Espaço destinado a fazer uma breve retrospectiva sobre a geração mimeográfo e seus poetas mais representativos, além de toques bem-humorados sobre música, quadrinhos, cinema, literatura, poesia e bobagens generalizadas
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sexta-feira, outubro 21, 2011
Causos de Bambas: Ernesto Penafort
(Capa de Getulio Alho. Retrato do autor: Bico de pena de Edmilson Salgado)
enquanto a lua for calada e branca
eu serei sempre o mesmo, este esquisito,
este invisível vulto, apenas visto
quando o vento, de leve açoita as folhas.
enquanto a lua for calada e branca
eu serei sempre o mesmo, apenas visto
quando um raio de sol morre na lágrima
que se despede de uma folha verde.
eu serei sempre assim, apenas sombra,
apenas visto quando a voz de um gesto
colhe no bosque alguma flor azul.
apenas visto quando em fundo azul
voar a garça (o meu adeus ao mundo?),
enquanto a lua for calada e branca.
Julho de 1987. Por conta de desavenças na família, o poeta Ernesto Penafort foi morar uns tempos na casa-ateliê do pintor Anisio Melo.
Sabendo da fixação pela cor azul que movia o amigo, Anisio Melo adquiriu uma caixa de corante alimentício na cor azul piscina e fez um risoto de camarão, usando o corante como um dos ingredientes.
Anisio Melo batizou o prato de “Azul Geral”, título de um dos livros mais famosos do poeta.
Quando foi chamado para experimentar a iguaria, Ernesto Penafort ficou completamente pirado com a obra-prima onde até os camarões eram de um azul resplandecente.
Comeu uns três pratarrazes, depois bebeu meia dúzia de cervejas e foi dormir, após ter elogiado a sensibilidade, o refinamento e os dotes culinários de seu anfitrião.
Anísio foi dar aulas de desenho para seus alunos, nos fundos da residência.
Meia hora depois, o afável Waldir Coutinho, diretor do Instituto Brasil Estados Unidos (IBEU), que funcionava ao lado do ateliê, estava batendo na porta de Anísio Melo, completamente alterado:
– Seu Aníso, seu Anísio, corra que tem um inquilino seu fazendo imoralidades na janela da sua casa! Corra lá e dê um jeito no sujeito ou eu vou chamar a Polícia! O filho da puta já urinou em duas alunas e uma professora do nosso estabelecimento! – disparou o diretor.
Anísio foi ver o que estava acontecendo.
Se deparou com Ernesto Penafort completamente pelado, ainda bastante bêbado, se divertindo em urinar nos transeuntes pelo janelão da frente da casa.
– Que porra é essa, Peninha! Você está ficando louco? – exasperou-se o pintor.
– Louco? Eu estou maravilhado, Anísio, maravilhado! – avisou o poeta. “Eu posso não ter o sangue azul, mas a minha urina agora tem a cor azul e quero que todo mundo saiba. Olha só!”
E disparou um novo jato de urina pelo vão da janela, em direção a rua, quase molhando um rapazola que ia passando.
A urina era de um azul resplandecente.
Anísio conseguiu retirar o mijão da janela, o convenceu a voltar a dormir e, na mesma hora, jogou no lixo o corante alimentício de cor azul piscina.
O risoto “Azul Geral” nunca mais foi repetido.
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