Pesquisar este blog

segunda-feira, agosto 10, 2009

ABZ da Guitarra Elétrica em 10 Lições – Take 5


A Santíssima Trindade: Clapton, Page & Beck – Tal como grande parte da juventude inglesa do começo da década de 60, o jovem Eric Clapton - nascido na cidade inglesa de Ripley, em 1945 - era um aficionado do blues americano. Foi esta paixão que o fez mergulhar cada vez mais neste estilo musical, começando por Chuck Berry e Buddy Holly, indo mais fundo no blues urbano de Muddy Waters e B.B. King, até chegar a suas raízes rurais com Blind Lemon Jefferson.

Apesar de aos quinze anos ter ganho uma guitarra de seus avós - que faziam as vezes de seus pais adotivos -, foi só dois anos mais tarde que Clapton começou a dedilhar o instrumento.

Não demorou muito tempo para que ele já estivesse tocando numa banda local chamada Rhode Island Red and the Roosters (pela qual já haviam passado Brian Jones e Tom McGuiness, que depois viria a tocar com Manfred Mann) e logo depois com Casey Jones and the Engineers, que alcançou algum sucesso local.

Em outubro de 1963, Clapton foi convidado para substituir ao guitarrista Anthony “Top” Topham em um novo grupo, com apenas três meses de existência: os Yardbirds. Pouco depois eles estreavam, sucedendo os Stones no clube Crawdaddy, em Richmond, e logo excursionavam pela Europa com o bluesman Sonny Boy Williamson.

Eric permaneceu nos Yardbirds até março de 1965, saindo por achar que o grupo estava se afastando de suas raízes blues e seguindo numa direção mais comercial. Porém, este período foi o suficiente para Clapton firmar-se como uma sumidade na guitarra (tendo seu nome comparado a Deus nos famosos grafittis do metrô londrino), pelos solos lentos e perfeitos que executava em sua Fender Telecaster, conseguindo um vibrato com a ligeira variação do dedo que pressionava a corda, técnica que lhe valeu o apelido de “slowhand” (“mão lenta”).

John Mayall - ao lado de Alexis Korner, um dos pioneiros do cenário de blues inglês - logo em seguida convidou Clapton para integrar os seus Bluesbreakers. Foi nesta época que ele passou a usar a Gibson Les Paul, que por seu sustain e variações tonais se mostrava mais adequada à execução do blues, além de se dedicar à prática do instrumento de forma quase doentia durante o período de um ano e meio que integrou a banda de Mayall, o que aprimorou sensivelmente sua técnica.

Porém, influenciado por Jimi Hendrix - que estava em Londres com seu empresário Chas Chandler (ex-baixista dos Animals) em via de montar seu trio -, Clapton resolve montar um grupo que extrapolasse os limites do blues puro e desenvolvesse novas sonoridades.

Foi assim que formou o Cream junto ao baixista Jack Bruce e ao baterista Ginger Baker (ambos ex-membros da banda de Alexis Korner e da Graham Bond Organization), que, junto ao Experience de Hendrix, serviu de modelo para vários power trios na mesma linha que surgiram posteriormente (West, Bruce & Laing, Mountain, Beck, Bogert & Appice).


Foi no Cream que Clapton consolidou seu estilo, através de longos solos onde a improvisação era constante. Um estilo que contrapunha frases lentas e rápidas, inserindo no meio destes pequenos acordes de uma ou duas notas, além de se utilizar de escalas maiores sobre harmonias menores e das notas “puxadas” e em vibrato, adicionando um novo colorido ao fraseado do instrumento.

Mas as proporções gigantescas que o Cream assumiu pareciam não estar nos planos originais de seus integrantes e o grupo se despede do público com um concerto derradeiro no Royal Albert Hall, em novembro de 1968, depois de uma grande excursão pelos EUA no ano anterior.

Durante este período, Clapton também participou das gravações dos álbuns We’re Only in It for the Money, de Frank Zappa, Beggars Banquet, dos Stones, e do White Album, dos Beatles (é dele o solo em “While My Guitar Gently Weeps”).

Em seguida, Clapton formou um outro supergrupo - junto a Baker, ao baixista Rick Grech (ex-Family) e ao tecladista Steve Winwood (ex-Spencer Davis Group) - que teve duração efêmera: o Blind Faith, que em sua existência de apenas alguns meses pouco acrescentou à carreira de Clapton. A exceção foi sua composição “Presence of the Lord”, que se tornou um verdadeiro hino, sendo regravada por ele em vários álbuns ao vivo, sendo uma das únicas na qual se utilizava do pedal de wah-wah.


