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sábado, novembro 25, 2017

Na internet, a compaixão é um sentimento em extinção


Recauchutado – O submarino ARA San Juan: na reforma, ele foi cortado ao meio para a troca de quatro motores (Argentina Navy/AP)

Por Augusto Nunes

Oito dias depois do desaparecimento de um submarino argentino num ponto impreciso do Atlântico, o mundo ainda ignora o que aconteceu com os 44 tripulantes ─ 43 homens e uma mulher. Se houve uma explosão, alguém sobreviveu? Se permanece intacta, quando se esgotou a reserva de oxigênio? Em que parte do oceano estão marinheiros derrotados na luta pela vida ou corpos à espera de resgate e sepultamento em terra firme? A ausência de respostas torna as perguntas insuportavelmente aflitivas.

Desde o primeiro minuto, acompanho a saga dos argentinos sumidos no fundo do mar com angústia e espanto. Angustia-me imaginar o desespero crescente de um punhado de seres humanos surpreendidos pelas trapaças do destino. Espanta-me o pouco interesse despertado pela tragédia no mundo da internet, um mundo que até recentemente reagia com mobilizações imediatas e portentosas ao topar, por exemplo, com a imagem de alguma baleia encalhada numa praia da Polinésia.

Nos grandes sites, aos posts sobre o drama pavoroso, quase sempre rasos e burocráticos, seguem-se dois ou três comentários ─ às vezes nenhum. Um texto publicado nesta quinta-feira no UOL, por exemplo, mereceu uma única observação: o leitor se declarou indignado com um prosaico erro gramatical cometido pelo redator anônimo. Num Brasil embrutecido pelo Fla X Flu interminável e feroz, talvez não haja mais espaço para manifestações de solidariedade.

Até pouco tempo atrás, fossem quais fossem o palco da tragédia e a nacionalidade das vítimas, ondas de clemência irrompiam, espontâneas e vigorosas, instantes depois da primeira notícia. É penoso constatar que, no Brasil do século 21, é o ódio o mais poderoso motor das mobilizações no universo digital. A cólera epidêmica pode ter transformado a compaixão num sentimento a caminho da extinção. 

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