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segunda-feira, junho 20, 2011

Aula 39 do Curso Intensivo de Rock: Pink Floyd


No início de 1966, os hippies americanos começaram a desembarcar na Inglaterra e, em breve, Londres já contava com uma comunidade florida bastante ativa.

Eles possuíam suas próprias lojas, as “head shops” (“lojas-cabeça”), onde foram abolidas todas as noções tradicionais de comércio: ia-se lá pra ouvir música, fazer trocas, conversar, fumar maconha e beber cerveja.

Como Jack Kerouac tinha previsto alguns anos antes no livro “The Dharma Bums” (“Os Vagabundos do Dharma”), o orientalismo, sob todas as suas formas, fazia numerosos adeptos.

Todo mundo estava lendo sobre budismo, confucionismo, taoismo, upanishads, I Ching, Gurdjieff, Ouspenski, Blavatski, Lao-Tsé e Bhagavad Gita.

Proliferavam os saris indianos, os casacos afegãos e as togas gregas.

Duas suecas, Ula e Gitta, institucionalizaram esta tendência na sua loja do Chelsea, a Antique Market, que em poucas semanas se tornou o templo do vestuário-cabeça da Inglaterra.

A cítara e a tabla, redescobertas pelo beatle George Harrison e pelo stone Brian Jones, faziam concorrência à guitarra e à bateria.

Os próprios hábitos alimentares (como a macrobiótica) das antigas colônias britânicas conquistavam adeptos.

Era a grande desforra dos hindus, paquistaneses e afegãos, reabilitados pelos netos e bisnetos de seus colonizadores no próprio solo da pérfida Albion.

As rádios-piratas, que eram o meio de expressão mais poderoso da nova geração musical britânica, abriram os seus programas a esta nova música que embalava os hippies de Kensigton Park Lane e Portobello Road, e batizaram-na de “psychedelic music” (“música psicodélica”).


John Peel, animador da rádio pirata “Perfumed Garden” (“Jardim Perfumado”) destilava da meia-noite às duas da manhã uma música vanguardista e onírica onde se misturavam os grandes nomes do momento (Beatles, Stones, Bob Dylan e os conjuntos da costa Oeste americana) e os novos grupos emergentes, que ainda não tinham discos lançados, mas que Peel gravava diretamente nos clubes undergrounds da capital.

Espécie de conto musical das mil e uma noites, essa pirataria noturna das ondas sonoras londrinas começou a atrair para a causa psicodélica alguns milhares de jovens de toda a Grã-Bretanha.

Desde a chegada do ácido lisérgico à Inglaterra, em 1965, que um certo número de intelectuais se tinham ligado em atividades culturais diferentes.

Poetas organizavam happenings e recitais em praças públicas, feiras e mercados.

Jovens escritores tentavam furar a caretice dos jornalões tradicionais criando fanzines alternativos.

Uma equipe formada por Frank Miles, Jack-Henry Moore e Jim Haynes, tinha montado uma livraria (Lovebooks), onde se podia encontrar toda a espécie de livros sobre as experiências alucinógenas, a poesia da beat generation, os textos teóricos de Norman O. Brown, Wilhelm Reich e Marcuse, e até mesmo os textos sagrados da Índia, do Japão e do Tibete.

Em outubro de 1966, com uma grande ajuda financeira do beatle Paul McCartney – amigo íntimo de Frank Miles – foi feito o lançamento do primeiro jornal underground britânico, o International Times (IT).

Nesta ocasião foi organizada uma grande festa no abandonado centro ferroviário de triagem, o Roundhouse, sendo animada por dois grupos musicais desconhecidos chamados de Soft Machine e Pink Floyd.

Numa atitude inovadora, os hippies londrinos desenvolveram seus próprios órgãos de informações, com destaque para o citado jornal IT, cuja redação funcionava na cave da livraria Índica.

A característica essencial do jornal era a independência dos seus redatores.

Ao contrário dos Estados Unidos, onde Timothy Leary, Ken Kesey ou Allen Ginsberg representavam oficialmente o movimento, no underground londrino não havia líderes.

O jornal IT abordava nas suas colunas questões artísticas e sociais, como a literatura, o teatro, a música e o consumo de drogas.

Nesse campo, o tablóide dava provas de uma seriedade que impressionou seus opositores.

Eles pediam a revisão de uma legislação antidrogas, repressora e hipócrita, baseada num desconhecimento total do assunto.

