regional Eleitoral, Josenildo Pereira era estudante de Engenharia Elétrica na Utam e boêmio de carteirinha.

Ele enfrentava um problema sério no final das suas noitadas etílicas: nenhum motorista de táxi queria levá-lo em casa, porque ele morava na rua São Sebastião, em São Raimundo, exatamente nos fundos do cemitério Santa Helena.

Para driblar a má vontade dos taxistas, Josenildo desenvolveu um macete: pedia para o taxista ir para o bairro de São Raimundo e, lá chegando, ia guiando o motorista pelas ruas:

“Entra aqui na Cinco de Setembro. Agora sobe pela Rego de Barros até a Rua das Cacimbas. Agora pega a Avenida Rio Branco e entra na Vista Alegre. Aqui, você dobra a esquerda”.

Quando o taxista caía em si, já estava na rua São Sebastião, em frente do cemitério.

Uma madrugada, vindo do clube Kalamazon, Josenildo cumpriu o script direitinho.

Ocorre que em vez de parar em frente da sua residência, o taxista parou exatamente em frente ao portão traseiro do cemitério, que costumava ficar aberto.

Enquanto dava o troco da corrida, o motorista percebeu que estava parado diante do cemitério, em uma ruela mal iluminada, deserta e silenciosa.

Sem esconder o nervosismo, ele indagou do passageiro:

– Porra, bicho, você não tem medo de descer aqui não?...

Morto de bêbado, Josenildo embolsou a grana do troco e tranqüilizou o motorista:

– Eu tinha medo quando estava vivo. Hoje, não. Hoje eu tiro de letra...

Dito isso, ele entrou pelo portão aberto do cemitério na maior sem cerimônia e sumiu na escuridão.

O motorista saiu cantando os pneus do carro na mesma hora e, se não morreu do coração naquela noite, deve ter certeza de que transportou uma “visagem”.

Assim nascem as lendas urbanas.

quarta-feira, novembro 24, 2010

Causos de Bambas: Sebastião Assante

Abril de 1979. O jornalista Sebastião Assante era um exímio dançarino de bailes de salão e sempre que podia se aventurava em um arrasta pé.

Bem casado, tranquilo, de bem com a vida, ele se limitava a ir para os bailes e dançar até se esbaldar.

Encerrado o expediente, ia pra casa sem nenhum remorso.

Seus parceiros habituais, mais interessados em aventuras sexuais do que em exibições dançantes, começaram a espalhar na cidade que Assante era um “autêntico cansa-puta”.

O jornalista ficou mordido.

Uma noite, logo depois de um baile no São Raimundo, Sebastião Assante resolveu acompanhar os parceiros nas estrepolias sexuais da pós-festa.

Uns dez casais saíram da sede do clube direto para a deserta praia da Ponta Negra.

Sebastião Assante e uma cabrocha chamada Rosenira faziam parte da comitiva.

Na escuridão da praia, os casais se afastaram uns dos outros para deixar a Natureza seguir seu curso longe de olhares curiosos.

Sebastião Assante e Rosenira ficaram pelados e também começaram a namorar.

Quando estavam no meio do bem bom, Assante deu uma conferida no relógio de pulso: cinco horas da manhã.

Era a hora em que sua esposa acordava para fazer o café da garotada.

Ele não contou conversa.

Desvencilhou-se da cabrocha apressadamente, vestiu a roupa e se mandou pra casa.

Entrou pé ante pé.

Para sua sorte, sua esposa ainda estava dormindo.

Quando começou a se despir para entrar no banheiro e exterminar as marcas do pecado, sua mulher acordou.

Ele havia acabado de tirar a camisa.

– Estava aonde até agora, amor? – ela indagou.

– Trabalhando na redação do jornal! – explicou Assante. “Fechei a primeira página junto com o Peri Augusto, sai, fui até a Eduardo Ribeiro, peguei o carro e vim pra casa”, continuou, enquanto retirava a calça.

– E como é que você está sem cueca? – quis saber sua mulher.

Assante olhou pra baixo.

Sim, ele havia esquecido a porra da cueca na praia da Ponta Negra.

A pressa é inimiga da perfeição.

Tentou a única cartada que lhe parecia possível.

Batendo na cabeça, como se quisesse lembrar alguma coisa, ele atalhou:

– Puta que pariu! Esqueci de te contar que também fui assaltado no canto da Joaquim Sarmento com a 24 de Maio, assim que saí da redação...

Sem esboçar nenhuma reação de espanto, sua esposa insistiu na questão fulcral:

– Foi mesmo? E por que eles não levaram o teu relógio Mido, a tua corrente de ouro, o teu anel de pedra preciosa, a tua carteira porta cédulas... Por que foi que eles levaram apenas a tua cueca de copinho, que já estava meio furada?...

Até hoje o Sebastião Assante não sabe explicar o incidente.

Como organizar uma suruba de classe mundial

Vamos começar pelo começo. Você resolveu patrocinar uma suruba? Ótimo.

Depois de definir o local e o clima, você só precisa contratar uma garota e um garoto de programa. Pra quê?

Bom, eles dois se infiltrarão na festa como um casal comum e, a um sinal seu, serão os primeiros a tirar a roupa e cair na gandaia.

Como é muito difícil manter a organização numa suruba – se fosse organizada, não seria suruba –, o casal de programa funciona como o “gatilho” da orgia.

Quando você sentir que há clima, dispare. A partir daí, é só relaxar e gozar.

Mas, se tudo der errado, não se desespere. No final, nós damos algumas dicas sobre o que você deve fazer se a suruba desandar.

Afinal de contas, quando a gente quer alguma coisa o universo conspira em nosso favor. Quem disse isso foi o Paulo Coelho. Você lê Paulo Coelho? Hummm...

Não se avexe. Como diria Chico Picadinho, vamos por partes.

Quem nunca deu uma suruba em casa é porque não quer que os convidados sujem e quebrem tudo, ou, então, tem medo de pagar um mico e cair em desgraça diante dos outros machos do seu círculo (sem trocadilho) de amizade.

De fato, não há nada pior do que uma suruba meia-boca, desanimada, que acaba cedo e não é comentada no dia seguinte.

Dá o mesmo trabalho para organizar que um bacanal do arromba (ops!) e, na noite em que acontece, acaba sendo um embaraço só.

Nós vamos dar a receita para uma suruba de sucesso.

Advertimos: não é coisa simples. Entretanto, a satisfação de ver sua casa cheia de gente bonita, dançando, flertando, transando, urrando, fungando, chupando e dando gritinhos de prazer compensa todo o trabalho preparatório.

Antes de tudo, precisamos definir o que queremos dizer com a palavra suruba. Claro que não é aquilo que se convencionou chamar de reunião social.

Uma reunião social na casa do jornalista Humberto Amorim, por exemplo, significa que as pessoas irão se encontrar, mas a música não passará de faixas obscuras de jazz em determinado volume, as luzes estarão bem acesas, vocês conversarão sobre vinhos franceses e charutos Cohibas e às 2 da manhã o último convidado já terá se retirado.

Há reuniões com comida e sem comida, mas todas elas terminam cedo e são bem comportadas, como as que rolam no Clube dos Discófilos Fanáticos.

Quem vai a uma suruba está pensando em comer, mas suruba não é exatamente um jantar.

Há jantares de todos os tamanhos e estilos – até jantares dançantes –, mas eles não são o que nós chamamos de suruba.

Para um macho de responsa, suruba é um encontro que começa às oito da noite, mas só acaba depois das 11h da manhã do dia seguinte, acontece na penumbra e ninguém é de ninguém.

