André Barcinski
Tive de ler a reportagem da “Folha” duas vezes para me
certificar de que não estava delirando: Chico Buarque, Gilberto Gil, Caetano
Veloso, Djavan, Milton Nascimento e Erasmo Carlos se uniram a Roberto Carlos na
campanha para exigir autorização prévia de biografados.
De Roberto Carlos não se podia esperar outra coisa.
Afinal, passou a carreira toda sem dar um pio contra a
ditadura e viveu os últimos 50 anos como um verdadeiro monarca, decidindo tudo
que podia ou não ser dito sobre ele (não é à toa que é chamado de “Rei”,
enquanto Xuxa, outra figura pública que ainda acredita viver na Monarquia, é a
“Rainha”).
Mas Chico Buarque? Um dos compositores mais censurados do
país? Gil e Caetano, exilados pelos militares? Gil, o ministro do Creative
Commons? Absolutamente surreal.
Na coluna de Ancelmo Gois no jornal “O Globo” de sexta,
Djavan justificou assim sua decisão:
“A liberdade de expressão, sob qualquer circunstância,
precisa ser preservada. Ponto. No entanto, sobre tais biografias, do modo como
é hoje, ela, a liberdade de expressão, corre o risco de acolher uma injustiça,
à medida em que privilegia o mercado em detrimento do indivíduo; editores e
biógrafos ganham fortunas enquanto aos biografados resta o ônus do sofrimento e
da indignação. Nos países desenvolvidos, você pode abrir um processo. No Brasil
também, com uma enorme diferença: nós não somos um país desenvolvido.”
Brilhante. Quer dizer que, enquanto não formos um “país
desenvolvido”, o melhor é recorrer à censura típica das repúblicas das bananas?
O parágrafo de Djavan é tão confuso quanto algumas de suas
letras.
Ele começa dizendo que é necessário preservar a liberdade de
expressão “sob qualquer circunstância”, para logo depois justificar a censura
sobre “tais biografias”.
Que biografias seriam essas? As que Djavan e amigos não
aprovam?
Depois, o compositor diz que editores e biógrafos ganham
“fortunas”.
Não sei em que país Djavan vive.
Onde eu vivo, se um autor vende dez mil cópias, sai dando
cambalhota de felicidade (o escritor ganha, em média, 10% do preço de capa,
então faça as contas e verá que escrever no Brasil, com raras exceções, é coisa
de maluco ou diletante).
Vivo num país onde o Luis Fernando Veríssimo diz que não
sobrevive de literatura. O Veríssimo.
E não adianta Djavan e turma dizerem que não se trata de
censura.
Claro que é.
Só é disfarçada de preocupação de mercado.
Em setembro, durante a Bienal do livro, Ruy Castro leu um
manifesto, assinado por 47 nomes, incluindo o historiador Bóris Fausto, o
escritor Cristovao Tezza, o poeta Ferreira Gullar, o cineasta Nelson Pereira
dos Santos e o jornalista e escritor Carlos Heitor Cony, contra a suspensão da
tramitação do projeto de lei que libera a publicação de biografias sem
autorização dos retratados.
Um dos trechos do manifesto diz:
“A dispensa do consentimento prévio do biografado não
confere ao autor imunidade sobre as consequências do que escrever. Em casos de
abuso de direito, uso de informação falsa e ofensiva à honra, a lei já contém
os mecanismos inibidores e as punições adequadas à proteção dos direitos da
personalidade”.
Ninguém é a favor de biografias mentirosas.
Um autor que publica uma calúnia ou informação falsa deve
ser punido.
Mas também ninguém pode ser a favor de um mercado de livros
“chapa branca”, como os ícones da MPB querem criar.
Um comentário:
É Simão, o bom e velho Rock'n Roll ficou neste domingo mais uma vez mais triste e sem graça...
"Lou Reed: morre aos 71 anos o criador do Velvet Underground"
http://whiplash.net/materias/news_822/191132-loureed.html
Abraços, Delcimar
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