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quarta-feira, novembro 22, 2006

Poesia Marginal, anos 70

Gilfrancisco Souza

Exaurido o ciclo das vanguardas e instaurado o ciclo repressivo político e ideológico, só nos resta, à poesia brasileira, o espaço marginal da produção alternativa. Estávamos no início dos anos 70, quando um enorme e heterogêneo contingente de poetas investiu – usando como armas os seus versos – contra o sufoco da censura e repressão implantadas no Brasil a partir de 1964.

Por que marginal? Didaticamente explicando, era porque, nessa época, os autores que não eram muitos conhecidos, não tinham seus textos publicados pelas grandes editoras. Eram eles mesmos que produziam seus textos e arrumavam uma forma de divulgá-los. Por isso, são conhecidos como poetas marginais e sua poesia, a poesia marginal – porque estava à margem das publicações tradicionais.

Muitos foram os poetas marginais dos anos setenta que se tornaram grandes letristas da música popular brasileira (MPB): Jorge Mautner, Torquato Neto (1944-1972), Waly Salomão (1944-2003), Antônio Carlos Brito, o Cacaso (1944-1988), Charles, Chacal, Geraldo Carneiro, Antônio Risério, Tite de Lemos, Ronaldo Santos, Ronaldo Bastos e Bernardo Vilhena, dentre outros.

O termo marginal vulgarizou-se no universo lingüístico brasileiro a partir da década de 50, quando os planos desenvolvimentistas geraram uma consciência eufórica do progresso. Acreditava-se na transformação rápida de um país subdesenvolvido numa nação de alto nível capitalista.

Nos anos setenta, a palavra marginal associou-se à produção artística, principalmente literária, ultrapassando tanto o seu significado pejorativo, quanto econômico. A poesia marginal abriu um novo e vasto campo para a investigação literária, uma poética com textura gramatical complexa e eficiente.

Por outro lado, não é possível conceituar a "poesia marginal" sem efetuar um estudo dos temas, cuja rede a construiu. Ela trouxe, sem dúvida, a abertura, sensualizou o amor, erotizou o poema e falou claro sobre o que antes era velado e submerso na cena do sonho, ou seja, escandalizou.

Durante os anos setenta, especificamente na Bahia, em São Paulo e no Rio de Janeiro, o artigo do dia era poesia: nos bares da moda, nas portas de teatros, nos corredores das universidades, nos lançamentos, livrinhos circulam e se esgotam com rapidez.

Alguns mimeografados, outros em xerox ou impressos em antigas tipografias suburbanas, raríssimos em offset, romperam o bloqueio das editoras aos novos escritores, em especial aos poetas, imprimindo em matrizes a sua poesia e depois as vendendo em praças públicas, elaborando um produto graficamente pobre, simples, cujo raio de ação, raras vezes, ultrapassava o ambiente onde foi confeccionado.

Ela é "marginal" na medida em que essas condições, bem como sua distribuição, era feita à margem da política editorial vigente, visto que a própria precariedade de sua produção a liberta do quadro alienante e dominador da cultura oficial. Desta forma, devemos destacar que este grau de artesania é de suma importância, pois valoriza a relação autor-leitor através da obra, que se transforma não apenas em veículo mas em objeto lúdico da obra de arte.

Os anos de 1975-1976, no Rio, foram especialmente marcados por uma série de acontecimentos, de uma maneira ou de outra, relacionados com a produção literária, por exemplo: o número de livros de poesias alternativos lançados era bastante elevando bem como era curto o espaço de tempo entre um lançamento e outro.

De certa maneira esse boom poderia ser explicado pelo autoritarismo vigente que, limitando a participação dos jovens na vida política, deixando-lhe aberta apenas a porta da literatura para onde foram canalizados os anseios, os traumas e as verdades de toda uma geração reprimida pelo poderio militar.

Do ponto de vista estético, as inovações dos "marginais", produtores intelectuais de editoração, limita-se ao anticonvencionalismo gráfico. Nela, estariam circunscritos os inúmeros textos da vanguarda, como recusa de uma linguagem do poder. Mas, tudo isso, Waly Sallormoon e Torquato Neto já anunciavam a virada do formalismo experimental, quando publicaram Me Segura qu’eu, vou dar um troço, 1972, e Os últimos dias de Paupéria, 1973, para a nova produção poética de caráter informal.

Durante quase toda a década, houve inúmeras publicações em grupo ou separadamente: Navilouca, Qorpo Estranho, Polém, Pipa, Código, Muda, José, Anima, Gandaia, Escrita, Ficção, Desafio, Paralelo, Pólo Cultural, O Saco, Inéditos, Flor do Mal, GAM, Presença, Malasarte, Alguma Poesia, Intercâmbio, Graúna, Garatuja, Almanaque Biotônico Vitalidade, etc.

Portanto, a editoração marginal ou independente continua a existir num país como o nosso, enfrentando todas as possíveis dificuldades, o escritor queira ou não, é sempre um marginal. Temos aqui a marginalidade editoria, a que se refere Heloisa Buarque de Holanda.

Grupo como Frenesi, da PUC, reunia professores e alunos, gente de duas gerações, uma, cuja trajetória se encontrava em melhor situação que o pessoal da "geração mimeógrafo" em termos de prestígio intelectual. O lançamento da coleção ocorreu em outubro de 1974, reunindo cinco trabalhos de autores diferentes: Corações Veteranos, de Roberto Schwarz, Passatempo, de Francisco Alvim, Grupo Escolar, de Antonio Carlos de Brito (Cacaso), Na busca do sete-estalo, de Geraldo Eduardo Carneiro, e Motor, de João Carlos Pádua (textos e Bita, fotos).

Nuvem Cigana, grupo originário da Escola de Comunicação, é talvez o que conseguiu mais notoriedade em virtude de se encontrar mais bem equipado e de ter tido também a maior permanência no tempo. Além de reunir uma grande diversidade de atividades (poetas, músicos, arquitetos, desenhistas) e até mesmo um bloco de Carnaval: o Charme da Simpatia.

Faziam parte do grupo: Charles, que lançou Creme de lua, Perpétuo Socorro e Coração de Cavalo, Chacal (Quampérios, Olhos vermelhos, Nariz Aniz e Boca Roxa), Ronaldo Bastos (Canção de Búzios), Guilherme Mandaro (Hotel de Deus), Bernardo Vilhena (Atualidades Atlânticas, e as revistas Ponte e Malasartes) e Ronaldo Santos, (Vau Talvegue e 14 bis).

Ao contrário dos outros grupos, que se caracterizam por reunir conjuntos bastante específicos de produtores, a coleção "Vida de Artistas" (1974-1975), agrupa pessoas diferentes e que se encontraram em meio a toda a movimentação e a conseqüente discussão do fenômeno da "poesia marginal", desta forma vão estar presentes poetas como Cacaso (Beijo na Boca e Segunda Classe, com Luís Olavo), Eudoro Augusto (A vida alheia), Luís Olavo Fontes (Prato Feito), Chacal (América) e Carlos Saldanha (Aqueles papéis).

É neste clima de repressão de "desbunde", de questionamento do próprio pensamento de "esquerda", de desarticulação da vida universitária e do movimento estudantil, é que surge Folha de Rosto, na Faculdade de Letras da UFRJ.

Basicamente, o núcleo do grupo era formado pelo baiano Claudius Portugal (criador da marca), Adauto de Souza Santos, César Cardoso e Maria Parulla, que em setembro de 1975, editam a revista Assim, onde reunia textos teóricos sobre literatura, poemas, contos e entrevistas. Traz colaboradores como: Luis Soares Dulci, José Castelo, Sandra Castelo Branco, Severino Méier, Durval de Barros, além de seus organizadores. Boa parte desses colaboradores vai aparecer na antologia Folha de Rosto.

Ainda neste ano, o poeta Claudius Portugal lança seu primeiro livro Konfa & Marafona (Carta à Família) – contos, com prefácio de Heloisa Buarque de Holanda. Deste livro, deveria participar Adauto, mas, no entanto, problemas surgiram durante sua impressão, impossibilitando a idéia inicial do projeto, em reunir contos e poemas. O livro de Adauto foi editado posteriormente, alguns meses depois, precisamente em novembro e se intitulava Konfa & Marafona II, com subtítulo de Urbanóide.

A publicação seguinte a aparecer foi à antologia Folha de Rosto, em 1976, que vinha novamente reunir estas mesmas pessoas da Faculdade de Letras, além de outras a elas ligadas. O último trabalho do grupo, ainda pelo selo Folha de Rosto é o livro que Claudius publicaria nesse mesmo ano, Em Mãos, esse agora de poemas, acompanhado de desenhos e algumas fotos.

2 comentários:

Anônimo disse...

o Centro de Estudos Latinos Américanos através dos seus membros(ÁREA DE PESQUISA) localizou o poeta e crítico de arte Vicente de Percia nos poemas de sua autoria:"A Edson Luís de Lima Souto" e "Por falar de Esperança" em várias publicações em periódicos no Brasil(inclusive jornal de Letras) e Exterior.conceituados ntelectuais rasileiros:João Felício dos Santos,
Rose Marie Muraro e outros.Consta que foi prêmio Master de Literatura na década de 80 e crítico de artes plásticas e música clássica.Em 2003 esteve em Lisboa,PT e Dublim,IR proferindo conferências.Solicito ao escritor informações s/ o SrºPercia e outros escritores que refletem essa época,incluíndo Vsª grato.C.E.L.(transl/Luisa Moldonado Acarreta)

Anônimo disse...

Solicito informação s/ o poeta Vicente de Percia,o mesmo possui prefácios dos intelectuais Nelson Wernecck Sodré,João Felício dos Santos e Rose Marie Muraro."O Centro de Estudos Latino Américanos" conseguiu em periódicos os poemas do referido autor:"A Edson Luis de Lima Souto" e "Por falar de Esperança".Poeta engajado.Grato(transl/Justinnée Jeff)