Milhares de
jovens brasileiros e brasileiras têm uma ideia fixa: tacar fogo no colégio e
sair do Brasil (ou vice-versa). O intercâmbio, ou swing de famílias, é a única
maneira que esses jovens têm de tornar realidade seu tão sonhado sonho de
conhecer outros povos e poder fumar maconha no meio da rua, numa boa.
Existem duas
modalidades de intercâmbio: o intercâmbio oficial e o intercâmbio paralelo. Mas
o que é importante ressaltar é que o intercâmbio não é mais um privilégio de
poucos. É um privilégio de muitos poucos. Só com muita grana ou com uma propina
da Petrobrás você consegue sustentar na sua casa um americano de dois metros
de altura à base de Big Mac, leite tipo A a e Jack Daniel’s. O mais importante
é você escolher bem a família com a qual você pretende trocar figurinhas, óleo
e experiência. Famílias com sobrenome Rotschild, Rockfeller e Forbes são uma
boa pedida, mas devido à grande procura, nessas famílias só se consegue vaga no
quarto de empregada da casa do cachorro.
Dito isso, pare de
bater essa carreira, pegue o espelho e mire-se no exemplo desses jovens que se
aventuraram, longe de seus entes queridos, em terras estranhas, onde se pode
fumar maconha no meio da rua, numa boa. Por conterem cenas chocantes, emoções e
rapazes fortes, os relatos que publicaremos a seguir não devem ser lidos por
analfabetos que sofrem do coração.
Alabama, terra de contrastes – “Meu pai sempre quis que eu
aprendesse uma língua. Meu pai era de Portugal e dizia que, se soubesse falar
português, hoje estaria rico. Um dia o velho meteu na cabeça que tinha que me
mandar pros Estados Unidos para aprender português. Vendeu a Rosca de Ouro, sua
padaria de estimação e, com o dinheiro arrecadado, me mandou pros States.
Minha
família americana morava em Wicheeta do Norte, no interior do Alabama. A cidade
era pequena. Na rua principal, só havia uma drugstore (loja de drogas), uma barber-shop
(loja de barbas), um drive-in (carros dentro) e cinquenta shopping-centers
(shopping-centers).
Meu pai
americano se chamava Bob Pai e era o mais famoso taxidermista da cidade. O
nome da minha mãe americana era Mildred, e meus irmãos se chamavam Skip e Bunny.
E também tinha a minha irmã gostosa americana, a Sue Ann, que a garotada na rua
chamava carinhosamente de Bitch.
A coisa mais
difícil no intercâmbio é você se adaptar aos novos hábitos. No início eu
estranhava um pouco quando via meu pai americano (american father) sair de
manhã com sua espingarda para caçar crioulos. Outro problema foi a comida. Como
bom filho de português, estava acostumado a comer coisas leves no café da
manhã: tripas à moda do porco, bacalhau à Zé do Pipo e um café com leite. Mas
lá nos States eles dão muita importância à primeira refeição (breakfast) e
minha mãe americana me obrigava a comer tudinho. O intercâmbio é legal por
isso. Você pode fazer lá fora coisas que não pode fazer aqui. Comer a mãe, por
exemplo.
Uma coisa em
que nós estamos adiantados no Brasil é em matéria de higiene. Só porque eu
tomava banho todo sábado, como meu pai me ensinou, o pessoal achava que eu
tinha alguma doença de pele. Lá em Wicheeta
do Norte, o dia do banho anual era esperado com ansiedade moderada. Todas as
casas da região enchiam suas tinas de água e tinha início o ritual do banho
comunitário (community bath). O banho era de família: primeiro a mãe americana,
depois a filha americana. Nesse dia, o sabonete (soap) caiu no chão e meus irmãozinhos
americanos (Skip e Bunny, dois metros cada um) me pediram para abaixar e pegar.
O intercâmbio é legal por isso: você pode fazer lá fora as coisas que não pode
fazer aqui. Tomar no rabo (ass), por exemplo.
Mas o mais difícil foi aprender
inglês. As frases
que eu tinha decorado no CCAA não me foram muito úteis. O pessoal caía na
gargalhada quando eu dizia: “Don’t worry about, it’s just a mosquito bite”, ou
“What about Mount Kilimanjaro, in Tanganika?”.
Outra coisa
comum nos Estados Unidos é o jovem trabalhar desde cedo. Eu aparava a grama,
consertava a cerca, rachava lenha, colhia algodão, trabalhava nas minas de
carvão, vendia carros usados e, no fim de semana, fazia faxina nos cinquenta
shopping-centers. Meu pai americano dizia que com o dinheiro economizado nesses
trabalhos eu ia poder mandar Skip e Bunny para a universidade.
De todos os
momentos que vivi durante esse intercâmbio o que mais me marcou foi o rodeio,
quando meus colegas de turma me amarraram e marcaram com ferro em brasa na
minha testa a palavra asshole (babaca), lembrança que trago comigo até hoje e
não sai da minha cabeça.” (Joaquim Ferreira dos Santos Filho).
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