Há que ter gente dançando com um som legal, gente beijando, gente bebendo, gente conversando e gente trepando animadamente.

Exige discrição dos presentes e uma fauna bem diversificada.

Gente bonita e glamurosa, na proporção de duas fêmeas para cada macho (os esquisitões presentes não contam), onde cinco fatores determinarão seu sucesso. São eles, em ordem de importância: convidados, local, bebidas, comida, som & vídeo.

Sim, suruba é parecida com uma festa rave na praia do Tropical Hotel.

A diferença é que na festa rave do Tropical Hotel ninguém come ninguém – com exceção dos seguranças, que sempre comem meia dúzia de pessoas na porrada.

Selecionando a audiência

A coisa mais importante para uma suruba fazer sucesso é garantir mais mulheres do que homens.

Não só isso, mas boa parte dessas mulheres terá de ser boa, bonita e gostosa.

Conseguindo isso, sua suruba certamente será um sucesso, porque o mulherio sarado atrai convidados da mesma forma que o cheiro do sangue atrai os espanhóis às arenas, as piranhas a uma rês ferida, e os críticos literários a um livro que eles não entendem.

Na real, acontece de muitas pessoas ligarem para o celular de quem já está na área para perguntar se tem muita mulher boa, bonita e gostosa disponível no pedaço.

Se a resposta for afirmativa, a suruba tornou-se obrigatória.

Se não, eles vão procurar outra suruba melhor.

Para quem tem dezenas de belas amigas, conseguir reuni-las não será muito difícil. Mas, se mulher bonita só entra na sua casa na foto de capa do CD da Jennifer Lopez, você terá trabalho dobrado para arregimentar as vacas.

Aí, não tem jeito: só resta apelar para aquele seu descolado amigo fotógrafo que agenda meninas de programa com poseur de modelos e ponto final.

Outra coisa importante: misture tipos diferentes.

Chame alguns canalhas de carteirinha, alguns biriteiros profissionais, alguns poetas minimalistas (poetas verborrágicos que gostam de declamar poesia laudatórias são, literalmente, o fim da picada!), alguns clubbers, alguns caras esquisitões, alguns publicitários, alguns playboys, alguns artistas e alguns certinhos – executivos, advogados, juízes, promotores, delegados, traficantes, prefeitos, secretários municipais, sindicalistas, o que for.

A variedade é o molho da suruba.

Evite convidar pessoas anti-sociais e travestis.

Não há nada mais deprimente numa suruba do que um cara se masturbando sozinho no canto da sala.

E travesti é que nem torresmo: pode até ser bom de comer, mas ninguém recomenda.

Os tipos seguintes, pelas razões expostas, não devem nem saber que você vai promover uma suruba: amigos jornalistas ou colunistas sociais. Eles vão espalhar o nome de todos os presentes e ainda inventar mentiras (“O Fábio Russomano? Deu pra todo mundo!”).

Amigos que ficam sentimentais depois que bebem (“Pô, shó eu que não thô comendo ninguém... Vochês shão todos uns canalhash!”).

Caras que tocam violão e que insistem em usar o instrumento em público (“Atenção, please! Atenção, please! Parem de gemer que agora eu vou cantar Bandolins...”).

O pessoal de Recursos Humanos da sua empresa (a não ser que você queira ser demitido por justa causa).

Qualquer um que seja de Ribeirão Preto (eles nãos sabem fazer suruba sigilosa. Filmam tudo, colocam na internet e depois dá o maior rolo).

Mulheres feias (raimundas têm o seu valor, mas catifundas, tribufus e mocréias não têm valor algum).

Gays não assumidos (Para estes há uma espécie de teste. Se o sujeito passa mais de três horas diárias na academia ou se ele reconhece que uma mulher está usando bolsa Prada, então tem boas chances de ser. Agora, se ele falar “essa festa é uó!”, “o DJ é um erro” e “essa calça é tudo”, pode ter certeza!).

O feng shui da orgia

Como você já deve saber, suruba precisa de espaço bem transado pra rolar legal.

Nada pior do que festa desorganizada, sem lugar pra sentar, deitar ou ficar de quatro.

Como bom anfitrião, é sua obrigação deixar seus convidados bem ajeitados – para que você também fique.

Por isso, esqueça mesas dobráveis, de pés finos e tampos de vidro. Elas poderão causar prejuízos materiais e, principalmente, decapitar ou capar alguém.

Prefira móveis sólidos como os de madeira certificada.

Espalhe grandes pufes pela sala: eles facilitam o encaixe das pessoas e podem ser movidos de lugar se o ambiente ficar congestionado.

Almofadas fofas são indispensáveis: são ótimas embaixo do joelho, para apoiar as costas e sabe-se lá pra que mais.

Sofás com encosto, só perto da parede, senão a visão da festa fica comprometida.

Espelhos, muitos espelhos! Por todos os cantos. Até no teto.

Tapetes felpudos são interessantes. Mas nunca em cores claras! Ninguém vai querer continuar se atracando em cima de manchas imensas de... bem, do que quer que seja.

Cadeiras são proibidas! Tendem a quebrar e fazer a galera tropeçar.

Evite tudo o que possa causar micos ou acidentes de percurso.

Se a suruba for rolar ao ar livre, compre tapetes antiderrapantes. Além de impedir que a galera escorregue como manteiga em frigideira quente, também evita joelhos ralados.

Mantenha várias toalhas, rolos de papel higiênico e de absorventes íntimos em lugares discretos e estratégicos. Nunca se sabe o que pode acontecer.

Cuidado! Se os casais começarem a se atracar em volta da piscina, é bom que ela tenha camas infláveis: um cadáver boiando vai, definitivamente, cortar o tesão. A menos que tenha um necrófilo naquele trenzinho bem animado.

O bar do bacanal

Bebida não pode faltar nunca, em hipótese alguma. Precisa ser variada, pero no mucho.

Não se preocupe em arrumar suco de pêssego para os bellinis nem morangos para aquele seu amigo mala-sem-alça que, quando sai, só toma daiquiris.

O essencial é ter muito gelo, vodka, rum, tequila, pisco, conhaque, uísque (escocês, sempre. Whisk americano de milho, tipo Jack Daniel’s é coisa de viado!), água tônica, club soda, cerveja, cachaça, limão e açúcar para fazer caipirinha e coca-cola (light inclusive).

Se tiver energy drink para misturar com a vodka, melhor.

Se tiver vinho branco, ainda melhor.

O resto, se pintar, é lucro.

Saiba calcular a quantidade, para não comprar a mais e acabar estourando o limite do cheque especial.

Se você convidar 50 pessoas, irão à suruba entre 20 e 30. Então compre o suficiente para 30 convidados, que é o número máximo que pode aparecer.

Mande com o convite (mesmo que seja um bilhetinho transmitido por e-mail) uma observação no final pedindo aos machos que levem alguma bebida.

O inconveniente desse método é de não poder prever o que eles irão levar.

Se o tempo permitir, divida as tarefas, como no antigo “amigo secreto” da escola.

Peças aos seus amigos mais íntimos que levem, por exemplo, duas garrafas de uísque cada um.

Calcule que um ou outro chegará à suruba de mãos abanando e dirá que esqueceu.

Aos menos chegados, peça colaborações mais modestas, como um saco de gelo ou uma caixa de cervejas em lata.

Tenha um estoque de emergência para o caso de todos os seus amigos aparecerem de mãos abanando, com pelo menos meia dúzia de garrafas de uísque – a cerveja dá para comprar na loja de conveniência da esquina.

Qualquer barman vai querer tirar uma lasquinha das suas convidadas. Não contrate nenhum.

