Cleber Teixeira e Leila Míccolis na Feira do Livro de Blumenau
Leila Míccolis é carioca, tem mais de 30 livros editados (poesia e prosa), com obras publicadas na França, México, Colômbia, África, Estados Unidos e Portugal, além de teatróloga, roteirista de cinema e escritora de novelas de tv, entre elas “Kananga do Japão”, “Barriga de Aluguel” e “Mandacaru”.
Elaborou verbetes para a “Enciclopédia de Literatura Brasileira” (MEC/OLAC) e também publicou: “Catálogo da Imprensa Alternativa”, 1986, pela RioArte/Prefeitª do RJ.
Publicada na Revista Poesia Sempre (Biblioteca Nacional/MEC), consta do Banco de Dados Informatizados do Banco Itaú - Módulo Literatura Brasileira, Setor Poesia (categoria: “Tendências Contemporâneas”) e dos “Cadernos Poesia Brasileira” - vol. 4, “Poesia Contemporânea”, editado pela mesma instituição, 1997.
Sua obra é citada e analisada por escritores como: Affonso Romano de Sant’Anna (Ed. Vozes/1978), Glauco Mattoso (Ed. Brasiliense/1981), Jair Ferreira dos Santos (idem/1986), Assis Brasil (Ed. Imago/FBN/UMC, 1998).
Co-edita Blocos, com Urhacy Faustino, revista impressa e eletrônica (www.blocosonline.com.br) e é Mestre em Ciência da Literatura/Teoria Literária na UFRJ, com Bolsa de Pesquisa pelo CNPq. Eis alguns de seus poemas:
Ponto de vista
Eu não tenho vergonha
de dizer palavrões
de sentir secreções,
vaginais ou anais.
As mentiras usuais
que nos fodem sutilmente,
essas sim são imorais,
essas sim são indecentes.
Atirador de facas
Arrancar as vendas
e acompanhar,
de olhos abertos,
a trajetória do punhal,
cravado em nosso corpo, em nosso peito,
a cada amor desfeito.
Engorda
Ilusões para os aflitos
para a mulher, segurança,
para a casa, samambaias;
consolo para os doentes,
conselhos aos desgarrados,
aos leitos de amor, cambraias.
Sorvete para as crianças,
esmolas para os famintos,
para os turistas as praias;
para os homens, futebol,
televisão para todos
e alface para as cobaias.
LIBERALidade
Há quem fale em "poder jovem"...
Se ele existe, que me provem,
pois se resolvo querer
o que os pais não estão a fim,
dizem que eu não tenho idade,
nem sequer maturidade
pra saber o que é bom pra mim.
Como eu prefiro as verdades
mesmo que sejam ruins
concluo olhando os meus brins
que poder jovem é escolher
a marca da calça JEANS...
Coprofagia
Tenho medo
de te mandar à merda
e gostares.
Democracia
A índia enrabada,
a negra explorada,
a branca fodida,
direitos iguais.
Na vida
Não sou comportada.
Puta e lésbica
e o que mais me der na telha,
pareço um pássaro
procurando espantalhos e alçapões,
querendo me expandir como sono
em pálpebras cansadas,
explodir em violência
no silêncio dos acomodados.
Puta e lésbica
e o que mais me der na telha
sou a seqüência
do que o primeiro gesto desencadeia.
Ciências físicas (e contábeis)
O homem se divide
em:
cabeça, bolso e membro.
A cabeça serve para pensar em mulheres.
o bolso para pagá-las.
o membro para fodê-las.
Mais alguma pergunta?
Reprodução
Trepamos como dois coelhos
para fazermos fedelhos
que dos pais serão espelho,
e treparão como coelhos.
Mau tempo
Coração assustado
à espreita de aparições,
temor constante,
o sobressalto até pelos estalos da madeira,
pelas sombras, pesadelos
e todas as tocaias que rondam o escuro,
e a perspectiva sombria
de não se estar vivo
no outro dia.
Vingança
Esmagar em silêncio
a palavra engolida e fingir-se contente.
Escolher em silêncio
o momento preciso
e escondê-lo no ventre.
