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quinta-feira, abril 02, 2009

Nas ondas do rádio


Em abril de 1998, o DJ e produtor musical Armandinho Mendes, dono da rádio Novidade FM, me convidou para dar uma guaribada na programação jornalística da emissora. Na verdade, ele queria que os locutores parassem de improvisar (leia-se falar bobagens, como ocorre na maioria das rádios FM) antes, durante ou depois dos blocos musicais.

Para ser franco, o jornalismo da emissora já era tocado com extrema competência pelo meu brother Iran Alfaia, que tinha como braço direito a saudosa Elaine Lima. Na programação musical havia dois caras fantásticos, Marco Antonio Ribeiro e Chacal Coletti, que extraíam o supra-sumo do que havia de melhor, mais recente e mais quente nas pistas de dança do planeta.

Para se ter uma idéia do poder de fogo da dupla, os hits “novidadeiros” das outras rádios locais já haviam saído da programação da Novidade FM há, pelo menos, uns seis meses, depois de terem sido veiculados ad nauseaum. Primeira rádio a tocar Radiohead? Novidade FM. Primeira rádio a tocar Armand Van Helden? Novidade FM. Primeira rádio a tocar Farofa Carioca? Novidade FM. Primeira rádio a tocar Eliana Printes? Novidade FM.

Os locutores também eram da melhor competência: Julio Roberto, Carlão, Walze, Rogério. As locutoras (Tatiana Sobreira e Andressa Belmont) além de competentes, eram qualquer coisa além de gostosas... Ou seja, não havia em que mexer, até porque a rádio já era líder de audiência no segmento jovem.

O problema é que o Armandinho encasquetou com a “folga” dos locutores, que adoravam falar abobrinhas. Aliás, deixei de ouvir rádio (com exceção do programa do Joaquim Marinho, “Zona Franca”, que nessa época era veiculado na Novidade FM e hoje está na Amazonas FM) por causa disso. Chatice por chatice, ainda prefiro as minhas.

Para escapar da sinuca de bico, eu e Iran combinamos o seguinte: nos primeiros 15 ou 20 segundos de cada bloco musical, quando só rola os primeiros acordes dos hits, os locutores leriam uma pequena notinha musical. Podia ser a posição da música na parada da Billboard, a inspiração do músico para compor a letra, alguma curiosidade sobre o artista, enfim qualquer coisa que impedisse os locutores de “improvisar”.

Os programadores musicais, evidentemente, ficaram putos porque aquilo dava uma trabalheira da moléstia. Eles tinham que nos informar, com a antecedência de um dia, a seqüência das músicas e o tempo orquestrado no início de cada bloco de três músicas para que a gente encaixasse os “minicomerciais” de 15 segundos.

Agora calculem distribuir cerca de 220 músicas (sem repetir, claro!), divididas em blocos de três, ao longo do dia (das 7 da manhã às 19h), que era quando rolava a programação “oficial” da rádio. E haja “notinhas” quentes para caber naqueles míseros segundos orquestrados. Minha capacidade (e a do Iran Alfaia) de escrever textos sintéticos foi testada ao limite.

No período noturno, logo depois da “Voz do Brasil”, os locutores, todos “cobras criadas”, eram donos de seus programas e falavam o que bem entendiam. O programa “Um toque de bar”, do Ney Amazonas, rolava das 19 às 20h, só com MPB de raiz, que nem mandioca. O Fernando Araújo entrava em seguida, com o famoso “Speedback”, das 20h às 22h, com os melhores hits de dance music dos anos 70, 80 e 90. Logo em seguida entrava o João Cury, com o charmoso “Hi-Fi”, das 22h à meia-noite, somente com clássicos pop/rock dos anos 50, 60 e 70.

Por último, entrava o DJ Augusto Omena, de meia-noite às 2h, com o programa “Megamix”, onde desfilavam os últimos lançamentos mundiais de house, garage, techno, trance, drum’n’bass, trip hop, raggamuffin’ e o escambal. A partir das 2h até às 6h, quando começava o jornal diário ancorado pelo Carlão, rolavam músicas classudas sem praticamente “break” comercial. Nessa época e nesse horário, 90% dos táxis de Manaus sintonizavam a Novidade FM.

No início, os locutores se atrapalhavam um pouco ao ler as notícias com a ênfase correta, mas com algumas semanas pegaram a “manha”. E, graças à web, era possível acessar sites de revistas eletrônicas sobre música e cultura pop atualizadas diariamente (Billboard, Rolling Stone, Vibe, NWE, Wired, Cash Box), pegar uma notícia legal, traduzir, sintetizar ao máximo e colocar no ar. Mais de 70% das notícias que os cadernos de culturas dos jornais dariam no dia seguinte, a gente dava em primeira mão. Uma farra do boi!

A estrela da casa era o apresentador Rogério, um locutor de pouco mais de 20 anos, nascido em Santarém, com passagens pela TV Liberal, de Belém do Pará, e pela BBC, de Londres. Seu inglês era fluente, sua voz, aveludada, sua dicção, impecável. Ele reconhecia que não tinha muita cultura musical e eu o municiava emprestando livros e revistas sobre música. Ficamos amigos de infância (em parte, porque meu pai também nasceu em Santarém), se bem que ele tivesse idade para ser meu filho. Seu programa ia ao ar das 14h às 16h.