Por que proibir (e favorecer, na prática, a criação de um mercado negro) o “purple heart”, a pequena pílula vermelha à base de benzendrina, muito utilizada pelos mods nas loucas noites de fim-de-semana?

Por que considerar a marijuana como uma droga narcótica quando, em nocividade para o organismo humano, ela não era mais perigosa do que o álcool e a nicotina?

Esta operação-verdade a respeito do novo cavalo-de-batalha dos cronistas alternativos ingleses teve sua apoteose quando os Beatles e outros superstars compraram uma página inteira do sisudo Times (o mais conceituado jornal inglês) para informar a opinião pública das características dessa famosa marijuana, realmente tão perigosa quanto o brandy ou o whisky escocês.

O International Times lançou, entre outros, o slogan “quando a música muda, as paredes tremem”.

Com a mudança do rock tradicional para o rock psicodélico, as paredes de Londres realmente tremeram.


Era a dois passos de Oxford Street, por baixo do cinema Berkeley, que a agitação atingia o máximo.

No número 31 da Tottenham Court Road, todas as noites de sexta-feiras, uma multidão estranha de novos ciganos penetrava no bastião hippie de Londres, o clube UFO.

O “Unidentified Flying Object” (“Objeto Voador Não-Identificado”, que os malucos apelidaram de “Underground Freak Out”, expressão absolutamente intraduzível) não era, evidentemente, o único clube hippie de Londres, mas era a discoteca das pessoas que liam IT.

Lá podiam ser encontrados desde tocadores de cítaras aos grandes grupos de percussão africana, rolavam projeções de filmes de Buñuel ou de Marylin Monroe, peças de teatro e jam sessions de free jazz, além, evidentemente, de se apresentarem os grupos psicodélicos.

O UFO tendia a favorecer todas as formas de espetáculo que provocassem um abalo ou uma sensibilização interior.

Apresentavam-se sessões de música experimental (gravada ou ao vivo) e projeções de vanguarda pela Exploding Gallaxy (um de seus expoentes era Hélio Oiticica).

Os iniciados podiam rever aí o filme “O cão andaluz”, de Luis Buñuel, ou os filmes underground nova-iorquinos de Mekas, Yoko Ono e Andy Warhol.

Todas estas experiências audiovisuais eram entrecortadas por interferências de conjuntos estranhos como o Bonzo Dog Doodah Band que cultivava a paródia, o exagero e a provocação, ou exóticos, como o Ginger Johnson Band, formado por batuqueiros africanos.

Esta cave paradisíaca, em que as “psychedelic parties” (“festas psicodélicas”) faziam os hippies se esquecerem do “grey people” (“pessoas cinzentas”, a classe média britânica), abriu suas portas no dia 31 de dezembro de 1966 tendo como atração principal um conjunto ainda pouco badalado chamado Pink Floyd.

Todo o underground londrino se encontrava no UFO para uma espantosa noite de passagem de ano que não teria nada em comum com a tradicional ceia familiar inglesa.


Num dilúvio de sons, perfumes, cores e luzes, o Pink Floyd começou a fazer um espetáculo delirante e arrebatador.

O volume sonoro foi elevado ao limite do suportável e as últimas técnicas eletrônicas (efeito larsen, eco, distorção) eram sistematicamente utilizadas, numa preocupação enorme de inovação.

Este envolvimento sonoro foi criado num ambiente alucinante, em que estromboscópios, projeções giratórias, efeitos de luz negra, projetores de slides e bolhas multicoloridas arrebatavam permanentemente os olhos e os ouvidos.

Toda essa tecnologia futurista pontuava o estranho universo musical do conjunto que mergulhara até a medula no experimentalismo, criando um mundo imaginário em que se entrechocavam fantasmas alados, delírios interiores, febres cósmicas e sonhos de ficção científica.

A exploração deste mundo infernal e angustiante prosseguiu durante várias horas, fraccionado em longas suítes de várias dezenas de minutos, durante as quais o público hipnotizado e completamente chapado acompanhava, aos berros, a fúria demencial do conjunto.

Este espetáculo que exigia uma verdadeira participação não-passiva do espectador conseguiu fazer a cabeça do público e o Pink Floyd se tornou rapidamente o grupo mais popular do underground londrino.