Como para se penitenciar de suas duas incursões malsucedidas reunindo supergrupos, no início de 1969 Clapton voltou a excursionar como mero acompanhante de Delaney and Bonnie (que abriam os shows do Cream) e tocou com a Plastic Ono Band de John Lennon, no Canadá.

Neste período já tinha substituído suas Gibsons (Les Paul, SG e ES-335) pela Fender Stratocaster e, no ano seguinte, gravaria o seu primeiro álbum solo e participaria do triplo de seu amigo George Harrison, All the Things Must Pass. Logo após montaria o Derek and the Dominos (com os músicos que acompanhavam Delaney and Bonnie), com quem excursionou até o fim de 1971, quando a convite de George participou do concerto em benefício de Bangladesh.

Desta fase com os Dominos, o destaque fica por conta de seu único álbum de estúdio - o duplo Layla & Other Assorted Love Songs - que tinha a participação da steel guitar (guitarra de mesa com as cordas dispostas horizontalmente e tocadas com o bottleneck) do americano Duanne Allman e uma versão de “Little Wing”, uma homenagem póstuma a Hendrix, que meses antes falecera, além de ser dedicado a Patti Boyd Harrison (então esposa de George, com quem Clapton se casaria em 1979).

Amargurado e desencantado com a morte de Hendrix - sucedida pela de Duanne Allman - e com o clima pesado que passou a existir entre ele e George, que foi abandonado pela mulher por sua causa, Clapton se refugia na solidão de sua casa em Surrey e na heroína por um longo período, até ser resgatado em 1973 por seu amigo Pete Townshend com um concerto no Rainbow, de Londres (acompanhado pelo próprio Townshend, além de Steve Winwood e Ron Wood, entre outros).

Com a ajuda de Townshend, Clapton abandonou as drogas e voltou a gravar novamente no ano seguinte. Mas uma mudança radical havia se operado: onde estavam os célebres solos que haviam construído sua fama de Deus durante a década anterior?

Estavam ali mesmo nos dedos de Clapton, só que de forma calma e contida, embasados por arranjos leves que flertavam com a balada country e o reggae. Desde então sua carreira tomou o sabor de uma tarde ensolarada de domingo. Foi como se tivéssemos chegado ao sétimo dia da criação e Deus precisasse descansar.


James Patrick Page era pouco mais de um ano mais velho que Clapton e desde bem cedo já havia se apaixonado pela guitarra em sua cidade natal, Epsom. Suas primeiras influências partiram de guitarristas americanos de rockabilly, como Scotty Moore, James Burton e Cliff Gallup, e posteriormente passou a se interessar pelo jazz de Django Reinhardt e o blues de B.B. King e Elmore James.

Aos 17 anos, Jimmy Page começou a excursionar com sua Fender Stratocaster como guitarrista de um grupo chamado Neil Christian and the Crusaders, até que foi obrigado a desistir devido a uma febre glandular.

Sua carreira como sessionman teve início em 1963 quase por acaso, quando foi chamado para substituir ao guitarrista Big Jim Sullivan, um músico de estúdio experiente e muito requisitado no circuito londrino.

Daí em diante teve uma ascensão fulminante nesta atividade, participando da maior parte dos discos gravados nos estúdios ingleses durante os dois anos seguintes, inclusive em importantes gravações do Who (“I Can’t Explain”), Stones (“Heart of Stone”, “She’s a Rainbow”), Kinks (“You Really Got Me”, “All Day and All of the Night”) e o Them (“Here Comes the Night”), entre outros. Isto devia-se a seu virtuosismo no instrumento, que permitia que ele moldasse suas participações ao estilo dos músicos que acompanhava.


Foi numa destas sessões de estúdio que conheceu Jeff Beck, de quem se tornou amigo. Com a saída de Eric Clapton dos Yardbirds, Page foi o primeiro nome sondado para substituir-lhe, mas este decidiu permanecer na sua posição de sessionman, indicando Beck para a vaga.

Havia outro ponto em comum entre Eric Clapton, Jimmy Page e Jeff Beck além da guitarra: os três estudaram durante a adolescência em escolas de arte. E foi no Wimbledon Art College, em Londres, que o introvertido Beck começou a se interessar pelo blues e o R&B americano.