Deixe os birinaites dispostos sobre uma mesa bem forte. A gente garante que vai ser um dos locais mais procurados da festa.

Champanhe ou espumantes são fundamentais. Mostram que você é um cara sensível, sofisticado e que, imagina!, jamais pensaria que só por causa desse aperitivo sensual as mocinhas iriam liberar a franga.

Destilados são mais velozes na hora de destravar os tímidos. E é bom porque não incha a barriga e você não corre o risco de um golden shower (“cascata de mijo”) durante um cunnilingus mais caprichado.

Vinho é imprescindível para embriagar a mulherada. O único problema é que ele costuma levantar o astral, mas não o resto.

Se isso rolar com você (você toma vinho? Hummm...), comece uma dissertação sobre o radical de bacanal e ganhe tempo para o amigão se reanimar.

Arma latina: rum e coca-cola. Invente qualquer história sobre o nome da mistura (cuba libre, não esqueça) e diga: “Ah, isso me faz lembrar uma piada sobre um foguete cubano, mas deixa pra lá!”. Se ela rir com “Cuba lançando foguetes”, você está feito.

Gelo é indispensável: dá pra brincar de tobogã no corpo delas, serve para curar assaduras do amigão e pra atirar na cabeça de quem disser “aí não, meu, mais respeito!”

Ahã, você acha que não vai precisar beber nada durante o festerê? Espere um esquisitão chegar na moita e encostar em você, querendo sua opinião abalizada sobre o “Código de Da Vinci” (sim, é leitura de viado, claro. Você já leu e tem uma opinião formada a respeito? Hummm...).

Na pior das hipóteses, a melhor saída é dizer: “Escuta aqui, porra, eu vou ali buscar uma biritinha e não quero mais lhe ver pegando no meu pé, entendeu?...” (A palavra “pé” tem várias aplicações).

Para desopilar o figueiredo, energéticos são sempre bem-vindos. O perigo é tudo recomeçar rapidamente. Haja fôlego.

Água (inclusive com gás) é a salvação da lavoura. Água tônica também: nunca se sabe quando o estômago vai embrulhar.

Engov e afins são itens básicos. Se não tiver soro glicosado em casa nem souber como se faz soro caseiro (uma colher de chá de sal, outra de açúcar e meio litro d’água), armazene água de coco dentro da geladeira.

Pode fazer a diferença entre um coma alcoólico básico de um de seus convidados e o necrotério mais próximo.

Mas tem algumas bebidas que você não deve servir nem que lhe arranquem os colhões sob golpes de martelo.

Por exemplo, Keep Cooler. O nome já diz tudo.

Gim, porque deixa o cara de porre na segunda dose. Se um bimbo a dois já é difícil, imagine a três, a quatro, a cinco, com a cabeça cheia de gim. Só pode dar em merda.

Licores. Coisinha doce pode ser um elogio carinhoso para a perseguida da sua guria, mas, quando se trata de licores, é isso mesmo o que quer dizer “Êta coisinha doce da merda”... Dá ânsia de vômito.

Campari, Cinzano, Martini. Credo. Leia o que foi dito pra licores.

Batida de coco, nem fodendo. Se a garrafa cair, vai parecer que esporraram no mundo. Metade das mulheres mais pudicas vai sair correndo, com medo de emprenhar.

A comida do festim

É bom partir do princípio de que os convidados comem o que lhes é oferecido.

Se você comprar 10 sanduíches de metro, os 10 serão devorados. Se comprar 20, os 20 irão embora.

Compre apenas o suficiente para que ninguém passe fome. Isso significa uns 500 gramas de quitutes por convidados, no máximo.

Vá juntando os gramas relativos a cada aperitivo e faça o cálculo.

E nem pense em servir jantar: dá um baita trabalho, custa caríssimo e acaba engessando a suruba, porque nenhuma mulher vai ter pique de encarar um “frango assado” depois de traçar um pratarraz de paella valenciana.

Numa suruba, o mais importante é que todo mundo coma bem. Por isso, a comida deve ser leve.

Ninguém vai transar depois de comer feijoada ou maniçoba – mesmo que todas as suas amigas sejam cariocas ou paraenses.

Logo, trate de providenciar só comidinhas leves para a galera segurar a onda quando o rock rolar.

Melhor é providenciar quitutes que se possam comer com as mãos sem fazer sujeira, como canapés, bolinhos, sushis, sashimis, salgadinhos etc.

Sanduíches de metro, apesar de ficarem bonitos na mesa, fazem a maior sujeira, porque deixam vazar molhos e mostarda.

Se fizer questão, escolha recheios que fiquem firmes dentro do pão, como queijo, salame e presunto, em vez de ingredientes escorregadios, tipo salmão, patê ou requeijão.

Se estiver em dúvida, procure um bom bufê e peça sugestões de aperitivos.

Não estranhe se lhe sugerirem morangos silvestres com pimenta vermelha, abóbora confeitada com ameixas agridoces ou barcos de endívia com ovas de peixe. Recuse isso tudo.

Vá de aperitivos com mais chance de agradar a todos, como canapés de salmão com cream cheese, bolinhos de bacalhau, torradinhas, queijos (nada de gorgonzola, por favor!) e sanduíches de bisnaguinha, manteiga salgada, alface e peru.

A combinação pode soar estranha, mas faz um sucesso danado.

Outra coisa: calda de sorvetes de todos os sabores, mel e marshmallow têm grande utilidade.

Sendo que aquele tubinho da calda ainda pode servir para mais coisas depois...

Mas cuidado: é perigoso se cair em mãos inimigas.

Frutas leves e sugestivas, tipo uva itália, maçã, pêssego e banana-prata são bem-vindas.

A banana-prata também pode servir para um monte de outras coisas.

Nem pense em servir nozes.

Com elas vem o quebrador de nozes, e tudo o que possa servir de arma letal no meio da suruba deve ser evitado.

Evite também qualquer coisa com formato fálico, pela mesma razão.

Frituras também, nem pensar. Pode causar efeitos terríveis.

Outro alimento vetado deve ser ovos de codorna e amendoim.

Vai escancarar suas intenções e a festa vai ficar parecendo inferninho carioca do Posto Cinco.

Se a sua suruba for um sucesso, quando amanhecer o dia todo mundo já vai ter comido (ops!) bastante.

Guarde na geladeira, para o afterhours, coisas revigorantes e práticas, tipo sorvetes, refrigerantes, toddinhos e muita água.

Se tiver sopa de mocotó, melhor ainda.

O som da esbórnia

Você adora Cat Stevens cantando “With A Little Help From My Friends”? Bárbaro. Coloque o disco para tocar quando entrar no chuveiro de manhã. Na suruba, nunca – a não ser que queira pôr todo mundo para dormir.

O maior erro cometido por surubeiros amadores é teimar em tocar seu som predileto.

O importante é embalar quem está na pista de dança, ou seja, tocar músicas de que a maioria das pessoas goste.

E esse som que bota o pessoal para dançar muitas vezes não é o mesmo som que você ouve quando está sozinho em casa.

A mistura infalível é pop e house – que é a vertente da música eletrônica que mais se assemelha ao pop.

Não adianta torcer o nariz.

A palavra pop vem de popular – aquilo que agrada ao povo.

Quase todo mundo gosta de dançar ao som de Madonna, Prince e Michael Jackson. Fazer o quê? Inventar a roda?...

Antes de todo mundo querer dar pra todo mundo (esperamos que você não se inclua nessa categoria), a sua festinha animada é só uma festinha animada e, para virar uma esbórnia, ela tem um longo caminho, que passa, essencialmente, por gente animada e hormônios à flor da pele.

Portanto, fuja de qualquer coisa que possa ser identificada como música popular brasileira.

