Espaço destinado a fazer uma breve retrospectiva sobre a geração mimeográfo e seus poetas mais representativos, além de toques bem-humorados sobre música, quadrinhos, cinema, literatura, poesia e bobagens generalizadas
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sexta-feira, junho 03, 2011
Aula 56 do Curso Intensivo de Rock: Sex Pistols
O show dos Ramones em julho de 1976, em Londres, foi a gota d’água que despertou a onda punk inglesa.
Na platéia estavam quase todos os que seriam os astros das futuras bandas punk locais, como John Lydon (Sex Pistols), Joe Strummer (The Clash), Siouxsie (The Banshees), os caras do Damned e todo mundo do Jam.
Os Ramones deram o empurrão inicial em todas essas bandas ao demonstrarem, numa espécie de aula prática, que não era preciso dominar qualquer técnica musical para criar um grupo e cair na estrada.
Foi uma palavra de ordem que melhor sintetizou o assalto ao Olimpo do rock: “Do it yourself!” (“Faça você mesmo!”)
Era a adaptação ao mundo pop da pregação dadaísta do poeta romeno Tristan Tzara de que todo mundo podia ser artista – bastava querer.
No início, o punk não era só música.
O movimento prescrevia uma estética (a mais molambenta e estapafúrdia possível), uma política para o rock (imaginava-se que formar uma banda era se rebelar contra o autoritarismo de ter que idolatrar uma banda) e uma política de mercado (pululavam os selos independentes).
O Dammed foi o primeiro grupo punk inglês a gravar um disco em 1976, o Clash era mais politizado, mas o Sex Pistols se transformou na principal banda do gênero.
O grupo surgiu por inspiração do ex-militante anarquista Malcolm McLaren, que já havia produzido nos EUA a banda New York Dolls, uma das precursoras da onda.
McLaren, que até hoje se autodenomina o verdadeiro pai do movimento, elaborou com sua mulher, a estilista Vivienne Westwood, a moda punk na “Sex”, sua butique na King’s Road, especializada em “anti-moda”.
A loja hoje tem o nome de Westwood e lembra um brechó.
Vende roupas retrôs pós-punk como corpetes, espartilhos, colares de pérolas falsas gigantes, jaquetas de couro rasgadas.
Preços exorbitantes.
Westwood fez seu nome com os Pistols.
Na loja tem um relógio andando para trás, sob a inscrição “o mundo vai acabar em...”
Chique, não?
Em 71, a loja chamava-se “Let it Rock” e vendia roupas de teddy boys e velhos compactos simples.
Em 73, era “Too Fast to Live Too Young to Die” e vendia roupas para gangues de moto.
Em 74, era a “Sex”, vendendo tudo quanto era equipamentos sadomasoquistas (chicotes, coleiras, algemas) e demais artefatos para atividades extramaritais.
Em 77, “Seditionaires”, vendendo a estética punk para os extasiados turistas globais.
Estudante de arte nos anos 60, guru teórico de alguns hippies, propagandista e provocador anarquista encharcado pelos golpes de Estado culturais de maio de 68, McLaren já na época vendia em Londres camisetas com os slogans parisienses, entre os quais “Eu tomo meus desejos pela realidade, porque eu acredito na realidade de meus desejos”.
O sujeito sempre foi um image maker privilegiado, para quem toda a história da arte e das idéias deveria ser pilhada em benefício da exploração do mercado consumidor jovem.
No começo, bem que ele tentou forjar uma linha política para o punk: anarquista (na Inglaterra, uma ofensa similar a chamar alguém de “comunista” nos EUA ou de “bom crioulo” na Jamaica) e niilista, tudo isso movido a slogans, algo que McLaren herdou da revolta dos estudantes de maio de 1968.
A jogada do mestre mostrou-se inútil.
Os Pistols eram anarco-niilistas, pregavam o “no future!”, mas havia bandas de todos os matizes.
O The Clash era simpático ao trotskismo.
The Dils estampavam retratos de Engels e a foice e o martelo nas camisetas.
O Stiff Little Fingers, de Belfast, cantava o terrorismo nacionalista irlandês.
Tinha também grupos que acabaram na extrema-direita, defendendo o neonazismo – caso do Sham 69.
Também chamado de rock-da-fila-dos-desempregados, o punk, mais do que do protesto, serviu-se do deboche e da agressão para detonar o conservadorismo britânico.
