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domingo, maio 15, 2011

Aula 82 do Curso Intensivo de Rock: Korn


A perfeição do timing parece ensaiada.

Uma vez que a maioria das ditas bandas de rock está gravando baladas, a volta do heavy metal ganhou impulso triunfal.

Mas não se trata do velho metal satânico.

O novo metal não acredita que o mundo vá acabar tão cedo – afinal, a coleção de merchandising do ano 2003 já está na fábrica.

O visual é mais light: prefere marcas esportivas a roupas negras, adora calças folgadas, tranças descoloridas, piercings e cita o grupo de rap NWA como influência marcante.

Pensando bem, isto é a cara do rock brasileiro atual.

O grupo Korn, que lidera o “movimento”, tem bastante estrada – estreou em 1994 –, mas somente com seu terceiro álbum, “Follow The Leader” (“Sigam O Líder”), alcançou o primeiro lugar na parada da Billboard.


Seus fãs não têm nada em comum com os cabeludos de camiseta preta que ainda lotam os shows do Iron Maiden.

São skatistas de 14 anos com penteados de dreads, cujas irmãs têm todos os discos do Hanson.

Um sinal de que a banda sabe para quem fala é uma das ofensas berradas no álbum: “Você parece uma daquelas dançarinas do vídeo do Hanson”.

Com capa desenhada por Todd McFarlane (criador do gibi Spawn) e participações dos rappers Ice Cube e Trevant (do grupo Pharcyde), além do ator Cheech Marin (famoso por comédias de baixo orçamento e nível idem), “Follow The Leader” aponta os rumos do novo metal.

Rap e metal são os gêneros mais odiados por pais de adolescentes.

Desde a estréia dos Beastie Boys, as bandas que juntaram os dois gêneros vêm fazendo muito sucesso – moleques adoram irritar os pais.


Formado em Bakersfield, Califórnia, pelos parceiros de gandaia James “Murky” Shaffer e Brian “Head” Welch (guitarristas), que recrutaram Reginald “Fildy Snuts” Arvizu (baixista), Davi Silveira (baterista) e Jonathan Davis (vocalista, ex-Sexart), o Korn encontrou o equilíbrio mais irritante nessa fusão, ao manter os vocais guturais, as guitarras em volume insuportável e as letras obcecadas por sexo e violência – quando não por violência sexual.

Em um exemplo de canção romântica, “My Gift To You”, Jonathan Davis fala em estrangular sua noiva durante o ato sexual.

Outra faixa, “Pretty”, lembra os dias de Davis como assistente do médico legista de Bakersfield, falando do cadáver de uma criança de 12 anos, vítima de estupro.

Ele não precisa invocar a besta ou o número de Marilyn Manson para causar calafrios.

Como todo roqueiro desde Elvis Presley, Davis também teve o coração partido.

Mas o que seria uma música sobre corações partidos do Korn?



Uma paulada carregada de urros ofensivos contra “a vadia”, e daí para baixo, demonstrando preferência pelo pior do rap chauvinista.

O vocabulário é pesado, chulo e divertido para quem acompanha os desenhos animados de South Park.

O excesso de referências anais daria uma fortuna a psicólogos dispostos a analisar o passado do cantor.

Ele adora contar sua história para a imprensa, que a analisa de graça.

Diz que sofreu na infância, quando seus pais se separaram, e com a fama de gay espalhada pelos valentões da escola.



O passado “sofrido” rendeu as melhores faixas dos discos anteriores, “Daddy” e “Faget”, do disco de estréia, “Korn (94), e “Lost” e “No Place To Hide”, do segundo álbum, “Life Is Pearchy” (96).

Davis pode ser um misógino, mas jura não professar homofobia.

Uma calúnia favorita dos detratores do heavy metal é que o gênero é música de gays enrustidos – metaleiro costuma tratar mal as mulheres de suas letras.

Depois que Rob Halford, do respeitado grupo Judas Priest, assumiu suas tendências boiolísticas, o boato ganhou uma certa base.

Korn, ao menos, exercita seu humor com o tema.

Na faixa “All In The Family”, Davis e o vocalista Fred Durst, do grupo Limp Bizkit (um dos “filhotes” do Korn), fazem um duelo de ofensas em ritmo de rap (“O meu pau é maior que o seu!”), mas terminam os ataques com declarações obscenas de amor.

