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domingo, abril 10, 2016

A Origem do Mênstruo


Bernardo Guimarães

(De uma fábula inédita de Ovídio, achada nas escavações de Pompéia e vertida em latim vulgar por Simão de Nuntua)

Stava Vênus gentil junto da fonte
fazendo o seu pentelho,
com todo o jeito, pra que não ferisse
das cricas o aparelho.
Tinha que dar o cu naquela noite
ao grande pai Anquises,
o qual, com ela, se não mente a fama,
passou dias felizes...

Rapava bem o cu, pois resolvia
na mente altas idéias:
– ia gerar naquela heróica foda
o grande e pio Enéias.

Mas a navalha tinha o fio rombo,
e a deusa, que gemia,
arrancava os pentelhos e, peidando,
caretas mil fazia!

Nesse entretanto, a ninfa Galatéia,
acaso ali passava,
e vendo a deusa assim tão agachada,
julgou que ela cagava...

Essa ninfeta travessa e petulante
era de gênio mau,
e por pregar um susto à mãe do Amor
atira-lhe um calhau...

Vênus se assusta. A Branca mão mimosa
se agita alvoroçada,
e no cono lhe prega (oh! caso horrendo!)
tremenda navalhada.

Da nacarada cona, em sutil fio,
corre pupúrea veia,
e nobre sangue do divino cono
as águas purpureia...

 (É fama que quem bebe dessas águas
jamais perde a tesão
e é capaz de foder noites e dias,
até no cu de um cão!)

– “Ora porra” – gritou a deusa irada,
e nisso o rosto volta...
E a ninfa, que conter-se não podia,
uma risada solta.

A travessa menina mal pensava
que, com tal brincadeira,
ia ferir a mais mimosa parte
da deusa regateira...

– “Estou perdida!” – trêmula murmura
a pobre Galatéia,
vendo o sangue correr do róseo cono
da poderosa déia...

Mas era tarde! A Cípria, furibunda,
por um momento a encara,
e, após instantes, com severo acento,
nesse clamor dispara:

“Vê! Que fizeste, desastrada ninfa,
que crime cometeste!
Que castigo há no céu, que punir possa
um crime como este?!

Assim, por mais de um mês inutilizas
o vaso das delícias...
E em que hei de gastar das longas noites
as horas tão propícias?

Ai! Um mês sem foder! Que atroz suplício...
Em mísero abandono,
que é que há de fazer, por tanto tempo,
este faminto cono?...

Ó Adonis! Ó Júpiter potentes!
E tu, mavorte invito!
E tu, Aquiles! Acudi de pronto
da minha dor ao grito!

Este vaso gentil que eu tencionava
tornar bem fresco e limpo
para recreio e divinal regalo
dos deuses do Alto Olimpo.

Vede seu triste estado, ó! Que esta vida
em sangue já se esvai-me!
Ó Deus, se desejais ter foda certa
vingai-vos e vingai-me!

Ó ninfa, o teu cono sempre atormente
perpétuas comichões,
e não aches quem jamais nele queira
vazar os seus colhões...

Em negra podridão imundos vermes
roam-te sempre a crica
e à vista dela sinta-se banzeira
a mais valente pica!

De eterno esquentamento flagelada,
verta fétidos jorros,
que causem tédio e nojo a todo mundo,
até mesmo aos cachorros!”

Ouviu-lhe estas palavras piedosas
do Olimpo o Grão-Tonante,
que em pívia ao sacana do Cupido
comia nesse instante...

Comovido no íntimo do peito,
das lástimas que ouviu,
manda ao menino que, de pronto, acuda
a puta que o pariu...

Ei-lo que, pronto, tange o veloz carro
de concha alabastrina,
que quatro aladas porras vão tirando
na esfera cristalina

Cupido que as conhece e as rédeas bate
da rápida quadriga,
co'a voz ora as alenta, ora co'a ponta
das setas as fustiga.

Já desce aos bosques onde a mãe, aflita,
em mísera agonia,
com seu sangue divino o verde musgo
de púrpura tingia...

No carro a toma e num momento chega
à olímpica morada,
onde a turba dos deuses, reunida,
a espera consternada!

Já Mercúrio de emplastros se a aparelha
para a venérea chaga,
feliz porque naquele curativo
espera certa a paga...

Vulcano, vendo o estado da consorte,
mil pragas vomitou...
Marte arranca um suspiro que as abóbadas
celestes abalou...

Sorriu o furto a ciumenta Juno,
lembrando o antigo pleito,
e Palas, orgulhosa lá consigo,
resmoneou: – “Bem-feito!”

Coube a Apolo lavar dos roxos lírios
o sangue que escorria,
e de tesão terrível assaltado,
conter-se mal podia!

Mas, enquanto se faz o curativo,
em seus divinos braços,
Jove sustém a filha, acalentando-a
com beijos e com abraços.

Depois, subindo ao trono luminoso,
com carrancudo aspecto,
e erguendo a voz troante, fundamenta
e lavra este DECRETO:

– “Suspende, ó filha, os lamentos justos
por tão atroz delito,
que no tremendo Livro do Destino
de há muito estava escrito.

Desse ultraje feroz será vingado
o teu divino cono,
e as imprecações que fulminaste
agora sanciono.

Mas, inda é pouco: – a todas as mulheres
estenda-se o castigo
para expiar o crime que esta infame
ousou para contigo...

Para punir tão bárbaro atentado,
toda humana crica,
de hoje em diante, lá de tempo em tempo,
escorra sangue em bica...

E por memória eterna chore sempre
o cono da mulher,
com lágrimas de sangue, o caso infando,
enquanto mundo houver...”

“Amém! Amém!”, com voz atroadora
os deuses todos urram!
E os ecos das olímpicas abóbadas,
“Amém! Amém!”, sussurram... 

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