É verdade que tudo começou na butique Sex, em 75.
Lá, dois velhos conhecidos de McLaren, o guitarrista Steve Jones e o baterista Paul Cook, recrutaram um funcionário, Glen Matlock, para tocar o baixo de sua banda, então chamada The Swankers.
Um dia, junto à juke box da loja, McLaren, Westwood, Jones, Cook e Matlock escutaram um garoto de cabelo verde se esgoelar junto com Alice Cooper em “School’s Out”.
O sujeito chamava-se John Lydon e tinha toda a pinta de um marginal.
Entre Lydon e os outros três Pistols foi ódio à primeira vista.
Os Swankers viraram Sex Pistols, Lydon foi rebatizado como John Rotten (“Joãozinho Podre”) e o movimento punk ganhou uma cara.
Ele era o autoproclamado Anticristo, o que não prometia nenhum futuro, a queixosa voz demente da chamada “blank generation” (“geração vazia”).
Como líder dos Sex Pistols, Johny Rotten aterrorizou as instituições por dois anos no final da década de 70, antes de partir rosnando furioso em direção ao pôr-do-sol.
“God Save The Queen” e “Anarchy In The UK” foram antenas pop que levaram a manifestações nas ruas, debates acirrados no Parlamento e uma enxurrada de enormes manchetes escandalosas.
Quando Rotten largou uma caótica turnê pelos EUA no meio, deixou atrás uma história histérica de um dia-a-dia de drogas, bebedeiras, morte e recriminações.
“Já teve a sensação de ter sido enganado pra caralho?”, foi seu petardo de despedida, após o último e desastroso concerto da banda, em 1978.
Em 1996, Mr. Rotten, ou melhor John Lydon, continuava se curando daquela enorme ressaca, mas não tinha perdido nem um pouco de seu veneno.
Aos 38 anos, ele continuava um mestre na arte de chocar.
Por isso não foi surpresa que seu livro autobiográfico se chamasse “Rotten: no Irish, no black, no dogs” (“Rotten: sem irlandeses, sem negros, sem cães”).
O surpreendente é que aquele homem que ainda afrontava a realeza, os dinossauros do rock e a sociedade de um modo geral, tenha feito algo tão pertinente às instituições quanto escrever um livro de memórias.
Sua infância foi a maior pedreira.
De pais irlandeses católicos, Lydon era apedrejado no caminho para a escola católica pela maioria protestante.
Começou aí a revolta contra o inglês, que o marginalizava por ser de origem irlandesa, e também por ser bastante pobre.
O primeiro passo para sua transformação em Rotten foi a meningite que teve bem criança.
Não só por causa das alucinações (“mais fortes do que qualquer droga”) ou vômitos freqüentes, mas porque a doença o deixou um ano afastado da escola.
Quando voltou, se sentiu isolado, apático e à parte, completamente diferente dos outros.
Acabou sendo expulso da escola católica.
Na escola pública, adotou um visual pré-punk de desleixo total, que seria mais tarde adotado pela estilista Vivienne Westwood.
Foi na escola também que conheceu Simon Ritchie, a quem batizou de “Sid Vicious” em homenagem ao seu ratinho branco e que se transformou no seu melhor amigo.
Depois que pintou o cabelo de verde, Lydon foi expulso de casa.
Foi morar com Sid em apartamentos abandonados de Londres.
Era 1976. Os dois e mais um pequeno grupo de amigos circulavam pela cidade em trapos e com um corte de cabelo cuja idéia era “pegar uma tesoura e arrancar tufos para não ficar nenhuma parte arrumada”.
Bem diferente do rock-spray de hoje usado pelos rebeldes de boutique.
Antes de apodrecer de vez, Lydon perambulava por King’s Road cuspindo nos passantes, arrumando encrencas com outros moleques e exibindo orgulhosamente uma camiseta do Pink Floyd com a frase “I hate” (“Eu odeio”) pichada por cima.
King’s Road, onde McLaren e Westwood tinham sua loja de roupas de borracha e instrumentos de tortura, era a rua mais quente de Londres naquela época.
A loja Sex antes de atrair a molecada, era freqüentada por cinquentões sadomasoquistas.
Depois do primeiro sucesso da banda, virou quartel-general do Sex Pistols e de sua curriola de malucos.