Muito cabeludo macho gelou com essa.



Há uma imitação de Beavis & Butt-head no fim do disco, que identifica bem a referência cultural da banda.

Korn despontou em plena era de Beavis & Butt-head e reflete o conflito que tirou a série do ar.

A mesma dupla que procurava seios em videoclipes da MTV conviveu com o beijo de língua entre os integrantes do Red Hot Chili Peppers e os vestidos floridos do grupo Nirvana.

Essas atitudes ousadas ganharam carimbo de “cool” na série supostamente incorreta.

Korn não escapa desse dilema, ainda que o encontre na contramão.

Se Davis se horroriza com menores estuprados e se ressente por ter sido objeto de piadas sobre homossexuais, também acha a violência “cool”.

A banda trouxe alguns dos temas polêmicos do rock alternativo para o metal, como abuso infantil e tolerância sexual, mas não a ponto de deixar a macheza medieval do gênero de lado.



O Korn pode ter tirado o gótico do metal, mas permanece a mentalidade da época dos godos, ostrogodos e visigodos.

Lançado em 1999, o quarto álbum da banda, “Issues”, marcava a busca por um som mais pesado, inspirado pela depressão profunda que Jonathan Davis enfrentou depois que o grupo estourou nas paradas musicais do planeta.

Com faixas que levam nomes como “Dead” (“Morto”), “Falling Away From Me” (“Caindo de mim”) e “Am I Going Crazy?” (“Estou ficando louco?”), a banda estava se consagrando como uma das vozes fortes do público jovem dos Estados Unidos.

O poder do Korn pôde ser conferido na edição de 30 anos do Woodstock, em julho daquele ano, em que eles fizeram uma das mais elogiadas apresentações.

Desde que saiu de Bakersfield, a banda teve uma evolução e tanto: conquistou espaço no mercado via MTV (os clipes deles são campeões de execução, além de ganharem prêmios), organizou sua própria turnê (a bem-sucedida Family Values Tour, que já teve duas edições), saiu na frente no mercado on-line (com promoções e lançamentos exclusivos na Internet) e virou desenho animado (na participação em um episódio de Halloween de South Park).



Para o lançamento de “Issues”, eles resolveram inovar mais uma vez, fazendo um show só para convidados e fãs no histórico Apollo Theater, no bairro nova-iorquino do Harlem, acompanhados de um coral de vozes masculinas e a banda de gaitas de fole da polícia da cidade.

“Sempre gostei de gaitas de fole, porque minha família tem descendência escocesa, e quando soube que o departamento de polícia tinha uma banda, resolvi convidar os caras para o show”, disse Davis.

O cantor, que usou um kilt típico na apresentação, disse que preferiu não ter participações especiais no álbum porque ele conta uma história “com começo, meio e fim”.

“Não teria nada a ver ter alguém de fora”, afirmou ele.

A história a que ele se refere é a depressão e a síndrome de pânico que começou a sentir na época do disco “Follow The Leader”.

“Não conseguia mais levantar da cama sem sentir medo, achava que não ia mais conseguir viver e pensei muito em suicídio”, disse.

Hoje, pai de um menino, Davis diz estar recuperado, mas achava necessário explorar a experiência no disco.

“Acho que todo mundo um dia já pensou em suicídio, em um grau mais sério ou não. E não acho que eu vá influenciar as pessoas a também querer morrer só por ouvir minhas músicas sobre o assunto”.



Davis considera “Issues” o disco mais completo do Korn até agora.

Produzido por Brendan O’Brien, que assinou trabalhos do Rage Against The Machine, Stone Temple Pilot e Pearl Jam, além de ter mixado o último disco do grupo, o álbum tem a fúria das primeiras músicas deles, mas com uma sonoridade mais elaborada, recheada de efeitos e camadas distintas.

Parte da evolução da produção do grupo deve-se ao fato de que todos os integrantes têm influências distintas: enquanto Davis diz ter ouvido “de Duran Duran a Massive Attack, passando por Pantera”, os guitarristas Brian Welcom e James Schaffer gostam mais de speed metal, deixando o baterista David Silvera e o baixista Reggie Snuts com o hip hop mais agressivo.

