Por Ruy Castro
Uma das maiores preocupações dos garotos de
1968, além da ditadura militar e da guerra do Vietnã, era namorar. Não que
faltasse com quem. O problema era onde. Namorar era um eufemismo para fazer amor, o qual era um eufemismo para
o muito mais realista fazer sexo. A
pílula já era uma realidade e, naquele ano, em certos círculos do Rio, a
virgindade feminina se tornara um tabu ao contrário: uma garota que chegasse
virgem aos 19 anos tinha vergonha de admitir isso para colegas.
Se fossem solicitados a resolver o problema
das meninas, os rapazes estariam sempre dispostos a ir para o sacrifício. Mas,
onde? Os motéis ainda não existiam, os hotéis para encontros ficavam na
longínqua São Conrado e quase ninguém tinha carro ou dinheiro. No desespero,
ia-se para a praia à noite, principalmente a do Leblon. Era escura,
deliciosamente mal iluminada, deserta e, exceto por algum guarda enxerido e
achacador, com privacidade garantida. Os problemas eram o desconforto e a
areia, donde a expressão “sexo à milanesa”.
A alternativa, para os poucos que tinham
carro, era a corrida de submarino – uma modalidade esportiva noturna, praticada
por casais no banco da frente de seus Gordinis ou Aero-Willys, com os vidros
fechados e embaçados, na orla do Arpoador ou do Castelinho. Nunca se viu um
submarino ao largo, mas a prática era tão socialmente aceita que uma Kombi do
General ficava de plantão nas proximidades, para o indispensável
cachorro-quente de depois.
Mais seguras eram as garçonnières dos amigos. Garçonniéres eram quarto-e-salas mantidos
por homens casados para suas piruetas extraconjugais. Como não as usavam todo
dia, às vezes emprestavam-nas por algumas horas aos amigos e, de repente, sem
que soubéssemos como, a chave caía na nossa mão, sob a condição de que fôssemos
mais rápidos ainda.
Uma delas, por volta de 1966 ou 67, ficava na
rua Paula Freitas, em Copacabana. Ali, muitas vezes estivemos a ponto de morrer
de prazer. Pois imagine o susto ao ler nos jornais, em 1969 ou 70, que aquele
endereço acabara de “cair”. Fora tomado pelos órgãos de segurança, por se
tratar de um “aparelho” da VPR – a Vanguarda Popular Revolucionária, um dos
grupos da luta armada –, com ninho de metralhadoras e tudo, debaixo da cama. E
nunca soubemos se, desde sempre, o cafofo da Paula Freitas já não era um
“aparelho”, só que também usado para fins imorais.
Mais alguns anos se passaram e o romantismo
do sexo à milanesa e da corrida de submarino foi substituído pelo
profissionalismo dos motéis, com seus tetos espelhados, camas redondas e risco
zero. Os nativos se habituaram a esse conforto e assim é até hoje.
Tudo isso foi há muito, muito tempo. Desde
então, tivemos a libertação da mulher, duas ou três revoluções sexuais, a
ascensão e o declínio da Aids, a incrível volta da camisinha e uma brutal
expansão imobiliária, mas, para muita gente, nada mudou – o problema de onde
continua. Os adolescentes sempre terão de improvisar nesse departamento, seja
de escada de serviço do prédio, entre um andar e outro, ou na hora do recreio,
atrás do murundu.
Em 1983, Darcy Ribeiro, então vice-governador
do Rio, anunciou que, depois do Sambódromo, mandaria construir um Beijódromo. O
qual nunca chegou a existir e ainda bem, porque era uma falsa boa ideia. Todo
exibicionismo é bobo, ainda mais quando permitido. Sexo é sempre ótimo, mas,
com transgressão e risco, é muito melhor.
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