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quinta-feira, dezembro 03, 2009

Uma Noitada na Broadway - Parte 1


No último dia 1º de dezembro, voltei a participar de uma sessão etílico-musical no Clube dos Discófilos Fanáticos (CDF).

Era uma sessão especial: além de ser o último encontro da turma no ano, haveria, também, uma sessão pré-patuléia, a cargo de meu brother Jéferson Garrafa.

Por conta disso, imagino, o empresário Acram Isper levou para o covil quatro garrafas de Ballantine’s 17 anos – que não resistiram ao ataque dos lobos malteses por mais de duas horas.

O garrafão de dois litros de Johnnie Walker Black voltou a fazer as honras da casa.

Salvo engano, dos titulares do clube o único ausente foi o Salomito Benchimol (e ele teve a gentileza de telefonar para o anfitrião Arnaldo Russo, explicando que estava presente em espírito), que se encontrava em uma rodada de negócios em São Paulo.

Em compensação, o engenheiro de sistemas Pedro Russo, irmão do Arnaldo, que atualmente mora no Rio de Janeiro, viajou para Manaus apenas para participar do fuzuê. Ele retornou pra Cidade Maravilhosa no dia seguinte.

Apesar de ter sido a última reunião oficial do CDF, as atividades do clube continuam ao longo do mês.

Nesse sábado, por exemplo, os clubistas e as respectivas consortes vão se reunir no restaurante Alentejo, ali na rua Pará.

Posso estar delirando, mas desconfio que essa média com o mulherio é apenas para preparar o coração das distintas para a famosa rave...

Sim, vocês leram corretamente: os sacanas promovem anualmente uma rave no mesmo sistema “Clube do Bolinha” (mulher não entra!).

A deste ano acontece no próximo dia 18, começa às oito horas da noite de sexta e só termina às oito da manhã de sábado.

A presepada é no estilo “quem está fora não entra, quem está dentro não sai”, já que o Arnaldo Russo costuma trancar a chave da porta dentro de um cofre – e nenhum dos cachorros até hoje descobriu o segredo do cofre pra sair à francesa.

Durante a rave, cada membro do clube tem 17 minutos para apresentar uma audição musical cujo tema, esse ano, serão duetos mistos (homem e mulher dividindo os vocais).

Depois das apresentações, serão escolhidos os melhores do ano e sorteada a ordem de apresentação do clube para o próximo ano. E haja uísque, vinho, cerveja e acepipes de todos os tipos.


Mas vamos ao fuzuê da última terça-feira.

“Se houve uma música que marcou os anos 20, 30 e 40 em todo o mundo, esta foi – me corrijam se eu estiver enganado – o som das chamadas Big Bands!”, começou Jéferson Garrafa.

Big Bands? Levei um susto.

Como minha arqueologia musical não consegue retroceder além dos anos 50, me preparei mentalmente para receber uma aula sobre aquele tipo de música, que eu não conhecia nem de cumprimentar.

Aliás, minha lembrança mais remota de uma orquestra tocando alguma coisa interessante vem do Cine Ipiranga, na Cachoeirinha, no final dos anos 60, quando cinco minutos antes de se apagarem as luzes e as cortinas começarem a abrir, ecoava no recinto o clássico “In The Mood”, do Glenn Miller.

Aquela era a senha pra gente localizar as garotas que estavam guardando nossos respectivos lugares, se aboletar no local na maior sem-cerimônia e iniciar a sessão de “acocho”, a gíria da época para designar o atual “amasso”.


“As grandes orquestras comandaram o ritmo em centenas de salões de bailes de todo o planeta e consagraram junto ao grande público uma música nascida nos guetos negros norte-americanos. A gente poderia passar o resto da noite conversando sobre o assunto, mas eu vou tentar contar essa história em apenas trinta minutos”, garantiu o apresentador.

A partir daí, Jéferson começou a explicar que, diferente dos pequenos grupos de jazz, essas bandas, compostas de 12 a 25 membros, tinham músicas completamente arranjadas e anotadas em partitura.

Solos improvisados poderiam ser requeridos pelo arranjador. Era uma forma de jazz doce, romântica e melódica. Para reforçar o que dizia, ele colocava uma determinada música pra tocar e pedia aos atentos ouvintes que percebessem a nuance desenvolvida por este ou aquele músico. Show de bola.


