Simon Le
Bon, do Duran Duran
É longo o trajeto para a Cornualha, o braço mais ao sul da
maior ilha da Europa, a Grã-Bretanha. Além dos penhascos com imensas paredes
lapidadas pelo impacto constante do Canal da Mancha e do Mar Celta, ornadas com
ruínas de castelos medievais que emergem no imaginário das lendas da Távola
Redonda, os britânicos e os visitantes estrangeiros têm outro motivo para conhecer
o local: trata-se da maior concentração de cornos por metro quadrado do planeta.
Portanto, foi com um misto de incredulidade e surpresa que
descobri que a bonita cidade de Itacoatiara possui um pedacinho da Cornualha
incrustrado em seu território urbano na forma de um restaurante temático
chamado “Chifral do Barão”, localizado na Avenida Sete de Setembro, 152,
Centro, a dois quarteirões do hotel Rio Amazonas, onde a nossa banda tecnopop (eu,
Wild Skinhead, Marie Jolie e Edy Savage) estava hospedada e desfrutando das
maiores mordomias.
O restaurante pertence ao gentleman Ezilane Batista Viana
(aka “Barão”), um caboco perreché nascido na Terra do Guaraná e que se mudou
ainda criança para a Terra da Pedra Pintada.
Há onze anos, com a cara e a coragem, ele abriu seu
restaurante, que hoje se transformou em uma das atrações turísticas da cidade,
sendo frequentado por empresários, políticos, intelectuais, jornalistas,
boêmios, músicos, estudantes e malandros de todos os calibres.
Oriundo da Terra dos Papagaios Falantes (como Maués também é
conhecida), o grande Barão, naturalmente, não consegue passar dois minutos de tramela
fechada.
Ele conta dezenas, centenas, milhares de casos hilariantes
acontecidos com os frequentadores do restaurante, enfileirando uma história
depois da outra, e, se o cristão não morrer do coração durante um acesso de
riso, com certeza vai se transformar em amigo de infância do eterno gozador.
Aconteceu comigo.
O cardápio do restaurante é um espetáculo à parte.
São mais de 50 pratos, em porções generosas e preços
acessíveis.
Na noite de sábado, durante o jantar, a nossa banda encarou
caranguejo à moda caiçara, filé à milanesa, javali à caçadora, picanha na pedra,
guisado de porco, coelho desossado com anchovas, sucos de laranja,
refrigerantes e dezenas de garrafinhas de Heineken e Itaipava estupidamente
geladas e a dolorosa não passou de R$ 120.
Ficamos tão empolgados com o atendimento Vip e o preço de
liquidação com queima de estoque do cardápio, que repetimos a dose no almoço de
domingo para conferir se aquilo não tinha sido sorte de amadores.
Dessa vez, encaramos filé com fritas, lasanha, guisado de
língua, bisteca no bafo, bife de fígado, coelho a Transmontana, sucos de
laranja e bastante água mineral (nada de cerveja porque de lá íamos pegar a
estrada e pretendíamos retornar pra aldeia são e salvos, o que de fato
aconteceu).
A dolorosa novamente nos surpreendeu: míseros R$ 60, ou o
preço equivalente a um mísero prato meia-boca em um dos Lig-Ligs da vida em Tóquio,
Amsterdam ou Manaus.
Esse Barão é porreta!
Bom, mas quanto à origem do inusitado nome do restaurante
temático?
Segundo o próprio Barão, “apenas tiração de onda pra
escandalizar a província!”
– Em uma das viagens que fiz ao Nordeste, eu conheci o bar
Confraria dos Chifrudos, em Recife (PE), e achei muito engraçado – recorda.
“Aí, quando resolvi abrir um restaurante aqui na cidade, me inspirei nele!”
Entre as atrações do restaurante está o chapéu de viking
exclusivo dos membros da confraria, as duas poltronas “chifrônicas” utilizadas
pelos casais para registrarem sua passagem pela casa e uma espécie de chocalho
de boi, badalado alegremente sempre que um novo confrade entra no restaurante.
– Quando um dos dois não quer se sentar na poltrona para ser
fotografado ou, quando se sentam, mas ficam um pra lá e outro pra cá, eu já
começo a sentir cheiro de chifre queimado! – explica o psicólogo Barão. “Agora,
quando os dois se sentam de mãos dadas é porque os chifres já estão pra
derreter...”
