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sábado, agosto 25, 2012

Nunca antes na história deste prostíbulo



Ebert Vêncio
Da revista Bula

“Vem, novinha, delícia do papai! Que as mina tudo pira do jeito que o papai faz...”
(hit da música sertaneja)

A juventude compreende um período da vida deveras melindroso para o desenvolvimento psicossocial de um indivíduo. Quando se é jovem, nada parece impossível, inalcançável, nem mesmo os sonhos mais bestas. É fato: a mocidade está mais para poesia que prosa. Que o digam as musas e seus vates devotados. Houve uma época em que tive cabelos, e rimei muito amor com dor. Hoje, a lira foge dos meus pensamentos como o Tiago foge da cruz (Tiago é o meu vizinho ateu).

Há quase sempre muita energia vital para as atividades físicas, como esportes, pancadarias e sexo. Provocado pela efervescência dos hormônios, o cérebro juvenil funciona a mil por hora. Vive-se o apogeu da irreverência e do potencial criativo. Penando na adultícia, na chatice das encrencas cotidianas, gozando de irrisório élan, o máximo que conseguimos é enxergar, através do espelho retrovisor do tempo, o melhor de nós incrustado no passado longínquo. “Nossa... Éramos tão lindos e atirados...”. Dá até vontade de chorar ao idealizarmos fontes da eterna juventude.

Por causa da impetuosidade, outra característica do mancebo é supor que já saiba tudo. Esta convicção de semideus torna-o arrogante por natureza. Tenho um dileto amigo que hoje trabalha como Juiz de Direito. Antes de adentrar a magistratura, penou, ao longo de três anos, como Delegado de Polícia no interiorzão do Estado. Naqueles idos ainda guardava uma cara de menino.

Empolgado com a nova profissão, sentindo-se o John Wayne do pedaço, uma das primeiras e mais impopulares medidas que o inexperiente e jovial delegado tomou foi lacrar o prostíbulo da cidadezinha.

Na manhã seguinte, antes mesmo que o sino anunciasse a Missa das Onze, uma comissão extraoficial formada pela dona do cabaré, o prefeito, o secretário de finanças do município, dois ou três vereadores, um padre, dentre outros ilibados pais de família da pequena comunidade, foi-se haver com o insurgido delegado.

A turma reivindicava a reabertura imediata do estabelecimento, verdadeiro parque de diversões para os homens adultos, e que proporcionava aos moradores daquele lugarejo lazer inarredável, considerando-se a evidente escassez de opções. Era missa, novena, futebol, quermesse, cabaré... Não passava disso. De tão pacatas, as cidades interioranas, às vezes, conduzem seus cidadãos a desejos interiores incômodos, quando não, inconfessáveis.

Intrigado com a inusitada reação em cadeia, o mandatário mor da cadeia amoleceu e disse que seria autorizada a reintegração do covil, desde que as “di-menor” fossem retiradas do local. Drogas também não as permitiria (exceto, as músicas bregas com três acordes de péssima qualidade), nem fodendo (afoito, assoberbabo, inexperiente com as palavras, desapercebido ele fazia uma desagradável analogia com a fodelança).

Mesmo com engenhosos argumentos em contrário, a ressaltarem que as meninas, apesar da tenra idade, já operavam barbaridade na putaria e na libidinagem por longa data, o jovem xerife não cedeu às pressões da comitiva pró-prostíbulo, reiterando as suas condições para liberar a atividade. O pacto foi selado e todos comemoraram o bom senso do jovem doutor delegado, brindando com o licor de jenipapo trazido pelo pároco. Nos dizeres do religioso, era o Cronista Universal escrevendo certo com as letras tortas.

Uma estória puxa outra e uma crônica se constrói com puxadinhos. Por conta disso, às vezes, o texto vira muquifo. Já fui acusado de escrever muitos textos desconexos. Ainda assim, prossigamos neste arriscado enredo.

Há poucos dias, o Supremo Tribunal de Justiça retrocedeu na decisão que inocentava um sujeito acusado do estupro contra três meninas de 12 anos de idade. Anteriormente, sob a alegação da defesa de que o homem fizera sexo após o consentimento do suposto trio de putas infanto-juvenis (não foi eu quem disse isto; foi um homem vestindo beca), o STJ livrara o acusado.

Houve uma saraivada de manifestações indignadas tanto no Brasil quanto no exterior. Até a complacente ONU chiou. O esperneio certamente colocou juízo na cabeça dos juízes, que tomaram tento ao retroagirem na decisão.

Não entendo muito bem de cabarés, muito menos de leis. Mas, não é preciso ser um delegado de polícia em início de carreira para constatar que um homem adulto, ao despejar suas sementinhas (mais conhecidas como sêmen ou porra) nas delgadas grutinhas de amor daquelas crianças (anatomicamente denominadas vaginas), mesmo com seus consentimentos auferidos à base de moedas, agrados ou guloseimas, esteja, na verdade, cometendo uma atrocidade das mais abjetas que se tem notícia.

Não sei. A humanidade vive fases e fezes. A história está aí à disposição de todos os interessados em compreender um pouquinho da complexa e enigmática mente humana. Por exemplo, meu septuagenário pai conta que a sua avó fora entregue pelo pai a um noivo desconhecido, ainda aos 12 anos de idade, e demorara cerca de trintas dias até permitir ser tocada e desfrutada pelo marmanjo que já contava 34. Moraram juntos durante anos numa casinha de sapé na zona rural. Provavelmente felizes para sempre. Vá entender cabeça de gente...

Entretida com brincadeiras infantis no quintal, minha bisavó levou ene bordoadas do esposo, quando este chegava exausto dos brutos lides da roça, e não encontrava o almoço ainda pronto. Apanhou até aprender que já não era mais uma criança, embora a fantasia insistisse em fazer morada na sua cabeça. Tiveram catorze filhos: uns vivos, outros mortos; uns nascidos com a parteira, outros com o adjutório do próprio marido.

Como aos bois carreiros, o Homem é movido a ferrão, e carece ser estimulado para reagir. Se ninguém tivesse reclamado, possivelmente o meu amigo, ex-delegado novinho, jamais seria demovido (em parte) da sua decisão em interditar o prostíbulo, poupando as menininhas (frutas verdes amadurecidas à força) do desejo incontido daqueles homens de família por vaginas novatas.

Da mesma forma, se a mídia não desse o grito, a justiça brasileira talvez cometesse mais uma de suas injustiças, ao passar as mãos na cabeça de um pedófilo convincente (“Vá em paz, mas não repita mais essas atrocidades, viu meu filho?!”) sem que ninguém se apercebesse.

Se a minha bisavó ainda fosse viva, talvez achasse toda esta zorra uma coisa mais do que normal. Acostumada à miséria existencial, ela diria que “a vida é ruim assim mesmo, meu fio. Só Jesus na causa...”. E abrandaríamos sobremaneira os nossos dilemas brindando com licores de jenipapo.

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