Por Felix Valois
De acordo com os jornais, o segundo turno da eleição
presidencial vai ser decidido entre um órfão da ditadura e um filhote do PT. É
o mesmo que dar ao condenado a opção entre a forca e a guilhotina. Ou, como
fazia a Inquisição, conceder ao herege a graça de ser esganado antes da
fogueira, desde que renunciasse a satanás. Caso contrário, era churrasco humano
ao vivo e a cores.
É difícil compreender como chegamos a essa situação. Faz
apenas trinta e três anos que a ditadura acabou. Parece assim que ela nunca existiu
e mesmo os que dela se lembram com angústia e medo (é o meu caso) são obrigados
a ouvir sua relativização, assim como se ela não tivesse sido nada demais na
história do país. Basta ver que o ministro Dias Toffoli, presidente do Supremo
Tribunal Federal, declarou, ainda esta semana, que os militares fizeram em 64
apenas “um movimento”. Levou uma reprimenda da Associação dos Juízes para a
Democracia. E com razão. É certo que Sua Excelência não era nascido naquela
época. Mas os fatos, não é preciso vivê-los para conhecê-los. Se assim fora,
não haveria evolução.
Vamos tolerar a minimização do magistrado. Foi um movimento.
Acontece que esse movimento tem denominação específica na ciência política, que
o conhece, desde longas datas, como “golpe de Estado”. E o que se viu na
sequência deste também tem nome muito claro e inconfundível: ditadura, com o
adjetivo militar. O presidente constitucionalmente empossado foi deposto;
mandatos populares foram cassados e os direitos civis jogados no lixo,
inclusive com a suspensão da garantia do habeas corpus. Se isso não era
ditadura, minha velha e veneranda avó seria uma bicicleta.
Adicione-se a isso o ambiente soturno imposto pelo medo,
Prisões arbitrárias viraram rotina, ocorrendo pelo simples mau humor do coronel
de plantão. Pessoas desapareciam. Nunca mais foram vistas, como foi o caso de
nosso conterrâneo Tomás Meireles. A tortura nos cárceres oficiais era prática
do cotidiano, com cidadãos sendo submetidos à mais vil e cruel violência física
e psicológica. Tudo isso quando não ocorria o assassinato puro e simples do
dissidente do regime.
Foi assim por mais de duas décadas. Saímos finalmente e
logramos implantar uma ordem constitucional que, mesmo com seu viés
democrático-burguês, representa um mínimo de segurança jurídica, a permitir que
direitos sejam exigidos e obrigações legalmente cobradas. Por incrível que
pareça, depois dessa reviravolta monumental, já dentro da nova ordem jurídica,
ascende ao poder, com legitimidade e amplo apoio popular, o Partido dos Trabalhadores.
Deste nos livramos ainda não faz três anos, depois de sua
permanência por treze. Seria, sem dúvida, exagero dizer que a desgraça foi tão
grande quanto na ditadura. Mas não foi por falta de vontade e dedicação dos
dirigentes da agremiação. Se já não se viam as manifestações explícitas de
violência policial e oficial, a desonestidade passou a cavalgar sem freios, sem
peias, num espetáculo de libertinagem corrupta, capaz de fazer corar o mais
empedernido dos gângsteres.
Ali despontava o mensalão, com a desatinada compra de votos
de parlamentares para satisfazer objetivos imediatos do governo. Mais adiante
surge o maior esquema de paternalismo e populismo que o Brasil já conheceu,
difundindo-se, qual a bubônica, a praga das cotas e das bolsas. A meritocracia
foi pro brejo porque se deliberou que era necessário dar primazia a critérios
de raça e posição social na escolha de quem poderia desfrutar de serviços
oficiais no campo da educação.
Campo, aliás, em que vimos uma queda monumental, exibindo
professores com salários aviltados e um ensino fundamental de qualidade mais do
que deplorável. A ordem era não reprovar ninguém para que as estatísticas
oficiais pudessem se vangloriar de um êxito tão fictício quanto criminoso. E
ainda, de permeio, o enriquecimento assustador de alguns indivíduos, como foi o
caso de um filho do Lula, gênio que logrou deixar de ser lavador de bunda de
elefante no zoológico para brilhar no mundo das finanças como um grande e
corajoso investidor. Sem esquecer a nescidade da Dilma, com a sua estocagem de
ventos e a sua mulher sapiens.
Pois muito que bem. São os representantes de uma e outra
dessas linhagens que se apresentam como possíveis vencedores do pleito. É
demais para a minha velhice. Quem me dera pudesse eu caminhar singelamente para
a morte, mantendo elevada a crença que sempre tive neste meu grande país. Não
mais os ares ou eflúvios da ditadura ou do PT. São eles fétidos e infectos. O
Brasil merece coisa melhor. Vou continuar acreditando nisso. E, de qualquer
maneira, recuso-me a optar entre a corda e a lâmina. Se for o caso, que me deem
a cicuta.
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