Marcelo Dolabela nasceu em Lajinha (MG), em 1957. Poeta, artista plástico, cantor, compositor, pesquisador musical e professor universitário, ele fez pós-graduação em Letras pela UFMG, onde defendeu uma tese sobre Dolores Duran, e mestrado
Ativista do grupo anarco-poético Cemflores, ele é autor de mais de 30 livros de poesia, entre eles "Adeus, América", "Violência", "Gatilho", "Através das paredes", "Arte, Suor, souvenir", "Coração malasarte", "Lúdicos do inferno", "Alimento", "Gata presença", "Mandarins sem fantasias", "Radicais", "Grão", “Amônia” e “Poeminha e outros poemas”.
Foi também autor do texto do curta-metragem "Uakti - oficina instrumental", premiado como "Melhor Curta" e "Melhor Montagem", no "Festival de Gramado de 1987", co-editor da revista Fahrenheit 451 e da equipe de articulistas da revista Fanzine Gass, e produtor e apresentador do programa "Rock Molotov", levado ao ar pela Rádio Liberdade, de Belo Horizonte. Em 1987, publicou o hoje clássico "ABZ do Rock Brasileiro", pela editora paulista Estrela do Sul.
Marcelo Dolabela iniciou a sua carreira musical
Em 1984, o grupo se dissolveu e Marcelo formou a banda Divergência Socialista, ao lado de Gato Jair (voz), Fabiane Andropov (voz), John Ulhoa (baixo) e Rubinho Troll (bateria), cuja sonoridade musical sofria influência do "posite-punk" ao minimalismo de John Cage. Com essa formação, eles gravaram uma fita K-7 pelo selo independente Onda.
Três anos depois, com algumas modificações no núcleo inicial – saíram Fabiane Andropov, Gato Jair e John Ulhoa, substituídos por Silma (voz) e Marompas (baixo) –, o Divergência Socialista lançou outra fita, pelo selo independente Câmbio Negro Produções. O grupo encerrou as atividades no início dos anos 90. Alguns anos depois, o guitarrista John Ulhoa juntou-se a Fernandinha Takai e montou o Pato Fu. Marcelo Dolabela continua fazendo recitais poéticos em Belô.
AUTOEXPLICATIVO
Eu, por exemplo, o radical do traço, Marcelo Dolabela, poeta e dadamídia, o pop mais dadá de Beagá, na linha direta de Rimbaud,
Saravá!
a benção Lígia Clark,
a nossa Modrian da Alegria,
terra de Hendrix de João Gilberto,
a benção Oswald de Andrade,
tu que gritaste com humor todas minhas mágoas de amor,
a benção, Bashô,
a benção Tzara,
a benção Ezra Mallarmé,
sua benção, Hélio Oiticica (Meu irmão!...)
a benção Wladimir Maiakóvski,
a benção, Safo Ono,
a benção meus maus Glauber Sganzela,
vocês, sobrinhos de Vortov,
a benção, Tarsila Crepax,
sua benção Lewis Warhol,
a benção, todos os grandes tropicalistas do planeta,
pop, dadá e antropófago,
lindos como os olhos moles de Pagu,
a benção maestro Luciano Klhiébnikov,
parceiro e amigo querido,
que já viajaste tantas revoluções comigo
e ainda há tantas a viajar,
a benção, Beüys Lichtenstein, parceiro cem por cento,
você que une a ação ao sentimento e ao pensamento,
a benção, Baden & Vinícius,
amigos novos, parceiros novos,
que fizeram este samba comigo, a benção, amigo,
a benção Maestro Walter Benjamim, que não és um só,
és tantos, tantos como meu fuzil de todos os sins,
inclusive o de Guimarães Joyce,
saravá!
a benção, que eu vou partir,
eu vou ter que dizer a Zeus...
HADESKAIS (1)
a sífilis de sua geração
e não há fuga, nenhuma paixão,
que o tirará deste mangue.
este castigo infeliz:
se curar-se dessa sífilis,
só fabricará xarope.
HADESKAIS (2)
eis o vil duelo da poesia:
quanto mais se erguer glória e castelo
mais farelo soprará a ventania.
HADESKAIS (3)
da poesia sempre pula;
o que não for carne
nem for osso, será medula.
BALANÇO DA DÉCADA
uma década tem mais de cem séculos
dez bilhões de vozes num único eco
mil e uma noites num mero segundo
poucos trilhões de silêncio num ponto
quanto se conta os átomos é ótimo
a hora fica interminável num átimo
não se chega nunca a nenhum lugar
e apenas se volta ao mesmo volume
um só dia tem bem mais de dez décadas
num rústico eco a maior biblioteca
da luz do segundo nenhum consenso
até quanto nos faltará silêncio
MALETTA REVISITED # 86
eu estou: nas maravilhas do mundo
no Coliseu da cidade
no naufrágio dos poetas
ouvindo scherherazade
é o zum-zum da matilha do mundo
da Muralha da China, o barulho,
a baunilha dos vagabundos
única geração que ouve
a triste balada dos mouros
o transplante das décadas
a arcádia sem fé e sem ouro.
ESPELHANDO GODOT
acontece como se houvesse
fogo queimado por dentro
pra fora como se acontece
mas depois se esquece quando
se é que o fogo aparece
ou se queima desde quando
é por isso que a gente esquece
esquece primeiro dentro
depois como se nada houvesse
acontecido lá dentro
se vive do que acontece.
PRESUNTOS
sim, há bueiros sobre nossas cabeças
e cães ladram vadios no nosso intestino;
cometemos todo crime, somos heróis:
eis o que nos ensina a lei e o destino.
aprendemos a matar desde menino,
no café da manhã, cortando o presunto;
seguimos, à tarde, seremos bons heróis,
que sabem saborear um bom defunto.
saibamos manejar cifras, colt, palavras,
como um bom cidadão, sensato assassino;
assim, teremos bueiros sobre a cabeça
e vadios cães no nosso verde intestino.
um bom herói se faz desde bem menino,
conhecendo suas leis e seu assunto,
passeando sobre a cidade, bom herói,
recebendo uma medalha por defunto.
REVOLUÇÃO SEXUAL
meu amor
nesta questão de amor
estamos kitsch
AUTO-RETRATO
ser estrangeiro
em qualquer país;
ser passageiro
e ser feliz.
DA LINGUAGEM DO ESPELHO
evito a imagem
mas só o seu espelho
me faz linguagem
DOLORES DURAN
fazer terremoto e neblina
navegar sempre em vão
a palavra mais doce
a palavra mais vida
a fina palavra não.
MESSALINAS
no fim, tudo que escrevo
tem a palavra começo,
descanso de um escravo,
carteiro sem endereço
EDUCAÇÃO SEXUAL
Bety Boop Brotoeja Barbarela
Dale Arden Darla Diana Palmer
Jane Porter
Little Annie Funny
Modesty
Narda
Olívia Palito
Violeta Valentina
ejaculação precoce?
não doutor
simplesmente amor amore amour
MÁRIO REIS
toda poesia: busca que me vasa
pela fresta mais secreta de meu mar,
onde uma nau sem rumo, mas em brasa,
persegue cada lance seu olhar.
2 comentários:
Queria tomar umas doses com esse cablocoloko e confabular sobre o que rolar... Ass: Podrera (anônimo da cena underground belorizontina)
Esse moço parece-me muito legal; escreve bem demais. Conheci há muito tempo atrás um outro moço chsmdo Marcos Dolabela de Lajinha (mas num sei se fica em MG). Abraços ao Marcelo. Hiran Pinel
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