No dia sequinte, Chris Welch, da revista Melody Maker, escreveu um grande artigo explicando que os grupos progressivos eram mais interessantes porque poderiam ser o indicativo daquilo em que a música popular iria realmente se transformar.

O Pink Floyd foi um grupo inventado por Syd Barret, um estudante de Belas Artes de Camberwell, juntamente com três remanescentes do grupo Architectural Abdabs (formado por estudantes de arquitetura da Escola Politécnica de Londres), Roger Waters, Rick Wright e Nick Mason.


A origem do nome do grupo deve-se a Syd Barret.

Há quem diga que o nome surgiu numa visão durante uma viagem, mas na verdade Syd foi buscar o nome do grupo em um álbum que possuía de dois bluesmen da Geórgia – Pink Anderson e Floyd Council – juntando simplesmente o primeiro nome de cada um.

No entanto, e pode ser coincidência, quando o ácido lisérgico foi introduzido na Inglaterra, a gíria para uma ampola de ácido chamava-se “floyd” que curiosamente era mais ou menos cor-de-rosa (“pink”).

Daí algumas pessoas terem associado o Pink Floyd ao ácido cor-de-rosa.

O repertório inicial da banda resumia-se a covers de Bo Diddley, Rolling Stones e de clássicos do blues.

Depois inventaram sua própria música, chamada de “música colorida para perturbar os sentidos” e começaram a estudar as técnicas do light-show.

Estavam convencidos de que no futuro, para distrair e interessar os espectadores, era necessário produzir um show completo em que a retina e o tímpano encontrassem qualquer coisa além daquilo que o cinema, a televisão e a publicidade ofereciam todos os dias.

Foi em Londres que John Hopkins descobriu o grupo, atraído pela sua música e pela forma de se apresentarem no palco, ambas profundamente originais.

Na verdade, os membros do Pink Floyd, apaixonados pela eletrônica e pela ficção científica, começaram a triturar os sons dos seus instrumentos e a experimentar as técnicas do larsen e do eco.

A personalidade perturbadora de Syd Barret, suas idéias originais, seu jeito gozador e os solos torturados que extraía da guitarra, inquietaram e fascinaram Hopkins, um dos divulgadores dos happenings (expressão inventada em 58 por Alan Kaprow para designar uma festa ou um quadro vivo em que cada autor/espectador/ator procurava a libertação e a experiência criativa, individual ou coletiva, sem se preocupar com os resultados) e dono do UFO, a cidadela do movimento hippie.

Hopkins intuiu, com a precisão de uma cartomante, que o Pink Floyd seria capaz de provocar, sensibilizar, e balançar a emocionalidade total das pessoas, numa altura em que todos os jovens queriam exatamente vibrar e esvaziar-se do vazio insondável que transportavam consigo mesmo.

No subterrâneo enfumaçado de uma Swinging London comandada pelo trio Beatles/ Stones/ Hendrix, o Pink Floyd decolou da cena psicodélica emoldurada por experiências com feedback de guitarras, letras surrealistas e bolhas coloridas de luzes líquidas.


A estréia da banda em disco com “Piper At The Gates Of Dawn”, já desembarcou em sexto lugar nas paradas britânicas, desenhando algo que o pop batizaria de “rock espacial”.

Mas seu principal mentor, Syd Barret foi convidado a se retirar logo após o lançamento de segundo disco, “A Saucerful Of Secrets”, de 1968, que já contava com a participação do substituto David Gilmour.

Das experiências com trilhas de cinema em “More”, de Barbet Schroeder, e “Zabriskie Point”, dirigido por Michelangelo Antonioni, o grupo tirou novos alicerces para seu creme sonoro viajante, consolidado no duplo “Ummagumma” (1969) e, principalmente, em “Atom Heart Mother”, mais conhecido como o “disco da vaca”, que se transformou no primeiro top do grupo na lista inglesa, embora na parada americana tenha estacionado num modesto quinqüagésimo-quinto lugar.

A revanche viria com “The Dark Side Of The Moon”.

Quando o famoso disco do prisma do Pink Floyd foi lançado, em 1973, o mundo enterrava seus hippies e Richard Nixon, para mergulhar de cabeça na primeira crise do petróleo.

O disco acabou virando símbolo de resistência pacífica do chamado desbunde absoluto, que sorveu, bebeu e fumou cada nota do trabalho conceitual de maior sucesso do grupo inglês.

