São um insulto aos brasileiros de bem e um escárnio da
Justiça os termos da colaboração premiada assinada entre o sr. Joesley Mendonça
Batista e a Procuradoria-Geral da República (PGR), já que acintosa e
escandalosamente benéficos ao delator. Depois de ter praticado graves e
inúmeros crimes, o sr. Joesley recebeu tão somente uma multa de R$ 110 milhões,
que, diante do seu patrimônio, é irrisória.
Atônito ficou o País ao saber que o Ministério Público (MP)
se comprometeu a não oferecer denúncia contra o sr. Joesley em relação a
qualquer dos crimes delatados, em frontal desobediência à lei, que veda esse
tipo de benefício aos que são líderes de uma organização criminosa (Lei
12.850/2013, art. 4.º, § 4.º, I).
Não era necessária especial sagacidade à Procuradoria para
atinar que o sr. Joesley era, de fato e de direito, o líder da organização
criminosa. Nos vídeos gravados pela PGR, a fala do sr. Joesley é explícita a
respeito de quem tinha a voz de comando na operação, definindo o que fazer e o
que não fazer.
Ainda mais grave que a colaboração premiada foi a reação do
procurador-geral da República, Rodrigo Janot, diante dos questionamentos a
respeito da lisura e da conveniência de uma delação tão benéfica a um criminoso
da laia do sr. Joesley. Evidencia que o País tem hoje um procurador-geral da
República desnorteado, que parece desconhecer o seu papel e a sua
responsabilidade.
Em artigo publicado no portal UOL, Janot reclama que “o foco
do debate foi surpreendentemente deturpado. Da questão central – o estado de
putrefação de nosso sistema de representação política – foi a sociedade
conduzida para ponto secundário do problema – os benefícios concedidos aos
colaboradores”.
Ora, o debate não foi deturpado. É plenamente legítimo que a
sociedade questione a razão para se conceder um ilegal benefício ao sr.
Joesley. O procurador-geral, no entanto, não está disposto a debater essa
questão, e prefere simplesmente reafirmar sua querida tese: “O estado de
putrefação de nosso sistema de representação política”.
Eis aí uma deficiência séria que se observa na atuação do
Ministério Público. Alguns de seus membros estão deixando de lado o trabalho que
lhes cabe – a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses
sociais e individuais indisponíveis, como diz a Constituição – para se ocuparem
primordialmente de uma causa política, a demonstração de que todas as
instituições, exceto o Ministério Público, estão podres.
Tal visão das coisas não encontra respaldo nos fatos. O sr.
Joesley garantiu que não comprava apenas políticos, mas também procurador. Ou
seja, o MP não é incorruptível e exige, como qualquer instância pública,
controle e acompanhamento.
Com toda essa história, ficou claro que o sr. Joesley
conseguiu engambelar perfeitamente o procurador-geral. “Em abril deste ano, fui
procurado pelos irmãos Batista”, narra Rodrigo Janot no artigo que publicou em
sua defesa. “Trouxeram eles indícios consistentes de crimes em andamento – vou
repetir: crimes graves em execução –, praticados em tese por um senador da
República e por um deputado federal.”
Como se saberia depois, ele não resistiu aos encantos dos
dois irmãos e deu-lhes remissão da pena em troca das preciosas informações que
eles tinham para contar. Das quais, por sinal, não verificou a veracidade antes
de dar-lhes publicidade.
Melhor seria que o MP não estivesse tão desejoso de receber
com facilidade delações e denúncias, e se dedicasse à investigação propriamente
dita. Trabalhasse da forma como deveria, sem entrar em choques tão frequentes
com a Polícia Federal, o procurador-geral da República não teria tanta certeza,
mencionada no artigo, “de que o sistema de justiça criminal jamais chegaria a
todos esses fatos (narrados pelos irmãos Batista) pelos caminhos convencionais
de investigação”.
É perigoso para um País quando o procurador-geral da
República confere mais crédito aos caminhos não convencionais que aos caminhos
convencionais de investigação. Como se vê, há mais que indícios de que o sr.
Janot já não sabe onde se situa o norte firme da lei e da Constituição.
Se excessos ou omissões há de sua parte, a Constituição
prevê caminhos para sua substituição. Afinal, numa República, sempre deve
prevalecer a lei e a ela também se sujeita aquele que deve guardá-la.
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