Comemorando
o bom ano de seu The Noite, o humorista Danilo Gentili fala sobre
patrulha online e suas apostas para 2015: filme, livro e até um jogo
de tabuleiro sobre stand up.
Paulo
Giandalia
Com
agenda cheia este ano e a missão de se manter na briga pela
audiência – seu talk-show The Noite, no SBT, tem batido os 5
pontos e incomodado o Programa do Jô desde a estreia, em março do
ano passado –, Danilo Gentili só sente falta de tempo. Tempo para
escrever mais stand up. Nem ao Comedians, clube de humor do qual é
sócio em SP, tem conseguido ir (“e o pessoal vem me cobrando, mas
prefiro não aparecer a fazer um espetáculo ruim”).
Desde
que o sucesso bateu à sua porta, quando integrou a primeira equipe
do programa CQC, na TV Bandeirantes, ele não sai do noticiário. Nem
sempre da forma como gostaria. “Acho que a frase do Tom Jobim é
perfeita: ‘sucesso, no Brasil, é ofensa pessoal’”. Ele se
refere aos patrulheiros do politicamente correto, que, jura, aprendeu
a combater tanto na telinha quanto nas redes sociais. “Eles não
representam a opinião pública, como, muitas vezes, tem-se a
impressão”, afirma.
Aos
35 anos, o humorista, que iniciou a carreira se apresentando em bares
e teatros de sua Santo André natal, quer continuar polêmico e
aposta na conversa franca em seu programa de TV: “É isso que as
pessoas querem, diversão e sinceridade”. Sinceridade que ganhará,
este ano, um filme, um livro e um jogo de tabuleiro (“é um party
game baseado em stand up, se chamará O Rei da Comédia”).
Após
gravar o especial de Natal do The Noite (ele se considera um “cristão
monoteísta freelancer”), Danilo recebeu a coluna em seu camarim. A
seguir, os melhores momentos do bate-papo.
Você
está pensando em alguma mudança no The Noite para 2015?
Acho
que o grande desafio de um talk-show desse gênero, que é diário,
com uma plataforma amigável, com sofá e skyline atrás, não é ele
se inovar fisicamente, mas conseguir se manter fresco e interessante
através dos anos. Mudar muito seria uma traição ao público,
creio. Ele está acostumado, e eu também adoro esse cenário. Haverá
uma reforminha ou outra, mas não vou inventar a roda. Teremos,
claro, quadros novos, alguns que já estavam planejados, mas acabaram
não sendo aproveitados. O mais importante é que vamos investir em
bons entrevistados.
Como
legítimo representante da comédia stand up, você teve de se
policiar quando passou a trabalhar na TV aberta?
Não,
até porque não tinha nada a perder, né? Era uma opção que eu
poderia ter seguido, mas não aconteceu. Em Santo André, onde eu
comecei, ganhava a vida me apresentando em bares e teatros – que é
o que eu realmente gosto de fazer. Ou seja, quando fui para a TV,
mais precisamente para o CQC, pensava que o máximo que poderia
acontecer era dar errado.
Não
pensava em criar uma fórmula para um novo ambiente?
Sinceramente,
não. Tentava apenas falar. E crescer. Tentei manter minha liberdade.
Por isso, aqui no The Noite eu luto pela liberdade da equipe que se
apresenta comigo.
Tem
tido tempo de escrever para stand up?
Não,
e isso me chateia. Faz muito tempo que não faço. Porque não
aguento, mesmo. Boa parte do meu tempo é dedicada à produção do
The Noite. Acaba me faltando tempo para ser criativo fora do
programa, sobra só o bagaço para o stand up. Aí prefiro não
fazer.
Teme
que o público te cobre a mesma performance que se acostumou a ver no
Comedians?
Exato,
porque minha associação com o stand up é muito forte. Por isso não
quero que ninguém me veja fazendo stand up ruim. Se voltar a fazer,
quero que seja algo em que realmente acredito.
Apresentar
um talk show é mais fácil ou mais difícil do que você imaginava?