O disco do prisma ficou mais de 15 anos na lista dos mais vendidos da revista Billboard e por mais que o mundo gire e a lusitana rode, continua cultuado tanto por hippies que viraram yuppies e agora estão mergulhados em franquias, como por seus filhos, adolescentes que endeusam a guitarra precisa de David Gilmour, o baixo rude e marcado de Roger Waters e o mar de delírios que “The Dark Side” representa.

Esse disco-ícone foi concebido e gravado no Abbey Road Studios, a célebre casa inglesa onde os Beatles fizeram e desfizeram tudo, e teve como engenheiro de som Alan Parsons, que mais tarde virou músico de relativo sucesso, ou relativo fracasso, ainda não se sabe bem.

O Pink Floyd vinha de uma bem-sucedida carreira no segmento rock do mercado de discos e gravou clássicos do vandalismo existencial como o genial “Ummagumma”, uma espécie de LSD de vinil.


O fundador da banda, Syd Barrett, já estava internado há anos em conseqüência de uma viagem lisérgica de ida sem volta, e em seu lugar entrou David Gilmour.

Este funcionou como uma espécie de Orlando Orfei, domador das loucuras de Roger Waters, um homem angustiado, amargo, responsável por atitudes grotescas como a de atirar o seu contrabaixo na cara de um fã de primeira fila, no Canadá, só porque ele estava “me olhando demais”.

O disco “The Dark Side Of The Moon” rompeu a barreira do mercado alternativo e jogou o Pink Floyd nos braços do povo.

As canções “Time” e “Money” foram faixas exaustivamente tocadas em rádios do mundo inteiro (os ingleses classificam esses sucessos como “easy music”) e puxaram o disco para os píncaros da glória.

Naquela época, o marketing musical praticamente não existia, mas a receita do disco do prisma era perfeita.

Músicas que caíram no gosto popular e, ao mesmo tempo nas ocas alternativas, o que é dificílimo.

O LP sacramentou o casamento do Floyd com os esotéricos em geral.

“The Dark Side”, com seus devaneios melódicos e literários, caiu como um néctar sobre as mandalas e tarôs por ser considerado altamente astral. De fato é.

Assistir eclipses lunares em pontos desertos da cidade, acompanhado de uma bela gata, ao som de um disco que fala de nossos eclipses emocionais era um ritual comum – e altamente recomendável.

Embora nunca tenha atingido o primeiro lugar, “o lado escuro da lua” só foi ultrapassado em vendas pelo “Thriller”, de Michael Jackson, de 1982.

Mas em 1975, o disco “Wish You Were Here” chegou ao primeiro lugar nas paradas americanas e inglesas, com o tributo a Syd Barret, “Shine On You Crazy Diamond”.


O álbum do prisma, cujo título original bolado pela banda era “Eclipse – uma jornada musical pelos subterrâneos da loucura”, apela à alma e aos sentidos, variando entre aspectos básicos do ser humano, como em “Breath” (“Respire”), e condicionantes extremos da existência moderna, como em “Time” (“Tempo”) e “Money” (“Dinheiro”).

A apresentação gráfica – com o famoso prisma – foi feita pela Hipgnosis, empresa responsável pelas grandes capas do rock progressivo.

A gravação foi realizada nos estúdios da EMI, em Abbey Road, Londres, entre junho de 1972 e janeiro de 1973.

Na época, antecipava-se o lançamento comercial do sistema quadrafônico, com a duplicação dos canais de estéreo nos aparelhos de som.

O Pink Floyd já usava o sistema em seus concertos e “Dark Side” foi um dos primeiros álbuns dentro da nova técnica.

Numa entrevista à revista Guitar World, o engenheiro de som Alan Parsons, responsável pela gravação do álbum, contou algumas dificuldades que teve, por falta de recursos técnicos.

Por exemplo: o “delay” (“repetição”) das vozes de Waters e Gilmour em “Us And Them” foi feito à mão.

Ele passou um tempo enorme realinhando máquinas com a fita na velocidade errada para conseguir o efeito porque não havia delays digitais na época.

A caixa registradora na abertura de “Money” também foi criada com efeitos de fitas montadas à mão e gastou-se outro tempo enorme gravando cada pedaço para se conseguir o efeito quadrafônico, colocando cada tilintar da caixa num canal.

O disco é cheio de frases desconexas ou nem tanto e intervenções obtidas com o auxílio de todo mundo em que conseguiram por a mão.

