O escritor Ariano Suassuna não resistiu a complicações de um
AVC hemorrágico e faleceu nesta quarta-feira (23), aos 87 anos, no Recife.
Paraibano, radicado em Pernambuco, o autor de Auto da Compadecida estava
internado no Real Hospital Português, no bairro da Ilha do Leite, desde a
segunda-feira (21).
Ele sofreu uma parada cardíaca às 17h15, de acordo com
comunicado da instituição.
Ariano não morreu só. Porque, como disse o próprio autor em
uma das inúmeras entrevistas que concedeu: “quem gosta de ler não morre só”. E
ler era uma paixão de Ariano desde pequenino. Assim como escrever. Foram 15
livros de romance e poesia, além de 18 espetáculos de teatro.
A última atividade pública do escritor foi na sexta-feira
(18), quando concedeu uma aula-espetáculo no Festival de Inverno de Garanhuns
(FIG), no Agreste. Na manhã do sábado (19), tirou fotos com fãs que
participavam do evento.
“Não gosto da ideia de ter medo de morrer. Sou paraibano e
não gosto de confessar que tenho medo (risos). Eu conheço a palavra ‘medo’,
porque li no dicionário”, declarou Ariano em recente entrevista ao Correio
Braziliense.
Ariano deixa cinco filhos – Maria, Manoel, Isabel, Mariana e Ana –
e a esposa, Zélia de Andrade Lima, com quem era casado desde 1957. O casal teve
ainda outro filho, Joaquim, que cometeu suicídio em 2010.
Vida
Ariano Vilar Suassuna nasceu em Nossa Senhora das Neves,
hoje João Pessoa, na Paraíba, em 16 de junho de 1927, filho de Cássia Villar e
João Suassuna. Após a Revolução de 1930, seu pai foi assassinado no Rio de
Janeiro e a família mudou-se para Taperoá, no Sertão da Paraíba, onde morou até
1937.
O escritor de Romance d’A pedra do reino só veio ao Recife
em 1942, para dar continuidade aos estudos e, posteriormente, ingressar na
Faculdade de Direito. Depois de exercer a profissão de advogado por alguns
anos, abandonou o ofício para ensinar estética na Universidade Federal de
Pernambuco.
Depois de 38 anos, Ariano se aposentou e se dedicou a
ministrar aulas-espetáculo, formato em que ele aproveitava para contar
histórias, defender a cultura popular, fazer críticas e elogios. Com as
apresentações, percorreu teatros, escolas, congressos e centros culturais do
país inteiro, às vezes acompanhado de uma trupe de músicos e dançarinos, outras
vezes sozinho.
Foi membro fundador do Conselho Federal de Cultura (1967);
nomeado, pelo Reitor Murilo Guimarães, diretor do Departamento de Extensão
Cultural da UFPE (1969). Ligado diretamente à cultura, iniciou em 1970 o “Movimento
Armorial”, interessado no desenvolvimento e no conhecimento das formas de
expressão populares tradicionais.
Ariano foi secretário de Cultura do Estado de Pernambuco, no
Governo Miguel Arraes (1994-1998), membro da Academia Paraibana de Letras
(APL/PB), Academia Pernambucana de Letras (APL/PE) e da Academia Brasileira de
Letras (ABL). Em 2004, com o apoio da ABL, a Trinca Filmes produziu o
documentário O Sertão: Mundo de Ariano Suassuna, dirigido por Douglas Machado.
Era torcedor fanático do Sport Clube do Recife.
Por muito tempo, Ariano teve um modo trágico de ver a vida,
refletida nas suas primeiras obras. Depois que conheceu a companheira Zélia, em
1951, passou a ter uma visão menos dolorosa do mundo, o que abriu espaço para a
veia cômica nos textos. Ariano conheceu Zélia quando tinha 17 anos, e ela 13,
mas só viriam a namorar três anos depois.
“Foi um encontro fundamental para mim. Até o ano de 1951 eu
só escrevia tragédia. Eu nunca tinha procurado canalizar para o teatro uma veia
cômica que as pessoas da minha família normalmente têm. Os Suassuna, de modo
geral, são bons contadores de história. Depois de conhecer Zélia e entrar no
Teatro do Estudante foi que comecei a usar esta veia cômica. Eu acredito que o
teatro e a arte, de um modo geral, me ajudaram com relação a isto, mas também
não posso esquecer a colaboração da minha mulher”, afirmava, em 2005.
