Valentina de Botas
É normal passear aos domingos, como neste 16 de agosto, um
domingo como outro qualquer e isso o torna especialíssimo: é coisa corriqueira
cidadãos de um país que buscam a trilha da civilização marcharem contra um
governo ladrão e inepto, anormal é não fazê-lo; e é especial porque levou 13
anos para raiar. Somos corriqueiros, portanto reconhecemos quando o destino
salpica coisas especiais no nosso cotidiano acostumado a si mesmo.
Então, tudo se perfuma, não é mesmo? São ridículos os atos
grandiloquentes, cansativas as falas retumbantes. Há virtude e nobreza em viver
na trivialidade. Sonhamos; nascemos; temos na ponta da língua, sem conseguir
lembrar, o nome daquele filme com aquele ator que teve um caso com aquela atriz
que era a preferida daquele diretor. Que mais? Desperdiçamos nosso tempo e o
alheio; perdemos a hora.
Coisas básicas, comezinhas, emprestando algum sentido à
realidade que quase sempre se vira sem ele. Dilma Rousseff, continuadora do
regime que torna o assalto ao Estado uma normalidade com a qual o brasileiro
vinha se ajeitando e dando graças Deus; a presidente que verga, mas não quebra
porque lhe foi mais lucrativo quebrar a Petrobras; e que, vestindo a
legitimidade do cargo como uma roupa que não lhe serve mais, janta com
autoridades dos três poderes rebaixadas no festim escarnecedor para deglutir a
institucionalização do país.
A incompetência e a arrogância convictas mantêm Dilma alheia
ao agravamento da crise econômica e em confronto com a maioria da população.
Assim, o presidente da CUT, nutrida por uma grana da qual está dispensada de
prestar contas recolhida até de quem não é sindicalizado, anuncia a luta armada
para defender a mamata concedida na república de pixulecos. A grandiloquência
da patifaria no Palácio da Alvorada, patrimônio de todos nós que pagamos tudo,
ofensiva à democracia verdadeira, louva a democracia fictícia dos vigaristas em
mais um ato de escárnio com as instituições e a nação.
Com que armas o sindicalista paramilitar lutará? Compradas
onde e de quem? Vai atirar em gente desarmada? Os que marcharemos no domingo
não temos sequer as oposições, armados que estamos apenas com a lei e nossa
indignação. A presidente encontra-se sitiada pela lei, da eleitoral ao código
penal, e não pela “turma do Leblon” ou “dos Jardins”, ao contrário do que
vociferou o líder do MTST que fura a fila das moradias populares. Cerzindo a
continuidade do mandato com apoios comprados e arrendados, nessa hybris sem
volta, Dilma Rousseff insiste em ignorar os anseios por normalidade da
população.
Claro, dia 17 seremos ainda um país onde apenas metade das
residências tem rede de esgoto, com uma educação desoladora, com uma canalha
política gozando a vida, enfim, ainda um país sob a vigência de mazelas
curáveis se aplicado o tratamento correto, mas a passividade diante da anomalia
chamada PT, o fenômeno mais sórdido da história da república, é vulnerabilidade
que agrava todas as outras. Dia 16 só será especial se os indignados marcharmos
pela normalidade.
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