Já imaginou o que pode acontecer com o tesão coletivo quando o Cazuza mandar um “minha piscina está cheia de ratos/ suas idéias não correspondem aos fatos/ o tempo não pára”?

Ou o Renato Russo atacar de “todos os dias que acordo/ não tenho mais o tempo que passou”.

Todo mundo vai cantar junto, mas ninguém vai querer trepar.

Aí, fodeu geral. Ou melhor, ninguém mais vai foder.

Outra coisa. Não há tesão que resista a sertanejos, pagodeiros, freqüentadores do “Domingo Legal”, “Faustão” e afins.

Esqueça seus discos de rock pesado, tipo Led Zeppelin e Black Sabath, ou de rock inglês dos anos 80 (Smiths, Cure, Joy Division). Deprimido que é deprimido não come ninguém.

Também não emende um Abba (você tem disco do Abba? Hummm...) num Village People (hummm...) num Elton John (hummm...) numa Gloria Gaynor (hummm...) que, além de ser chato, vai pega mal pra caralho para a sua cinzelada reputação de espada matador.

Comece a festa com velhos sucessos de Diana Ross ou Donna Summer, para esquentar o clima.

Quando todo mundo já estiver embalado, é hora de passar para a música eletrônica com vocais, chamada house.

Mas o som pra liberar geral é muita black music, sensual e sacolejante: Marvin Gaye, Aretha Franklin, Isley Brothers, Sly and the Family Stone, George Clinton e coisas do gênero.

Dá vontade de dançar, rebolar, se esfregar, ficar de quatro, enfim...

Se tiver muita riponguinha no pedaço, encaixe (ops!) um Jorge Benjor na lista. Ou o eterno síndico e docemente cínico Tim Maia.

Esteja atento para que nunca role um silêncio total (pense nos seus amigos que gostam de gritar “Me chama de Shirley!” na hora agá. Eles podem se sentir acuados), mas também nenhum som que atrapalhe os gemidos.

Não deixe a música parar para evitar comentários constrangedores (“Não sabia que você tinha uma língua tão macia!”) ou supostos atos falhos (“Isso nunca me aconteceu ontem”).

Se todo mundo já estiver na suruba propriamente dita, dê preferência a um eletrônico calminho (Morcheba antigo, Groove Armada, Massive Attack, Lighthouse Family).

Mas se você não quer perder o melhor da festa, quem vai ficar comandando as pick-ups?

Nem pense em contratar um DJ profissional. Além de cobrarem uma fortuna e só aceitarem tocar em equipamentos de som profissionais, os sacanas ainda acabam comendo as mulheres mais bonitas da suruba.

O negócio é apelar pros mais chegados.

Sabe aquele seu amigão do peito, que nunca falta nas horas difíceis?

Peça a ele que fique operando o som a noite toda.

Faça uma seleção cuidadosa dos CDs e das músicas que ele deverá tocar.

Anote tudo num caderno e entregue ao voluntário.

Avise que se ele quiser inventar alguma merda estilo masshup, tentando fugir do script que tem em mãos, você vai surrá-lo pessoalmente.

Como você não quer perder tempo pesquisando sites na internet, eis aqui uma seqüência típica de som de suruba, que vai deixar a mulherada com a periquita molhadinha: “Love To Love Baby”, da Donna Summer, “Superfreak”, do Rick James, “Sexual Healing”, do Marvin Gaye, “I Want Your Sex”, do George Michael (você tem disco do George Michael? Hummm...), “Ring My Bell”, da Anita Ward, “You Sexy Thing”, do Hot Chocolate, “Disco Inferno”, dos Trammps, “Red Alert”, do Basement Jaxx, “U Don’t Know Me”, do Armand Van Helden, “Stand”, do Seal, “Tainted Love”, do Cabaret Voltaire, “Love Hangover”, da Diana Ross, “Boom Boom Pow”, dos Black Eyed Peas, e “You’re The First The Last My Everything”, do Barry White.

A etiqueta da suruba

O pessoal já dançou, já se esfregou, já se beijou, já se alisou, já se chupou, mas até agora ninguém ainda chegou aos finalmente.

Bom, que horas são? 10 horas da noite? Ainda é cedo. A suruba mal está começando.

De qualquer forma, não há combustível maior para ligar a moçada que uma sessãozinha de filme de sacanagem. Mas comece leve.

Se você chamar o pessoal pro sofá e colocar no Home Theather, por exemplo, “Rocco Arromba Todas”, poderá ser confundido com um tarado.

Além disso, o pau descomunal do cara numa tela de 76 polegadas vai deixar todo macho presente com vergonha do próprio pinto.

A idéia é não soar vulgar, mas também não parecer boiola: algo na linha de “9 e ½ Semanas de Amor” parece legal, para começar.

Se não souber o que pode esquentar sua platéia, tente títulos com a palavra “selvagem”. Tem vários: “Orquídea Selvagem”, “Instinto Selvagem”...

Qualquer um, menos documentário animal ou filme do Steve Seagal. Pensando bem, documentário animal pode ser uma boa.

Você também pode experimentar alguns filmes cult de sacanagem (que só viraram cult porque neguinho tarado tinha receio de levar a namorada para vem o Ron Jeremy em ação e ia assistir sozinho) ou exibir logo filmes com ménage à trois, à quatre, à cinq, do tipo “Três Formas de Amar”, “Férias de Verão”, “Calígula”.

E, se quiser mesmo arrasar, vá antes às locadoras e alugue todos os títulos pornôs nos quais constar a expressão “gang bang”.

Garanto que você não vai se arrepender.

Esqueça totalmente bestialidades (sexo com enguias, por exemplo). Pode causar gritinhos agudos e horrorizados nos mais sensíveis.

Qualquer título que dê vontade de rir, também deve ser vetado.

Isso inclui aquele vídeo que seus amigos fizeram quando você transava com a colega de faculdade no vestiário feminino.

Um dos grandes equívocos dos surubeiros é chegar na festa pelados.

Peça ao pessoal para chegar vestido, antes que a vizinhança telefone pra polícia.

Uma suruba deve começar naturalmente.

Não deixe ninguém entrar com máquinas fotográficas ou filmadoras.

Suruba não deve ser registrada: lembre-se daquela moçada de Ribeirão Preto.

Como acidentes acontecem, convide sempre um amigo médico – mas atenção para a área de atuação dele. Clínica geral, tudo bem. Ginecologia, não.

Se você convidar aquele seu amigo esquisitão, peça a ele para levar um acompanhante.

Dois esquisitões numa suruba é perfeitamente normal, mas um esquisitão à solta é um perigo constante.

Se você perceber esquisitões penetras na festa, não faça cena. Afaste-os delicadamente das pessoas, digamos, normais.

Leve os caras para o quarto da empregada e mostre sua coleção de CDs da Barbra Streisand (você tem coleção de CDs da Barbra Streisand? Hummm...).

Depois, tranque os caras lá dentro e jogue a chave fora.

Não seja o primeiro nem o último a tirar a roupa.

Comece pelos sapatos e evite tropeçar nas calças para não cair de boca (você gosta de cair de boca? Hummm...).

Depois que ficar pelado, esconda as roupas e a vergonha no armário.

Vomitar na parceira não chega a ser um must, mas é perfeitamente normal durante uma suruba.

A flatulência, por (ou pelo) outro lado, precisa e deve ser evitada.

Transar no banheiro, longe do olhar dos companheiros, é falta de etiqueta.

Se, durante o evento, um sujeito esquisitão chegar por trás e tentar se encaixar em você, não perca a compostura.