Pesquisador do assunto, Barão tem na ponta da língua a
resposta para todos os problemas filosóficos, estéticos ou existenciais que
angustiam os cornos da cidade.
– É quase um lugar comum dizer que o homem é o último a
descobrir que é corno, mas isto se deve a reação passiva da maioria, que
prefere acreditar na mulher e não nos amigos mais chegados! – analisa. “Aí,
quando o corno descobre, a Inês é morta e o Ricardão já deu o fora...”
Se por um lado existe um corno que quase sempre sai mal na
foto, do outro lado da história está o sujeito que se aproveita da situação e
consola a mulher alheia.
– Os ricardões, os zorros, os pés de panos, os fuleragens,
os bate-bola, os clóvis e os miguelitos também frequentam o restaurante numa
boa porque esse aqui é um espaço democrático! – diz Barão. “Eles não podem é
fazer graça com mulheres acompanhadas se não levam chumbo!”
Para não receber um metal pesado na moleira e se transformar
em corno manso (ou corno do mato, aquele que quando recebe um chifre fica
dizendo “Eu mato! Eu mato! Eu mato!”), Barão dá algumas dicas a serem seguidas,
todas de caráter preventivo:
1 – Evite casar com mulher quenga. As mulheres muito dadas
antes do casamento também costumam continuar dando muito depois. Sim, há
exceções.
2 – Se tiver condições prefira mulher que seja virgem, mas é
bom saber que está cada vez mais difícil de achar este produto no mercado. A
vantagem é que elas nunca vão te comparar com outros porque não tiveram outros.
Mas no dia que tiverem, sai de perto...
3 – Procure saber se a mãe da sua futura cara metade já
corneou o marido. Árvore defeituosa costuma dar fruto ruim. Há exceções, claro.
4 – Desconfie das muito certinhas, do tipo que não fala com
ninguém, fica vermelha com certos tipos de conversa e parece uma santa em
pessoa quando está na sua frente: ela pode esconder uma chifradeira em
potencial.
5 – Escolha bem antes de casar. Nunca esqueça que mulher é
igual relógio: depois que der o primeiro defeito, nunca mais anda direito.
6 - Ignore chinelos e toalhas molhadas, telefone e buzine na
esquina antes de chegar em casa, use sempre a campainha e nunca, em hipótese
alguma, chegue mais cedo do trabalho.
7 – Se chegar em casa e ver alguma coisa, não esquente.
Apenas se finja de cego. Disfarce. Dê uma de João-sem-braço. Entre numas de
Stevie Wonder. Tire onda de David Assayag. Enfim, finja não estar vendo aquilo
que só o seu coração sente e o povo na rua sabe.
8 – Não dê ouvidos a boatos. Afinal de contas, chato não é
ser corno: o chato mesmo são os comentários a respeito.
9 – Se por acaso apanhar a sua mulher no flagra, não
esquente a cabeça pra não derreter o chifre que ela lhe deu com tanto amor e
carinho.
10 – Se o Ricardão for valente e principalmente muito forte,
faça como os celulares de pobre: permaneça sempre fora da área ou totalmente
desligado.
11 – Respeite o chifre alheio, porque os direitos são
iguais.
12 – Se descobrir que está sendo corneado, levante, sacuda a
poeira e dê a volta por cima: chifre cresce, mas não dói!
13 – Mesmo que pegue os dois adúlteros no ato pecaminoso em
cima da sua cama, faça de conta que não viu nada. Pelo contrário. Entre no
facebook e poste uma foto da sua mulher em pose bem sensual afirmando que é
melhor dividir pudim com os outros do que comer merda sozinho.
14 – Nunca esqueça que é melhor ser corno do que ser
prefeito! Prefeito são só quatro anos, mas corno é pra vida inteira.
15 – Não tema ser corno, porque chifre é como alma penada:
geralmente só aparece pra quem tem medo.
– Se mesmo seguindo todos esses conselhos você ainda assim
for chifrado, não se desespere: na Associação de Cornos de Itacoatiara há vagas
e no Chifral do Barão sempre cabe mais um! – diz o eterno gozador Ezilane
Viana.
Quando visitar Itacoatiara, dê uma passadinha no restaurante
Chifral do Barão.
Você não vai se arrepender.
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