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domingo, novembro 09, 2008

A história da Panair e a ditadura militar


Luiz Zanin Oricchio (AE)

"Descobri que as coisas mudam e que tudo é pequeno, nas asas da Panair." Assim são alguns dos versos da música de Milton Nascimento e Fernando Brant que, em época de censura militar, recebeu o título anódino de "Conversando no bar". Ela é, na voz de Elis Regina, a música mais importante de "Panair do Brasil", documentário de Marco Altberg sobre a companhia aérea fechada de maneira arbitrária na época da ditadura.

Contada com imagens de arquivo e depoimentos, a história não é propriamente sobre uma empresa, uma companhia aérea, mas sobre uma espécie de símbolo de época, devidamente destruído quando a realidade política mudou.

A Panair do Brasil foi criada nos anos 1930, mas passou a funcionar em velocidade de cruzeiro no Brasil desenvolvimentista de Juscelino Kubitschek, nos anos 50. Era uma época de otimismo, na qual o futuro do País parecia se desenhar segundo a vontade de seus criadores. Brasília, indústria automobilística, bossa nova, Copa da Suécia - uma década do sucesso e da modernidade.

A Panair representava isso nos céus. Numa era de glamour da aviação, a companhia se esmerava em busca da perfeição - dos mecânicos às aeromoças. Para aquele Brasil que faria "cinqüenta anos em cinco", conforme refrão do presidente bossa nova, a Panair era a companhia aérea que convinha a um país que, dizia-se, tinha a vocação do futuro.

A Panair começara como subsidiária de uma empresa norte-americana, mas, a partir de 1942, as ações foram sendo compradas por brasileiros, Paulo Sampaio, Celso da Rocha Miranda e Mário Wallace Simonsen. Tornou-se exemplar. No exterior, seus escritórios funcionavam como embaixadas informais do Brasil. Era lá que, em tempos que a internet não existia nem na ficção científica, os brasileiros em viagem iam em busca de jornais da véspera para se informar sobre o País.

A Panair ajudava o Brasil a descobrir a si mesmo, com ligações a pontos mais distantes, como a Amazônia. Ligava-se também à América Latina, aos Estados Unidos e à Europa. Era o simbolismo de uma globalização "avant la lettre". E, pelo que se depreende do depoimento de ex-funcionários, mantinha relacionamento impecável com seus empregados, muitos dos quais constituem ainda hoje a chamada Família Panair. Esses "laços de parentesco" são cultivados em jantares periódicos, cheios de nostalgia e certa indignação.

No azul

E por que indignação? Porque, no auge de sua eficiência e brilho, a Panair teve as asas cortadas pelo governo militar. Suas linhas foram cassadas em 1965, sob alegação de dívidas com a União. No dia seguinte, duas concorrentes, a Cruzeiro e a Varig, já estavam a postos para assumir essas linhas, ainda que em caráter provisório. Provisoriedade que logo se tornou definitiva.

Munidos de documentos, alguns dos membros da Família Panair dizem que, pelo contrário, a companhia era, entre as aéreas, a mais solvente. Estava no azul, voando em céu de brigadeiro. Especulam que a suspensão das linhas se deu para favorecer a Varig, que teria ligações com o governo militar depois do golpe contra João Goulart.

Seja como for, apesar de toda a luta dos seus proprietários, a Panair não conseguiu mais levantar vôo. Sobrevive apenas como uma lembrança. Pelo jeito, uma lembrança muito forte de um tempo, talvez idealizado, mas que marcou época na história brasileira. De formato tradicional, com narração de Paulo Betti, "Panair do Brasil" dá seu recado com eficiência e emoção.

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