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terça-feira, novembro 28, 2006

MARCELO DOLABELA: GRAFISMO, DADAÍSMO E ROCK & ROLL
















Marcelo Dolabela nasceu em Lajinha (MG), em 1957. Poeta, artista plástico, cantor, compositor, pesquisador musical e professor universitário, ele fez pós-graduação em Letras pela UFMG, onde defendeu uma tese sobre Dolores Duran, e mestrado em Comunicação Social pela Universidade São Marcos (SP).


Ativista do grupo anarco-poético Cemflores, ele é autor de mais de 30 livros de poesia, entre eles "Adeus, América", "Violência", "Gatilho", "Através das paredes", "Arte, Suor, souvenir", "Coração malasarte", "Lúdicos do inferno", "Alimento", "Gata presença", "Mandarins sem fantasias", "Radicais", "Grão", “Amônia” e “Poeminha e outros poemas”.


Foi também autor do texto do curta-metragem "Uakti - oficina instrumental", premiado como "Melhor Curta" e "Melhor Montagem", no "Festival de Gramado de 1987", co-editor da revista Fahrenheit 451 e da equipe de articulistas da revista Fanzine Gass, e produtor e apresentador do programa "Rock Molotov", levado ao ar pela Rádio Liberdade, de Belo Horizonte. Em 1987, publicou o hoje clássico "ABZ do Rock Brasileiro", pela editora paulista Estrela do Sul.


Marcelo Dolabela iniciou a sua carreira musical em Belo Horizonte, em 1982, com o grupo mineiro de pós-punk Sexo Explícito, integrado por Rubinho Troll (voz), Roberto Nosso (guitarra), João Daniel (guitarra), Marompas (baixo) e Rogério (bateria).


Em 1984, o grupo se dissolveu e Marcelo formou a banda Divergência Socialista, ao lado de Gato Jair (voz), Fabiane Andropov (voz), John Ulhoa (baixo) e Rubinho Troll (bateria), cuja sonoridade musical sofria influência do "posite-punk" ao minimalismo de John Cage. Com essa formação, eles gravaram uma fita K-7 pelo selo independente Onda.



Três anos depois, com algumas modificações no núcleo inicial – saíram Fabiane Andropov, Gato Jair e John Ulhoa, substituídos por Silma (voz) e Marompas (baixo) –, o Divergência Socialista lançou outra fita, pelo selo independente Câmbio Negro Produções. O grupo encerrou as atividades no início dos anos 90. Alguns anos depois, o guitarrista John Ulhoa juntou-se a Fernandinha Takai e montou o Pato Fu. Marcelo Dolabela continua fazendo recitais poéticos em Belô.


AUTOEXPLICATIVO

Eu, por exemplo, o radical do traço, Marcelo Dolabela, poeta e dadamídia, o pop mais dadá de Beagá, na linha direta de Rimbaud,
Saravá!
a benção Lígia Clark,
a nossa Modrian da Alegria,
terra de Hendrix de João Gilberto,
a benção Oswald de Andrade,
tu que gritaste com humor todas minhas mágoas de amor,
a benção, Bashô,
a benção Tzara,
a benção Ezra Mallarmé,
sua benção, Hélio Oiticica (Meu irmão!...)
a benção Wladimir Maiakóvski,
a benção, Safo Ono,
a benção meus maus Glauber Sganzela,
vocês, sobrinhos de Vortov,
a benção, Tarsila Crepax,
sua benção Lewis Warhol,
a benção, todos os grandes tropicalistas do planeta,
pop, dadá e antropófago,
lindos como os olhos moles de Pagu,
a benção maestro Luciano Klhiébnikov,
parceiro e amigo querido,
que já viajaste tantas revoluções comigo
e ainda há tantas a viajar,
a benção, Beüys Lichtenstein, parceiro cem por cento,
você que une a ação ao sentimento e ao pensamento,
a benção, Baden & Vinícius,
amigos novos, parceiros novos,
que fizeram este samba comigo, a benção, amigo,
a benção Maestro Walter Benjamim, que não és um só,
és tantos, tantos como meu fuzil de todos os sins,
inclusive o de Guimarães Joyce,
saravá!
a benção, que eu vou partir,
eu vou ter que dizer a Zeus...



HADESKAIS (1)

o poeta tem no sangue
a sífilis de sua geração
e não há fuga, nenhuma paixão,
que o tirará deste mangue.

sempre irá no seu galope
este castigo infeliz:
se curar-se dessa sífilis,
só fabricará xarope.



HADESKAIS (2)

bater a cabeça nesse martelo,
eis o vil duelo da poesia:
quanto mais se erguer glória e castelo
mais farelo soprará a ventania.



HADESKAIS (3)

na loucura, a veia
da poesia sempre pula;
o que não for carne
nem for osso, será medula.



BALANÇO DA DÉCADA

uma década tem mais de cem séculos
dez bilhões de vozes num único eco
mil e uma noites num mero segundo
poucos trilhões de silêncio num ponto

quanto se conta os átomos é ótimo
a hora fica interminável num átimo
não se chega nunca a nenhum lugar
e apenas se volta ao mesmo volume

um só dia tem bem mais de dez décadas
num rústico eco a maior biblioteca
da luz do segundo nenhum consenso
até quanto nos faltará silêncio



MALETTA REVISITED # 86

eu estou: nas maravilhas do mundo
no Coliseu da cidade
no naufrágio dos poetas
ouvindo scherherazade

é o zum-zum da matilha do mundo
da Muralha da China, o barulho,
a baunilha dos vagabundos

única geração que ouve
a triste balada dos mouros
o transplante das décadas
a arcádia sem fé e sem ouro.




ESPELHANDO GODOT

primeiro acontece dentro
acontece como se houvesse
fogo queimado por dentro
pra fora como se acontece

mas depois se esquece quando
se é que o fogo aparece
ou se queima desde quando
é por isso que a gente esquece

esquece primeiro dentro
depois como se nada houvesse
acontecido lá dentro
se vive do que acontece.




PRESUNTOS

sim, há bueiros sobre nossas cabeças

e cães ladram vadios no nosso intestino;

cometemos todo crime, somos heróis:

eis o que nos ensina a lei e o destino.

aprendemos a matar desde menino,

no café da manhã, cortando o presunto;

seguimos, à tarde, seremos bons heróis,

que sabem saborear um bom defunto.

saibamos manejar cifras, colt, palavras,

como um bom cidadão, sensato assassino;

assim, teremos bueiros sobre a cabeça

e vadios cães no nosso verde intestino.

um bom herói se faz desde bem menino,

conhecendo suas leis e seu assunto,

passeando sobre a cidade, bom herói,

recebendo uma medalha por defunto.




REVOLUÇÃO SEXUAL

meu amor

nesta questão de amor

estamos kitsch




AUTO-RETRATO

ser estrangeiro

em qualquer país;

ser passageiro

e ser feliz.




DA LINGUAGEM DO ESPELHO

evito a imagem

mas só o seu espelho

me faz linguagem




DOLORES DURAN

fazer terremoto e neblina

navegar sempre em vão

a palavra mais doce

a palavra mais vida

a fina palavra não.




MESSALINAS

no fim, tudo que escrevo

tem a palavra começo,

descanso de um escravo,

carteiro sem endereço




EDUCAÇÃO SEXUAL

Bety Boop Brotoeja Barbarela

Dale Arden Darla Diana Palmer

Jane Porter

Little Annie Funny

Modesty Blaise Minie Miriam Lane

Narda

Olívia Palito

Violeta Valentina

ejaculação precoce?

não doutor

simplesmente amor amore amour




MÁRIO REIS

toda poesia: busca que me vasa

pela fresta mais secreta de meu mar,

onde uma nau sem rumo, mas em brasa,

persegue cada lance seu olhar.

2 comentários:

Anônimo disse...

Queria tomar umas doses com esse cablocoloko e confabular sobre o que rolar... Ass: Podrera (anônimo da cena underground belorizontina)

Anônimo disse...

Esse moço parece-me muito legal; escreve bem demais. Conheci há muito tempo atrás um outro moço chsmdo Marcos Dolabela de Lajinha (mas num sei se fica em MG). Abraços ao Marcelo. Hiran Pinel