Planejar em silêncio
a cobrança do medo
e sorrir entredentes.
Manchas
Cansada de brigar e botar banca,
num dos raros momentos de ternura,
eu hasteei minha bandeira branca
um tanto amarelada de gordura.
Três números de mágica
O espetáculo começa:
faço sair da cartola
televisões a cores,
automóveis
e imóveis
Em 180 prestações.
Depois te serro ao meio no caixão,
para salvar-te a seguir:
surges inteiro e pareces tão ileso
que nem dá para notar-se a castração.
Por último me cobres abracadabra
e volto ao tempo de menina
tirando da vagina objetos contundentes
que fizeram a minha vida e o meu hímen
complacentes.
Intuição
Ter nas pessoas
a confiança dos gatos,
que fecham os olhos
e esticam o pescoço,
na certeza do carinho.
Substituição
No meu prédio
compraram a área da frente,
toda arborizada,
para enfeitar a entrada.
Depois, acharam bobagem,
destruíram a paisagem,
e a transformaram
Em
por amor à ecologia,
puseram, no mesmo dia,
papel pintado no hall
no qual se vê, sob o sol,
em nuances coloridas,
lindas árvores floridas...
Pena de morte
Eram bastante bons
aqueles tempos de ódio,
em que planejávamos nossos assassinatos,
pelo simples prazer de nos vingarmos:
eu te via com os dedos na tomada,
tu me vias sufocada pelo gás.
Tempos em que sorrias ao atravessar a rua,
e eu achava graça em ser atropelada;
tempos em que queríamos fazer um filho,
para espancarmos juntos,
nos dias de ócio;
em que eu te servia de escarradeira,
em vez de cozinheira e passadeira.
Depois, veio o amor,
que é como um lenço em que se assoa,
ou mãe que chicoteia e nos perdoa.
Hoje afago-te as corcovas
e lustro-te as botas novas.
Referencial
"Solteira de aceso facho
precisa logo de macho;
se é nervosinha a casada
só pode ser mal trepada;
viúva cheia de enfado
tem saudade do finado;
puta metida a valente
quer cafetão que a esquente.
Mulher não vive sem homem.
A prova mais certa disto
é que até as castas freiras
são as esposas... de Cristo.
Tal regra é tão extremista
que não contém exceção:
quem sai dela é feminista,
fria, velha ou sapatão".
E é com essa bagagem de preconceitos adquiridos
que chega-se à conclusão,
na separação de amores doloridos,
de que não houve culpados.
Só feridos.
Pacifismo
Das folhas dos pinheirais
faz-se a folha de papel
e faz-se o papel-dinheiro...
Dos seios dos seringais,
do seu leite empedernido,
sangrado através das rachas,
autores e industriais
nutrem-se até da borracha.
Daí, se ouvimos dizer,
que a literatura pode ser
das armas, a mais cruel,
é talvez devido ao fato
de que o ato de escrever,
com conseqüências funestas,
traga em seu bojo aborteiro
a matança de pinheiros,
e a extinção de florestas.
Sendas estelares
Eu fui um dia rainha
e o meu reino se estendia
do quarto até a cozinha,
mas depois foi restringido:
em vez de amante, o marido,
em vez de gozos, extratos.
Agora nem isso tenho
Apenas restam-me os pratos.
A seco
Tem coisas que a gente só diz de porre
se não o outro corre;
mas passada a bebedeira,
a gente acha que fez besteira,
não devia ter falado,
que se expôs adoidado,
à toa e foi tolice.
Finge-se então que se esquece o que disse,
culpa-se a carência, a demência, a embriaguez
responsáveis por tamanha estupidez.
E é aceitando este estranho cabedal
que quando se volta ao “estado normal”,
cada vez mais sós, na defensiva,
corroídos morremos de cirrose... afetiva.
Lembrete
Responsáveis
pela Terra
todos somos.
NÃO PISE NA GRAMA!!!
Gnomos...
Para conhecer um pouco mais sobre Leila Míccolis acesse http://www.blocosonline.com.br/sites_pessoais/sites/lm/index.htm
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