Explique, didaticamente, que você não é cantor tropicalista, crítico de arte ou programador de linguagem Java, e que, portanto, ele que vá se encaixar na casa do caralho!

Broxar é sempre broxante, principalmente em público.

Evite cenas dramáticas e seja polido. Diga que vai soltar um barro e caia fora.

Numa suruba, é perfeitamente educado introduzir-se em rodas já formadas.

No entanto, se o dono da roda reclamar, não insista.

Por outro lado, abrir novos horizontes sexuais é perfeitamente comum no ambiente descontraído e orgiástico da suruba.

Lembre-se, porém, que bunda e conselho só se dá a quem pede.

Evite comentários sobre as práticas ocorridas durante a suruba.

“Nossa, mas essa sua boca é uma ventosa!” ou “Caralho! Se eu soubesse que o teu anel de couro era tão frouxo tinha continuado na perseguida!” não são frases absolutamente adequadas. Principalmente na frente dos outros.

Ajude, com bom humor, seus companheiros a recuperar as roupas espalhadas pelo chão: organize um concurso para ver quem encontra mais calcinhas.

Seja ético. Roubar calcinhas, tudo bem. Roubar carteiras, não.

Suruba não funciona com hora marcada.

Por isso, é possível que alguns grupos ainda estejam engatados enquanto você procura cigarros pelo chão para praticar o famoso ritual do pós-coito.

Seja educado e não pise em cima de ninguém.

Também evite comentários sobre o órgão sexual dos seus amigos.

Se disser: “Noooossa, que coisa enooorme”, vão achar que você é esquisitão.

Se disser: “Putz, que piroca ridícula!”, vão achar que você é pretensioso.

Não é absolutamente de bom-tom discutir o relacionamento de casais envolvidos na suruba.

Comentários do tipo: “Pô, sua mulher é a maior vadia e dá pra todo mundo!” nunca são bem aceitos, não se sabe bem por quê.

Se mesmo com todo o seu esforço, sua suruba não passar de uma festinha de formatura da quarta série ginasial, não entre em pânico. Não corte os pulsos. Não mude de país. Não se ache um merda.

Tudo neste mundo tem jeito, menos a defesa vascaína.

Aqui vão algumas ótimas e práticas desculpas para um eventual insucesso:

Se os únicos a transarem for o casal de garotos de programa que você contratou, passe um sermão na garota (na frente de todos), fingindo-se injuriado.

Algo do tipo: “Você pensa que está aonde, sua vadia filha-da-puta? Isto é uma festa de família!”.

Expulse o garoto de programa à base de pescoções (sim, vocês ensaiaram tudo para uma emergência, mas ninguém precisa saber).

Em seguida, pegue a menina pelo braço, leve-a pra cozinha e a tranque lá dentro.

Depois que todos se retirarem, volte lá com a guria e faça o acerto de contas pelo serviço pago.

A suruba não rolou, mas pelo menos você não vai acabar a festa sem comer alguém.

No desespero, você também pode aproveitar pra sacanear algum amigo que tenha pisado na (sua) bola.

É só mudar o discurso anterior para: “Eu sabia que convidar a namorada do Zezão ia dar nisso. Que vagabunda! É só ele virar as costas que ela oferece as costas pro primeiro que aparece!”

Caso você queira se vingar pela decepção do fracasso de sua suruba, mande um e-mail “por engano” para sua lista completa de e-mails com a seguinte mensagem:

“Cara, você nem imagina! Sabe aquela festa ontem na minha casa? Pois é, bicho, de repente, sem ninguém esperar, virou o maior bacanal... A Patrícia, a Esterzinha, o Hamilton, a Paula, a Carlinha, o Pedro, o Zezão (eu nem te falo quem engatou nele!), a Sheila, a Amelinha, o Gustavo, o Pedrosa... Sei lá quem mais, bicho!... O certo é que todo mundo que estava lá rodou na pica... Quem não comeu, deu! Você precisava ver...”

Evidentemente, você será odiado eternamente. Mas nunca se divertirá tanto.

É assim que surgem as lendas.

Vai fundo, homeboy!

Causos de Bambas: Leonardo Mota

Nascido em Pedra Branca, no Ceará, e morto em 1948, o poeta Leonardo Mota (nessa foto, ao lado do violeiro e repentista Anselmo Vieira) era um sujeito engraçadíssimo e tremendo bom caráter.

Num momento de pouquíssimo dinheiro (pindaíba braba) num hotel em Belo Horizonte, cujo dono chamava-se Maleta e vivia o acossando, o poeta pôs-se a meditar ao longo da noite.

Na manhã seguinte, endividado até a alma e já sem desculpa pelo atraso do aluguel, deu ao senhorio o seguinte poema:

Meu caro amigo Maleta
Tenha pena do poeta
Eu vejo a coisa tão preta
Que não posso ser profeta

Posso-lá dizer-lhe a data
Em que terei a dita
De pagar esta maldita
Conta que tanto me mata?

Não sou sujeito de fita
E por isso evito a rata
De dizer-lhe a data exata
Em que esta conta se quita

A paciência se esgota
Imagine a minha luta
Que vida filha da puta
Saudações, Leonardo Mota

Ganhou mais um mês de prazo para saldar o aluguel.

Causos de Bambas: Ary Barroso

Ano 1950. Inaugura-se no Rio a TV Tupi e o Estádio do Maracanã. Eram raríssimos os aparelhos de televisão e raríssimas as câmeras da Tupi: apenas uma.

Na primeira transmissão de futebol, Ary Barroso, experimentadíssimo narrador dos jogos pelo rádio, entusiasmado, falava sobre a maravilha eletrônica para os telespectadores e as extintas figuras dos televizinhos:

- Agora, meus amigos, os locutores de rádio não têm mais que se esforçarem com um imenso vocabulário para levar a você as emoções de um jogo de futebol.

Enquanto o Ary falava, a solidária câmera passeava pelo campo, mostrando os jogadores que se preparavam para o início da peleja.

O Ary continuava o discurso:

– Não será mais necessário esmiuçar a finta, descrever o drible, anunciar o perigo, descrever as minúcias do lance. A maravilha da eletrônica levará aos seus lares as jogadas emocionantes, os gols inesquecíveis. Os jogadores, amigos, estarão dentro de sua sala, convivendo com seus familiares!

Nessa precisa hora, a câmera detém-se em Zizinho, que está parado e, brasileiramente, coçando, com unção e bonomia, a genitália.

O Ary, a voz resignada:

– Também tem dessas coisas...

A orquestra do paquete Arlanza

Gambinus, o rei lendário de Flandres, segundo a crença alemã, foi o inventor da cerveja, líquido do qual são os campeões mundiais de consumo.

A presença de Gambinus no Brasil configurava-se num famoso bar de Recife, instalado na zona portuária – uma espécie de Praça Mauá do Rio – e era lá que se reunia a intelectualidade boêmia local.

Além desses freqüentadores, a tripulação elegante de maior escalão dos navios que aportavam na cidade também encontrava no Gambinus sua terra firme predileta. E as prostitutas, naturalmente.

Era no famoso bar que se reuniam intelectuais igualmente famosos, como Ariano Suassuna, Gilberto Freire, Murilo Costa Rego e o usineiro Zé Ricardo Carneiro da Cunha, uma espécie de grande arruaceiro de luxo.

Comia-se no Gambinus em quantidade sensivelmente menores do que se bebia e a mistura frequentemente era explosiva: marítimos, boêmios, pernambucanos, álcool e putas. E assim, em certos dias incertos, serviam-se trágicos tiroteios e peixeiradas na casa, não raro com baixas graves.