Principais obras
Linha de tempo
1927 – Nasce em 16 de junho, no Palácio da Redenção, sede do
governo da Paraíba. Filho de João Urbano Pessoa de Vasconcelos Suassuna e Rita
de Cássia Dantas Villar, era o oitavo filho de uma família que teria, ao todo,
nove herdeiros. Naquela época, a capital paraibana, atual João Pessoa,
chamava-se Nossa Senhora das Neves. Então presidente do estado (hoje um
governador), João Suassuna pensou em dar à criança o nome de Pedro, mas
resolveu homenagear um santo que vivera séculos antes no Egito.
1945 – Três anos depois de se mudar de vez para o Recife,
deixando a Taperoá da infância, Ariano Suassuna publica o primeiro poema:
Noturno. No colégio Oswaldo Cruz, para onde segue depois de estudar no
Americano Batista e no Ginásio Pernambucano, fica amigo de Francisco Brennand.
Todos os seus irmãos - Saulo, João, Lucas, Marcos, Germana, Beta, Selma e Magda
- agora estão estabelecidos na cidade.
1947 – Ariano escreve sua primeira peça de teatro: Uma
mulher vestida de sol. O texto conquista o prêmio Nicolau Carlos Magno, do
Teatro do Estudante de Pernambuco (TEP), mas nunca estreia - só em 1994 seria
adaptado para a TV. Concebe Cantam as harpas de Sião, que reescreveria uma
década mais tarde, como O desertor de Princesa. Ainda em 1947, um ano depois de
promover uma cantoria popular no Teatro de Santa Isabel, Ariano começa a
namorar com Zélia de Andrade Lima, na festa de aniversário de uma amiga em
comum.
1952 – Depois de duas temporadas em Taperoá, para onde fora
com o intuito de se curar da tuberculose que contraíra no Recife, Ariano volta
a Pernambuco e começa a trabalhar no escritório do jurista Murilo Guimarães. É
um jovem advogado que ao lado de Gastão de Holanda, José Laurênio de Melo,
Aloísio Magalhães, outros bacharéis em Direito, e a Orlando da Costa Ferreira,
para montar, três anos depois, O Gráfico Amador, uma sociedade que imprimiria
cerca de trinta livros em sete anos. O primeiro, a sair em 1955, é Ode, de
Ariano Suassuna.
1955 – No ano anterior, Ariano desistira da carreira na
advocacia, literalmente queimando seus livros de direito, e escrevera O rico
avarento, baseado em uma peça de mamulengo. Mas é atendendo a uma encomenda do
TEP que ele gradualmente se afasta da seara trágica para incorporar elementos
mais cômicos a seu teatro. Surge o Auto da Compadecida, que estrearia em
setembro do ano seguinte, para um Santa Isabel sem muito público.
1957 – Casa-se com Zélia em 19 de janeiro. Terão seis
filhos: Joaquim, Maria, Manuel, Isabel, Mariana e Ana. Auto da Compadecida é
encenado no I Festival de Amadores Nacionais, da Fundação Brasileira de Teatro,
no Rio de Janeiro e ganha a medalha de ouro da Associação Brasileira de
Críticos Teatrais. Ariano vence o prêmio Vânia Souto de Carvalho com O
casamento suspeitoso, montada pela Companhia Sérgio Cardoso, com direção de
Hermilo Borba Filho, em São Paulo; e a medalha de ouro da Associação Paulista
de Críticos Teatrais por O santo e a porca.
1967 – Completa uma década como professor na Universidade
Federal de Pernambuco, onde lecionou Teoria do Teatro, Estética e Literatura
Brasileira no Centro de Artes e Comunicação e História da Cultura Brasileira no
mestrado em História da UFPE. É membro fundador do Conselho Federal de Cultura,
do qual fará parte até 1973. No ano seguinte, funda também o Conselho Estadual
de Cultura de Pernambuco, que integrará até 1972. E, em 1969, é nomeado diretor
do Departamento de Extensão Cultural da UFPE pelo reitor Murilo Guimarães.
Ficará no cargo até 1974.
1970 – Em 18 de outubro, o concerto Três séculos de música
nordestina - do arroco ao Armorial e uma exposição de gravura, pintura e
escultura lançam o Movimento Armorial. Desde 1969 Ariano se juntara a Capiba,
Guerra Peixe, Jarbas Maciel e Clóvis Pereira em busca de uma música erudita
nordestina que se amalgamasse a seu teatro; à poesia de Deborah Brennand,
Janice Japiassu, Marcus Accioly e Ângelo Monteiro; à gravura de Gilvan Samico;
e romance de Maximiniano Campos. Publica poesias inéditas no volume O pasto incendiado.