“Somos como uma família, em que cada irmão gosta de uma coisa”, resume o vocalista.

No início de 2002, o Korn lançou seu quinto disco, “Untouchables”, sem se afastar um milímetro da mistureba rap-metal extremo que o consagrou.

O álbum nada mais é do que a repetição do que a banda vem fazendo, cujo estilo é rotulado como new metal.

“Here to Stay”, a primeira faixa, comprova tal afirmação.

O peso das guitarras encobre qualquer efeito eletrônico e Davis está cantando mais, ao invés de só sussurrar e berrar nas músicas.



O mesmo pode se dizer de faixas como “Blame” e “Hollow Life”, que apesar de conterem os chamados elementos new metal (vocais com efeitos, teclados irritantes em certo ponto), capricham no peso das guitarras, dando um toque quase thrash a alguns pontos.

O mesmo se verifica na cadenciada “Blottled Up Inside”, aonde os riffs lembram muito o velho Sepultura e Davis capricha no vocal.

Mas a banda não se esqueceu de seu passado, e também comparece com faixas como a esquisita “Haiting” (com efeitos eletrônicos e vocais melódicos ou agressivos), e a mais calma “Alone I Break”, aonde Davis volta a sussurrar vocais e gritar.

Mas merece ser citado que ambas também apresentam peso nas guitarras e um bom trabalho na cozinha, mostrando que a banda está investindo mais no peso, e no metal, não só no new.



Destaques? A própria “Alone I Break”, por ser a mais cativante do disco, e “Embrace”, por ser a mais pesada e aonde Davis atinge seu melhor vocal, quase gutural.

Mas todas são muito parecidas, embora a qualidade se mantenha bem além do que o Korn vinha fazendo.

É guitarra pesada, vocal melódico, efeito, ritmo mais lento e vocal agressivo em pelo menos 10 das 14 faixas do álbum.

Fato que não aparece na faixa “Beat It Upright”, de longe a melhor, uma paulada que ao vivo vai entortar pescoços, e a quase hardcore “Wake Up Late”, que seria perfeita, não fosse a quebrada de ritmo que a banda dá logo no começo.

Pelo peso apresentado e pelas sensíveis melhoras na performance dos músicos, é recomendável para qualquer fã de som pesado que esteja disposto a aceitar os elementos do new metal.

Se continuar assim, quem sabe eles fazem algo mais pesado ainda na próxima?

Entre as milhares de bandas de metal existentes no planeta, as seguintes merecem ser curtidas com o volume do CD-Player no máximo: Pantera, Thin Lizzy, Guns N’Roses (os reis do pseudogaragismo maldito), Eletrik, Primus, Kreator, Soul Asylum, Accept, Cinderella, Firehouse, Poison (a linha de frente do estilo metal-farofa por excelência), Red Hot Chili Peppers, Faith No More, Skid Row, Spin Doctors, Ugly Kid Joe, Janes’s Addiction, Ratt, Marillion, Lemonhead, Macabre, Dragon Lord, Warrant, INXS, Anacrusis, Helloween, Amorphis, Boredoms, Merzbow, Atrocity, Brujeria, Cradle of Filth, Nasum, The Dead Youth, Agathocles, Brutal Truth, Sadus, Rotting Christ, Six Feet Under, Carnivore, Dimmu Borgir, Extreme Noise Terror, Celtic Frost, Exciter, Vader, Dying Fetus, Inferno, Burzum, Misfits, Head of David, Anal Cunt, Fall of Because, Death, Crowbar, Immortal, Mayhem, Pitchshifter, Bolt Thrower, Sacred Reich, Death Angel, Grindcrusher, Sodom, Exodus, Grip Inc., Impaled Nazarene, Machine Head, Overkill, Nuclear Assault, Testament, Whiplash, Terrorizer, Saint Vitus, Anhatema, Trouble, Cathedral, Bethlehem, Fear Factory, Eterne, Dark Angel, Fishbone, Godsend, Opeth, Therion, Evereve, In Flames, Sirrah, Coroner, Hefeystos, Lake of Tears, Dead Can Dance, Love Like Blood, Your Shapeless Beauty, Ved Buens Ende, Misanthrope e Temperance.

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