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quinta-feira, novembro 23, 2006

CACASO: O TEÓRICO DO MOVIMENTO



Cacaso nasceu Antônio Carlos Ferreira de Brito em 1944 (Uberaba, MG) e morreu em 27 de dezembro de 1987, no Rio de Janeiro. Aos 12 anos ganhou página inteira de jornal por causa das caricaturas de políticos que enchiam seus cadernos escolares. Mas logo veio a poesia e antes dos 20 já estava colocando letras em sambas de amigos como Elton Medeiros e Maurício Tapajós. Em 67 veio o primeiro livro, A Palavra Cerzida.

Dois anos depois formou-se bacharel em Filosofia pela UFRJ, em 1969. Na época já colaborava nos jornais cariocas Opinião e Movimento e participava ativamente dos movimentos estudantis contra o regime militar. Entre 1970 e 1975 foi professor de Teoria Literária na PUC/RJ. Em 1974 e 1975 integrou os grupos Frenesi, com Roberto Schwarz, Francisco Alvim, Geraldo Carneiro e João Carlos Pádua, e Vida de Artista, com Eudoro Augusto, Carlos Saldanha (Zuca Sardan), Chacal e Luiz Olavo Fontes, produzindo suas próprias coleções, antologias e revistas.

Sua produção poética inclui os livros Grupo Escolar (1974), Segunda Classe (1975), Beijo na Boca (1975), Na Corda Bamba (1978), Mar de Mineiro (1982), Beijo na Boca e Outros Poemas (Antologia - 1985) e Lero-Lero (Obras completas - 2003). São livros que não só revelaram uma das mais combativas e criativas vozes daqueles anos de ditadura e desbunde, como ajudaram a dar visibilidade e respeitabilidade à "poesia marginal".

Sua obra, influenciada por Manuel Bandeira, Carlos Drummond de Andrade e Oswald de Andrade, tematizou a política e o amor em tempos de ditadura e liberação sexual, com humor e crítica social. Como professor e teórico da Comunicação, granjeou a simpatia e a admiração de centenas de jovens poetas.

No campo da música, os amigos/parceiros se multiplicaram na mesma proporção: Edu Lobo, Tom Jobim, Sueli Costa, Cláudio Nucci, Novelli, Nelson Angelo, Joyce, Toninho Horta, Francis Hime, Sivuca, João Donato, etc.

Nas aventuras da vida de artista e nas polêmicas da poesia, os companheiros de viagem se chamavam Leilah Assunção, Pedrinho, Rosa, Paula, Vila Arêas, Davi Arrigucci, Miúcha e Cristina Buarque de Holanda, Ferreira Gullar, Hélio Pellegrino, Afonso Henriques Neto, Ana Luísa, Bita Carneiro, Maurício Maestro e Ana Cristina César, entre outros.

"Aos 43 anos, Cacaso conservava o rosto juvenil, redondo, mantendo ainda os cabelos longos, a barba por fazer e as sandálias de couro. Para uma geração - a de 68 - Cacaso era o poeta, até na sua maneira desleixada de se vestir. (...) Também Cacaso tinha um lado teórico, que lhe servia para explicar aos seus companheiros o que estava fazendo. A poesia marginal, na verdade, foi o grande ‘poema sujo’ de uma geração. Esta poesia rejeitava os dogmas ou uma maneira de se fazer poesia que estava associada aos poetas concretos. Era uma rejeição vital. Afinal, eles não poderiam perder tempo lendo Ezra Pound - o grande mestre da geração concretista. Esta geração desejava falar de poesia e fazer poemas. Isto bastava. E fizeram. Cacaso era uma espécie de tutor deste movimento. Professor de Literatura da PUC, amigo do sociólogo Roberto Schwarz, leitor de autores marxistas, ele dava base teórica para aquela geração. E em vez de Ezra Pound, eles procuram a poesia - límpida e simples - de Manuel Bandeira."


(Wilson Coutinho in O som de um anjo. Jornal do Brasil. Caderno B. 1987.)


"É nas poesias daquela época [anos 70] que Cacaso - misturando procedimentos de Manuel Bandeira, Carlos Drummond de Andrade e Oswald de Andrade a uma percepção original - fez um retrato possível dos sentimentos vigentes num país imerso na ditadura. (...) Poesia política de lirismo discreto, sem nenhum pendor mobilizador, sem se pretender canto arrebatador ou denúncia sisuda de mazelas ditatoriais. Foi através do humor, das inversões de sentido à la Oswald de Andrade, que Cacaso obteve seus melhores resultados nessa fase. Nela, a política estava em maior evidência - mas, em nenhum momento deixou de fundar-se na individualidade de Cacaso, na sua nostalgia de situações perdidas e passadas e no seu estranhamento com o presente. Como no curto e direto ‘Lar Doce Lar’."


(Revista Veja in Trapaças da sorte. 1988.)


"A certa altura, Cacaso imaginou que a sua vida de intelectual e artista seria mais livre compondo letras de música popular do que dando aulas na faculdade. Na época chegou a idealizar bastante a liberdade de espírito proporcionada pelo mecanismo de mercado. Penso que ultimamente andava revendo essas convicções. Seja como for, o passo de professor a letrista, acompanhado de planos ambiciosos de leitura literária, histórica e filosófica, assim como de produção crítica, mostra bem a sua disposição de entrar por caminhos arriscados e de vencer em toda linha. Talvez apostasse que uma certa informalidade de menino lhe permitiria ignorar e superar as incompatibilidades que a nossa cultura ergueu entre arte exigente e arte comercial, entre estudos e estrelato, entre conseqüência política e fruição desinibida. (...)"


(Roberto Schwarz in O poeta dos outros. Novos Estudos Cebrap. 1988).

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