No clima de manifestações que tomaram o país nos últimos anos,
mulheres de várias idades bem que poderiam sair às ruas para protestar. Motivos
não faltam. Afinal, quando o assunto é o direito legítimo de “chegar lá”, os
mitos e tabus que permeiam a sociedade atrapalham, até os dias de hoje, a realização
feminina entre quatro paredes. “Posso me masturbar?”, “Posso gemer?”, “E se não
conseguir gozar?”, “Onde fica o Ponto G?”.
As muitas dúvidas sobre orgasmo, libido e formas de
excitação somam-se a questões emocionais, culturais, profissionais e biológicas,
povoando com muitas caraminholas o imaginário sexual feminino. Se ela tem
facilidade de dialogar com o parceiro, às vezes empaca na inconstância
comportamental, influenciada por seus hormônios. Se é bem informada e conversa
sobre o assunto, às vezes o medo de ousar a impede de liberar suas fantasias
mais íntimas.
Dona de um corpo cujo prazer é multifatorial e tão complexo
quanto o painel de controle de um Boeing, a mulher também não foi muito privilegiada
pela questão histórica. Estudos sobre o prazer feminino só passaram a ganhar
visibilidade depois dos anos 60. Impulsionadas pela entrada da mulher no
mercado de trabalho, liberação sexual e uso da pílula anticoncepcional, as
revistas voltadas a esse público passaram a desmistificar o assunto. Até lá,
tudo o que se esperava das mulheres no casamento era que “fossem boas mães e
boas donas de casa”.
Não se previa o orgasmo para elas, mas as novas gerações de
homens estão pensando um pouco mais nisso. Ainda bem. Com as mudanças do mundo
contemporâneo, os casais tiveram que se adaptar. Ao ganhar seu dinheiro e
comandar a própria vida, a mulher passou a cobrar do parceiro maior
participação no jogo erótico. Superando essa fase em que deviam apenas servir,
cada vez mais, passaram a exigir o “direito de chegar lá”. Nem todas sabem,
porém, que é preciso aprender o caminho até o cume da montanha.
Por melhor que seja o desempenho do macho, a mulher precisa
entender que é ela – e não ele – a grande responsável por seu prazer, na medida
em que se permitir e se tornar disposta a aprender como o orgasmo acontece. Ou
seja: quanto mais falar o que gosta e o que considera bom, maiores são as
chances de satisfação.
Isso explica o fato de por que, no ano passado, salas de
cinema mundo afora ficaram lotadas de leitoras eufóricas para ver o sedutor
sádico Christian Grey, da obra “Cinquenta Tons de Cinza”. Isso mesmo: a
trilogia de E.L. James, que levou ao delírio o público feminino com as
perversões do magnata que sofrera abuso sexual na infância e tornara-se um
dominador, acabou virando filme. Cenário de toda sorte de tortura e jogos de
sedução entre Grey e Anastásia, o quarto vermelho deixou muitas expectadoras
assanhadas diante da tela.
O pudor que muitas mulheres têm para revelar seus desejos
mostra que a muralha histórica erguida entre a excitação e os bons costumes
permanece. O fenômeno “Grey” revela uma tentativa de se livrar desses fantasmas
morais. Sedentas por histórias picantes, as amantes contemporâneas querem, mais
do que ler e ver, viver essas cenas. Sacanagem, sim, mas é a sutileza que leva
ao delírio Em parte, o fascínio pelas artimanhas de Grey se explica pelo fato
de que o sexo começa antes e termina depois da cama.
Segundo a sexóloga Florence Coelho Marques, são as sutilezas
que as levam ao delírio. “Mulher gosta de sacanagem, mas é exigente. Querem ser
observadas, degustadas, instigadas”, conjectura. As lições aprendidas em filmes
pornôs, que ensinam a repetir um mesmo movimento o mais rápido possível, segundo
Florence, devem ser esquecidas. Mitos como procurar o ponto G também podem ser
riscados do manual erótico.
