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sexta-feira, setembro 23, 2011

A encomenda do turco


Clicados pelo Luisão, da Confraria do Peixe: Jorge Tufic, Mauri Marques, Zemaria Pinto e Luiz Bacellar

Dezembro de 1987. O poeta Marcos Gomes estava saindo do Café do Pina, na Praça da Polícia, quando ouviu uns sussurros:

– Poeta!... Êi, poeta!...

Ele ficou intrigado. Ninguém o chamava daquele jeito.

Aqueles sussurros não podiam ser direcionados a ele.

Curioso, começou a olhar para os transeuntes que cruzavam a praça.

De repente, ele avistou o poeta Jorge Tufic, que havia se mudado para o Rio de Janeiro há algum tempo, escondido atrás de uma árvore.

Era ele que estava sussurrando daquele jeito.

– Poeta é você, meu grande Jorge Tufic! Eu não sou poeta, eu sou um mero aprendiz de fazedor de versos de pé quebrado! – devolveu Marcos Gomes, caminhando espalhafatosamente em direção ao turco. “Diga lá o motivo de você ter me distinguido com tal honraria...”

– Poeta, eu preciso de uma favor teu! – avisou Tufic. “É que umas amigas cariocas me pediram uma encomenda aqui da Zona Franca e eu não sei nem como começar a procurar...”

– Encomenda? Que encomenda? – perguntou Marco Gomes.

– Elas me pediram pra comprar meia dúzia de dildos que funcionem a pilha... – devolveu Tufic.

– Dildo? – questionou Marco Gomes, fazendo uma cara de quem estava ouvindo falar pela primeira vez em gravitação quântica.

– É, dildo. É a mesma coias que vibrador! – explicou Tufic, já ficando nervoso.

– Vibrador? – questionou Marco Gomes, fazendo uma cara de quem estava ouvindo falar pela primeira vez que a teoria das supercordas pode solucionar o problema da gravitação quântica.

– É, vibrador. Aquilo que também chamam de consolo! – explicou Tufic, enxugando com um lenço o rosto empapado de suor.

– Consolo? – questionou Marco Gomes, fazendo uma cara de quem estava ouvindo falar pela primeira vez em quarks, léptons, hádrons, bósons, supercordas, gravitação quântica e no Princípio da incerteza de Heisenberg.

– É, consolo de viúva. É o nome daqueles objetos de silicone que imitam um pênis... – desesperou-se Tufic, já a beira de um infarto, a voz quase sumindo.

– Ah, bom! – devolveu Marco Gomes. “Deixa comigo, que eu vou já encontrar essa encomenda!”

O rosto do turco se iluminou.

Os dois atravessaram a Praça da Polícia e entraram na primeira importadora existente no começo da rua Guilherme Moreira.

Marco Gomes chamou o balconista:

– Escuta aqui, bicho! Vocês aqui tem dildo que funciona a base de pilha?

– Dildo? – questionou o vendedor, fazendo uma cara de quem estava ouvindo falar pela primeira vez em gravitação quântica.

– É, dildo, porra! É a mesma coias que vibrador! – explicou Marco Gomes, já demonstrando impaciência.

– Vibrador? – questionou o vendedor, fazendo uma cara de quem estava ouvindo falar pela primeira vez que a teoria das supercordas pode solucionar o problema da gravitação quântica.

– É, vibrador, porra! Aquilo que também chamam de consolo! – explicou Marco Gomes, já achando que o balconista estava zoando de sua cara.

– Consolo? – questionou o balconista, fazendo uma cara de quem estava ouvindo falar pela primeira vez em quarks, léptons, hádrons, bósons, supercordas, gravitação quântica e no Princípio da incerteza de Heisenberg.

– É, consolo de viúva, porra! É o nome daqueles caralhos de silicone macetas, que os viados usam pra enfiar no cu!

Ao escutar a definição de Marco Gomes, Jorge Tufic saiu correndo de dentro da importadora como se tivesse visto o demo e quase foi atropelado por um carro no meio da rua.

O balconista cantou a pedra:

– Ah, parente, aquelas pombas de silicone só são vendidas em lojas especializadas. Não adianta procurar em importadoras, que vocês não vão achar. Aquilo só é vendido em sex shop. Aqui no centro tem uma sex shop, que fica na Dez de Julho, em frente ao edifício Cidade de Manaus. O nome da loja é “Planeta Sexy”.

Marco Gomes agradeceu pela informação e voltou a Praça da Polícia, em busca do poeta Jorge Tufic.

Ele estava escondido atrás do pé do famoso mulateiro, abaladíssimo, a camisa empapada de suor.

Assim que Marco Gomes se aproximou, o turco pagou geral:

– Porra, Marquinho, que conversa foi aquela lá na loja? Aquilo pegou mal! Eu não estou procurando vibrador pra enfiar no cu não. Eu só quero levar a encomenda que umas amigas do Rio de Janeiro me pediram...

– Sim, eu sei, mas se eu não falasse daquele jeito o cara não ia entender! – Marco Gomes tentou contemporizar. “Ele já me disse onde é que tem o produto. Vamos dar uma pernada até o edifício Cidade Manaus, que tem uma sex shop lá perto...”

– Depois desse susto que você me deu, eu não consigo caminhar um quarteirão. Minhas pernas estão tremendo até agora. Vamos de táxi! – explicou Jorge Tufic, ainda visivelmente nervoso.

Os dois embarcaram em um táxi e desceram no local indicado pelo balconista.

Era uma porta discreta, com uma pequena placa adesiva indicando tratar-se do “Planeta Sexy”.

Dentro da loja, dois entediados balconistas estavam conversando.

Nenhum cliente.

A quantidade de vibradores, entretanto, era indescritível.

De todos os tamanhos, grossuras, cores e texturas.

– Vocês tem vibradores que funcionam a base de pilhas? – perguntou Marco Gomes, como se fosse um experimentado frequentador de sex shop.

– De todos os tipos e em várias velocidades! – respondeu um solícito balconista. “E temos, inclusive, com sabores regionais: cupuaçu, jenipapo, marirana, tucumã...”

Os olhos do turco brilharam como diamantes ao sol.

Ele começou a cofiar as pontas do bigode com as duas mãos, visivelmente satisfeito.

Enquanto o balconista começava a descarregar uma grande quantidade de caralhos de silicone em cima do balcão, Jorge Tufic aproveitou a deixa para se livrar do olhar indiscreto de seu acompanhante.

– Obrigado, meu poeta, mas daqui em diante eu me viro sozinho! Você já pode ir embora e muito obrigado por tudo! – explicou Jorge Tufic, quase expulsando Marco Gomes da sex shop.

O poeta Marco Gomes deixou a sex shop e foi direto ao Bar do Armando, para contar a presepada para os cachorros presentes no local.

Que, diga-se de passagem, ficaram simplesmente abespinhados.

Até então ninguém sabia que havia caralhos de silicone com sabores regionais.

Winwenders e aprendenders.

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