Por Silvio Essinger
Quem apostaria que um grupo de redatores de humor desprovidos de sex appeal e de pendores artísticos (o que lhes sobrava, no caso, era cara de pau) viraria sensação dos palcos brasileiros em 1989? Nem mesmo os próprios envolvidos: Bussunda, Reinaldo, Hubert, Claudio Manoel, Marcelo Madureira e Beto Silva. O fato é que, na contramão dos prognósticos e do bom senso, há exatos 30 anos Casseta & Planeta entrava no radar do país com “Eu vou tirar você desse lugar” — um show que começou, tímido, nas segundas-feiras do Jazzmania, mas que rapidamente chegou ao horário nobre do Canecão e virou até um disco, “Preto com um buraco no meio”.
— A gente fazia aquele show na segunda da mesma forma que ia jogar bola na quarta. Não havia expectativa, a gente fazia porque gostava daquilo — recorda-se Madureira, aos 61 anos, em pleno processo de se reunir novamente com os amigos para voltar aos palcos, depois de um afastamento de mais de 20 anos.
No dia 26 de outubro começa, em Maceió, a “Casseta & Planeta Tour 30 Anxs 2019” (o show carioca é dia 8 de dezembro, no Vivo Rio). No novo espetáculo, o grupo recupera músicas dos antigos shows (caso do “Rap do vagabundo”, revisitado como “O rap do youtuber”) e apresenta músicas novas, em meio a paródias, velhos personagens dos programas de TV (Seu Creisson, Gavião Bueno), esquetes, causos e homenagens a Bussunda (falecido em 2006, de ataque cardíaco, quando cobria a Copa da Mundo para a TV) e Maria Paula (a Dona Casseta do programa “Casseta & Planeta, urgente!”). A venda de ingressos começa nesta terça-feira.
— Fazemos um stand up de cinco, diferente dos outros shows, que eram mais musicais, tinham banda e acabavam virando discos. Depois de tanto tempo de TV, a gente teve que se reacostumar à ideia de estar no palco — explica Claudio Manoel, 60 anos, por WhatsApp, de suas férias na Itália.
Pioneiros na internet
Claudio diz “cinco”, porque além de Bussunda, o grupo agora está desfalcado também de Reinaldo Figueiredo, célebre na TV pela paródia do presidente Itamar Franco, o Devagar Franco.
— Sou o mais velho do grupo, ou melhor, o mais vintage do grupo, e já tinha combinado que, depois que o programa na Globo terminasse ( em 2012, eles ainda fizeram “Casseta & Planeta vai fundo” ), eu ia começar a pendurar as chuteiras — conta Reinaldo, de 67 anos, por e-mail.
Hoje, o Casseta & Planeta existe basicamente na internet, meio no qual o grupo foi um pioneiro em termos de Brasil, ao lançar um site em 1995. Em seu canal do YouTube (com mais de 180 mil inscritos e vídeos que somam mais de seis milhões de visualizações), os cinco apresentam dois programas semanais. Às terças, sai a “Resenha Tabajara”, na qual comentam os acontecimentos do Brasil e do mundo. Às quintas, o “Plantão Casseta & Planeta”, com imitações, emulando o velho estilo do programa de TV. E este ano ainda, o quinteto estreia um programa de entrevistas.
— Na internet, a pegada do Casseta & Planeta não mudou, e a aceitação, no geral, tem sido boa. Não é uma coisa saudosista. Estamos nos revelando para um monte de gente, ao mesmo tempo em que reencontramos quem já era fã — avalia Marcelo Madureira.
Os tempos são outros, os humoristas reconhecem. E algumas das piadas que eles costumavam fazer — como a da capa de “Preto com um buraco no meio” (segundo eles, a descrição objetiva do que é um LP) e a do “mulher é tudo vaca” no refrão da canção de dor de corno “Mãe é mãe” — talvez não tenham a mesma graça em 2019, para dizer o mínimo.
— As pessoas querem olhar o passado do ponto de vista de hoje. Isso é um problema muito sério. Naquela época, a gente achou engraçado botar na capa do LP um negão fazendo um buraco com uma furadeira — conta Helio de la Peña, de 60 anos, o negro do grupo. — Lá mesmo no lançamento do disco, a gente foi contestado por um grupo de ativistas negros, dizendo que aquilo era uma alusão ao preto com um buraco de bala na testa. Mas essa ideia nunca ocorreu à gente!
— Era um outro momento, de saída da ditadura, todo mundo estava radicalizando para todos os lados — argumenta Beto Silva, 59 anos, que nas novas imitações assume o papel de Donald Trump (“e, agora, de Boris Johnson também”).
Hoje, em tempos de fake news, Casseta & Planeta tenta marcar presença na internet e nos palcos renovando o seu lema “Jornalismo mentira, humorismo verdade”.
— Hoje seria jornalismo fake e humorismo verdade — define Hubert Aranha, 59 anos, para quem o Brasil ainda está muito longe de ser o país da piada pronta. — A piada ainda não ficou pronta por uma razão simples: o orçamento foi superfaturado.
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