Junto com o CD que ele distribuiu após sua belíssima apresentação, Jéferson fez um pequeno estudo histórico sobre o fenômeno das Big Bands, incluindo um perfil biográfico dos principais músicos que se destacaram no meio.

O CD duplo é recheado de preciosidades como a música “One Step”, da Original Dixieland Jazz Band, “Riverboat Shufe”, do The Wolverines, e “Aunt Hagar’s Blue”, da Creole Jazz Band, alem de standards de Tommy Dorsey, Benny Goodman, Glenn Miller e Duke Ellington, entre outros.



Pelo que se lê no libreto, a história das big bands pode começar a ser contada no final do século 19, quando negros norte-americanos descendentes de escravos criaram o ragtime - mistura de música primitiva, hinos religiosos, marchas militares e até um pouco da estrutura rítmica de ritmos europeus, como a valsa.

O jazz nasceria desta fusão de estilos e começaria a ser difundido com as primeiras orquestras de rua criadas em cidades como Nova Orleans, Memphis e Saint Louis.

No início do século 20, a procura por trabalho levaria estas orquestras a outras grandes cidades e aos salões de bailes dos hotéis.

Era o embrião das big bands - usinas sonoras dançantes formadas por trompetes, trombones, saxofones e uma clarineta, piano, contra-baixo, guitarra, bateria, além de um crooner.


Dos palcos dos grandes clubes e dos shows das rádios nasceram estrelas como Duke Ellington (foto), Count Basie, Glenn Miller, Benny Goodman, Tommy Dorsey, Artie Shaw, Harry James e Woody Herman. A febre não tardou a se espalhar pelo mundo.

Em meados dos anos 20, as grandes orquestras já eram uma tradição. Embora o estilo fosse desavergonhadamente comercial, elas sempre contavam com músicos de primeira linha no seu cast.

Mas foi na década seguinte que elas se popularizaram definitivamente - resultado de interesse de músicos e arranjadores brancos por um tipo de som criado pelos negros (chamado jitteburg), na época bastante popular nos bairros crioulos de Nova Iorque. O swing nasceu daí e explodiria em todo o mundo depois do início da Segunda Grande Guerra.

Ou seja, após o fim dos anos 20, emergiu uma nova forma de jazz, mais “autêntica”, no sentido de que fazia um uso maior da improvisação. Apenas algumas gravações foram feitas e foram rotuladas de “race records”, em alusão ao fato de serem gravações destinadas exclusivamente ao público afro-americano.

Devido ao grande sucesso do swing nas big bands, os músicos mais velhos, de gerações anteriores, se sentiram forçados a se adaptar ao novo ritmo ou se aposentar. O próprio mercado, atormentado pela recessão, não aceitava formatos menores de grupos musicais. Não se podia arriscar.

Essa foi a era das transmissões de rádio ao vivo, costa a costa dos Estados Unidos. As transmissões eram feitas não só a partir dos estúdios das emissoras, mas também diretamente dos salões de baile.


O som das big bands era a música oficial dos soldados no front, a felicidade nos momentos de pausa entre um combate e outro, o ritmo da saudade dos que ficaram, a inspiração para os adolescentes, a trilha sonora dos namorados.

Hollywood logo percebeu o potencial do gênero, que não tardou a aparecer em 90% dos filmes produzidos na época. A explosão das big bands logo formaria uma geração de estrelas no mundo da música.

Carmem Miranda e Bing Crosby não tardaram a aparecer nas telas ao lado das big bands. Quando às grandes orquestras se juntavam nomes de astros consagrados, como Billie Holliday, Ella Fitzgerald e as Andrew Sisters, o resultado eram milhões de discos vendidos.

No auge do sucesso, poucos eram tão estrelas quanto os band-leaders, que lideravam as orquestras. Instrumentistas como Benny Goodman, Tommy Dorsey, Artie Shaw e Harry James eram verdadeiras celebridades. Entre eles o maior foi, sem dúvida, Glenn Miller.

Seu sucesso era tamanho que o governo americano se recusou a alistá-lo durante a guerra - preferiu enviá-lo com toda sua orquestra para o front, para divertir os soldados.

A fama de Miller cresceu tanto que historiadores apontam seu desaparecimento (num avião que sumiu rumo a Paris, em 1944) como o fim da era de ouro das big bands.

Foi essa odisséia toda que Jeferson Garrafa contou, com bastante conhecimento de causa, em apenas 30 minutos. O caboco é danado!

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