Espaço destinado a fazer uma breve retrospectiva sobre a geração mimeográfo e seus poetas mais representativos, além de toques bem-humorados sobre música, quadrinhos, cinema, literatura, poesia e bobagens generalizadas
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terça-feira, novembro 24, 2009
O dia em que Evandro Carreira parou a cidade
Evandro Carreira nasceu em Alvarães, antiga Caiçara, município de Tefé, em 24 de agosto de 1927, se formou em Direito pela Universidade do Amazonas e sagrou-se o melhor orador universitário do Brasil, em concurso realizado na Universidade do Brasil, no Rio de Janeiro.
Ex-presidente do Diretório Acadêmico da Faculdade de Direito, foi o segundo vereador mais votado de Manaus pelo PST, em 1959. Reelegeu-se em 1963, no mesmo ano em que Josué Cláudio de Souza, diretor da rádio Difusora, elegeu-se prefeito de Manaus pelo PTB.
Ex-deputado estadual por três legislaturas e ex-deputado federal, o saudoso Josué Pai, que sempre foi um homem honesto e prestativo, pagou um preço muito alto por confiar demais nos seus subordinados.
Ao fazer vista grossa para o balcão de negócios em que seus auxiliares transformaram a Prefeitura, virou um alvo fixo da oposição.
Em julho de 1964, o vereador Rodolfo Vale (PST) entrou com um processo de “impeachment” contra o prefeito, por improbidade administrativa, e foi instalada uma CPI.
Evandro, que era amigo particular de Josué Pai, foi conversar com ele e explicou a situação. O prefeito preferiu acreditar na versão dos subordinados. Os dois brigaram feio.
A Comissão Parlamentar de Inquérito era composta por cinco vereadores, sendo que três deles (João Bosco Ramos de Lima, Zé Marques e Ismael Benigno) eram funcionários da Difusora. Os três votaram um parecer inocentando o prefeito e o parecer foi levado para votação no plenário.
Evandro ficou revoltado com o resultado da CPI.
Às nove horas da manhã, o presidente da Câmara Municipal de Manaus, vereador Zânio dos Reis, abriu a sessão:
– Vamos colocar em votação o parecer...
– Não pode, porque você é filho da puta! – berrou Evandro, partindo pra cima do presidente.
O edil ficou tão assustado que desmaiou. A sessão foi suspensa por quase cinco horas.
Por volta das duas da tarde, o vice-presidente da Câmara, vereador Raimundo Aleixo, retomou os trabalhos. Evandro bateu firme:
– Aleixo, eu sou teu amigo, mas não coloca esse parecer pra ser votado com esses três em plenário. Eles têm de se julgarem impedidos! Tem que ser feito um outro parecer, porque eles impuseram esse parecer na CPI e agora querem impor aqui no plenário. Não pode!
Aleixo reabriu a sessão e colocou o parecer em votação. Evandro arremessou um cinzeiro, que passou tirando “fino” da cabeça do vereador e se espatifou na parede.
Aos gritos de “filhos da puta, bando de ladrões!”, Evandro partiu pra cima da mesa diretora. A sessão foi suspensa de novo.
Os vereadores decidiram matar o “brigão” no cansaço. Começaram a se revezar na Câmara, esperando Evandro se ausentar do plenário. Quando isso acontecesse, eles votariam e aprovariam o parecer.
Seis horas da tarde, um cunhado de Evandro foi saber o que estava acontecendo. Ele explicou a situação e pediu que seu cunhado trouxesse armas e munição. Onze da noite, Evandro continuava na bancada. Passou a noite lá.
No dia seguinte, Aleixo e mais quatro vereadores resolvem abrir a sessão (Manaus tinha onze vereadores na época e a CMM funcionava no salão nobre da antiga Prefeitura). O placar seria de 5 a 1 e dariam os trâmites por findo.
Quando Aleixo abriu a boca, Evandro sacou uma pistola 7.65 e um 38 duplo cano longo, e engatilhou as armas. Não ficou uma alma viva no plenário nem nas galerias.
Duas horas depois, o vereador João Bosco criou coragem e foi falar com ele. Evandro não se fez de rogado:
– Olha, Bosco, eu estou louco! – avisou. “Se vocês colocarem esse parecer em votação, eu vou atirar pra matar! E o primeiro que vai morrer é quem estiver presidindo a sessão.”
