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quarta-feira, junho 19, 2013

Quem é o homem por trás da máscara que está nos protestos no Brasil?


A máscara de Fawkes em V de Vingança

Paulo Nogueira (*)

E Guy Fawkes é uma presença dominante nos protestos no Brasil.

Você vê Guy – fala-se Gui porque Guy vem de Guido – nas máscaras que as pessoas associam a duas coisas: o filme V de Vingança e o grupo de hacker Anomymous.

Mas é Guy Fawkes que está ali, tal como idealizado na história em quadrinhos de Alan Moore que serviria de base para V de Vingança.

A expressão zombeteira e altiva de quem é invencível em qualquer circunstância, especialmente na derrota.

Mas quem é ele?

Guy Fawkes foi o herói da Conspiração da Pólvora, ocorrida na Inglaterra no começo dos anos 1600 e até hoje lembrada com paixão.

O que os conspiradores queriam não era pouca coisa: simplesmente explodir o Parlamento britânico no momento em que o Rei Jaime I abriria, formalmente, os trabalhos, em 5 de novembro de 1605.

Na essência do complô estava a raiva e a frustração que Jaime despertara entre os católicos ingleses.

Ele sucedera Elizabete, filha de Henrique 8.

Elizabete, feia e indesejada, morreu virgem e sem sucessores, e com ela chegou ao fim a dinastia Tudor.

Ela perseguira cruelmente os católicos, como seu pai. Imaginava-se que Jaime, escocês da família Stuart que ascendera por conta de laços familiares com um ramo dos Tudor, facilitaria a vida dos católicos.

Não facilitou.

Os católicos logo o detestaram – não só por manter a perseguição como porque ele era escocês.

Logo começou uma trama para matá-lo – e a todos os parlamentares.

Os conspiradores compraram uma casa ao lado do Parlamento, em Westminster, e foram aos poucos, em completa discrição, enchendo de pólvora.

Fawkes, alto, forte, bonito, um guerreiro provado em várias guerras nas quais atuou como mercenário, tomava conta da casa, e estava preparado para explodir a si próprio, com a casa, caso fosse descoberto.

Uma fraqueza pessoal de um dos conspiradores pôs o plano a perder.

Na tentativa de salvar um amigo, o conspirador relutante mandou a ele um recado cifrado e anônimo. Recomendou-lhe que não fosse à abertura do Parlamento, no dia 5 de novembro.

O destinatário estranhou.

A carta chegou a Jaime, e o plano foi descoberto. Fawkes foi impedido, na ação de surpresa da polícia, de explodir a casa.

Ele bem que tentou, para evitar que os conspiradores fossem descobertos, presos e punidos.

Ele foi levado à presença de Jaime, e nasceram aí frases memoráveis.

O rei perguntou por que o objetivo era matar tanta gente – a família real, todos os parlamentares etc?

“Tempos desesperadores exigem medidas desesperadas”, respondeu Fawkes.

O rei insistiu perguntou: para que tanta pólvora?

“Era a maneira mais rápida de mandar todos os escoceses de volta à Escócia”, disse Fawkes.

A coragem de Fawkes assombrou. Foi condenado à morte por enforcamento e esquartejamento.

Submetido a uma sessão infernal de torturas, não revelou nada que já não fosse conhecido.

Em sua História da Inglaterra para Crianças, Dickens o define como um “homem de ferro”. (De Jaime, diz que era o mais feio, o mais ridículo e o mais inepto dos mortais.)

O dia 5 de novembro passou a ser comemorado na Inglaterra com uma queima de fogos.

Aos poucos, a imagem de Fawkes de vilão foi se transformando na de um justiceiro, de um guerreiro heroico e libertário.

No filme V de Vingança é assim que ele aparece, reencarnado num homem que usa sua máscara e, para punir um Estado totalitário, faz o que Fawkes não conseguiu: explode o Parlamento.

A máscara de Fawkes aparece, hoje, em manifestações de protesto mundo afora, incluídos os do Movimento Passe Livre.

É também utilizada pelos hackers do grupo Anonymous, junto com este lema: “Nós não esquecemos, nós não perdoamos”.

A história é escrita pelos vencedores. Fawkes perdeu, e por isso foi inicialmente tratado como um traidor vil e inclemente.

Mas, num caso raro, a posteridade transformou o perdedor esquartejado num exemplo de coragem, bravura e justiça — num personagem que inspira lutas contra a opressão dos Jaimes que se espalham pelo mundo em todas as épocas.



(*) O jornalista Paulo Nogueira, baseado em Londres, é fundador e diretor editorial do site de notícias e análises Diário do Centro do Mundo.

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