O
mais difícil foi convencer as pessoas de que podia dar certo. Levou
uns quatro anos para acreditarem em mim… (risos)
Por
que tanto tempo?
Acho
que porque não havia concorrência. O Jô Soares ficou 20 anos
sozinho no ar. Ouvi de tudo: que o Jô era mais inteligente, mais bem
relacionado, mais culto, fala mais idiomas do que eu.
Tem
entrevistado proibido no seu programa, por você ou pela produção?
De
jeito nenhum. Eu até gosto quando vem gente de que eu não gosto!
(risos) A polêmica e o conflito podem ser mais interessantes ainda
para o programa. Em 2014, a gente entrevistou Luciana Genro, Aloysio
Nunes, Levy Fidelix… a gama é extensa, e o sofá tem de ser
eclético. Falamos com a ex-mulher do Fernando Collor (hoje Rosane
Malta). Em uma mesma semana vieram aqui o padre Fábio de Melo e os
vencedores do Prêmio da Indústria Pornô 2014.
Mas
o fato de você ter opiniões fortes, sobretudo políticas, não
atrapalha na interação com alguns entrevistados?
Por
mais que eu tenha as minhas opiniões, e esteja acostumado a
divulgá-las nas redes sociais, aqui eu não faço isso, para
preservar o formato do The Noite. Aqui é entretenimento, tento
sempre privilegiar o entretenimento.
Está
difícil fazer humor por causa do politicamente correto?
Na
primeira vez em que aconteceu, me senti muito mal. Porque a primeira
coisa que a patrulha do politicamente correto faz é se travestir de
opinião pública. Isso acontece em todas as áreas. A mais
corriqueira é a propaganda. Vamos pegar um anúncio com a Gisele
Bündchen, por exemplo. Pois dez patrulheiras se reúnem e passam o
dia inteiro ligando para o Conar para reclamar. E o Conar “conclui”
que as mulheres do Brasil estão muito ofendidas com o anúncio da
Gisele Bündchen. Só que não é verdade, não tem ninguém
ofendido. O problema é que a patrulha é muito organizada.
Hoje
você ainda fica na defensiva ou aprendeu a lidar?
Na
primeira vez, fiquei pensando: “Meu Deus, que cagada que eu fiz! E
agora? Todo mundo me odeia…”. Bom, continuei fazendo meu show, e
a fila para entrar dava volta no quarteirão. E não era gente
querendo me bater. (risos) Percebi que todo mundo que começa a
ganhar alguma projeção, como era o meu caso na época, isso faz uns
cinco anos, se torna alvo do patrulhamento, acaba no jornal.
Acha
que se consideram guardiãs de uma agenda política?
E
tentam colocar todo mundo dentro da caixinha delas. Demora para você
perceber isso, mas, depois que você percebe, não se intimida mais.
Porque esses patrulheiros não representam, de maneira nenhuma, a
opinião das pessoas. As pessoas são muito mais bem-humoradas do que
se supõe, muito mais inteligentes.
O
Tom Jobim costumava dizer que, “no Brasil, sucesso é uma ofensa
pessoal”. Concorda?
Essa
frase tem tudo a ver com o que a gente está falando: quando um
grupelho tenta se apropriar do seu sucesso e te usar como espantalho.
Se você está de acordo com a cartilha ideológica desse grupelho,
se torna cool, legal, tudo que você fala passa a ser correto. Agora,
se você não está de acordo, é burro, xucro, atrasado,
popularesco, é tudo de ruim. Você vê isso em todo lugar. Mas o
público em geral não é assim, não se ofende com o seu sucesso,
muito pelo contrário, vejo muito carinho, muita torcida.
Acha
que os públicos de stand up, TV e cinema são diferentes? Algum é
mais sofisticado?
Não,
é o mesmo público. É um pessoal que gosta de humor. Eu sei disso
porque eu sou esse público. Sempre que me meti a fazer qualquer
projeto, me coloquei no lugar do público. Eu gosto de humor, e ele
pode estar em qualquer lugar.