Ao som espacial dos supergrupos de rock progressivo, Rotten, Jones, Cook, Matlock e Sid Vicious (que substituiu Matlock no começo de 1977) contrapunham músicas curtas, com no máximo três ou quatro acordes e muita, muita raiva.
Exemplo de canção: “Sou um anticristo / Sou um anarquista / Não sei o que quero / Mas sei como chegar lá / Eu quero é destruir” (“Anarchy In The UK”).
O Sex Pistols restaurou a agressividade do rock e a ameaça inicial que ele representava para o establishment com seu caráter insolente e raivoso, como ficou demonstrado num célebre episódio.
Na noite de 1º de dezembro de 1976, a atração principal de um programa ao vivo de TV chamado “Today” (algo como o programa do Jô Soares, mas no horário nobre) seria uma banda do primeiro escalão de popularidade da EMI, que cancelou o compromisso quase em cima da hora.
Na falta de alguém à altura, a gravadora decidiu tapar o buraco com os Sex Pistols, que haviam sido contratados em setembro e gravado o single “Anarchy In The UK”.
A repercussão da faixa, lançada no dia 27 de novembro, foi imediata.
Na produção, o veterano Chris Thomas adicionou mais sujeira à canção ao levar Steve Jones a sobrepor 21 vezes sua guitarra distorcida.
Mas o que pegava mesmo era a letra, um verdadeiro atentado ao conservadorismo do Reino Unido: em três minutos, o vocalista Johnny Rotten berrava mensagens de terror político, social e religioso, xingava a principal publicação sobre música da ilha (o New Musical Express, cujas iniciais, NME, soavam como a palavra “inimigo” em inglês) e convocava a plenos pulmões a destruição da ordem vigente.
Por causa disso, os Pistols ganharam inimigos de todos os lados, da imprensa à categoria artística.
A EMI, temerosa, recusou-se a divulgar a fúria iconoclasta da banda.
O NME, como era de se esperar, meteu o sarrafo no grupo.
Sem apoio da mídia, das rádios e até da própria gravadora, a banda tinha tudo para experimentar seus 15 minutos de fama antes de cair no túnel do ostracismo.
Foi nesse clima que, acompanhado do empresário Malcolm McLaren, o quarteto e mais alguns integrantes do então incipiente movimento punk (entre eles, Susan Janet Balion, que mais tarde formaria o Siouxsie & The Banshees, e Sid Vicious) chegaram de limusine aos estúdios da TV Thames.
No camarim, enquanto esperavam a hora de entrar em cena, tomaram um porre – no qual foram seguidos pelo apresentador do programa, Bill Grundy.
“Ele bebeu muito antes de entrar no ar e já estava extremamente agressivo com todo mundo”, acusou Rotten.
Para Matlock, o apresentador não queria entrevistá-los.
“Não por causa do visual, mas porque estava inseguro. Não sabia quase nada sobre a gente”, explicou.
Ao começar o bate-papo, Grundy foi logo disparando a metralhadora.
“Tenho uma informação de que vocês receberam 40 mil libras de uma gravadora. Não parece conflitante com a pregação antimaterialista do movimento punk?’, provocou.
Quando começou a pegar pesado e fazer ironias com o futuro do grupo (“Beethoven, Mozart, Bach e Brahms, todos eles morreram...”), Rotten o interrompeu com o seu típico sarcasmo: “Eles são nossos heróis, compositores maravilhosos que nos fazem ficar excitados”.
E sussurrou: “Grande merda tudo isso”.
Grundy ficou surpreso.
“O que você disse?”
“Nada, apenas um palavrão. Próxima pergunta.”
O entrevistador insistiu para que o termo fosse repetido.
Um dos acompanhantes atendeu ao pedido e disse novamente: “Merda”.
Ao tentar retomar as rédeas do programa, Grundy foi ainda mais grosseiro e perguntou a Siouxsie se ela se assustava ou estava apenas se divertindo ao estar com a banda.
Ao receber um elogio irônico da garota, disparou: “Poderemos nos encontrar mais tarde?”
Foi o estopim para Glen Matlock: “Respeite a mina, seu velho tarado!”.
O apresentador retrucou: “Vamos adiante. Você tem mais dez segundos. Diga algo ultrajante”.
E inflamava ainda mais o músico, que continuava a desfilar impropérios: “Bicha Velha! Filho da Puta! Babaca! Chupador de Buceta! Corno!”
“Vamos lá, mais uma! Que garoto inteligente!”, falava o dono do Today.