Um belo dia lança âncoras nas águas pernambucanas o transatlântico Arlanza, um elegantíssimo navio sob bandeira inglesa, e o maestro da banda de bordo, acompanhado de seus músicos, vai devorar o smongas borg – mesa de frios – do Gambinus e, se possível, uma das moças da casa.

Zerados os pratos e zerados vários copos, o nível etílico do bar chegou a um ponto crítico da escala Richter e começou o terremoto, findo o qual a orquestra do Arlanzo está morta, com exceção do maestro.

Desesperado, ele partiu em uma busca frenética pelos músicos da terra, pois, sem orquestra, o fantástico transatlântico não podia ficar. Disseram ao pobre homem que o Zé Ricardo Carneiro da Cunha seria o único a resolver o problema.

De fato, Zé Ricardo resolveu a questão e no mesmo dia apresentou-se a orquestra de músicos brasileiros, amigos do aliciador.

Não se sabe qual foi a conversa do usineiro com o grupo nem com o maestro, mas horas depois, estavam al mare. Destino: Rio de Janeiro.

Nenhum dos músicos sequer conhecia um instrumento musical e, após um dia de grossa bebedeira, foram convocados para o baile da meia-noite. Foi quando souberam do problema.

Chegaram ao Rio a ferros.

Causos de Bambas: Coronel Janjão


As famílias de colonos, retirantes, miseráveis, açoitados pela seca, ocuparam uma parte ínfima das grandes terras do latifundiário Janjão, no sertão pernambucano, e ele foi expulsá-los de lá.

– Mas o padre disse que a terra pertence a Deus – disse um mais afoito. “Que a terra é de todos...”

– Isso é lá pras negas dele! – berrou Janjão, que ficou injuriado e foi à aldeia tomar satisfações com o padre.

O padre era um holandês moderno, desses que usam calça jeans, óculos ray-ban, fumava sem parar e, para dar um ar de bacanidade ao ritual, soltava fumaça pela venta.

Janjão o encontrou no meio da missa, instruindo os fiéis com um sermão, e foi entrando mais os dois jagunços, chapéu na cabeça, papo-amarelo na mão, anunciando:

– Vou-lhe dizer uma coisa, baitola fio da égua...

– Isto aqui é a Casa de Deus! – protestou o padre, erguendo um crucifixo. Pura perda de tempo.

– A terra é minha, comprei com meu dinheiro e quem aparecer lá sem minha licença vou lhe mostrar o que sucede.

E deu dois tiros para o ar. Não satisfeito, ordenou ao povo que estava na igreja, perplexo.

– Agora, quero ouvir todo mundo cantando Ó Jardineira.

E em Rio Branco, ex-Arcoverde – ou vice-versa –, um coro aterrorizado entoou inteira a marchinha Jardineira composta por Humberto Porto e Benedito Lacerda para o carnaval de 1939, regido pela competente batuta 44 do maestro Janjão.

Causos de Bambas: Sandra Barsotti

Cabo Frio, anos idos. O arquiteto Paulo Casé, hospedado na casa de um amigo, fazia sala para a atriz Sandra Barsotti e um rapaz muito enjoiado, cordões de ouro, pulseiras, etc.

Entra Ricardo Amaral no seu costumeiro espalhafato, berrando à maneira do Chacrinha:

– Alô! Alô! Sandra Barsotti! Como vai, vai bem?

A moça levantou-se para saudar o escandaloso empresário e apresentar-lhe o companheiro:

– Este aqui, Ricardo, é meu novo marido.

Ricardo, aos berros:

– Você já decorou o nome dele?

A atriz, que tinha fama de muito namoradeira, não sabia onde se esconder.

segunda-feira, novembro 22, 2010

O único argentino negro campeão mundial

Argentina, 1978. O país sedia a Copa do Mundo e é campeão, em plena ditadura. Maradona não foi, não está no álbum de figurinhas. Outras estrelas foram, e estão lá. Fillol, Kempes, Luque, Passarella… Porém, a última figurinha chama atenção. O goleiro reserva, que nem entrou em campo.

Negro, Hector Baley entraria para a história sendo o único argentino negro campeão mundial. Ele também estaria no time argentino de 1982, aquele que foi eliminado pelo Brasil e Itália na segunda fase. Novamente não entrou em campo, mas já tinha deixado uma marca.

 O cantor afro-argentino Fidel Nadal chegou a ser entrevistado pela edição local da Rolling Stone.

Para ler um pouco mais a respeito da lenda urbana disseminada pelo Gigio Bandeira de que não existem negros na Argentina, clique aqui

Um Baile de Máscaras inesquecível

Eu, Moacir Andrade e Francisco Mendes no badalado Pina Chope

Fevereiro de 1945. Sábado gordo, dia do Baile de Máscaras no clube mais elitista da cidade.

Vestido garbosamente de “blacktie”, o artista plástico Moacir Andrade estava postado no alto da escadaria do Ideal Clube que dá para o salão superior, quando sua atenção foi despertada para um casal de comerciantes portugueses que adentrava no clube conduzindo uma jovem ricamente fantasiada de dama da corte italiana.

Ao lado da trinca, conversando animadamente, vinha o médico Flávio Castro, amigo de sua família.

Cobrindo o rosto, a garota trazia uma daquelas máscaras de porcelana típicas do carnaval de Veneza.

As luvas douradas, o vestido rodado cheio de superposições, o chapéu pontiagudo na cabeça, a exuberante peruca loira e o discreto leque negro com que ela se abanava graciosamente despertaram a libido do pintor. Foi tesão a primeira vista.

Elegantemente, Moacir tirou a moça para bailar, seus pais concordaram, e durante a noite toda, até a orquestra tocar “Cidade Maravilhosa” encerrando o frege, os dois pombinhos não se desgrudaram mais.

O artista plástico ficara irremediavelmente apaixonado.

O curioso é que, com exceção de seus expressivos olhos azuis vislumbrados sob a máscara de porcelana, nenhuma parte do corpo da menina estava a mostra.

Moacir não sabia se ela era branca, morena, mulata ou amarela.

Mas isso era o de menos. O importante é que ele estava completamente apaixonado e disposto a se casar com a garota no dia seguinte.

Durante alguns dias, Moacir Andrade tentou inutilmente localizar o paradeiro da menina.

Como ninguém era capaz de fornecer uma pista segura, ele tentou sua última cartada: foi bater no consultório de Flávio Castro.

O médico demonstrou uma certa surpresa em ver aquele rapaz de pouco mais de 20 anos tão empenhado assim em encontrar sua alama gêmea.

– Olha, Moacir, deixa eu te contar uma coisa. Aquela menina se chama Ariadne e seus pais são abonados comerciantes locais. Ela é filha única, fala vários idiomas, toca piano clássico e violino, é educadíssima, lindíssima e irradiava muita felicidade! – explicou o médico. “Há dois anos ela contraiu o bacilo de Hansen, ninguém sabe como. Seus pais gastaram uma fortuna com médicos do mundo todo, mas não conseguiram debelar a doença. Ela tem poucos meses de vida. Os três viajaram ontem para São Paulo e provavelmente você nunca mais vai voltar a vê-los. A Ariadne me pediu apenas para te dar um recado: que aquela noite, no Baile de Máscaras, no Ideal Clube, foi a noite mais feliz de toda a sua vida.

Moacir Andrade quase pirou o cabeção.

E sempre que se recorda daquela noite mágica, fica visivelmente emocionado.

