Thomas Pappon
Da BBC Brasil
Ivan Lessa certamente será lembrado como a principal cabeça
pensante dos tempos áureos do Pasquim e pelo seu texto refinado e ácido – muitas
vezes aberto a interpretações distintas, mas que rendeu-lhe a fama de um dos
grandes escritores brasileiros.
Ele reverenciava as regras da arte de escrever, que
dominava. Entregava sua coluna religiosamente um dia antes da publicação
prevista. Erros de gramática e regência ou colocações sem sentido, não os
havia.
Se via como cronista, um comentador de fatos pescados de
jornais e noticiários, na tradição de Paulo Mendes Campos, Sérgio Porto, Rubem
Braga e Fernando Sabino.
“Não sou jornalista”, dizia, enfático, na cantina da BBC – onde
confraternizava com os colegas de trabalho, nos três dias da semana em que
vinha para Bush House, antiga sede do Serviço Mundial.
Mas falava com muito orgulho de seu – talvez – único
trabalho com o “repórter” da BBC Brasil: de quando entrevistou, em Londres, o
ícone do jazz Billy Eckstine.
Ivan Lessa amava Eckstine. E amava Frank Sinatra, Dick
Haymes, Frankie Laine, Sammy Davis Jr., Joe Mooney e um monte de crooners
obscuros que conheceu nos anos 40 e 50, junto com a rapaziada que
co-frequentava as Lojas Murray, no Rio, e que tramou a Bossa Nova – entre eles
João Gilberto, que, em 2000, quando veio a Londres para um show no Barbican,
ficou mais de uma hora no telefone com Ivan, trocado conversa fiada e cantando
sambas antigos.
Maior que o amor pela música, só o amor pelo cinema. Ivan
sabia tudo da Hollywood dos anos 40 e 50, e nutria um orgulho especial por ter
conhecido atores e roteiristas americanos no Rio de Janeiro ou mesmo nos EUA,
apresentados pelo seu pai, o escritor Orígenes Lessa, que trabalhou anos como
uma espécie de lobista cultural fazendo um meio campo entre EUA e Brasil.
Ivan detestava o cinema brasileiro, que considerava amador,
mas gostava de falar do ator José Lewgoy, seu grande amigo, e não escondia o
orgulho de estar listado no IMBD como “actor“ ligado a filmes brasileiros.
Nos anos 50, Ivan foi ator mirim em dois ou três filmes,
entre eles “Maior Que o Ódio” – em que contracena com Agnaldo Rayol –, dirigido
por Jose Carlos Burle, estrelado por Anselmo Duarte.
Nos quase 15 anos em que convivi com o Ivan, raramente vi
ele tão feliz como quando ele soube que suas cenas em “Maior Que o Ódio” tinham
sido colocadas no YouTube.
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