Por Ruy
Castro
O conceito é
de Millôr Fernandes, e se explica por si mesmo: a vida é perto. Foi dito por
ele para a cantora Olivia Byington, a respeito de alguém que, sendo carioca e
morando no Rio, fazia questão de ter casas e apartamentos em várias cidades do
planeta. “A vida é perto, Olivia”, disse Millôr. Sem elucubrações outras. Ela
entendeu, contou para todo mundo e todo mundo entendeu.
Foi também
de Millôr que roubei o conceito de que ideal é morar, no máximo, até o 4º andar
– para conservar a perspectiva humana. Por isso, há anos, ao comprar um
apartamento no Rio, fiz questão de que, ao chegar à janela, eu estivesse ao
alcance da voz de quem passava lá embaixo, na calçada. De que pudesse ler a
tabuleta na carrocinha com o preço do Chica Bom e, idealmente, distinguir a cor
dos olhos das moças a caminho da praia – único item que não foi atendido,
porque elas passam de óculos escuros. Enfim, a vida é perto.
Preocupada
com as possibilidades de contágio da gripe suína em São Paulo, uma autoridade
sanitária paulistana disse que a situação é grave porque, lá, as pessoas passam
o dia em interiores: no ônibus, no metrô, no escritório, na fábrica, no
restaurante, na boate, em casa ou na casa dos outros. Impossível o espirro
individual. Daí inferi que, em algumas cidades, a vida é dentro. E que, em
outras – o Rio, por exemplo –, a vida é fora.
Pode-se
estender o conceito a muitas categorias, com direito a escolha, como a de que a
vida é hoje, ontem ou amanhã; de que a vida é agora ou nunca; ou de que é um
amistoso ou a valer três pontos. Tudo vale. Mas, sob qualquer das
possibilidades acima, a vida seria muito melhor se tivéssemos mais tempo para
pensar nela.
Mas não dá,
porque a vida, quando acordamos para ela, é depressa demais.
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