Apaixonado por samba desde menino, o delegado Petrônio Carvalho começou sua carreira de pagodeiro na escola de samba Vitória Régia, depois se mudou para a Sem Compromisso e, finalmente, resolveu deitar raízes na Reino Unido, depois que descobriu que um de seus subordinados, o investigador Jairo Beira-mar, era diretor de bateria da escola.
Petrônio Carvalho gostava de tocar tamborim, mas não tinha muita intimidade com o instrumento. Por conta disso, Jairo Beira-mar lhe colocou para tocar caixinha de guerra na “Furiosa”.
Em 1989, a Reino Unido estava concentrada ao lado do cemitério São João Batista, no Boulevard Amazonas, pronta para descer (ou subir, sei lá!) a avenida Djalma Batista com o enredo “Axé Mãe Preta”.
Jairo posicionou a bateria como se deve: caixinhas de guerra e taróis aqui, frigideiras e reco-recos ali, surdos acolá, treme-terra mais atrás, cuícas e agogôs desse lado, tamborins no miolo, essas coisas.
Um atraso inexplicável no desfile – a Barelândia, do saudoso mestre Maranhão, havia cismado de fazer um protesto e teimava em não retirar os carros alegóricos da avenida – fez Jairo ir saber o que estava ocorrendo.
Quando voltou, vinte minutos depois, quase teve um infarto. A bateria havia se transformado numa animada roda de pagode, comandada pelo delegado Petrônio Carvalho.
As garrafas de cachaça circulavam de mão em mão, dezenas de vagabundas, passistas e baitolas rebolavam provocativamente, transeuntes estavam tocando instrumentos da bateria, enfim, uma zorra total. Jairo ficou simplesmente puto.
Enquanto reorganizava a bateria, a escola começou a desfilar. O trabalho de reposicionar os ritmistas – alguns em adiantado estado de embriaguez alcoólica – era quase desumano.
Mesmo assim, Jairo foi em frente. Os que cismavam de tocar “atravessado” recebiam uma baquetada do exigente diretor.
Feita do legítimo pau de ferro, a baqueta especial do diretor de bateria parecia um taco de beisebol.
Quando a escola entrou na Djalma Batista, o delegado Petrônio Carvalho levou a primeira baquetada no ombro, que quase lhe partiu a clavícula:
– Toca direito, porra! Se não quiser tocar, corre pro mato e vai embora! Só não quero ver neguinho vacilão fazendo merda aqui na avenida! Isso aqui é sério, caralho, isso aqui é sério! – fulminou Jairo Beira-mar.
O delegado ficou passado com a reprimentada chula do subordinado, mas não disse nada.
Antes de chegar na Tevelândia, Petrônio Carvalho já havia recebido meia dúzia de baquetadas no ombro. Seu braço esquerdo estava quase desmontado.
Na área de dispersão, com todo mundo chorando, se abraçando e confraternizando pelo belíssimo desfile da escola (que acabou ganhando o título daquele ano), Petrônio chamou o subordinado:
– Porra, Jairo, eu nunca apanhei desse jeito nem do meu pai. Não quero mais saber dessa porra de bateria não. No próximo ano, vê se me arranja um lugar na diretoria de Harmonia. Eu estou saindo daqui pra ir falar com o massagista Dico Paiva, porque acho que meu ombro está fraturado...
Na segunda-feira seguinte, Petrônio apareceu na delegacia com o braço esquerdo na tipoia. Sua clavícula tinha ido mesmo pro espaço.
Ele explicou aos subordinados que o problema ocorrera quando ele estava perseguindo uns bandidos nas quebradas do Puraquequara e levara uma queda da muléstia em uma das ruelas do bairro.
O investigador Jairo Beira-mar, na maior cara dura, confirmou a história.
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