Tem
algo previsto para cinema em 2015?
No
segundo semestre começa a gravação de Como Se Tornar o Pior Aluno
da Escola, baseado em um livro meu.
Fora
o Roberto Bolaños, de quem você é fã declarado, quem são os seus
ídolos no humor?
Nossa,
adoro Chaves e Chapolim, acho o Chespirito (apelido de Bolaños, que
significa pequeno Shakespeare) o máximo! Mas, quando você começa a
trabalhar com humor, tende a se afastar dos comediantes que fazem a
sua cabeça. A gente tem muito medo de replicar os outros, imitar
trejeitos, métodos. Por isso, não tenho ídolos.
Já
fez alguma piada da qual tenha se arrependido depois?
Todas
as que não fizeram o público rir são a prova de que eu errei. Mas
entendi o que você quis dizer… Às vezes, a gente passa do ponto.
O problema é que criamos piadas o tempo todo, então, a margem de
erro é muito alta. É assim mesmo para quem trabalha com humor
autoral. O stand up é muito baseado em tentativa e erro. De cada 30
piadas que escrevo, umas 5 se salvam, o resto vai para o lixo. Ainda
vou errar muito, pode apostar.
Essa
margem de erro aumentou com as redes sociais?
O
problema das redes sociais é que elas potencializam tudo, inclusive,
e principalmente, os seus erros. Aí os patrulheiros fazem a festa,
dá até a impressão de que você só sabe fazer aquele tipo de
piada ‘errada’.
Como
é o seu relacionamento com as redes sociais?
Costumo
responder aos meus fãs e seguidores. Com o passar do tempo, fui
aprendendo a separar o joio do trigo no mundo virtual. Todo mundo tem
direito de não achar graça de uma piada, de se ofender, de dar
opinião. Mas, depois de bastante tempo levando pedrada, já consigo
saber se a pedra está partindo de um fã que realmente não gostou
daquela piada (e quer que você volte a acertar), se veio de uma
pessoa comum que não gostou ou se veio de um patrulheiro, para quem
não faz diferença se a piada é boa ou ruim. Aliás, isso que eu
estou dizendo será tema de um livro que vou publicar em 2015, o Guia
Politicamente Incorreto do Humor Brasileiro.
Do
que se trata?
Estou
fazendo um apanhado de casos como esses que comentei, comparando-os e
evidenciando o que acontece. Sou um cara que faz piada de tudo: de
mim, da minha mãe, de padre, de pastor, de crente, da esquerda, da
direita… Ou seja, sei exatamente quais são os temas tabus no
Brasil. Quando entendi isso, entendi também quem são os
patrulheiros. Quando descobri quem são os patrulheiros, percebi
porque estão fazendo isso.
Você
bloqueia gente nas redes sociais?
Se
percebo que é patrulheiro, bloqueio. Porque é um cara que está me
seguindo com o intuito único de usar minha piada contra mim.
Tem
vontade de fazer um show stand up Politicamente Incorreto 2?
Tentei
fazer e não consegui. Estava nos meus planos para a reta final das
eleições à presidência. Mas tive dois problemas: primeiro, o
ritmo de trabalho, uma loucura; segundo, porque, diferentemente do
primeiro show, em que eu me divertia escrevendo as piadas, dessa vez
fiquei mal. Não tinha vontade de rir, mas de xingar!
O
que te irrita no Brasil?
O
que me deixa agoniado não é governo corrupto e roubalheira, porque
isso acontece nas melhores famílias. Estou no Brasil, me espantaria
se não acontecesse. O que me agonia é perceber a simpatia do
mainstream em relação ao que está acontecendo. As pessoas que
deveriam estar evidenciando os fatos são as que estão aliviando. O
espaço na grande mídia anda muito ocupado por simpatizantes da
situação. Em qualquer lugar normal, se um governo é corrupto, está
todo mundo batendo nele. Mas aqui tem muita gente aliviando, e isso
me angustia. É um mau sinal.
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