Nascido em 1944, em Surrey, ele teve educação musical em vários instrumentos ainda criança e foi sem grandes dificuldades que se tornou autodidata na guitarra. Ao sair do colégio, Beck já acompanhava diversos grupos mais ou menos obscuros com sua Fender Telecaster e nem pestanejou em aceitar o convite para substituir o mais aclamado guitarrista da época nos Yardbirds.


A entrada de Beck no grupo causou uma mudança na direção musical da banda, que abandonou sua linha pautada exclusivamente no blues para aventurar-se em novos rumos musicais. Ele tinha uma habilidade especial para manipular o feedback de seu instrumento e os então recém-criados pedais de wah-wah e distorção, produzindo efeitos inéditos na sua guitarra.

Mas, no fim de 1965, ele é obrigado a se afastar temporariamente dos Yardbirds por motivos de saúde, ao mesmo tempo em que Jimmy Page é chamado para substituir o baixista Paul Samwell-Smith. Quando Beck retornou, Page já havia trocado de posição com Chris Deja, o outro guitarrista do grupo.

Com esta formação, eles partem para uma vitoriosa excursão de seis semanas pelos EUA e ao voltar para a Inglaterra o som do grupo já causa sensação. Contando com dois fabulosos guitarristas solo, os Yardbirds começaram a desenvolver um trabalho que se aproveitava de efeitos de estéreo produzido pelas vozes dos dois instrumentos, assim antecipando o som de muitas bandas psicodélicas.

Nesta época Beck usava uma Gibson Les Paul e Page se revezava entre a Fender Telecaster e uma Les Paul Custom “Black Beauty”, além de utilizar esporadicamente uma Vox de doze cordas.

Um dos raros registros deste dueto foi feito no filme Blow Up, de Antonioni, onde os Yardbirds tocavam “Stroll On”, enquanto Beck destruía sua Gibson (uma cena concebida originalmente para Pete Townshend).

Esta conjunção durou pouco, pois no fim de 1966 o temperamental Beck abandonou os Yardbirds sem maiores explicações. No ano seguinte, ele formaria o Jeff Beck Group, que contava com o baixista Ron Wood, o baterista Aynsley Dunbar - logo substituído por Mickey Waller - e Rod Stewart nos vocais.


Com este time, acrescido de participações de John Paul Jones e Nicky Hopkins, ele gravou o antológico LP Truth (1968), que conta inclusive com uma música de Page – “Beck’s Bolero” -, na qual o próprio toca violão de doze cordas.

O disco sintetizava um repertório calcado no blues e no soul - especialmente pela voz de Stewart -, mas que tomava um colorido diferente com as intervenções paranóicas da guitarra de Beck com o grupo perfeitamente afiado e afinado.

Logo Hopkins foi efetivado como pianista e o intempestivo Beck dispensou Waller (substituindo-o por Tony Newman) e Ron Wood, tendo que chamar este de volta às vésperas do início das gravações do segundo álbum, Beck-Ola (1969), por não ter encontrado um substituto à altura.

Pouco depois de terminados os trabalhos de estúdio o grupo se dissolve, com Wood optando pela guitarra e indo com Stewart se juntar aos Small Faces e Beck pondo em prática suas intenções de formar um power trio, fazendo contatos com o baixista Tim Bogert e o baterista Carmine Appice, do grupo nova-iorquino Vanilla Fudge (que também havia acabado).

Mas um grave acidente de carro fez o veloz Jeff Beck pôr fim a seus planos musicais imediatos, deixando-o inativo durante quase dois anos. Neste meio tempo, Jimmy Page começara a gerar das cinzas dos Yardbirds a mais perfeita expressão do heavy metal dos anos 70.

A princípio com o nome de The New Yardbirds, logo mudado para Led Zeppelin, Page havia encontrado em Robert Plant, John Paul Jones e John “Bonzo” Bonham uma banda perfeitamente sintonizada com as suas pretensões musicais e que o deixava à vontade para experimentar não só na guitarra, como também nas inúmeras possibilidades oferecidas pelos estúdios.

Isto já se nota em seu primeiro álbum (gravado em 1969), onde Page conseguiu um timbre de guitarra muito similar ao da Les Paul com uma Fender Telecaster (que lhe foi presenteada por Jeff Beck), somente com o uso de pequenos amplificadores e da disposição dos microfones.