1971 – É publicado o Romance d'a pedra do reino e o príncipe
do sangue do vai-e-volta pela editora carioca José Olympio; Ariano vinha se
dedicando à obra desde 1958. A história narrada por Dom Pedro Dinis Quaderna se
passa na Paraíba de 1930, e retoma fatos reais, como a tragédia da Serra do
Catolé, onde fica a verdadeira Pedra do Reino. O livro tem 635 páginas e
passaria mais de três décadas fora de catálogo, sendo reeditado somente em
2004, pela mesma editora. Ainda em 1971, A pena e a lei sai pela Livraria Agir.
1975 – O então prefeito do Recife Antônio Farias coloca
Ariano como Secretário de Educação e Cultura, cargo que exercerá até 1978. Pela
Editora Universitária, da UFPE, publica Iniciação à estética. No Diario de
Pernambuco publica os folhetins de Ao sol da onça Caetana, primeiro livro de O
rei degolado. A parceria com o Diario segue até 1977, com o fim d'As infância
de Quaderna e o início de artigos dominicais (A confissão desesperada). Ainda
no Diario, Ariano, em 1981, escreve uma carta “pedindo sossego”, intitulada
Despedida.
1990 – Em 9 de agosto, Ariano é empossado como sexto
ocupante da cadeira 32 da Academia Brasileira de Letras, para a qual havia sido
eleito um ano antes. Vai à posse com um fardão feito por Edite Minervina, costureira
recifense, e com bordados criados por Cicy Ferreira, do Clube das Pás. No
discurso, cita Os sertões e Euclides da Cunha. “Se queremos, mesmo, encontrar
um caminho para nosso país, temos que segui-lo, levando adiante, na medida das
forças de cada um, a chama iluminadora daquele que foi e continua a ser a obra
fundamental para o entendimento do Brasil”.
1995 – No terceiro governo de Miguel Arraes, assume a
Secretaria de Cultura do Estado, onde ficará até 1998. Dentro do programa de
trabalho, cria o conceito de aula-espetáculo, que o levaria a percorrer
teatros, escolas, congressos e centros culturais do país inteiro, às vezes
acompanhado de uma trupe de músicos e dançarinos, outras vezes sozinho. Festeja
cinco décadas de vida literária e, ao participar da III Cavalgada à Pedra do
Reino, é coroado Cavaleiro da Pedra do Reino. Da UFPE, de onde se aposentara
desde 1989, recebe o título de professor emérito.
2002 – A escola de samba carioca Império Serrano escolhe
como tema de seu carnaval Aclamação e coroação do imperador da Pedra do Reino
Ariano Suassuna. Ele desfila na Marquês de Sapucaí, ao lado de Zélia, da
sambista Dona Ivone Lara e do vaqueiro Zeca Miron, de São José do Belmonte. Vem
também dessa pequena cidade uma plateia de 150 pessoas, que viajou de ônibus
para ver o escritor e participar do desfile. Recebe, ainda neste ano, o prêmio
nacional Jorge Amado de Literatura e Arte, concedido pela Secretaria de Cultura
e Turismo da Bahia.
2007 – Pela segunda vez, assume o cargo de Secretário de
Cultura de Pernambuco, no governo de Eduardo Campos, neto de seu amigo Miguel
Arraes (falecido em 2005). Isso ocorre nove anos depois de se despedir da vida
pública e política, em carta publicada nos jornais, para se dedicar ao novo
livro. Convoca artistas populares para assessorá-lo na secretaria. Comemora
bodas de ouro com Zélia e acompanha as comemorações dos seus 80 anos, que
incluem homenagens, novas publicações e a exibição da microssérie A pedra do
reino, de Luiz Fernando Carvalho.
2011 – Torna-se secretário da Assessoria ao Governador.
2013 – Sofre infarto do miocárdio e posterior derrame e
permanece internado por seis dias no Hospital Real Português. Em dezembro,
volta a realizar aulas-espetáculo, após quatro meses de recuperação.
2014 – Ariano foi o homenageado do Galo da Madrugada, no
Carnaval do Recife. Em abril, também recebeu homenagem na 2ª Bienal do Livro de
Brasília. A escola de samba Unidos de Padre Miguel informou que o escritor será
tema do desfile de 2015, com o enredo O cavaleiro armorial mandacariza o
Carnaval, escrito pelo carnavalesco Edson Pereira.
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