Xico Sá
Nada como aquela olhadinha que ela dá quando lá embaixo. Ainda e pra sempre,
da série “detalhes tão pequenos de nós dois”. A vida se resume a observar,
microscópio de eros, rei Roberto e velho Nelson, a mulher e o seu drama.
Nada como aquela
olhadela, sobrancelhas assanhadas, mirando lá de nossos países baixos cá para
cima do nosso cocuruto alumbrado. Tão lindamente sacana, ah, que nega a minha nega, derreto-me
como mantchega!
Ela quer saber se estou gostando, claro que estou mortinho
ali no pré-gozo. Tem um orgulho, “vê como faço bem feito e com gosto”, ali
naquela olhadinha plongé, contra-plongé, depende de quem vê...
Como eu gosto, ela diz, posso? Aperto com força os seus cabelos, resvalando numa fração de
segundo para um carinho no rosto, lado esquerdo, com o lado B da mão e dedos,
quiromancia e mistérios.
Ela desce lá naquele cantinho fronteiriço, desenha a
história do olho com riscos da língua em círculos, lambe a última costura da
minha pobre existência, nirvaniza-me, petitemort, e assina nossosbatismos
lindos com lambidas góticas, assim como
quem escreve inocentemente na areia, coraçãozinho flechado, e o nome de quem
aposta, como se o amor fosse um jogo do bicho.
Não resisto a olhadinha lá de baixo, vem cá, estou longe e
perto, meu amor, tudo em volta está deserto, tudo certo, como na canção do 2 e
2 são cinco.
Como nosso universo é tão perfeito aqui na cama, só na cama, lá
embaixo, na cama zen, japão do amor,
horizontalizo-me, para sempre, viro réptil, nunca mais me levanto, nunca
mais me levanto e ando, odeio meus Lázaros internos, agora eu quero mais é
nadar no seco, melhor jeito de navegar aos teus pés, e de vez em quando, quer
saber?, afundo as mãos nos arrecifes e te dou um peixinho, como aquele do conto
de Virgílio Piñera, que aprisiono nas profundezas sujas das nossas existências.
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