O seu domínio das técnicas de gravação ficou patente na utilização dos playbacks de guitarra, em arranjos verdadeiramente orquestrais (“Stairway to Heaven”, “The Song Remains the Same”, “Achilles’ Last Stand”) ou em colagens de ruídos, solos e efeitos sonoros (“Whole Lotta Love”).

Enquanto guitarrista sua presença foi marcante não apenas por seu fraseado lírico e riffs poderosos como também em suas intervenções acústicas pontuadas por acordes pesados (“Your Time Is Gonna Come”, “Over the Hills and Far Away”) e seus trabalhos com slide guitar (“Celebration Day”, “Down by the Seaside”).

Mesmo ao vivo, Page conseguia reproduzir quase inteiramente a alquimia sonora obtida em estúdio com playbacks, seja tocando sua Les Paul com um arco de violino e pedal wah-wah (“Dazed and Confused”) ou a Gibson de dois braços, de seis e doze cordas (que usava em “The Song...” e “Stairway...”).

Mas, se o início dos anos 70 trazia boas novas para o esotérico Page, discípulo do ocultista Aleister Crowley, em contrapartida representava mau agouro para o egocêntrico Jeff Beck, discípulo apenas de si mesmo. Depois de recuperado do acidente, ele tenta formar aquele velho trio com Bogert e Appice, mas vê frustrada sua intenção por ambos estarem envolvidos com o Cactus, o novo grupo deles.

Então, sua sorte começou a mudar quando recrutou um novo time de músicos praticamente desconhecidos - o tecladista Max Middleton, o baterista Cozy Powell, o baixista Clive Chaman e o vocalista Bob Tench - e gravou dois LPs: o primeiro produzido por ele próprio e o seguinte por Steve Crooper, ambos mais voltados para o funk e o soul.

Com o fim do Cactus, Beck despediu Chaman e Powell sumariamente, convocando Bogert e Appice para os seus lugares. Logo, Tench saiu para se juntar a Roger Chapman e Charlie Whitney (ambos ex-Family) nos Street-walkers. Foi então recrutado o obscuro vocalista Kim Milford, mas esta formação não durou mais que alguns meses. Beck retorna ao projeto do power trio, com Bogert e Appice.


Eles lançam um LP (com os vocais a cargo de Beck) e estavam quase terminando o segundo quando o grupo se dissolve, pois estávamos em 1973 e não mais nos áureos tempos do Cream. Com o fracasso de seu power trio, Beck se afasta do cenário musical por mais de um ano para voltar em grande estilo com um álbum instrumental - Blow by Blow (1975) - e uma nova banda, com o baixista jamaicano Phil Chen, o baterista Richard Bailey e os teclados de Middleton.

Produzido por George “Sgt. Peppers” Martin, o disco traz Beck não só mergulhado no soul e no funk como de maneira mais profunda no jazz. A criatividade com que sempre fez uso das inovações eletrônicas permaneceu, como no uso do talk box - um pedal pelo qual é possível modificar a nota soada com a boca, através de um tubo plástico, como se a guitarra “falasse” (em “She’s a Woman”, de Lennon & McCartney).

Seu estilo continuava estritamente pessoal, mas a mudança em sua direção musical era marcante. Beck aderira - ao que parece em definitivo - ao jazz-rock e depois de uma excursão pelos EUA com a Mahavishnu Orchestra de John McLaughlin, começa a desenvolver um trabalho com o tecladista Jan Hammer (membro original da Mahavishnu), o baterista Narada Michael Walden (também ex-Mahavishnu) e o baixista Wilbur Bascomb, entre outros.

Neste período renegava seu passado de guitarrista de rock, classificando seus colegas Jimmy Page e Eric Clapton como músicos “rasteiros”. Mas nas voltas que o mundo dá, eis que nos deparamos com o volúvel Beck em plena década de 80 retornando ao rock “rasteiro”, ao gravar e se apresentar com velhos chapas como Rod Stewart e Mick Jagger. Mas o próximo passo de Jeff Beck sempre foi imprevisível.


Quanto a Page, depois da dissolução do Led Zeppelin devido à morte de Bonham, em 1980, enveredou-se por uma malfadada tentativa de impor-se com outra banda: The Firm, que gorou após dois LPs. E em 1988 lança - a exemplo de Keith Richards -, afinal, seu primeiro álbum individual (descontando-se a trilha sonora de Desejo de Matar II).

Nenhum comentário: