Para viabilizar a chegada de linha de bonde ao bairro da
Cachoeirinha, o governador Eduardo Ribeiro decidiu construir uma ponte metálica
na avenida Sete de Setembro, no ponto em que o igarapé do Mestre Chico deságua
no rio Negro.
A nova ponte foi construída no período de 1892 a 1895, com
todas as peças importadas da Inglaterra e sob a supervisão do engenheiro Frank
Hirst Hebblethwaite.
A ponte recebeu vários nomes: Terceira Ponte, Ponte Metálica, Ponte da Cachoeirinha e Ponte Benjamin Constant, mas até hoje é conhecida pelos moradores como “Ponte de Ferro”.
A ponte recebeu vários nomes: Terceira Ponte, Ponte Metálica, Ponte da Cachoeirinha e Ponte Benjamin Constant, mas até hoje é conhecida pelos moradores como “Ponte de Ferro”.
O serviço de viação por bondes foi inaugurado em Manaus em
1896, ainda durante o governo Eduardo Ribeiro.
Funcionando em caráter
provisório, estava sob a responsabilidade do engenheiro Frank Hirst Hebblethwaite
e contava com apenas duas linhas que tinham por fim interligar a área urbana
com os subúrbios, ou seja, as áreas mais distantes com o centro da cidade.
A estação central estava localizada na Praça XV de Novembro, tendo como referência o Pavilhão Universal, localizado nas proximidades dos armazéns da Booth Line.
O serviço atendeu inicialmente aos limites compreendidos
pela estrada Epaminondas, entre a Praça Uruguayana e a Praça Cinco de Setembro,
e entre esta praça e o Igarapé do Baptista, no final da estrada Epaminondas, no
bairro de Flores, nas proximidades de onde hoje está o estádio Vivaldo Lima, praticamente na zona rural da cidade.
A outra linha partia da Epaminondas pelo Boulevard Amazonas até o Cemitério São João Batista, no Alto do Mocó.
A outra linha partia da Epaminondas pelo Boulevard Amazonas até o Cemitério São João Batista, no Alto do Mocó.
Mais tarde, uma nova linha foi inaugurada partindo da estrada Epaminondas, nas proximidades da Ponte dos Bilhares, e seguindo em direção ao bairro de São Raimundo pela estrada velha via ponte de ferro da Cachoeira Grande, que deu origem à famosa
“Rua da Cachoeira”, do bairro de São Jorge.
Em 1900, os serviços estavam sob a responsabilidade da
Manáos Railway Company, empresa inglesa que recebeu consideráveis auxílios para
sua instalação na capital, mas, desde o começo, os seus serviços foram
considerados muito precários pela população.
Deste período é válido ressaltar uma solicitação curiosa: a
imprensa noticiava com frequência que a população solicitava o prolongamento do
horário dos bondes até o fim dos espetáculos quando houvesse programações no
Teatro Amazonas.
Em 1909, a concessão dos transportes por bondes foi entregue
à empresa The Manáos Tramways and Light Co. Ltda, com sede e usina de força
central no Plano Inclinado, no bairro de Aparecida, que gerenciou
simultaneamente os serviços de bonde e o sistema de energia elétrica do Estado.
A empresa, também de origem inglesa, destacou-se por traçar
uma política com posicionamento rígido voltado para a eficiência dos serviços
de bonde.
Seus funcionários, todos estrangeiros, seguiam normas que favoreciam
ao cumprimento de quadro de horário e freqüência no número de viagens.
Trabalhavam uniformizados e atendiam com cortesia aos usuários dos bondinhos.
Em janeiro de 1913, uma nota publicada no jornal O Tempo
demonstrou haver, realmente, uma proposta de qualidade nos serviços
desenvolvidos pela Manáos Tramways.
A mensagem trazia a seguinte informação: “A
Manáos Tramways tem a honra de avisar ao respeitável público que nas noites da
véspera e dia de São João, 23 e 24 de junho, haverá bondes para todas as linhas
durante todas as noites e será aumentado o número dos mesmos para a linha de
Flores”.
A expansão do perímetro urbano da cidade transformou o
bairro da Cachoeirinha em passagem e ponto obrigatório dos serviços de bonde,
fazendo com que o governo estadual arrendasse, em forma de contrato, este novo
serviço para o engenheiro cubano Antônio de Lavandeyra (responsável pela
construção das docas do Porto Flutuante de Manaus) pelo prazo de 70 anos.
No dia 9 de julho de 1918, entretanto, o contrato sofreu
alterações, e o gerenciamento dos bondes da Cachoeirinha foi transferido para a
The Manáos Tramways and Light Co. Ltda.
Para melhor servir os usuários, a empresa construiu um
prédio situado na antiga Praça Benjamin Constant, na saída da ponte metálica,
que servia de garagem dos bondes, laboratório de carpintaria e mecânica,
almoxarifado e oficina de manutenção dos carros da companhia.
O aumento da população, entretanto, forçou a ampliação do
sistema elétrico da cidade e a criação de uma distribuidora de energia que
servisse de apoio à usina central, fato concretizado em 1939, com a inauguração
de uma sub-usina (hoje Amazonas Energia), na mesma praça.
Por volta da década de 40, disputando passageiros com os
bondinhos pelas vias de Manaus, passaram a circular os primeiros ônibus –
confeccionados em madeira e montados sobre chassis de caminhões – que faziam
linha para todas as áreas urbanas e suburbanas da cidade. Foi a partir desse
período que a situação dos “bondes elétricos” começou a ficar comprometida.
A exemplo dos barcos regionais, os ônibus de madeira
possuiam nomes próprios pintados nas laterais: Eneida, Progresso, Brasil, Radiant,
Monte Ararate, Hilariante, Torino, Hudson, Silvia, Girassol, Santa Helena,
Nazaré, Santa Inês, Isabel, etc.
Em pouco tempo, várias kombis-lotação (chamados de
“expressos”) juntavam-se aos ônibus de madeira na disputa por passageiros,
tornando ainda mais complicada a existência dos bondes.
Em 1949, a economia de Manaus apresentava-se complemente
desmantelada e o fornecimento de energia era racionado, o que prejudicava o
funcionamento dos bondes.
Pouco a pouco, a Manáos Tramways foi perdendo o
interesse pelos serviços de viação e, em 1950, apresentou um relatório no qual
alegava que os bondes eram os principais responsáveis por seus prejuízos.
Em 1951, o gerenciamento dos serviços elétricos e, por
conseguinte, o transporte por bondes, passou a ser responsabilidade do Estado, por iniciativa do governador Álvaro Maia.
No mesmo ano, o jornal A Crítica publicou uma notinha dizendo que “os serviços elétricos do Estado são
presentemente, verdadeira calamidade, nem luz, nem bonde, nem força.”
Apesar das inúmeras dificuldades, os bondinhos permaneceram
atuantes por mais de 60 anos.
Eles só deixaram de trafegar em 1957, por decisão do governador Plínio Coelho, mas contra
a vontade da população, que via neles um eficiente e barato meio de locomoção e
uma alternativa a mais em termos de transporte coletivo.
O jornalista Mário Adolfo, meu sócio no vibrante CANDIRU,
tem uma história recorrente a respeito dos bondes da cidade: ele conta que
fabricou muito cerol de papagaio colocando pedaços de vidro nas linhas férreas para serem
pulverizados pelos bondinhos.
Bom, quando os bondinhos deixaram de circular, em 1957, o
Mário Adolfo estava com três anos.
Efetivamente, uma linha do bondinho passava pela rua Borba, diante da sua casa, mas custa crer que a Dona Inês Aryce de Castro fosse capaz de
deixar um fedelho de três anos se aproximar daquela linha férrea, ainda por cima portando cacos de vidro nas mãos para supostamente fazer cerol.
E, apesar de tê-lo visto preparando cerol no final dos anos
60, quando éramos adolescentes, não creio que ele fosse capaz de desenvolver
aquela complicada atividade quando estava com apenas três anos de idade.
O problema é que o Mário Adolfo não dá a mínima para as
minhas contestações pertinentes e continua repetindo a mesma história sempre
que nos encontramos para encher a caveira de birita.
Os principais roteiros de bondes na Cachoeirinha eram os
seguintes:
Circular Cachoeirinha – Praça XV de Novembro, Sete de
Setembro, Ponte Metálica, Waupés, Curva da Morte, Ipixuna, Borba, Manicoré,
Carvalho Leal, Belém, Praça Chile (Cemitério São João Batista), Belém (em
frente ao Parque Amazonense), Boulevard Amazonas, Silva Ramos, Epaminondas,
Instalação e Praça XV de Novembro.
Cachoeirinha-Sete de Setembro – Praça XV de Novembro, Sete
de Setembro, Ponte Metálica, Waupés, Curva da Morte, Ipixuna, Borba, Manicoré e
Carvalho Leal até a Casa Amarela, no cruzamento das ruas Codajás e Carvalho
Leal. Voltava fazendo o mesmo percurso.
Linha do Pobre Diabo – Praça XV de Novembro, Sete de
Setembro, Ponte Metálica, Waupés, Curva da Morte, Ipixuna, Borba e Santa
Isabel, até a igreja do Pobre Diabo. Voltava fazendo o mesmo percurso.
Parada Campelo – Praça XV de Novembro, Sete de Setembro,
Waupés, Curva da Morte, Ipixuna, Borba, Manicoré e Carvalho Leal até a Casa
Campelo, no cruzamento das ruas J. Carlos Antony e Carvalho Leal. Voltava fazendo
o mesmo percurso.
O cruzamento das ruas Waupés e Ipixuna ganhou o nome de
“Curva da Morte” por ser uma curva extremamente fechada e de péssima
pavimentação, que não oferecia boa visibilidade aos motoristas.
O trecho da Waupés entre a Ipixuna e a Silves era
entrecortado por vários igarapés, de forma que necessariamente os motoristas que
vinham pela Waupés eram obrigados a dobrar à direita, na Ipixuna, para
alcançarem o resto do bairro da Cachoeirinha.
Dos vários acidentes lá acontecidos, um batizou
definitivamente o nome da curva.
O fato teve como protagonista o motorista do empresário Abadon Azaro, um abastado comerciante local, que residia à rua da Instalação, no centro da cidade, e era proprietário da famosa Drogaria Comercial.
O fato teve como protagonista o motorista do empresário Abadon Azaro, um abastado comerciante local, que residia à rua da Instalação, no centro da cidade, e era proprietário da famosa Drogaria Comercial.
Como a maioria dos endinheirados da época, Abdon Azaro
possuía um carro inglês de marca Buick.
Certa noite, o motorista escapou à vigilância do patrão e saiu no carro em alta velocidade em direção a Cachoeirinha, onde uma cabrocha o aguardava para os embates de Eros.
Quando entrou na curva a 80 km/h, o carro derrapou nos trilhos do bonde, capotou, e o chofer teve uma morte trágica porque o vidro da porta do carro decepou-lhe a cabeça.
Certa noite, o motorista escapou à vigilância do patrão e saiu no carro em alta velocidade em direção a Cachoeirinha, onde uma cabrocha o aguardava para os embates de Eros.
Quando entrou na curva a 80 km/h, o carro derrapou nos trilhos do bonde, capotou, e o chofer teve uma morte trágica porque o vidro da porta do carro decepou-lhe a cabeça.
Alguns anos depois, um caminhão da fábrica Fitejuta
transportando vários funcionários e camburões de água para debelar um incêndio
que ocorria no parque fabril da empresa, localizado na Carvalho Leal, entrou na
curva em alta velocidade, também derrapou nos trilhos e capotou, matando um
ocupante do caminhão e deixando outras dez pessoas em estado grave.
Mais tarde, o comerciante José Carvalho estava caminhando
pelo meio-fio em direção ao seu estabelecimento (Casa Carvalho) quando foi
atropelado pelo ônibus Radiant, que também havia entrado na curva em alta velocidade.
Felizmente, apesar das fraturas e das escoriações generalizada, seu Carvalho sobreviveu para
contar a história e hoje a Banda do Carvalho, que se reúne na sexta-feira magra
em frente ao seu bar, tem sua concentração localizada exatamente na “Curva da
Morte”.
A Cachoeirinha foi o primeiro bairro de Manaus a ser servido
por uma linha de ônibus, sendo o responsável pelo pioneirismo o motorista
Adelmo Marques (aka “Dedé”), que inaugurou a linha com o ônibus “Periquito da
Madame”.
O veículo era um caminhão com cobertura de madeira na
carroceria e diversos bancos de madeira para dois passageiros dispostos em seu
interior, um formato logo copiado por outros donos de caminhões.
O ônibus saía da Praça Oswaldo Cruz, seguia pela Sete de
Setembro, entrava na Waupés, seguia até a “Curva da Morte”, pegava as ruas
Ipixuna, Borba, Manicoré e Carvalho Leal até a Casa Amarela, retornando pelo
mesmo trajeto.
Ele foi batizado com aquele sugestivo nome devido ao sucesso de uma
marchinha carnavalesca, composta por Nestor de Holanda, Carvalhinho e Teixeira,
que fez muito sucesso no carnaval de 1947: “O periquito da madame come milho, /
come arroz, / come feijão, / mas quase sempre, / o periquito da madame,
coitadinho, / sofre indigestão! / Eu trato bem / o periquito da madame, / tenho
cuidado com a sua refeição. / Não compreendo por que é / que o tal bichinho, /
coitadinho, / sofre indigestão!”.
Aparentemente, qualquer pessoa que possuísse um caminhão podia convertê-lo em um ônibus e depois obter uma licença da prefeitura para trafegar em determinadas linhas.
De uma hora para outra, centenas de ônibus começaram a circular pela cidade.
O ônibus mais famoso de Manaus era o Radiant, pintado nas cores azul marinho e rosa, também feito de madeira.
Suas “porfias” com outros ônibus pelas ruas da Cachoeirinha deixavam os passageiros com o coração na boca.
De uma hora para outra, centenas de ônibus começaram a circular pela cidade.
O ônibus mais famoso de Manaus era o Radiant, pintado nas cores azul marinho e rosa, também feito de madeira.
Suas “porfias” com outros ônibus pelas ruas da Cachoeirinha deixavam os passageiros com o coração na boca.
O ônibus mais estranho era o Sputnik, no formato de um
dirigível Zeppelin, pertencente ao seu Hudson, dono do posto de gasolina
Constelação, localizado ao lado da Casa Amarela.
Os zepelins eram confeccionados em Belém do Pará pela Viação Sul Americana. Tinham carroceria de madeira, ferro e flandres, pintados externamente na cor de alumínio. O interior era forrado em couro e os bancos, alcochoados. Em vez de cobradores, eram tripulados por ‘aeromoças’.
Os zepelins eram confeccionados em Belém do Pará pela Viação Sul Americana. Tinham carroceria de madeira, ferro e flandres, pintados externamente na cor de alumínio. O interior era forrado em couro e os bancos, alcochoados. Em vez de cobradores, eram tripulados por ‘aeromoças’.
No início dos anos 60, foram vendidos para Manaus e São Luiz. Antes disso, porém, inspiraram uma marchinha
carnavalesca muito famosa em Belém: “Mamãe eu quero, quero / andar de zepelim, /
com tanta mulher boa / dando sopa, está pra mim”.
A maior frota de ônibus de madeira e, por extensão, a que
mais provocava acidentes, era formada pelos ônibus vermelhos e brancos chamados
Ana Cássia, cuja garagem ficava em Santa Luzia, de propriedade do empresário Cirilo Anunciação, o “Batará” .
O Hilariante, pintado nas cores verde e amarelo, foi o
primeiro ônibus de ferro a circular na cidade, tendo sido fabricado em São
Paulo pela empresa Marcopolo.
Apelidados de “rabo quente” porque possuíam uma descarga
vertical superaquecida na parte traseira, os ônibus de ferro praticamente
levaram à extinção a prática de “morcegar” os veículos, colocada em prática
pela molecada desde que os primeiros ônibus começaram a circular.
Era quase impossível se aproximar da traseira do ônibus por
causa do calor que irradiava da descarga.
A brincadeira de “morcegar ônibus” consistia em se pendurar
feito um morcego no parachoque traseiro dos ônibus e circular por alguns
quarteirões, para espanto e desespero dos transeuntes que achavam a brincadeira
muito perigosa.
5 comentários:
Muito legal, escriba!
Muito bom o Blog! Está de parabéns!
Sempre fui ligado a história dos bondes em Manaus, o avô do meu pai(Zeca Alfaia) Nicola Gioia, italiano do sul da Itália, quando da chegada em Manaus em 1906 trabalhou muitos anos como condutor de bondes até se aposentar como fiscal da companhia elétrica do estado.
http://www.myheritage.com/photo-4_11094851_11094851/identidade-nicolau-gioia-1
Gente amei esse blog. Lendo isso, foi como comprovar tudo que meu pai falou um dia desses durante o café da manhã. Amo ouvi-lo falar de como era Manaus.
Gente amei esse blog. Foi como comprovar tudo o que meu pai falou um dia desses durante o café da manhã. Amo quando ele conta histórias de Manaus, de como era, como eram os meios de transporte, tudo, tudo. Amoooo.
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