A produção foi obrigada a encerrar o combate verbal colocando no ar os créditos finais do programa.
Era a primeira vez que a TV britânica transmitira palavrões.
As linhas telefônicas da Thames ficaram congestionadas por telespectadores indignados.
Steve e Siouxsie ainda se deram ao trabalho de atender algumas pessoas: “Desligue essa porra de telefone imediatamente, seu velho estúpido!”
Quando a polícia chegou à emissora, McLaren havia acabado de colocar todos de volta na limusine para escapar de algo pior.
No dia seguinte, o rescaldo da confusão.
Grundy pegou duas semanas de supensão, de acordo com um conselho de ética das comunicações britânicas.
Jornais sensacionalistas fizeram estardalhaços em suas manchetes.
“Até ontem, era apenas música. Agora é tudo um circo armado”, resumiu Steve Jones.
Curiosidade: a banda que deu um bolo no apresentador Bill Grundy era o Queen...
Contratados pela EMI, foram despedidos três dias depois do episódio na tevê.
A A&M Records pagou à banda 75 mil libras antes de limá-la, o que aconteceu uma semana depois que Rotten e o resto da gangue fizeram uma baderna completa nos escritórios da empresa, vomitando nas plantas de plásticos e molestando sexualmente as secretárias.
Cada vez mais perseguidos pela mídia, eles não tinham onde gravar ou se apresentar.
Gravaram um novo compacto (“God Save The Queen”) pelo selo independente Virgin Records e chegaram ao primeiro lugar das paradas inglesas, embora a música estivesse proibida de tocar no rádio ou na TV.
Em suas letras, roupas e gesticulações, ninguém corporificou melhor o espírito punk do que Johny Rotten e Sid Vicious.
O vazio existencial de toda uma geração e seu desprezo pelos valores estabelecidos ficava evidente numa de suas canções mais conhecidas: “Pretty vacant: we’re so pretty / Oh so pretty vacant / And we don’t care”.
Ou seja: somos lindamente desocupados e estamos cagando e andando pra isso.
Ao mesmo tempo, socialites em busca de emoção convidavam a banda para festas superbadaladas.
Uma vez eles penetraram numa reunião oferecida pelo parlamentar fugitivo John Stonehouse.
“A última vez que o vi ele estava no canto de um quarto fumando um baseado e perguntando onde estava a cocaína”, diz Lydon nas suas memórias.
Ele afirma que os aristocratas do pop, como Mick Jagger e Paul McCartney – pessoas que ele desprezava –, tentaram ganhar acesso à corte dos Sex Pistols.
“Os McCartney me convidavam para ir a casa deles, mas nunca fui. Um dia estava passando pela Harrod’s num táxi quando eles saíram, me viram, e correram atrás do carro, mas eu tranquei a porta”.
Para Lydon, Elton John não passava de “um bufão gordo doido para tomar chá com a Rainha como qualquer ‘social climber’ (‘alpinista social’) da vida”
Quanto ao estilo de vida, se os hippies eram pacifistas e ecológicos, os punks escolheram ser belicosos e escatológicos.
Além dos palavrões que pontuavam suas letras, eles adotaram um agressivo ritual em suas apresentações que consistia em regar a platéia com cerveja, urina e cusparadas.
Lydon diz que os escarros têm origem física.
Ele sofre de sinusite crônica e precisa cuspir de tempos em tempos.
Um dos talentos mais notórios de Sid Vicious era vomitar em cena e ele acabou fazendo escola.
A platéia, por sua vez, retribuía estas amabilidades, arremessando latas e garrafas sobre os ídolos.
Foi também Sid Vicious que acabou inventando a dança oficial dos punks.
Dentro de um círculo imaginário, ele pulava dando socos no ar como se estivesse brigando, jogava a cabeça pra cima e pra baixo e pisava forte no chão.
Às vezes, a título de improviso, Sid batia com sua corrente em volta do círculo.
Logo todos os punks começaram a imitar o estilo e a dança foi batizada de “pogo”, nome de um brinquedo infantil semelhante ao pula-pula.
O Sex Pistols já se apresentava no underground londrino desde 1975, mas só foi atingir a celebridade em junho de 1977.
Na mesma semana em que a Rainha Elizabeth II comemorava o jubileu de prata de seu reinado, os Pistols escandalizavam a Inglaterra gritando “there’s no future”.
O ápice do escândalo aconteceu quando a banda alugou um barco e desceu o rio Tâmisa tocando “God Save The Queen” (“Deus salve a Rainha”, mas no sentido de salvar mesmo).
Completamente chapado, Lydon grunhia o verso “She ain’t a human being” (“Ela não é um ser humano”) e o resto da turma entrava com o refrão: “There’s no future in England’s dreaming”.
Chamada às pressas, a polícia marítima deve ter sentido muita vontade de afundar o barco e fuzilar aqueles malucos, mas era esta percepção da ausência de futuro do sonho inglês que sintetizava o punk britânico.
No mesmo ano, eles lançaram o LP clássico da banda: “Never Mind The Bollocks Here’s The Sex Pistols” (“Esqueçam os escrotos, aqui estão os Sex Pistols”, numa tradução aproximada).
O disco é um documento histórico.
A trilha sonora de um golpe cultural planejado com impressionante atenção a detalhes de promoção e “imagem pública” (a cargo de McLaren).
O som representa uma caricatura do rock.
Assim como o caricaturista exagera os traços dominantes de um rosto, os Sex Pistols eliminaram todos os detalhes supérfluos de um gênero musical já por demais conhecido, projetando o que restara com uma ferocidade deslumbrante.
Um som cru e simples, como o dos Ramones.
A bateria de Paul Cock nada mais do que adequada.
O baixo sólido presente, mas sem nenhum destaque (no disco é Steve Jones que toca).
O timbre da guitarra é sujo e até indistinto, com uma acumulação de overdubs (também de Steve Jones) batalhando por espaço – uma guitarra em cima da outra até o som atingir uma força danada, mas, mesmo assim, estranhamente impessoal.
Cria um clima de música completamente descartável, só que, ao mesmo tempo, pega você pelo pescoço.
É um efeito esquisito, fundamental na trajetória da banda.
E, acima de tudo, a voz essencial de Johnny Rotten, transmitindo ódio e desprezo levados aos extremos.
Já as letras carregam uma acusação.
São difíceis de traduzir – mil imagens, uma atrás da outra, com muita gíria e trocadilhos.
E eles sabiam chegar na hora certa.
“God Save The Queen”, por exemplo, começa assim: “Deus salve a rainha, / O regime fascista fez de você um imbecil, / Bomba H em potencial... / Deus salve a rainha, / Ela não é um ser humano, / Não há futuro nos sonhos da Inglaterra” (O papel de Sid Vicious na banda era exemplificar este imbecil.).
Provocação máxima: durante um tempo, Johnny Rotten nem podia andar na rua sem sofrer agressões.
As rescisões de contrato, que deram uma bela grana ao grupo, são abordadas na faixa “E.M.I.”: “E vocês acharam que estávamos fingindo, / Que nós todos só queríamos dinheiro, / Vocês não acreditam que somos pra valer / Ou perderiam sua atração barata – como a E.M.I.”
Seus alvos eram a complacência e a rigidez não só em formas musicais, como também da sociedade que as valorizava e mantinha.
Se fosse apenas uma questão de garra e raiva, o disco não representaria mais que “um novo álbum de rock”.
E, no fundo, ele não apresenta mais que a mesma velha raiva juvenil de sempre.
O que tornou a posição dos Pistols sem precedentes foi que este desprezo estendia-se até o que eles próprios tocavam.
A garra de Johnny Rotten era alimentada pelo ódio ao rock, o que não excluía o som dos Pistols.
O grupo estava programado para destruir e se autodestruir.
Eles se autoconsumiram furiosamente, sacaneando com meio mundo, inclusive com o Pink Floyd (segundo eles, “The Wall” era um plágio progressivo de “Anarchy In The UK”).
As “pistolas sexuais” se extinguiram em 1978 quando Rotten voltou a ser Lydon e criou no mesmo ano o PiL (Public Image Ltd.).
Sid Vicious morreu de overdose em 1979, depois de supostamente ter assassinado Nancy, sua grande paixão, durante uma crise de paranóia.
Com o PiL, Lydon esteve no Brasil em 1987.
Nos shows no Anhembi e no Canecão, o vocalista ficou apavorado com a chuva de escarros que saudou sua presença no palco.
Hoje diz que no famoso verão de 1976 cuspia por problemas de saúde e não por atitude.
Existe alguma coisa mais rock do que isso?
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Um comentário:
Ótimo texto! Parabéns!
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