Outubro
de 1988. Eu ainda estava meio de ressaca, numa manhã de sábado, quando recebi
um telefonema da minha irmã Simone. Ela queria saber se eu conhecia algum
médico ortopedista que pudesse emprestar seus pensos cirúrgicos para uma
emergência. Eu sequer sabia que diabo eram “pensos cirúrgicos ortopédicos”.
– São
uns equipamentos que servem para tracionar e esticar os ossos de uma perna! –
ela tentou explicar.
Continuei
boiando.
–
É que o irmão de uma amiga minha sofreu um acidente de carro nesta madrugada e
precisa ser operado com urgência, mas os pensos cirúrgicos ortopédicos do
Hospital Getúlio Vargas estão todos sendo usados – insistiu.
Falei
que iria falar com Rogelio Casado, Manuel Galvão e Eugênia Turenko, já que a
maioria dos meus amigos médicos eram psiquiatras. Talvez eles pudessem me dar
alguma dica, sei lá. Só no começo da tarde, ainda sem localizar os tais pensos
cirúrgicos ortopédicos, é que fiquei sabendo que o irmão da amiga da Simone era
o Nei Parada Dura. Foi um choque.
Há
alguns anos, o boêmio Nei Parada Dura
tinha um novo amigo de gandaia que nunca soube como se chamava. A gente, lá no
Bar do Aristides, o chamava de “Cabeludo” (porque ele parecia um hippie tardio
com a cabeleira na altura dos ombros) ou de “Maria Bonita” (porque o sacana era
bonito como um travesti imitando a Raquel Welch, apesar de ser espada matador
registrado em cartório). Era um bom jogador de sinuca e bebia como gente
grande.
Numa
noite sexta-feira, os dois foram farrear com uma meninas sapecas lá pras bandas
do Bar Xorimã. Por volta das 5h de sábado, já com o dia quase amanhecendo,
resolveram tomar a saideira em um boteco no início da Avenida Noel Nutels, na
Cidade Nova. De repente, as meninas pediram pra ir pra casa. Em vez de chamar
um táxi e despachar as garotas, Nei Parada Dura, um eterno cavalheiro de fina
estampa, resolveu levá-las em casa, no final da Cidade Nova, no seu próprio
carro. Cabeludo ficou esperando pelo parceiro no boteco.
Quando
estava voltando pro boteco – provavelmente em alta velocidade, imagino, já que
o sacana gostava de correr –, Nei Parada Dura, morto de bêbado, aparentemente
dormiu na direção do carro e entrou na traseira de um caminhão da Brahma, que
estava parado na frente de um bar, com os operários descarregando os vasilhames
de cerveja para um boteco. Com o impacto, os ossos das pernas se quebraram e
foram parar em seus quadris, provocando uma hemorragia interna.
Ele
foi levado para o Hospital Getúlio Vargas, onde os médicos conseguiram estancar
a hemorragia. Mas o hospital não possuía os tais pensos cirúrgicos. Salvo
engano, ele foi removido do HGV para um outro hospital, onde também não havia
os tais pensos cirúrgicos. Na tarde de domingo, sem ainda ter sido operado, Nei
Parada Dura atravessou o espelho. Menos de um ano depois, Cabeludo estava
participando de um “racha” na estrada da Ponta Negra, perdeu a direção do carro
e se esborrachou num poste. Morte instantânea.
Os dois devem estar continuando
a gandaia no Paraíso, já que nunca foram mesmo de ficar parados. Saudade
miserável de vocês, homeboys!
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