Mouzar Benedito (*)
Parece óbvia a pergunta, a Fifa, todos sabemos, já escolheu
o tatu-bola que, coitado, recebeu um nome pra lá de infeliz, Fuleco. Ele está
escolhido e pronto, não é? Não, não é. O Fuleco é mascote da Fifa.
Não vi até hoje o coitado ser tratado como mascote pelo
povo. E o povo tem razão: não fomos nós que o escolhemos.
Seus aparecimentos nos gramados são burocráticos e sem
graça, sem aplausos, sem ganhar a simpatia de ninguém.
O Fuleco é mascote dos bastidores, da manipulação de grana,
dos burocratas.
Saci, o mascote do povo
Tenho ouvido muita gente declarando apoio ao Saci para ser
mascote. Mas mascote do povo, não da Fifa.
Deixemos que o Fuleco compareça aos estádios junto com
estrangeiros e com brasileiros que têm grana pra ir lá.
Nos bares, em casa, nas reuniões de amigos para assistir aos
jogos, o Saci há de ser o escolhido e comemorado.
Nós o havíamos indicado, com um monte de justificativas.
Relembro algumas:
Ele é de origem indígena, tornou-se negro e “ganhou” o
gorrinho mágico presente em muitos mitos europeus, então é uma espécie de
síntese da formação do povo brasileiro, que é uma mistura desses três grandes
povos, além dos orientais que vieram pra cá quando a figura do Saci já estava
pronta.
Ele é negro, como a maioria dos nossos jogadores de futebol,
e essa negritude, num país que não superou o racismo, é importante como símbolo
de uma luta por igualdade.
É também perneta, o que representa outra bandeira de luta
nestes tempos que se fala tanto de inclusão. Além disso é e pobre, não tem nem
roupa, e mora no mato.
Com três motivos para ser “infeliz”, ele é gozador,
brincalhão, aprontador, divertido. Enfim, um brasileiro autêntico, dos bons.
Ele é um ser libertário. Uma das lendas sobre a perda de uma
das pernas do Saci é que quando se tornou negro ele foi escravizado por um
fazendeiro e era mantido à noite, na senzala, preso a um tronco por uma perna,
com grilhões.
Uma noite, ele cortou a perna presa e fugiu: preferia ser um
perneta livre do que um escravo de duas pernas.
Hoje em dia fala-se tanto em ecologia, proteção e
recuperação do meio ambiente... E aí está o Saci de novo, como protetor da
floresta.
Ele é popular, conhecido de todos os brasileiros, e existem
desenhos dele feitos por um montão de gente, e até as crianças o desenham e se
divertem com ele.
Aí está um motivo para ele não ser o escolhido da Fifa: não
dá lucro aos mercenários do esporte. Inventaram uma mascote (nada contra o
tatu-bola) e registraram três nomes como marcas pertencentes à Fifa para depois
anunciar a escolha e pôs os três nomes em votação pela internet, os três
horrorosos.
Nem ao menos tiveram a dignidade de deixá-lo com seu próprio
nome, tatu-bola. Virou Fuleco.
O Saci faz parte da nossa cultura popular e, se fosse
“eleito”, seria assumido pela população, ao contrário do tal Fuleco, pra quem
todo mundo torce o nariz.
Então, repito, vamos torcer para que se realize no Brasil
uma bela Copa do Mundo, apesar da submissão do país à Fifa, e que a seleção
brasileira jogue bonito e vença.
Mas protestando contra a corrupção, contra os desmandos da
Fifa, contra a mercantilização do esporte e contra tudo de ruim, todas as
tramoias que tentam nos enfiar goela abaixo.
E festejando o que tem de bom: a alegria do futebol bem
jogado e bonito, a nossa riquíssima cultura, o nosso jeito de ser e viver.
Que a Fifa reine em
outras plagas. Aqui é Saci!
O Fuleco estará nos estádios superfaturados da Copa? Pois
bem, nas ruas, nas praças que queremos que continuem sendo do povo,
festejaremos com o Saci.
Que cada um o desenhe, pinte, faça escultura dele com sua
arte e sua criatividade, não tem que ser “um” Saci oficial, imposto.
Muitos cartunistas devem oferecer criações bem-humoradas do
Saci Mascote, para serem usadas por quem quiser.
Mas quem não quiser nenhuma delas pode desenhar, pintar ou
esculpir seu próprio Saci, o Saci do seu grupo, da sua turma.
Os Sacis são democráticos. Ninguém vai pagar royalties em
nome dele.
Enfim, viva o Saci, mascote do povo na Copa do Mundo de
2014, no Brasil.
Não nos submeteremos a nenhum império. Que a Fifa vá reinar
em outras plagas!
(*) Mouzar Benedito,
mineiro de Nova Resende, é geógrafo, jornalista e também sócio fundador da
Sociedade dos Observadores de Saci (Sosaci)
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