Fernando Gabeira
O governo assaltou e arruinou a Petrobras. A tese mais
elementar era esta: parte do dinheiro roubado foi desviada para as campanhas de
Lula, Dilma e tutti quanti.
No Brasil, o elementar nem sempre se impõe. Almas generosas
dizem: não há provas de que os milhões roubados da Petrobras foram usados em
campanha. Todo o dinheiro foi registrado no TRE: contribuições legais. As
empresas que doaram são as mesmas do escândalo. O dinheiro da propina foi
simplesmente lavado.
As almas delicadas não acreditam que tenha havido dinheiro
sujo na campanha e não fazem a mínima ideia de para onde voaram milhões de
dólares. E consideram que está tudo bem com a lavagem de dinheiro, embora isso
seja um crime punido por lei.
Agora a casa caiu. A prisão do marqueteiro João Santana
mostra que ele recebeu dinheiro do escândalo do petróleo como pagamento pela
sórdida campanha de 2014.
Fechou-se o quadro. Ele já estava desenhado no celular de Marcelo
Odebrecht. Numa das anotações falava que as contas na Suíça poderiam atingir a
campanha dela. Quem é ela? Se afirmar que é Dilma, as almas generosas vão
dizer: há milhões de outras mulheres no Brasil.
Delcídio do Amaral já havia advertido Dilma de que a prisão
de Marcelo Odebrecht atingiria sua campanha, porque a empresa pagou a João
Santana no exterior. Mercadante teria dito: a Odebrecht é problema do Lula.
Solidariedade zero entre eles.
Agora, vão dizer que o dinheiro de Santana foi ganho em campanhas
no exterior. Ele fez algumas, no universo da esquerda latino-americana. Todas
pagas regiamente. Acontece que ele enviou o dinheiro do Brasil. Por que as
campanhas lhe pagariam aqui? Acontece que recebeu durante a campanha de Dilma.
Por que as campanhas de fora pagariam fora do tempo?
E como se não bastasse: que outras campanhas levaram
dinheiro de propina de Keppel Fels, que tem um estaleiro no Brasil, opera com a
Petrobras, e seu lobista Swi Skornicki, destinatário de um bilhete da mulher de
João Santana, Mônica, orientando-o a depositar os dólares no exterior?
As descobertas da Lava Jato apenas demonstram com provas uma
tese cristalina: roubaram para permanecer no poder e acumular fortunas. Mas,
sobretudo, para prosseguir no governo, entupindo as campanhas de dinheiro sujo.
Tecnicamente, a Lava Jato seguiu o caminho real: o dinheiro.
É em torno da grana que eles giram como mariposas.
Além da cooperação suíça, as autoridades norte-americanas
foram rápidas em enviar seus dados. Os suíços mantiveram sua disposição de
colaborar.
Enfim, o cerco se fechou, uma parte considerável do mundo se
alia ao povo brasileiro no esforço não só de punir os responsáveis, mas também
de recuperar o dinheiro roubado.
E o governo, os políticos, os brasileiros, em tudo isso? O
que era apenas uma tese que já balançava Dilma se tornou um fato comprovado com
documentos. Aliás, mais documentos do que em outros casos da Lava Jato.
Se fosse uma partida de xadrez, diria que o governo levou um
xeque-mate. Antes apenas se falava que a campanha de Dilma foi feita com
dinheiro roubado. Agora todos sabem.
Mas o PT não é um jogador de xadrez comum, e não só porque
atropela regras. Ele se distancia da própria realidade. Xadrez? Não estou vendo
o tabuleiro. Antena no sítio de Atibaia? Lula não usa celular. Prisão do
marqueteiro? O PT não tem marqueteiro, é apenas um senhor que nos ajuda.
De qualquer forma, será difícil acordar todas as manhãs, num
país mergulhado em crise econômica, e pensarmos que ele está nas mãos de um
grupo que roubou para vencer.
E não será apenas uma certeza política. Estarão lá, diante
de nós, as contas no exterior, os dólares enviados, as transferências,
conversões – enfim, toda a trajetória do fio condutor a que eles estão ligados:
a grana.
De qualquer forma, o episódio é um momento de otimismo, na
medida em que precipita a queda de Dilma. Como as crises estão entrelaçadas,
uma solução política poderia dar algum alento à economia e se um projeto de
transição sério fosse levado até 2018.
O PSDB voltou do recesso dizendo que votaria os projetos de
interesse do país ao lado do governo. Isso me parece correto, pois sempre fui
contra as pautas-bomba que explodem no bolso dos contribuintes. No entanto, não
se deve acreditar ser esse o grande problema da oposição. Seu problema é não
focar na saída da crise: o impeachment. E não trabalhar com uma ideia mais
clara da transição.
Olhando para o futuro próximo, não faz sentido dizer que
vota a reforma da Previdência só se o PT votar também. É um tema inescapável na
transição.
Orientar-se pela posição do PT é, de uma certa forma,
antecipar uma disputa em 2018. Não sabemos direito como será 2018 nem se haverá
PT. O problema é achar um rumo para a transição e fazê-la acontecer com a queda
de Dilma.
Os acontecimento da semana mostram que o jogo de empurrar
com a barriga é apenas um esforço para levar Dilma até 2018, tudo bonitinho,
faixa passada. A realidade, por meio de uma investigação competente, com apoio
internacional, mostrou mais uma vez que é preciso pegar o touro à unha.
Os que esperam 2018 deveriam considerar apenas como ele será
muito pior se nada for feito. Com que cara o Brasil chegará lá, dirigido por um
governo corrupto, incompetente, politicamente nulo?
Quem sabe faz a hora ou espera acontecer? Ao contrário da
canção, às vezes, acho melhor esperar acontecer. Mas, no caso específico, há um
sentido de urgência.
Continuar com esse governo vai desintegrar o país. Uma
terrível animação de Hong Kong já mostra a Baía de Guanabara poluída, atletas
vomitando, a estátua do Cristo Redentor fazendo toneladas de cocô. É uma peça
de humor. Mas se parece muito com o pesadelo que vivemos no Brasil.
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