Evandro ficou na bancada o dia inteiro, igual a um Bill the Kid anacrônico. A sessão ainda suspensa.
Por volta das nove da noite, chega o vereador Paulo Nery (licenciado e Chefe de Polícia do governador Artur Reis), na companhia de vários oficiais da PM e soldados. Evandro contou o que estava acontecendo.
Preocupado com a zorra que estava acontecendo, o governador queria falar com o “brigão”. Evandro concordou em ir até ao Palácio Rodoviário, desde que fosse garantido que na sua ausência não haveria sessão para aprovar o famigerado parecer.
Paulo Nery telefonou para o governador e ele concordou. Um major e quatro soldados ocuparam o plenário da Câmara.
Quando Evandro e Paulo Nery chegaram na casa do governador, nos altos do Palácio Rodoviário, já estavam lá o general Álvaro Santos, comandante do GEF, e meia dúzia de coronéis.
O general foi logo detonando:
– Em nome de quem o senhor está fazendo essa baderna na Câmara Municipal? O senhor agora virou xerife da cidade?...
Evandro não deixou por menos:
– General, eu estou me comportando assim em nome dos mesmos princípios que o senhor aprendeu na Escola Militar. Porque eu sou segundo tenente, com carta patente do Exército!
O general tomou um susto. Aí, chamou um coronel, conversaram baixinho, e ele voltou à carga:
– E daí? Qual é o direito que dá pro senhor fazer essa arruaça?...
O maninho se arretou:
– O meu direito, general, é o de lutar pelos princípios da revolução! Ou o senhor não fez a revolução?! Há corrupção na prefeitura de Manaus, general...
– Como é que o senhor prova? – insistiu o militar.
Evandro estendeu-lhe um calhamaço, com um parecer técnico proferido por um capitão de engenharia do Exército, confirmando o superfaturamento de obras e a utilização de material inadequado. O general ficou pasmo.
Evandro deixou a casa do governador e voltou para o plenário da Câmara, onde ficou de campana. Passou o resto da noite sem pregar os olhos.
Na manhã seguinte, na abertura da sessão, o vereador João Bosco, líder do prefeito na Câmara, leu a carta de renúncia de Josué Pai.
Só então Evandro deixou a CMM e foi pra casa dormir, depois de passar 54 horas no plenário.
Em outubro de 1964, com base no relatório da CPI, o governador Artur Reis demitiu Josué Pai do cargo de Juiz do Tribunal de Contas e o indiciou pelo crime de responsabilidade.
Absolvido das acusações alguns anos depois, o combativo radialista da “Crônica do Dia” daria a volta por cima, se elegendo deputado federal mais duas vezes.
Evandro Carreira se afastou da política em 68 para exercer a advocacia, sendo considerado durante muito tempo “a voz dos que não tinham vez”, já que não cobrava honorários da população carente.
No início dos anos 70, ele comprou uma briga federal com a Prefeitura durante a desapropriação do lupanar “La Hoje”, onde hoje está localizada a Estação Rodoviária, ganhando a causa e uma bela indenização para o dono, que lhe valeram régios honorários.
Em 1974, foi eleito senador pelo MDB. Ecologista quando ninguém sabia o significado da palavra, Evandro ganhou o apelido de “senador pororoca” pelo discurso caudaloso que fazia (e ainda faz) em defesa da Amazônia. É um santo guerreiro!
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2 comentários:
Pois é, Simão, infelizmente não temos mais ninguém pra lutar pela nossa cidade que está entregue às baratas e a casa do povo, tornou-se antro de chacais...
Saudações.
Que pena que descobri seu blog agora, mas nunca é tarde pra descobrir coisas novas e boas. Pena que descobri numa pesquisa de achar algo sobre nosso ex senador Evandro, que infelizmente, faleceu nesse dia, e com ele morre um tipo de Homem que raramente encontraremos em nosso país quiçá em nossa cidade. Gostaria de tê-lo conhecido e apertado sua e dito: "Muito obrigado Dr. Evandro Carreira", pelo respeito ao povo e a erário público.
Que Deus receba sua alma e a guarde ao seu lado e que continue nos protegendo dos famigerados políticos.
Adeus Doutor Evandro!!!
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