A risada do louco em “Speak To Me / Breath” é de um roadie. A frase final do disco, “na verdade não existe um lado escuro na lua”, foi dita por um faxineiro.

Diversas falas estão por todo disco, misturadas a coisas como a leitura da Bíblia com o piano de Wright ao fundo na abertura de “The Great Gig In The Sky”.

O disco “Dark Side” é a obra mais bem sucedida (em termos comerciais) do rock progressivo, tão elogiada quanto detratada pelos adeptos do som anterior do Floyd, um tanto esotérico, ainda na linha criada por Syd Barret, o gênio louco expelido da banda em 1968.

Em “Speak To Me / Breathe” (“Fale comigo / Respire”), o coração criado no sintetizador VCS3 abre o disco e um louco ri. Gilmour canta: “O tempo que você viver / E a altura em que você voar / E os sorrisos que der / E as lágrimas que chorar / É tudo que sua vida jamais será”.

A música “Time”, cantada por Gilmour e Wright, destaca-se pela explosão de relógios e a letra falando do tempo consumindo a vida.

Em “Money”, o maior sucesso do Floyd, a letra contrapõe as mordomias dos bem sucedidos com os conformados à espera de uma promoção.

Em “Us And Them”, a letra fala do contraste entre a burguesia e os desabrigados: “Saia do meu caminho / Tenho muito o que fazer / Meu dia está muito ocupado / Pela falta de uns trocados / Para uma xícara de chá / E um pedaço de pão / O velho morreu”.

Em “The Great Gig In The Sky” (“O Grande Concerto No Céu”) brilha o vocal de Clare Troy, uma profissional de backing vocals. Ela emulou a interpretação a partir de um anúncio de analgésico.


A primeira excursão depois do sucesso de “Money” foi um pesadelo.

As pessoas gritavam do princípio ao fim.

Os músicos a banda se olhavam com uma única pergunta na cabeça: Quando é que eles vão parar? Mas eles não paravam nunca. Foi um choque. A música do Floyd nunca mais foi a mesma.

Hoje, passados quase 30 anos do lançamento, você entra em qualquer loja de discos e está lá, em destaque, o CD do prisma.

Liga uma FM popular e no programa noturno de flashbacks está lá a cena.

Na linha, uma ouvinte chorando de saudades enquanto o locutor, voz melosa, manda “Time” para os ares.

“The Dark Side Of The Moon” foi trilha até de casamentos e enterros.

Um disco muito além dos conceitos de marketing e dos jardins da mesmice.

Seis anos depois, em 1979, o Pink Floyd voltaria a mexer com as emoções da humanidade gravando “The Wall”, a ópera caos de Roger Waters sobre nosso lixo inconsciente.

O disco é sensacional, mas apenas “Another Brick On The Wall” virou sucesso popular, easy music. Explicável.

O disco aborda os tijolos neuróticos que nos cercam a partir da família, passando pela escola (comparada a um moedor de carne) e o casamento, que leva o personagem traído a um estado tal que a música-tema se chama “Confortavelmente Dopado”.

De tijolo em tijolo criamos o muro, “The Wall”.


Com o lançamento do filme homônimo, dirigido por Alan Parker (que chegou a se embolar em lutas corporais com Roger Waters na sala de montagem), ergueu-se ainda mais o muro que o separa do desbundante “The Dark Side Of The Moon”.

“The Wall” é de uma ferocidade tamanha que muita gente deixou os cinemas de gatinhas.

Outros cinco álbuns seriam lançados pelo Pink Floyd nos anos seguintes, numa guinada que levou à tomada do poder dentro da banda por Roger Waters, embora a assinatura musical continuasse a ser a guitarra de Gilmour.

O ato final das constantes quizumbas internas do Floyd foi “The Final Cut” (1983), investida politicamente correta contra a então primeira-ministra Margareth Thatcher.

Depois disso, Waters brigou com Gilmour e se foi. Wright tinha brigado com Waters e saído.

A banda voltou a se reunir em 1987, sem Waters, quando lançou “A Momentary Lapse Of Reason”.

Na seqüência, vieram “Delicate Sound Of Thunder” (ao vivo, de 1988), “The Division Bell”, de 94, e “P.U.L.S.E.”, de 95.

Lançado em junho de 2000, “Is There Anybody Out There? – The Wall Live” é apenas um álbum caça-níquel, gravado ao vivo, em comemoração aos 20 anos do cultuado “The Wall”.

