O escritor Jones Cunha me exibindo a sua famosa arte plumária, no Lago de Tefé
No final dos anos 70, seu Aristides colocou uma mesa de sinuca no Top Bar e o boteco, que já vivia superlotado, começou a colocar gente pelo ladrão. Todo mundo queria tirar a barriga da miséria apostando no próprio taco.
Havia os chamados “cobras criadas”, em que se destacavam Nei Parada Dura, Alencar (aka “Baixinho”), Lúcio Preto, Frank Cavalcante, Marco Aurélio, Jones Cunha, Valdron, Carlinhos Branco, Helvécio e Guerra – os dois últimos traziam os próprios tacos importados em elegantes maletas de couro. Nessa turma, as apostas eram feitas em dinheiro.
Havia os diletantes, como Rubens Bentes, Chico Porrada, Mestre Louro, Sici Pirangy, Arlindo Jorge, Carlos Noia, Epitacinho Almeida, Ruizinho Major, Manoel Augusto, Antídio Weil, Roberto Amazonas, Sidão Soares, Nelito Bandeira e Luiz Lobão. Nessa turma, as apostas eram feitas em cerveja.
E, finalmente, havia os “patos”, ou seja, o resto da corriola. Como jamais gostei daquela ladroagem travestida de jogo sério, me limitava a olhar as partidas de longe.
O desencanado Lúcio Preto, um dos mais habilidosos naquele jogo de larápios, jogava sempre com uma latinha de Skol na mão e o taco na outra. Quero crer que era uma espécie de simpatia.
Antes de dar uma tacada, ele colocava a latinha em uma das bordas da mesa e começava a rodar a sinuca feito um peru doido, tentando encontrar a melhor jogada.
O escritor Jones Cunha, que na época era liso e confiado, aproveitava essa presepada do Lúcio Preto para pegar discretamente a sua latinha de cerveja e detonar legal.
Quando terminava sua odisseia – ele nunca matava menos de três bolas seguidas –, Lúcio Preto metia a latinha na boca e descobria, horrorizado, que o conteúdo havia se evaporado.
Sem falar nada, ele pedia nova latinha do seu Aristides e continuava jogando.
Um dia, puto da vida porque já havia perdido três partidas seguidas pro Nei Parada Dura, Lúcio Preto pediu uma nova latinha de Skol do seu Aristides, foi até o banheiro, despejou o conteúdo fora e encheu a lata de urina.
O choque térmico fez com que a lata de cerveja ficasse tipo “véu de noiva”. Ele voltou pra mesa, fingiu que dava uma golada, colocou a latinha em uma das bordas da mesa e começou a procurar a melhor jogada feito um peru doido.
Sorrateiramente, Jones Cunha pegou a latinha “véu de noiva” e deu uma golada de respeito, disposto a detonar o conteúdo todo de uma só vez.
Alguns segundos depois, ele ficou pálido feito um defunto vítima de hepatite e começou a cuspir o líquido de volta, emporcalhando o piso do bar. Ninguém entendeu nada.
Lúcio Preto, que havia acabado de concluir sua jogada, se aproximou dele e sussurrou em seu ouvido:
– Qualé, bicho?! Se eu soubesse que tu não gostavas de beber mijo, eu tinha pedido outra coisa...
Jones Cunha não passou recibo, mas também nunca mais se aproximou das latinhas de cerveja do Lúcio Preto.
Um comentário:
Esse era o grande Lúcio. Não merecia morrer abandonado pelas irmãs.
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