Nicolas Behr (Nikolaus von Behr) nasceu em Cuiabá, Mato Grosso, em 1958. Estudou o primário com padres salesianos, em Diamantino, onde os pais eram fazendeiros. Mudou-se para a capital aos 10 anos e sonhava ser geólogo. Mora em Brasília desde 74.
O livrinho se transformou no maior “best seller” da poesia marginal. Tirou mais de 8 mil exemplares, sempre de mão em mão, vendido apenas pelo autor em suas perambulações pelo campus, a rodoviária, bares e entrequadras.
Em 1978, após lançar Grande Circular, Caroço de Goiaba, Bagaço e Chá com Porrada, foi preso pelo DOPS por “ posse de material pornográfico” (na verdade, por suas atividades políticas no movimento estudantil) sendo julgado e absolvido no ano seguinte. O Dr. D’Alambert Jaccoud foi seu advogado. Foi um processo tão absurdo e surrealista, que Nicolas Behr acabou nas Páginas Amarelas da revista Veja para contar sua versão dos fatos.
De lá pra cá dedica-se à produção e comercialização de mudas, seu antigo “hobby”, sendo pioneiro na produção de mudas de espécies nativas dos cerrados, especializando-se em palmeiras e em frutas e árvores raras. Voltou a publicar seus livros de poesia a partir de 1993, com Porque Construí Braxília.
Sócio-Gerente da Pau-Brasília viveiro.eco.loja. Casado com Alcina Ramalho desde 1986, tem três filhos: Erik (1990) Klaus e Max (gêmeos – 1992). Mora na Península Norte.
É o caso dos desenhos presentes em Grande circular, que trocam as críticas ao Congresso por “brincadeiras” que fazem dos prédios do Senado e da Câmara lápis, carrinho, gilete, Palácio do Planalto. Não é à toa que uma das acusações da Justiça aponte os desenhos como provas contra o denunciado. E também não é à toa que tais críticas perdurem e sejam tão atuais quase 30 anos depois…
A par de seu valor como poesia e crítica, no entanto, Restos vitais oferece outros sabores a serem curtidos. “O nome dá a pista: o que sobrou do que fui, mas que ainda me mantém vivo”, explica Nicolas Behr. “Não são restos mortais, portanto. São vitais. São indícios de presente vindos direto do passado, são histórias, testemunho de um tempo que muitos não viveram, mas que podem vivenciar por intermédio do poeta.”
*
se é para bem de todos
e felicidade geral da nação
diga ao povo
que direitos, direitos
humanos à parte
*
se é para o bem de todos
e felicidade geral da nação
diga ao povo
que fique
*
se é para o bem de todos
e felicidade geral da nação
diga ao rei
que o povo fica
*
se é para o bem de todos
e felicidade geral da nação
diga ao povo
que a entrada é pelos fundos
*
quem teve a mão decepada
levante o dedo
*
Deus está morto
Marx está morto
eu estou morto
vou enterrar os três
depois de amanhã
*
ninguém me ama
ninguém me quer
ninguém me chama Nicolas Behr
*
o telefone toca
a vida
tá
por um fio
*
não vou com tua cara
nem a pau
...
não sou oito
nem oitenta
sou oitenta e oito
...
hoje andei
feito um pedestre
...
meu nome de guerra?
gregório de mattos
...
meus caninos
tão doendo
pra cachorro
*
sou um poeta
sem eira nem beira
ninguém me chama
Manuel Bandeira
*
a poesia não morreu
ela tá apenas
enterrando a gente
*
você tem uma hora de prazo
pra escovar os dentes
pagar suas dívidas
comprar um carro zerinho
e dar um tiro na cabeça
*
matei a aula no recreio
estrangulei o professor na sala de espera
esquartejei meu colega de banheiro
esfolei o professor no intervalo
torturei o porteiro na saída
passei em todos os vestibulares da vida
*
na quinta-feira
da semana passada
esqueci minha boca
dentro do armário
naquele dia
não mordi ninguém
*
xingar um cara desse
de filho da puta dá cadeia?
*
entro na sala
sem pedir licença
sem por favor
sem muito obrigado
vou direto ao assunto
como vai?
tudo bem?
saio sem fechar a porta
*
enfim, era preciso sabe
quanto cimento será gasto
numa ponte por onde ninguém
passará de mãos dadas
MANCHETE DE 2001
OBJETOS VOADORES
NÃO IDENTIFICADOS
SOBREVOAM A CIDADE
(eram duas borboletas)
A VOLTA DO POETA
Depois de depor no DOPS
voltou pra casa angustiado
abraçou-se à máquina de escrever
e datilografou:
- Poesia,
aqui me tens de regresso...
AMORZINHO
amorzinho
me deixou
amorzinho
tem um defeito
não pode ver homem
BRAXÍLIA (RECOMPOSIÇÃO)
*
começa a demolição
quero pra mim
os anjos da catedral
*
a última coisa
que quero fazer
em brasília é morrer
*
estou salvo:
a poesia não é tudo
*
centro cultural
nicolas behr?
nem morto
PALAVRA FINAL
amai-vos uns aos outros
e o resto que se foda
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