Um belo dia, para a introdução da música “I Belong To You”, do Lenny Kravitz, eu escrevi alguma coisa sobre seu último disco. Era um texto curto, de 10 segundos. Como o Lenny Kravitz insistisse em não abrir a boca, Rogério resolveu improvisar:

– Pra se ter uma idéia, ela esteve recentemente no Japão, divulgando o disco “Five”, e foi aplaudida de pé. A garota está com tudo e não está prosa....

Eu estava na sala de redação, em uma sala na frente do estúdio, ouvindo a rádio, e levei um susto.

Na hora em que começou o break comercial, entrei no estúdio.

– Que porra é essa, Rogério? Onde foi que você leu que esse negão é viado? O cara tá pegando a Vanessa Paradis, uma tremenda ninfeta, e você me vem com essa... Que porra é essa?...

Dessa vez, quem levou um susto foi o Rogério:

– Negão?... Eu li aqui Lenny... Pensei que fosse o nome de uma mulher...

Bom, era esse o nível intelectual de nossos locutores há 10 anos. Mudou muito pouco. Sim, o Armandinho tinha razão em não querer que eles improvisassem. O ouvido do ouvinte não é penico.

É evidente que o Rogério Vaughan nunca mais cometeu alguma gafe semelhante. Nem ele nem os demais locutores, que se esmeravam cada vez mais por dar informações na medida certa, inclusive sugerindo textos introdutórios.

Quase no final do ano, depois de eu passar vários meses reclamando que era um desperdício de talento ele continuar em Manaus, Rogério criou coragem, pediu as contas da Novidade FM e da TV Cultura, onde apresentava o Jornal da Noite, e se mandou pra São Paulo.

Ele ralou um pouco na Rádio Globo e na Band FM, mas depois passou a integrar a equipe de narradores da ESPN Brasil, onde está até hoje. Vaughan também é a voz-padrão dos canais Discovery Channel e History Channel no Brasil, além de já ter sido locutor dos jogos FIFA Soccer. Uma bela e vitoriosa carreira de locutor!

Eu ainda permaneci na rádio Novidade FM até junho de 2000, quando tive que viajar para Manacapuru para ajudar na campanha de reeleição do prefeito Ângelus Figueira.

O Iran Alfaia continuou tocando a rádio, no mesmo formato, mas, algum tempo depois, se mudou para Brasília, onde assessora até hoje a deputada Vanessa Grazziotin (PCdoB). Nossos porres na capital federal dariam para escrever um livro!

Marco Antonio Ribeiro, que trabalhava à noite na engenharia de fábrica da Nokia, resolveu virar executivo, passou alguns meses na Finlândia, e só retornou a Manaus depois que foi promovido a gerente. A gente se encontra de vez em quando.

Armandinho se mudou para a Espanha, para fazer mestrado em engenharia de som, passando mais tempo na ponte aérea Barcelona-Nova York do que em Manaus. Dávamos notícias um do outro por meio de e-mail. No começo do ano passado, ele retornou a Manaus e está tocando a rádio, que virou Radio Mix.

Bom, mas naquele início de década, sem os feitores no pedaço, os amotinados se aproveitaram das circunstâncias para dominar o navio. Em resumo, menos de dois anos depois, a rádio havia voltado ao formato pasteurizado que domina as FMs do país – e haja abobrinhas vomitadas ininterruptamente por locutores metidos a “expertos”. Fazer o que?

MAIS DO MESMO

1. Fiquei sabendo hoje de manhã que no último domingo faleceu a esposa do meu mano Ozimar, funcionário da ALE e presidente perpétuo da agremiação cultural Jovens Livres, da Cachoeirinha, atual campeão de futebol na categoria Masters, do “Peladão”, promovido pelo jornal A Crítica. Não conheci a esposa do Ozimar, que faleceu jovem, aos 45 anos. Soube que ela era doente renal crônica e que se submetia àquelas inenarráveis sessões de hemodiálise três vezes por semana. Tenho alguns amigos que convivem com esse pesadelo há mais de 15 anos. É um sofrimento indescritível, pros paciente e pros seus familiares, totalmente impotentes diante do problema. Espero, de coração, que a esposa do Ozimar tenha, finalmente, encontrado a paz ao lado do Criador. E me irmano a ele e aos seus filhos nessa dor dilacerante. Minhas condolências sentidas, querido Ozimar. E que sua esposa vele por nós.

2. A Thalita Rocha Borges me deu esse toque:

Sou filha de Caio Borges, e em uma de minhas navegadas em busca de algo que matasse a minha saudade, achei seu blog que falava sobre ele! Caio (era assim que gostava de ser chamado até pelos filhos) era um homem maravilhoso, inexplicavelmente irreverente. Gostaria de agradecer seus sentimentos, e convidar a todos os amigos para a missa de 7° dia que será realizada na próxima sexta-feira, dia 3, na Capela São João Batista, ali na Manaus Moderna, próximo da Montanna (Centro) às 19hs. A presença de todos é indispensável. Mais uma vez, obrigada pelo carinho!!!

So sorry, Thalita, mas, infelizmente, nesta sexta-feira ainda vou estar em Manacapuru, acompanhando o deputado Ângelus Figueira nessa sessão itinerante da ALE. De qualquer maneira, vou estar junto com vocês em espírito e pensamento. Meu brodão Caio Borges vai entender e perdoar. Beijão no coração. (SP)

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