André Forastieri
Gaby Ostentação é
autocomplacente, autoreferente, pseudopopular, marketeira, obcecada com a
imagem, crivada de preconceito de classe, e principalmente boçal.
Claro que tinha que ser apresentada ao público pela primeira
vez no episódio final de Big Brother
Brasil. E apropriadíssimo que a música só alcance todo o potencial de sua
escrotidão no videoclipe.
Gaby prometia mais. Deu nisso – virou “famosa”, uma Preta
Gil cover, modelo plástica-e-photoshop. Anda aparecendo muito na TV. Tem música
na novela das sete. Vem aí o novo disco, produzido longe do Pará e do
tecnobrega, com a missão de tocar na rádio. A “música de trabalho” é Todo Mundo, produzida pelo mesmo Mário
Caldato dos Beastie Boys e de Marcelo D2. “É sobre a nossa felicidade em
receber a Copa em casa e sobre o otimismo de que tudo dará certo”, explica
Gaby, sem ironia visível.
Artisticamente, o álbum nasce supérfluo. O vídeo de Gaby Ostentação é mais que suficiente.
Reúne um bando de famosos dublando Gaby e afetando gracinhas e dancinhas. Gente
como Luciano Huck, Daniela Mercury, Marcelo Adnet, Marcelo Serrado, Fábio
Porchat, Valeska Popozuda, Sérgio Mallandro, Anitta, Dani Calabresa e por aí
vai.
A letra passa pito no funk ostentação. Gaby está acima
dessas questões materiais, agora que não é mais feia e tá na moda. Diz:
Sou rica
Tô ostentando alegria
Gostosa
Do tipo Maravilhosa
Me escuta
sente a pressão
A felicidade não se compra com cartão
O que aprendemos hoje, amiguinhos? Que “o dinheiro não traz
a felicidade”. Falou completar o bordão como aquele velho comercial de Benson
& Hedges, “manda buscar”. Porque o vídeo é um bando de ricos e famosos
pregando à periferia. Gente que tem muito, cantando a maravilha da vida simples
para quem não tem nada.
Gaby Amarantos só aparece no final, silenciosa, carregando
cartazes com as mensagens:
Ostente felicidade
Ostente respeito
Ostente paz
Ostente humildade
O vídeo foi lançado no dia da mentira. Acaba com Gaby dizendo
“claro que eu não virei funkeira, né galera… a gente reuniu todos esses famosos
para falar que a gente pode ostentar muita coisa além do dinheiro, que tá aqui
no coração!”
Ostentar muita coisa, além do dinheiro. Dinheiro que tá aqui
no coração… Entendeu? Arte não é o que o artista mostra, é o que eu enxergo.
Gaby abre o coração, e a gente vê direitinho a grana lá dentro.
Miranda, produtor do primeiro disco de Gaby, e o cara que
fez a música do Pará acontecer nacionalmente, lamentou publicamente, postando
no Facebook:
“Para a artista talentosíssima que é, que lançou um disco
tão inovador e respeitado por todos mesmo que pouco ouvido pelo povo – e pode
ser esse o motivo – retroagir para uma música tão fuleira, brega no sentido
mais errado da palavra, ainda se valendo de uma quase crítica (oportunista?) a
um dos gêneros mais autênticos do país, irmão gêmeo de sua Xirley… ainda por
cima embevecida de personalidades globais! Resta-me perguntar: cadê você, Gaby?
Que nunca mais apareceu aqui… (citando o mestre Odair José).”
Miranda, amigão, grande coração, segue torcendo por Gaby, e
explicitou isso em um segundo post. Eu não. Nem ela precisa da nossa torcida.
Tem novos amigos e boa antena. Captou e ostenta com galhardia o ethos da cena
cultural carioca. Impressionante como os poucos críticos desta velha máfia não
são capazes de capturá-la com tanta precisão quanto Gaby.
Gaby Ostentação
navega no veio principal da cultura que compensa. Rebola no bloco dos
tropicalistas ministros, e de seu cordão de puxa-sacos na academia e mídia. É o
bonde do elogio da ignorância, da fetichização da favela. Trata-se de passar a
mão na cabeça dos escravos, para que eles jamais ousem levantá-la. É tudo por
dinheiro, sempre, sem fim, e quanto mais vier do tesouro nacional, melhor.
Porque do público pagante, sabemos, não vem.
Gaby está prontinha para substituir Regina Casé no Esquenta. E o pior é que certamente
consideraria isso um elogio.
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