Duda Machado
Uma dupla condenação vem mantendo a poesia erótica e
satírica e os poemas humorísticos de Bernardo Guimarães (1825-1884) longe dos
leitores e do lugar de destaque que merecem.
De um lado, um juízo crítico equivocado subestima a parte
mais viva de sua obra poética em nome de critérios que privilegiam a eloquência
sentimental e a dicção indianista do romantismo brasileiro.
De outro lado, uma inexplicável e espantosa atitude de
consentimento à censura vem confinando – há mais de 140 anos – a publicação de
poemas como “Elixir do Pajé” e “A Origem do Mênstruo” a edições clandestinas
cada vez mais raras.
Nas últimas décadas, a criativa linguagem de humor e sátira
de Bernardo Guimarães vem sendo devidamente reavaliada por poetas e críticos
como Haroldo de Campos, Luiz Costa Lima e Flora Sussekind.
No entanto, o sabor desta poesia continua ignorado pelos
leitores. Divulga-lo é parte imprescindível de sua reavaliação.
A qualidade de poemas como os dois citados anteriormente e
mais “A Orgia dos Duendes” supera amplamente a maior parte da produção do
romantismo brasileiro, tão débil e tão divulgado.
Mais ainda: estes poemas – ao lado de muitas outras peças de
humor e bestialógico – constituem a mais divertida e consistente crítica às
debilidades e convenções deste romantismo.
A linguagem destes poemas – marcada pelo humor, pela paródia
e pela sátira – é uma inventiva demolição de temas, clichês e convenções
poéticas. E, deste ângulo, dialoga à sua maneira com parte essencial do
modernismo brasileiro.
Publicado no dia 7 de maio de 1875, numa impressão
clandestina feita em Ouro Preto (MG), “Elixir do Pajé” tem como alvo o ritmo e
a retórica de Gonçalves Dias em poemas como “I-Juca Pirama” e “Os Timbiras”,
expressões máximas da imagem sublime do índio.
Só em Oswald de Andrade (“O Santeiro do Mangue”) e Gregório
de Matos encontra-se algo próximo a esta grossa prosa de palavrões, erotismo
satírico e escatológico, tramada em tão inventiva poesia antipoética.
Por fim, um lembrete: Bernardo Guimarães, o
autor desta “Trilogia Sacana”, é em tudo avesso ao romancista que ganhou fama
com o clássico “A Escrava Isaura”.
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