A coletânea “Echoes – The Best Of Pink Floyd”, lançada pela EMI em 2001, com 26 canções da banda, é recomendada apenas para quem nunca ouviu falar no conjunto e que travar um contato inicial com o tal de rock progressivo.

Dos cinco álbuns anteriores, o que se saiu melhor foi “The Division Bell”.

Portas batem, sinos dobram, vozes e ruídos invadem a melodia distendida em câmera lenta. Guitarras lancinantes riscam a cortina etérea de teclados.

A fórmula de ópera-rock progressiva, repetida no disco, parece ter saído da cabeça perturbada de Syd Barret, ainda hoje imerso nas trevas lisérgicas dos anos 60.

O trio remanescente do grupo (com a cisão provocada em 1984 pela saída de Roger Waters) não parece preocupado com o giro permanente do dinossauro em torno da própria cauda.

Em vez de trocar de pele, o animal reforça a couraça, incluindo no disco o sax setentista Dick Parry, o baixo de Guy Prett, a percussão de Gary Willis, a guitarra de Tim Renwick e os teclados de Jon Carin.

O resultado é uma trilha sonora incidental, que não pode ser vendida separadamente do show de pirotecnia laser, projeção de imagens psicodélicas e da indispensável antologia de hits.


O álbum sai da climática planície borbulhante de “Cluster One” e passa pela crítica política de “A Great Day For Freedom” (uma recriminação sobre a indiferança da Europa ocidental às tragédias dos países do Leste), esgrimindo com choro de guitarras e desespero poético em “What Do You Want From Me”.

A idéia do título, tirada de um sino usado na Câmara dos Comuns para indicar o fim das discussões bimbalha na faixa finalista “High Hopes”.

O disco com certeza cabe na discoteca dos fãs de carteirinha, mas dá a entender que o Pink Floyd parece enredado na roda viva da própria fama.

“Ainda há uma fome insaciada”, prega a letra deste progressivo nos estertores.


“Eu vi as melhores mentes de minha geração destruídas pela loucura”, disse Allen Ginsberg em seu clássico poema “Uivo”.

Os anos 60 foram uma barra-pesada para muita gente, mas uma das grandes perdas daqueles anos loucos foi Roger “Syd” Barrett, o primeiro guitarrista do Pink Floyd (também cantor e compositor), responsável pelo brilhante álbum “The Piper At The Gates Of Dawn”, de 1967 (é co-autor também de algumas faixas no segundo álbum do grupo, “A Saucerful Of Secrets”, influência confessa do Kraftwerk).

Barrett deu uma pirada legal em 1968 e foi convidado a sair da banda pelos colegas.

Auxiliado por Peter Jenner, ex-agente do Floyd, ele levou dois anos para gravar seu primeiro disco-solo, “The Madcap Laughs”.

Parte da história da peregrinação de Barrett pós-Floyd apareceu numa coletânea cheia de faixas inéditas, “Wouldn’t You Miss Me – The Best of Syd Barrett”, lançado pela EMI em 2001.

Além de “The Madcap Laughs”, a coletânea traz material dos discos “Barrett” e “Opel” e mostra uma figura ímpar no cenário do rock daquele tempo.


Syd Barrett e sua mente psicodélica tinham uma exuberante originalidade e misturavam fixações tanto na cultura popular (no caso, na inédita “Bob Dylan Blues”) como na chamada “erudita” (a faixa “Golden Hair” é um trecho de poema de James Joyce musicado).

Às vezes folky, delirante, melódico como Paul McCartney e inquieto como David Bowie em sua fase mais cool, Syd Barrett deixou 22 faixas reaproveitadas nessa coletânea.

O material prova que o culto em torno de sua figura não é exagerado.

“Eu não acho que ele tenha perdido o circo pop”, diz um dos mais ferrenhos seguidores de Barrett, o guitarrista do Blur, Graham Coxon. “Eu acho que ele se encheu e escolheu uma existência mais pastoral”.

Basta dar uma ouvidinha em “Here I Go” para saber exatamente de onde vêm a inspiração e os trejeitos vocais de Damon Albarn, do Blur, em seu disco “13”.

Hippie movido a climas ritualísticos, Barrett reaparece como personagem único do seu tempo nessa coleção de canções, um alquimista em busca da pedra filosofal da música debaixo de sons de órgãos ecumênicos e guitarrinhas macias.