O playboy artilheiro e o crioulo homicida


O timão do Fazendario. Em pé: Justo, Walnei, Lucio Branco, Chicó (falecido) e Toninho. Agachados: Alexandre (mascote), Sici Pirangy, Odivaldo Guerra, Nelson e Sadok Pirangy

Agosto de 1979. O eterno playboy Odivaldo Guerra foi convidado por Sadok Pirangy para reforçar o time do Fazendário em um jogo amistoso contra o indigesto Palmeiras, de Educandos, no campo do Bancrévea.

Escalado de ponta de lança, Guerra começou logo a mostrar serviço: com dez minutos de jogo, já havia feito um gol e metido duas bolas no travessão.

Para evitar o desastre anunciado, o técnico do Palmeiras fez sua primeira substituição e colocou em campo o beque Manicão, um crioulo corpulento e de maus bofes, cuja única tarefa seria marcar colado o implacável atacante.

Na primeira bola que recebeu, Guerra deu um “balãozinho” em Manicão e partiu em direção ao gol.

O beque saiu atrás e lhe deu uma rasteira violenta, que o levantou um metro do chão. Falta.

Na segunda bola que recebeu, Guerra deu um “chagão” por baixo das pernas do Manicão e partiu em direção ao gol.

O beque saiu atrás e lhe deu uma rasteira mais violenta ainda, que o levantou dois metros do chão. Nova falta e uma advertência verbal pro zagueiro.

Na terceira bola que recebeu, Guerra parou com a bola dominada na frente do seu algoz. Os dois ficaram se estudando.

De repente, Guerra deu um elástico que entortou o zagueiro e Manicão caiu no chão de cu trancado.

Com o caminho livre, Guerra embicou na direção do gol. Manicão se levantou e saiu azulado atrás de Guerra.

Na hora em que o ponta de lança ia chutar no gol, o zagueiro deu uma espetacular “voadora”, entrando de dois pés nas costas do atacante.

Com o impacto, Guerra foi arremessado fora do campo, despencou em uma ribanceira e desapareceu  no meio de um matagal. Nova falta e um cartão amarelo pro zagueiro.

Quando o ponta de lança retornou ao campo, vinha armado com uma estaca de dois metros. O crioulo Manicão ficou branco.

Os jogadores dos dois times ficaram apreensivos pelo suposto desfecho da presepada.

Guerra se aproximou do beque, jogou a estaca no chão e detonou:

– Porra, meu irmão, já que você está querendo mesmo me matar acho bom você usar essa estaca... Porque só na base da pernada, você não vai conseguir não...

O zagueiro ficou tão envergonhado que pediu pra ser substituído.

O Fazendário ganhou de 5 a zero, com três gols do nosso eterno playboy.

sexta-feira, novembro 19, 2010

A vingança do contrário


O bumbá Gitano foi fundado em março de 1979, na Vila Mamão, depois de um arranca rabo federal entre os fundadores do bumbá Corre Campo ocorrida no ano anterior.

Entre os dissidentes que participaram da criação do novo boi estavam Clóvis, Zé Preto, Pirulito, João da Santa, Guerreiro, Tiziu e Judicael Almeida.

O bumbá foi confeccionado pelo mestre Lauro Chibé nas cores marrom e branca. O novo bumbá, evidentemente, virou inimigo preferencial do bumbá Corre Campo.

Em junho daquele ano, o bumbá Gitano se apresentou oficialmente pela primeira vez no Festival Folclórico do Amazonas, que acontecia em um tablado armado na Bola da Suframa.

Como toda obra feita às pressas pela prefeitura, o tablado possuía vários desníveis entre as tábuas, que se constituíam em verdadeiro perigo para o bailado dos brincantes.

O bumbá Gitano começou a fazer sua apresentação sob uma intensa vaia e apupos das numerosas torcidas dos bumbás Corre Campo e Tira Prosa.

Lá pelas tantas, o “miolo” Pirulito resolveu abusar das correrias e viradas rápidas do boi, que levavam a sua pequena torcida ao delírio.

Em uma dessas presepadas, ele deu uma “topada” em um dos desníveis existentes no tablado, perdeu o equilíbrio e caiu, com boi e tudo, no meio da torcida do Corre Campo.

Uma queda de quase dois metros de altura.

Depois de receber meia dúzia de catiripapos, bofetões e chutes na bunda desferidos pelos torcedores adversários, Pirulito foi jogado de volta para o tablado.

Uns dois minutos depois, o bumbá Gitano também era jogado de volta para o tablado.

Já voltou sem um chifre, sem um olho, sem um rabo e com a cabeça vergada para trás que nem pés de curupira.

Não deu outra.

O boi detonado acabou amargando um terceiro lugar, atrás de Corre Campo e Tira Prosa.

Sufoco no teleférico


Julho de 1980. Recém-casados, o jornalista Mario Adolfo e a pedagoga Maria Teresa estavam passando a lua de mel no Rio de Janeiro, quando o compositor Rui de Carvalho apareceu no apartamento deles, na tarde de um sábado, e convidou os dois pombinhos para uma tour alcóolica pelos principais botequins da cidade.

Abstêmia convicta, Maria Teresa recusou polidamente o convite. Mário Adolfo resolveu encarar.

Ele e Rui de Carvalho começaram seu passeio pelo Bracarense e, assim que meteram o pé na jaca, foram de Cervantes, Bofetada, Clipper, Bar Senegal, Bar Magnífico, Bar do Luiz, Lamas, Diagonal, Bar Brasil, Tangará, Paladino, Paulistinha, Braseiro, Petisco da Vila e o diabo a quatro.

Beberam uma tonelada de “garotos”, aquele chopinho em copo pequeno, e detonaram trocentos tipos de iscas diferentes (ovos coloridos, carne seca desfiada, lombinho, linguiça, nhoque, bolinho de bacalhau, ostras, fígado de galinha, salaminho, queijos, picles, moela, torresmo, camarão a vapor, aipim, ovos de codorna e por aí afora).

Quando encerraram a esbórnia, já de madrugada, o fígado do jornalista estava pedindo penico.

No dia seguinte, Maria Teresa havia agendado previamente uma visita ao Pão de Açúcar.

Mesmo com uma ressaca da moléstia, Mário Adolfo resolveu acompanhar a patroa.

Sua barriga emitia ruídos estranhos, acompanhados de calafrios e cólicas cada vez mais fortes.

O biodigestor não estava dando conta das iscas devoradas na véspera sob uma cachoeira de chope.

Para completar, era domingo. E domingo, como se sabe, o bondinho do Pão de Açúcar fica de gente que nem corvo em carniça de vaca atolada.

Imprensado no meio de 64 passageiros, Mário Adolfo soltou um silencioso “bufa” dentro do teleférico, no início do trajeto morro da Urca - Pão de Açúcar.

O cheiro de rato podre rapidamente empesteou o ambiente.

Algumas pessoas começaram a passar mal. Outras tiveram ânsia de vomitar. Foram três minutos de desespero.

Assim que a porta do bondinho abriu no ponto de chegada, uma senhora idosa, com inflexões de raiva mal contida, falou bem alto, pra todo mundo ouvir:

– O nojento que fez uma desgraceira dessa deve rezar pra salvar a alma porque o seu corpo já está podre em vida e não tem mais jeito...

Mais encolhido que tripa grossa na brasa, o jornalista Mario Adolfo limitou-se a concordar com a anciã balançando afirmativamente a cabeça.

