Até
quem você não imaginava anda fazendo biquinho no espelho para
autorretrato nas redes sociais...
Ricardo
Coiro
Outro
dia eu senti vontade de provolone à marciana (quitute típico do meu
planeta).Também desejei ter um filho. Mas logo desisti; do filho.
Pensei: e se ele virar um ser viciado em postar selfies sem camisa –
e com direito a biquinho – em frente ao espelho? Já imaginou?
–
Filhão,
o almoço está na mesa.
–
Um
segundo, pai. Só estou procurando um filtro para uma selfie!
–
Está
esfriando...
–
Calma,
pai. Essa selfie é muito importante para mim!
É
foda, cara. Não sei se eu conseguiria lidar com algo assim.
Aí
resolvi comprar um cachorro.
–
Moça,
eu quero uma raça que não faz selfies. Qual você me indica?
–
Aí
fica difícil, senhor.
–
Como
assim?
–
Todo
cachorro faz selfie hoje em dia. E depois postam no Focinhobook. Ou
no Instacão.
–
Então
deixa. Valeu.
Até
os animais estão fazendo selfies por aqui? Você ouviu isso,
terráqueo? Como deixaram isso acontecer?
Outro
dia entrei no Instagram e, para a minha surpresa, dei de cara com a
selfie de um brother. Não esperava isso dele, de verdade. Não
daquele amigo. Não de um cara que só está há dois anos na Terra.
O cara estava de calça de moletom (daquelas que deixam o peru
balançando) e com os mamilos à mostra.
Mas
sabe o pior? Abaixo da foto havia uma frase de biscoito da sorte: “A
preocupação nunca venceu o destino”.
O
que uma coisa tem a ver com a outra? Não sei quem é o autor dessa
frase, mas tenho certeza que ele ficaria decepcionado se soubesse que
acabou junto a uma demonstração de insegurança. O que foi? É,
isso mesmo que você leu: “demonstração de insegurança”. Ou
não é?
Em
uma importante universidade do meu planeta, fizeram um estudo e
descobriram o que leva a raça humana a fazer mais selfies do que
doações. Funciona assim: os inseguros postam selfies porque, graças
aos likes (confetes virtuais) recebidos, sentem-se mais confiantes, e
bonitos.
Mas
o efeito da confiança adquirida à base de selfies bem-sucedidas
dura pouco. E logo eles, os inseguros, postam mais uma foto, de outro
ângulo. E com outro penteado. Simples assim. Sacou?
O
ser humano, de maneira geral, carece de aceitação constante. E não
há forma de conseguir aceitação mais rápida e prática do que uma
selfie. Um sorriso, um click, um filtro e pronto, o mundo todo parece
amar você.
É,
talvez eu seja muito extremista e exagerado. Coisa de marciano. Mas é
selfie que não acaba mais, concorda?
Quando pensei em mudar para a
Terra, em 2014, eu já sabia que essa coisa de selfie-ostentação
estava perdendo o controle, e que, até da bunda, estavam fazendo
retratos.
Mas hoje, dez anos depois, vejo que o negócio tomou
proporções assustadoras. As selfies têm provocado mais acidentes
em estradas do que o álcool. Acredita?
Aliás, você leu as notícias
de hoje? Um cara morreu esmagado pela barra do supino porque, bem no
meio da repetição, resolveu fazer uma selfie? Dá pra acreditar? Só
na Terra mesmo.
E
sabe o mais bizarro? Até mesmo aqueles que se dizem imunes e
contrários às selfies, como o Ricardo Coiro (aquele escritor que
que acabou de abrir um foodtruck de bolovos gourmets, sabe?), vez ou
outra caem em tentação, e, também por insegurança, postam uma
selfie, mesmo que tímida e disfarçada de “eu só tirei isso para
mostrar o grafite lá de trás”.
Como
eu sei disso? Outro dia, na Avenida Paulista, eu vi o Coiro sendo
atropelado por uma cadeira de rodas motorizada. Ele estava achando o
melhor ângulo para uma selfie quando, de repente, caiu no colo de
uma senhora.
Eu vi tudo! Vi a idosa gritando sem parar e, no chão e
dentro de um IPhone 129, uma foto do Ricardo sorrindo como se
dissesse: por favor, ajude-me a inflar o meu ego murcho, curta a
minha foto.
Disseram-me
que a selfie é o novo “espelho, espelho meu!”. Não entendi
nada. Deve ser coisa que só entende quem nasceu aqui, na Terra.
Uma terra na qual fingem que não estão nem aí para a opinião dos outros, mas que, na verdade, nem de casa saem caso a selfie do corte de cabelo novo não receba elogios.
Quer saber? #PARTIUMARTE.
Uma terra na qual fingem que não estão nem aí para a opinião dos outros, mas que, na verdade, nem de casa saem caso a selfie do corte de cabelo novo não receba elogios.
Quer saber? #PARTIUMARTE.
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