“Porque eu sou Mr. Dylan, o Rei, e eu sou livre como um pássaro voando”, diz a letra de “Bob Dylan Blues”.

Dylan foi uma das obsessões de Barrett, mas as guitarras em faixas como “Wolfpack” sugerem que seu incêndio visionário estava também muito à frente do seu tempo.


Em julho de 2006, de acordo com a Reuters, os integrantes do Pink Floyd, assim como outros músicos do Reino Unido renderam um tributo a Syd Barrett, morto no dia 9, em sua residência em Cambridge, na região sudeste da Inglaterra.

Em comunicado conjunto, David Gilmour, Roger Waters, Nick Mason e Rick Wright expressaram grande tristeza pela morte de Barrett e lembraram que “Syd foi a luz que guiou a banda no início”.

O cantor David Bowie descreveu o músico, que passou os últimos anos em reclusão na casa que tinha pertencido a sua mãe em sua cidade natal, como “um verdadeiro diamante”, em referência à canção que Waters dedicou a seu companheiro, “Shine On You Crazy Diamond”.

“Não posso expressar a tristeza que sinto agora. Syd foi uma grande inspiração para mim”, declarou Bowie, que acrescentou que as poucas vezes em que viu Barrett no palco durante a década de 60 “ficarão gravadas para sempre” em sua memória.

O ex-guitarrista do Blur Graham Coxon, que em algumas ocasiões confessou ter sido muito influenciado por Barrett, comentou que “durante 20 anos” o também compositor o levou a “lugares melhores”.


Syd Barrett morreu aos 60 anos por causas não especificadas, segundo um porta-voz do grupo.

O cantor e compositor, nascido em 1946, ocupa de forma indiscutível um lugar de destaque entre os grandes da música.

Ele tocou por três anos ao lado de Bob Klose, Roger Waters, Nick Mason e Rick Wright, até que estes decidiram, em 1968, que Barrett tinha deixado de pertencer oficialmente ao Pink Floyd por culpa de um suposto mau comportamento e por causa de seu envolvimento constante com drogas alucinógenas.

Ele foi substituído por David Gilmour, seu amigo de infância.

Apesar de tudo, Syd Barrett gravou nos anos seguintes alguns álbuns-solo, entre os quais “The Madcap Laughs” e “Barrett”, ajudado pelos seus antigos companheiros da banda David Gilmour e Roger Waters.

Em 1975, o Pink Floyd lançou “Wish You Where Here”, um disco em que homenageava o antigo companheiro do grupo.


Syd Barrett entrou num estúdio de gravação, pela última vez, em 1974, mas “todos os anos continuam a sair livros, discos, coletâneas e DVD sobre ele”, realçou à Agência Lusa o crítico musical Rui Tentúgal, um jornalista que tem acompanhado a carreira do Pink Floyd.

“Não há, em relação a Syd Barrett, um culto idêntico ao de Jim Morrison, mas ele ficou associado à imagem de um gênio atormentado e louco e tornou-se um exemplo perfeito dos mitos que alimentam o rock”, acrescentou.

Segundo Rui Tentúgal, a “originalidade” de Syd Barrett se assentava no caráter “surrealista” das letras que escrevia e na forma como fez “o blues evoluir para o psicodelismo do rock progressivo”.

“As letras, muito ligadas ao espírito da época, tinham a ver com o mundo dos sonhos e a música incluía longas suítes instrumentais, que refletiam a liberdade e a improvisação introduzidas pelo free jazz”, explicou.

3 comentários:

Anônimo disse...

Nossa , muito bom, tem praticamente tudo sobre o pink floyd, mais gente tinha que ler . Parabéns!

Anônimo disse...

perfeito fala quase tudo alem de da grande nota a influencias da banda e a forma como se tornaram grandiosos e irreverentes e Syd o poeta louco uma lenda do rock progressivo '

Anônimo disse...

Tenho 64 anos e acompanho a trajetoria do grupo, o meu preferido, desde "o album do prisma".
Excepcional. O melhor e mais completo de tudo que ja' li sobre o Pink Floyd (e ainda falta alguma coisa). Apesar de alguns assuntos aparececem repetidos uma ou duas vezes, talvez por lapso, foi muito bem redigido por quem entende do assunto.
Parabens! Valeu!