O ponto principal é a mente. Por isso, é importante
investir em tudo o que precede a penetração: massagem nos pés, beijinho no
cangote, língua passeando pelo corpo, safadezas ao pé do ouvido, mordidinhas no
pescoço, beijo na boca. Todas essas peças que, soltas, parecem brincadeira de
adolescente, são o combustível do tesão, justamente porque ativam pontos na
imaginação feminina.
Como saber se ela chegou lá? – Se em um momento de grande
excitação a mulher percebe pequenas contrações rítmicas e involuntárias na
entrada da vagina, seguindo-se uma sensação de relaxamento, possivelmente houve
um orgasmo.
Por que é mais demorado para a mulher do que para o homem? –
Diferenças em relação à resposta sexual. A mulher tem a pélvis mais larga e
precisa de maior fluxo sanguíneo para estar pronta para a relação. Por isso,
para elas, as preliminares são fundamentais!
Quantos tipos de orgasmos diferentes existem? – O orgasmo
sempre será clitoridiano. Pode ser desencadeado pela penetração vaginal ou
anal. Mas ponto G, orgasmo vaginal, são mitos. Não existem.
Como escolher um vibrador? – Existe uma gama enorme de
modelos, formas, etc. Os “da moda” são os Rabbits, que prometem maravilhas.
Podem ser usados pela mulher sozinha ou com seu parceiro. Na prática, como o
orgasmo vem sempre do clitóris, tanto faz se o vibrador é em forma de pênis
avantajado, ou se vibra dentro da vagina em multivelocidades. O que importa é que
haja um estímulo prazeroso no clitóris, e para isso basta ser um vibrador
discreto, de forma oval, por exemplo.
Há remédios que podem diminuir a libido? – Muitas medicações
podem diminuir a libido. Eu diria que a maioria delas! Excetuando-se os
analgésicos e os antibióticos, todas as demais medicações, com o uso crônico,
podem ter alguma interferência. Para amenizar essa questão é imprescindível uma
avaliação com um especialista (terapeuta sexual ou sexólogo), que poderá
identificar se há associação de alguma medicação ou não. Muitas vezes culpamos
doenças e medicações quando, na verdade, a relação não está bem: há depressão,
crise financeira, doença em familiares ou outros fatores contribuindo para a redução
do desejo sexual.
A idade influencia na libido? – Após os 40 anos, começa a
haver uma redução fisiológica, natural, nos níveis de testosterona circulante
das mulheres. Após a menopausa esta redução se acentua. Naquelas submetidas à
retirada dos ovários a situação é ainda mais preocupante. Os baixos níveis de
testosterona podem se relacionar a um menor desejo, impulso e fantasias
sexuais. Com a proximidade da menopausa, muitas mulheres passam a apresentar
redução dos níveis de estrogênio circulantes, fato associado à menor
lubrificação vaginal (atrofia genital), causando desconforto ao coito.
A libido pode ser estimulada? Como? – Sempre pode e deve ser
estimulada. Leituras, filmes, lingeries, performances, perfumes, jantares,
viagens, agrados (flores, presentes, surpresas, mensagens, e-mails). Cada casal
pode usar da criatividade para inovar, namorar, driblar a rotina. Costumamos
promover mudanças em nossas vidas quando nos separamos: algumas pessoas cortam
o cabelo, mudam o penteado, renovam o guarda-roupa, começam a frequentar
academia, redecoram a casa... Por que não podemos fazer isso durante e para
manter uma relação?
Muitas mulheres acham que se liberar na cama e deixar claro
suas fantasias pode parecer vulgar. Isso é machismo da cabeça feminina? – De
certa forma, sim. As mulheres aprenderam essas questões equivocadas ao longo de
décadas, com nossos antepassados. Por isso “se permitir” é tão difícil. Com
mais intimidade, a comunicação do casal tende a melhorar.
Por que o sexo anal é tabu? – Por que ainda existem os mitos
de que é um local sujo, proibido, alusão à relação homossexual masculina,
constrangimento em aceitar que pode ter prazer desta forma, em se permitir. Dê
a bunda com prazer e o prazer vai surgir. Simples assim.
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