A melhor capa de disco de todos os tempos


Por Ana Maria Bahiana
Velvet Underground – The Velvet Underground & Nico
Gravadora – Verve
Ano – 1967
Design – Andy Warhol
Fotografia – Andy Warhol
Imagine Nova York. Não a Nova York de hoje, gorda, de luxo, donald trump, sex and the city, wall street, ruas limpas, casacos de pele, espresso bars, comédias românticas com meg ryan, festas com bellinis, paris hilton e sean puffy daddy combs.
Imagine Nova York magra, junkie, pobre, livre, ruas sujas, dentes podres, lofts abandonados, squatters, grandes espaços vazios suspensos abertos como bocas para quem quisesse cuspir neles, morar neles, sonhar neles, heroína, opiáceos puros – ecstasy ainda não havia sido inventado, tudo era pó e gim, coisa barata e farta (estranho, quem ganhava com isso?) –, max’s kansas city, ratos, fumaça dos subterrâneos, gente nos subterrâneos, esgoto nos subterrâneos como veludo, espesso, fedorento, liso, escuro.
Imagine 1967. Vinil, vietnã , úlcera roendo por dentro, uma geração contra a outra, lyndon johnson, helicópteros em missões secretas, swinging london, mary quant, maconha, testes de ácido, mundos coloridos, festival de monterey, jimi hendrix, jefferson airplane, beatles, strawberry fields forever, janis joplin, carlos castañeda, caras pintadas.
Drop in, drop out, get free. If you’re going to San Francisco, be sure to wear some flowers in your hair... Mas São Francisco é uma península. Nova York é uma ilha.
Na ilha dos dentes podres, Andy, o filho homossexual de imigrantes tchecos – solitário e talentoso, bolsista, isolado, chacota dos colegas, tardes solitárias no estúdio desenhando futuros prováveis –, chegou para trabalhar em publicidade, encurtou o nome de Warhola para Warhol, ganhou tubos de dinheiro, mandou chamar a mãe e os três gatos dela e se instalou numa peculiar vida dupla.
Em casa, com Dona Julia Warhola e caixas de recortes de tudo; nas ruas, como o mestre e senhor de um cavernoso galpão, meio estúdio, meio teatro, meio galeria, chamado The Factory.
Agora você tem de imaginar portas abertas. Portas abertas como arte. Doce, tímido e incrivelmente dominador do jeito como pessoas doces e tímidas são capazes de ser, Andy abria as portas da Factory sem julgar e sem perguntar, sem catalogar e sem querer saber para que serviam os pedaços de humanidade que as marés da ilha empurravam através delas. (Por favor, não esqueça que você está imaginando 1967!).
Artistas, travestis, junkies, vagabundos, atores pornô, modelos, garotos de programa, traficantes, socialites, beatniks. "As pessoas simplesmente eram", diria, muitas décadas depois, um surpreendentemente intacto sobrevivente da experiência. "Elas chegavam à Factory e, de alguma forma, se encontravam. Encontravam um espaço onde podiam ser elas mesmas."
Por essas portas, um dia passou um agregado de gente tão improvável que apenas ali poderia ser seu paradeiro. Lou Reed e Sterling Morrison eram colegas de faculdade nascidos no mesmo lugar – Long Island, Nova York –, do mesmo tipo de família – rica e conservadora.
John Cale, nascido no País de Gales, era um músico treinado em conservatório – com especialização em viola – e educado tanto por mestres minimalistas quando pelas exigências de uma gravadora comercial, tipo linha de montagem, onde sua tarefa era produzir canções pop em massa.
Maureen Tucker era irmã de um amigo de faculdade de Lou e Sterling.
Faziam música juntos com vários nomes até que um, descolado de um romance sadomasô, colou: Velvet Underground. Estavam tocando num bar em Greenwich Village, o Cafe Bizarre, quando Andy os viu.
Aí tudo mudou.
A arte de Andy Warhol era, basicamente, a arte do desejo de Andy Warhol. E Andy desejou o Velvet Underground. Talvez não sexualmente de forma explícita – chegaremos à banana em um minuto.
Mas os desejou em sua vida-arte-vida, desejou a coisa rock que eles traziam para dentro da Factory, a trilha sonora que eles proporcionavam a suas outras aventuras no caminho de uma arte de massa/massa como arte.
A trilha era assim: insular e angulosa, um pulsar quieto sobre uma base tribal. Guitarras improváveis e letras (Reed formou-se em literatura) falsamente simples e extremamente eruditas sobre drogas, chicotes, prostituição. 
Na Costa Oeste, tudo girava multicolorido e harmônico, e em Londres, as notas saltitavam sobre oboés e fitas invertidas, mas o Velvet era uma ilha numa ilha, e Andy era uma ilha numa ilha e foi paixão à primeira vista. Antes da consumação, houve Nico.
Nico era alta, ossuda, imponente, às vezes loura, às vezes ruiva (“pintei o cabelo de ruivo porque me disseram que Jim Morrison só gostava de ruivas, eu era tão louca por ele”).
Germânica e rainha do gelo, era a pessoa que ela havia inventado no mundo particular da Factory, para onde fora importada depois de uma carreira como modelo e quase popstar.
Nico cantava como se fosse Morticia Adams com um garrote no pescoço, o que, na visão de Andy, era absolutamente perfeito para o Velvet.
Um disco seria feito, estava decidido, e Lou comporia algumas canções especialmente para Nico (“Femme Fatale”, “All Tomorrow’s Parties” e “I’ll Be Your Mirror”).
O disco foi gravado em um dia, talvez dois, num estúdio caindo aos pedaços – Scepter Records – e bancado inteiramente por Andy e um amigo, ex-executivo de gravadora (custo total da produção: 1,5 mil dólares).
Os Velvets vinham ensaiando ferozmente havia semanas. “Foi um período extremamente produtivo”, Cale recorda. “Mexemos com a afinação, aprendemos a usar instrumentos e efeitos” – e participaram dos shows-multimídia da Factory, os Exploding Plastic Inevitable.
 A Verve, divisão da MGM Records, comprou o disco, mas teve de esperar pela capa.
Andy queria uma banana, mas não qualquer banana – uma banana em camadas que, devidamente descascada, revelasse seu interior.
Uma cortadora especial teve de ser providenciada para a execução dessa perfeita metáfora de Nova York em 1966/67, com a Factory e os Velvets no meio.
Banal e possivelmente passada, bruta e simples e só no espaço branco da capa, pedaço descolado de uma natureza morta não consumida, a banana se abre (ao longo da linha perfurada dizeres mínimos indicam – “descasque devagar e você verá”) para revelar um interior rosa fálico, frágil e sensual. Uma ilha dentro de uma ilha, com uma casca grossa por cima. (E a assinatura de Warhol embaixo, honra imerecida pelo próprio título do álbum).
A contracapa tem os Velvets tocando num E.P.I. na frente de um still do filme de Warhol The Chelsea Girls – um still de uma figura complicada do universo warholiano, Eric Emerson, que depois, precisando de grana para pagar fiança e sair da cadeia, processou a gravadora pelo uso não autorizado de sua fotografia.
The Velvet Underground & Nico foi lançado em março de 1967, chegou ao modestíssimo centésimo septuagésimo primeiro lugar das paradas americanas em maio e depois desapareceu.
Os tempos não estavam maduros, a banana flutuava entre o que absolutamente era, em seu universo preciso, e o que poderia vir a ser.
A banda se separaria em 1969 e Lou Reed seguiria para uma brilhante carreira-solo.
Nico morreria do coração na Espanha justo quando tinha largado as drogas.
Andy Warhol faria uma outra capa fálica de muitas camadas – Sticky Fingers, dos Rolling Stones –, se tornaria uma estrela das artes americanas contemporâneas e morreria aos 58 anos entre suas caixas de recortes, depois de uma cirurgia de rotina.
Eric Emerson morreria aos 30 anos de overdose e seria homenageado com uma canção do Sonic Youth, uma das centenas de bandas que jamais teriam existido se The Velvet Underground and Nico não tivesse existido antes.